STJ – AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2597210 - PR (2024/0100821-7)
ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que "para que o credor possa anular o negócio jurídico havido em fraude, é preciso que seu crédito tenha sido constituído antes da realização do negócio tido como fraudulento" (AgInt no AREsp 1028709/RJ, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/09/2017, DJe 13/10/2017). Aplicação, na hipótese, da Súmula 83 do STJ. 2. A alteração das conclusões adotadas pela Corte de origem acerca da existência de fraude contra credores, realizado mediante a análise dos fatos e a datação específica dos marcos temporais, implica o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice disposto na Súmula 7 do STJ. 3. A solidariedade decorre de pacto negocial ou da lei (art. 265 do CC/02) e, no caso em concreto, verifica-se que o agravado/recorrido possui legitimamente, por contrato, o direito de regresso em face do agravante/recorrente, porquanto, como restou consignado, o recorrente é devedor solidário e contratualmente responsável pelo eventual prejuízo da empresa que ambos eram sócios, sendo, portanto, obrigado solidariamente pelo ressarcimento do dano, na forma da responsabilidade civil. 4. O conteúdo normativo do dispositivo legal tido por violado, relativo à tese de prescrição (art. 25 , II e IV, da Lei n.º 8.906/94), não foi objeto de exame pela instância ordinária, mesmo após o julgamento dos embargos de declaração opostos pelo ora recorrente. Ademais, nas razões do especial deixou o insurgente de apontar eventual violação do artigo 1.022 do CPC/2015, razão pela qual incide, na espécie, a Súmula 211 desta Corte Superior. 5. Agravo interno desprovido. (AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.457.805/SP, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 3/10/2022, DJe de 6/10/2022.) Confiram-se, ainda, os seguintes precedentes: AgInt no AREsp n. 1.679.153/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Tu
Decisão completa:
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2597210 - PR (2024/0100821-7)
RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZI
AGRAVANTE : MANOEL PEDRO PEREIRA LIMA
AGRAVANTE : ELISA MAIA DOS SANTOS LIMA
ADVOGADOS : CARLYLE POPP - PR015356
JAMILE APARECIDA MACHNICKI - PR060484
AGRAVADO : BRADESCO SA CORRETORA DE TÍTULOS E VALORES
MOBILIÁRIOS
ADVOGADO : VIDAL RIBEIRO PONCANO - SP091473
DECISÃO
Cuida-se de agravo (art. 1.042 do CPC/15) interposto por MANOEL PEDRO
PEREIRA LIMA e ELISA MAIA DOS SANTOS LIMA, em face de decisão que não
admitiu recurso especial da parte ora insurgente.
O apelo extremo, fundado na alínea "a" do permissivo constitucional, desafia
acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Paraná, assim ementado (fls. 590-596, e-
STJ)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E
MORAIS. 1. PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO DOS PREJUÍZOS ADVINDOS
DE OPERAÇÃO ESTRUTURADA EM BOLSA DE VALORES E REALIZADA SEM
AUTORIZAÇÃO DOS ACIONISTAS. ACORDO EXTRAJUDICIAL, NO QUAL AS
PARTES, DE COMUM ACORDO, ACEITARAM O REEMBOLSO DE 50% DO
CUSTO DE LIQUIDAÇÃO ANTECIPADA E DERAM PLENA QUITAÇÃO, COM
RENÚNCIA EXPRESSA AO DIREITO NO QUAL SE FUNDA A AÇÃO.
IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO INICIAL. SENTENÇA REFORMADA. 2.
SUCUMBÊNCIA. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS. 3. LUCROS CESSANTES,
TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA INCIDENTES SOBRE O DANO MORAL
E DECAIMENTO MÍNIMO DO PEDIDO. QUESTÕES PREJUDICADAS. 4.
HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO CABIMENTO. 1. Em se tratando de direito
disponível e diante da validade e eficácia da transação extrajudicial havida entre as
partes, prevalece a cláusula de quitação e de renúncia do direito pelos autores,
razão pela qual a reforma da sentença é a medida que se impõe, a fim de julgar
improcedente a pretensão inicial. 2. Diante da improcedência da pretensão inicial
em sede recursal, necessária a redistribuição do ônus sucumbencial determinado
na sentença, nos termos do caput do art. 85 do CPC. 3. Em consequência da
reforma da sentença e da redistribuição do ônus de sucumbência, resta
prejudicada a análise da apelação dos autores relacionada aos lucros cessantes,
ao termo inicial dos juros de mora incidentes sobre o dano moral e ao decaimento
mínimo do pedido. 4. Incabível a majoração da verba honorária em grau recursal
prevista no art. 85, §11, do CPC, se um dos requisitos necessários fixados pelo
STJ não foi preenchido: o não conhecimento integral ou o desprovimento do
recurso. Apelação Cível provida. Apelação Cível 2 (Elisa Maia dos Santos Lima e
Manoel Pedro Pereira Lima) prejudicada.
Irresignada, a parte apresentou embargos de declaração, assim ementados (fls. 624-629,
e-STJ):
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA.
PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO DOS PREJUÍZOS ADVIDOS DE
OPERAÇÃO ESTRUTURADA EM BOLSA DE VALORES E REALIZADA SEM
AUTORIZAÇÃO DOS ACIONISTAS. ACORDO EXTRAJUDICIAL, NO QUAL AS
PARTES, DE COMUM ACORDO, ACEITARAM O REEMBOLSO DE 50% DO
CUSTO DE LIQUIDAÇÃO ANTECIPADA E DERAM PLENA QUITAÇÃO, COM
RENÚNCIA EXPRESSA AO DIREITO NO QUAL SE FUNDA A AÇÃO. ACÓRDÃO
QUE DEU PROVIMENTO AO APELO DA REQUERIDA, A FIM DE REFORMAR A
SENTENÇA E DE JULGAR IMPROCEDENTE A PRETENSÃO INICIAL.
ALEGAÇÃO DE OBSCURIDADE E DE OMISSÃO. VÍCIOS INEXISTENTES.
QUESTÕES DECIDIDAS DE FORMA CONTRÁRIA AOS INTERESSES DOS
EMBARGANTES. REDISCUSSÃO. IMPOSSIBILIDADE. VALORAÇÃO DA
PROVA. LIVRE FUNDAMENTAÇÃO. Os embargos de declaração são cabíveis
somente para sanar omissão, obscuridade ou contradição contida no julgado, ou
ainda, para sanar erro material. Ausentes quaisquer dessas hipóteses, devem ser
rejeitados os aclaratórios. Embargos de Declaração rejeitados.
Apresentado Recurso Especial, foi reconhecida nulidade na decisão dos
embargos e determinada análise expressa das teses do ora insurgente (fls. 777-781, e-
STJ).
Realizado novo julgamento, assim ementado (fls. 811-817, e-STJ):
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA.
PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO DOS PREJUÍZOS ADVINDOS DE
OPERAÇÃO ESTRUTURADA EM BOLSA DE VALORES E REALIZADA SEM
AUTORIZAÇÃO DOS ACIONISTAS. ACORDO EXTRAJUDICIAL, NO QUAL AS
PARTES, DE COMUM ACORDO, ACEITARAM O REEMBOLSO DE 50% DO
CUSTO DE LIQUIDAÇÃO ANTECIPADA E DERAM PLENA QUITAÇÃO, COM
RENÚNCIA EXPRESSA AO DIREITO NO QUAL SE FUNDA A AÇÃO. ACÓRDÃO
QUE DEU PROVIMENTO AO APELO DA REQUERIDA, A FIM DE REFORMAR A
SENTENÇA E DE JULGAR IMPROCEDENTE A PRETENSÃO INICIAL.
ALEGAÇÃO DE OBSCURIDADE E DE OMISSÃO. ANTERIOR ACÓRDÃO DE
REJEIÇÃO DOS EMBARGOS ANULADO EM SEDE DE AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL (ARESP Nº 2329209/PR) POR VISLUMBRAR OFENSA AO ART. 1.022
DO CPC ACERCA DA ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO ART. 51, XV E XVII, DO
CDC. VÍCIOS SANADOS, MAS SEM MODIFICAÇÃO DO JULGADO. Constatada
a ocorrência dos vícios e omissão e de obscuridade em relação à suposta violação
do art. 51, XV e XVII, do CDC alegada nas razões recursais, impõe-se o parcial
acolhimento dos embargos de declaração opostos, mas sem modificação do
julgado. Embargos acolhidos, mas sem efeitos infringentes.
Nas razões do recurso especial (fls. 824-864, e-STJ), a parte insurgente
apontou violação aos artigos 489, II, §1º, IV, VI, e 1022, I, II, § único, II, do CPC, ao artigo
51 do CDC e ao artigo 505 do CPC.
A Corte de origem inadmitiu o apelo nobre sob os seguintes fundamentos: (i)
ausência de violação aos artigos 489 e 1.022 do CPC, porquanto o acórdão teria
examinado exaustivamente as matérias submetidas à sua apreciação; (ii) incidência do
óbice da Súmula 7/STJ para a análise da tese de preclusão, pois a alteração da
conclusão do Colegiado demandaria reexame de provas; e (iii) aplicação dos óbices das
Súmulas 5 e 7/STJ quanto à alegada ofensa ao artigo 51 do Código de Defesa do
Consumidor, visto que a revisão do julgado pressuporia nova incursão nas cláusulas
contratuais e no acervo fático-probatório.
Inconformada, a parte agravante interpõe o presente agravo em recurso
especial (fls. 916-961, e-STJ),
Foi apresentada contraminuta às fls. 976-983, e-STJ.
É o relatório.
Decido.
O recurso não merece prosperar.
1. Os recorrentes defendem a nulidade do acórdão proferido pelo Tribunal de
Justiça do Estado do Paraná por suposta negativa de prestação jurisdicional. Sustentam
que, mesmo após o retorno dos autos por força de determinação anterior desta Corte
Superior (no bojo do AREsp nº 2.329.209/PR), o órgão julgador a quo teria persistido em
omissão e obscuridade quanto a pontos cruciais para o deslinde da controvérsia, tais
como: a preclusão da matéria relativa à validade do acordo extrajudicial, a alegada
transmissão do vício da operação original ao termo de ajuste posterior, e a necessidade
de análise aprofundada da nulidade da cláusula de renúncia sob a ótica da
vulnerabilidade do consumidor amparada pelo Código de Defesa do Consumidor.
A alegação de violação aos artigos 489, II, § 1º, IV e VI, e 1.022, I, II, e
parágrafo único, II, do Código de Processo Civil, todavia, não se sustenta no caso
concreto.
Ao contrário do que sustentam os agravantes, o Tribunal de origem, ao
rejulgar os embargos de declaração (fls. 811-817, e-STJ), cumpriu a determinação desta
Corte e se pronunciou, de modo expresso e detalhado, sobre as questões apontadas
como omissas, em especial sobre a indigitada violação ao art. 51, incisos XV e XVII, do
Código de Defesa do Consumidor. O acórdão complementar, embora mantendo a
conclusão do julgado anterior, demonstrou ter sanado os vícios apontados, dedicando
fundamentação específica e exaustiva para afastar a tese dos então embargantes.
Eis o decidido nos embargos de declaração (fls. 813- 816, e-STJ)
Conforme restou exposto nos acórdãos anteriores (mov. 34.1 e 26.1), os autores,
ora embargantes, ajuizaram a presente ação indenizatória visando a condenação
da requerida ao pagamento dos prejuízos resultantes da contratação irregular, em
22/01/2016 e sem autorização, de uma operação estruturada consistente na
compra de “opção de compra” do derivativo BBDCB14 e na venda de “opção de
compra” do derivativo BBDCB17, mediante a mobilização de grande parte da
carteira dos autores mantida em bolsa, em valor superior a três milhões de reais”
Ocorre que, apesar da insurgência quanto à operação estruturada acima
mencionada em torno da qual os autores formularam os pedidos e as causas de
pedir (mov. 1.1), nenhuma controvérsia de ilegalidade ou de vício de
consentimento foi levantada contra o “termo de ajuste de obrigações recíprocas”
de mov. 1.6 e 1.7, firmado em 11 e 12/01/2017 “de comum acordo, ciência e
vontade” e pelo qual os autores não só autorizaram expressamente a liquidação
antecipada da operação estruturada como também deram ampla e irrestrita
quitação com renúncia ao direito em que se funda a ação.
Nesse particular, convém pontuar que referida tese de nulidade da cláusula de
quitação e renúncia por violação aos incisos XV e XVII do art. 51 do CDC, a qual
sequer constituiu o escopo da petição inicial, surgiu apenas por ocasião das
contrarrazões ao recurso de apelação (mov. 270.1), caracterizando verdadeira
inovação da causa de pedir, em afronta ao art. 141 do CPC.
Inclusive, essa circunstância restou devidamente ressalvada no acórdão de mov.
26.1, no sentido de que: “(...) ausente alegação de ilegalidade ou de vício de
consentimento em relação aos termos de Ajuste de Obrigações Recíprocas (mov.
1.6 e 1.7) por ocasião da petição inicial, não cabe aos recorrentes fazê-lo agora e
sede recursal, ainda que sob à ótica do CDC”.
No entanto, presumindo-se possível extrapolar os limites até aqui expostos, resta
perquirir se, no caso concreto, a cláusula de quitação e renuncia violou o disposto
nos incisos XV e XVII do art. 51 do CDC. A resposta é negativa.
A começar pelo inciso XVII do art. 51, denota-se que sequer incide ou pode ser
aplicado no caso concreto, uma vez que sua redação foi introduzida no CDC pela
Lei nº 14.181/2021, a qual passou a vigorar somente a partir de 02/07/2021, ou
seja, muito posteriormente à assinatura dos termos de Ajuste de Obrigações
recíprocas de mov. 1.6 e 1.7 (11 e 12/01/2017), razão pela qual referida regra não
poderia retroagir para alterar negócio jurídico constituído anteriormente.
Como é cediço, quando a lei nova prevê expressamente a regra de retroatividade
mínima (ou mitigada – art. 3º da Lei nº 14.181/2021), esta passa a incidir apenas
sob os efeitos futuros dos atos jurídicos constituídos sob o regime da lei antiga,
como é o exemplo clássico dos contratos de prestação continuada (v. g. ADI 493,
STF), circunstância que, como se percebe, não ocorre no caso em apreço, na
medida em que os termos de ajuste firmados respectivamente em 11 e 12/01/2017
foram efetivamente consumados em 30/01/2017, com a liberação dos recursos
previstos na cláusula 1.3 do ajuste, sem qualquer pendência de fato futuro.
Por sua vez, o exame do acervo probatório coligido, também não permite concluir
que a cláusula de renúncia e quitação seja passível de nulidade por suposta
violação ao inciso XV do art. 51 do CDC, ou seja, em virtude de cláusula contratual
relacionada ao fornecimento de produto e serviço que esteja em desacordo com o
sistema de proteção do consumidor, até porque, de acordo com o caput do art. 7º,
os direitos previstos em referido Código não excluem outros decorrentes da
legislação interna ordinária, bem como dos que derivem dos princípios gerais do
direito, analogia, costumes e equidade, sob pena de evidente desvirtuamento dos
institutos.
De igual modo, também não se pode subverter o princípio da interpretação mais
favorável ao consumidor/aderente (CDC, art. 47; e CCB, art. 423) em detrimento
da norma geral de interpretação da boa-fé prevista no art. 113 do Código Civil.
A partir disso, por força do princípio da boa-fé objetiva (CCB, art. 113), é sabido
que eventual insatisfação com os termos da transação, diferentemente do que
ocorre nos contratos típicos de adesão, deveria ter sido questionada por ocasião
das tratativas, de modo que a insurgência posterior à assinatura do pacto passa a
violar o princípio que veda o comportamento contraditório.
Assim, apesar da incidência do CDC ao caso, tal fato, isoladamente, não é
suficiente para acarretar na procedência automática e indiscriminada da pretensão
inicial, na qual os recorrentes se limitaram a alegar a ausência de eficácia da
cláusula de quitação e renúncia, ao singelo argumento de estar ela condicionada à
ausência de prejuízos. E, de acordo com o acórdão embargado, a tese foi afastada
com base nos seguintes fundamentos (mov. 34.1):
(...) Como se percebe do teor do ajuste, a alegada falta de autorização para a
operação estruturada questionada em 22/01/2016 foi definitivamente
superada e retificada em 11 e 13 de janeiro de 2017 com a assinatura de
referido Termo de Ajuste, pelo qual os autores não só autorizaram
expressamente a liquidação antecipada da operação como também deram
ampla e irrestrita quitação e renunciaram ao direito em que se funda a ação.
E a análise das cláusulas citadas acima não deixa dúvidas quanto à
inexistência de qualquer fator que condicionasse essa renúncia à ausência
de prejuízos, visto que a responsabilidade assumida pela requerida restou
expressamente delimitada à 50% do custo da liquidação, o que restou
cumprido nos termos das notas de corretagem de mov. 50.2, fls. 05/07.
Sob essa perspectiva, convém complementar que a transação, tal como aquelas
constantes dos autos (mov. 1.6 e 1.7), é afeta aos direitos patrimoniais de caráter
privado (CCB, art. 841), dentre os quais se incluem os direitos de renúncia e de
quitação, bem como se caracteriza como ato jurídico bilateral com o objetivo de
extinguir ou prevenir litígios mediante concessões recíprocas.
Por essa razão, os termos de ajuste de mov. 1.6 e 1.7, na qualidade de acordos
extrajudiciais, não se confundem com as operações estruturadas que lhes deram
origem e, portanto, não compreendem o conceito de “cláusulas contratuais
relativas ao fornecimento de produtos e serviços” (CDC, art. 51, caput), de modo a
afastar a incidência da nulidade de que trata o art. 51, inciso I, do CDC.
(...)
Em resumo, considerando a diferenciação existente entre os contratos típicos de
adesão e a transação, a interpretação dessa última não pode se afastar das
características e do contexto de formação do acordo extrajudicial, no qual, por
natureza (CCB, art. 840), as partes acordam entre si mediante concessões mútuas.
(...)
Nesse contexto, conforme fundamentação já exposta no acórdão embargado, a
interpretação das cláusulas constantes dos termos de Ajuste de Obrigações
Recíprocas (mov. 1.6 e 1.7) demonstra que, por força do que dispõe o art. 840 do
CCB, a alegada falta de autorização para a operação estruturada ocorrida em
22/01/2016 foi definitivamente superada e retificada em 11 e 12 de janeiro de
2017 com a assinatura de referidos acordos, pelos quais os autores, de comum
acordo, não só autorizaram expressamente a liquidação antecipada da operação
como também renunciaram ao direito em que se funda a ação e deram ampla e
irrestrita quitação.
Por isso, sendo a transação o meio legal para que as partes extingam uma
incerteza obrigacional, não podem recair sobre ela os vícios questionados da
obrigação originária (operação estruturada), a exemplo das alegadas ausência de
autorização, irregularidade da contratação e transmissão do defeito do dever de
informação, visto que as cláusulas do acordo não padecem de nenhuma
ambiguidade, contradição, incerteza ou falha quanto ao entendimento das
situações limitativas de direitos.
Daí se depreende que, diversamente do que pretendem fazer crer os recorrentes,
inexiste qualquer ilegalidade ou ineficácia da composição envolvendo a renúncia
ao direito que se funda a ação, em razão da absoluta disponibilidade dos direitos
patrimoniais acordados, em relação aos quais não se vislumbra nenhum dos
defeitos e nenhuma das invalidades do negócio jurídico (CCB, artigos 145 a 188).
Com base nessas premissas, conclui-se pela insubsistência da tese alegada nas
razões recursais de nulidade da cláusula de renúncia e quitação por violação do
art. 47, do inciso XV do art. 51 do CDC ou do art. 423 do CCB, uma vez que
restou evidenciada a ausência de inconformismo dos autores quando da
assinatura dos termos de ajuste de mov. 1.6 e 1.7, realizada de livre e espontânea
vontade.
De resto, é fato público e notório que a operação na bolsa de valores é
condicionada à abertura de conta em corretora ou instituição financeira autorizada
a operar no pregão, ocasião em que se exige do titular o cadastro e a assinatura
de termo e de perfil de risco, pelos quais este passa a ter plena ciência de que os
investimentos realizados no mercado de ativos financeiros estão sujeitos a
diversos riscos aos quais o investidor livremente se submete, especialmente do
risco de perda total ou parcial do capital investido.
E em consequência disso, não bastasse a plena quitação dada pelos recorrentes,
também não se vislumbra dos termos de ajuste de mov. 1.6 e 1.7 a ocorrência de
qualquer prejuízo que possa ensejar a nulidade do pacto, uma vez que os próprios
autores admitiram na petição inicial (mov. 1.1, fls. 05, 3º parágrafo) ter havido o
“retorno de aproximadamente R$2.000.000,00 (dois milhões de reais)” por força
dos acordos firmados, enquanto que a operação estruturada objeto do litígio (mov.
50.2, fls. 02 e 04) envolveu a mobilização de aproximadamente R$ 1.026.570,00
(um milhão e vinte e seis mil e quinhentos e setenta reais).
Nesse aspecto, não se pode ignorar ser remota a chance de um investimento de
um milhão de reais dentre as diversas alternativas existentes no mercado retornar
em um ano um rendimento de aproximadamente R$ 973.430,00.
Destarte, diferentemente do que alegam os embargantes, não há nas provas
documental e oral qualquer circunstância que contrarie a conclusão de inexistir no
acordo termo que o condicionasse à ausência de prejuízo.
Portanto, conforme fundamentação já exposta no acórdão embargado, a leitura
das cláusulas constantes dos termos de Ajuste de Obrigações Recíprocas (mov.
1.6 e 1.7), à toda evidência, não comportam a interpretação exposta na petição
inicial, cuja narrativa expõe insurgências apenas em relação à operação
estruturada e não em relação aos acordos.
No mais, apesar da argumentação apresentada nas razões dos embargos de
declaração, os vícios de obscuridade e de omissão quanto à preclusão da
preliminar de ausência de interesse de agir decidida no item 1. b da decisão de
mov. 92.1 também não são capazes de ensejar a modificação do acórdão
embargado.
Com efeito, é insubsistente a alegada preclusão da matéria examinada pelo
acórdão embargado ao argumento de já ter sido analisada na decisão saneadora
(mov. 92.1), a qual assim dispôs:
1-b) Da mesma forma, não há como se cogitar o acolhimento, neste
momento processual, da alegação de falta de interesse.
Segundo o professor Luiz Guilherme Marinoni “As condições da ação devem
ser aferidas in status assertionis, isto é à vista das afirmações do
demandante, sem tomar em conta as provas produzidas no processo”
(Código de processo civil comentado artigo por artigo – Luiz Guilherme
Marinoni, Daniel Mitidiero. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008,
pág. 261).
O mesmo autor adverte: “É por isso que as condições da ação devem ser
aferidas com base na afirmação do autor, ou seja, no início do desenrolar do
procedimento. Não se trata de fazer um julgamento sumário (fundado em
conhecimento sumário) das condições da ação, como se elas pudessem
voltar a ser apreciadas mais tarde, com base em outras provas. O que
importa é a afirmação do autor, e não a correspondência entre a afirmação e
a realidade, que já é problema de mérito.” (Teoria Geral do processo / Luiz
Guilherme Marinoni. 2 ed. rev. e atual. – São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2007. – (Curso de processo civil; v. 1), págs. 185/186).
Dessa forma, diante da argumentação de que a quitação e renúncia estariam
vinculadas à ausência de prejuízos, não tendo essa condição se verificado,
imperioso reconhecer a impossibilidade de extinção prematura da demanda.
Existindo comprovação das alegações apresentadas pela parte requerida,
não há que se cogitar falta de interesse, mas, sim, o julgamento de
improcedência da demanda.
Como se percebe, diversamente do que pretendem fazer crer os embargantes, não
ocorreu novo julgamento em relação à preliminar de falta de interesse de agir
afastada pela decisão saneadora, tanto que o processo não foi extinto sem
julgamento de mérito.
Em outras palavras, significa dizer que a alegada preclusão não aproveita o
embargante, assim como também não aproveitou ao embargado, que deixou de
recorrer, pois a única interpretação possível da decisão da ilustre magistrada é no
sentido de que a falta de interesse de agir foi afastada porque se vislumbrou que o
banco trouxe na sua defesa apenas indícios de que não teria havido prejuízos aos
autores e que estes indícios deveriam ser apurados no decorrer da instrução
processual.
Não se vislumbra a alegada omissão ou contradição, pois o órgão julgador
dirimiu a controvérsia de forma ampla e fundamentada, embora não tenha acolhido as
pretensões da parte insurgente.
Ademais, a orientação desta Corte é no sentido de que o julgador não está
obrigado a rebater, um a um, os argumentos invocados pelas partes, nem a indicar todos
os dispositivos legais suscitados, quando tenha encontrado motivação satisfatória para
dirimir o litígio, como ocorrera na hipótese.
Nesse sentido, confira-se:
AGRAVO INTERNO EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
RESPONSABILIDADECIVIL. DANO AMBIENTAL. NAVIO BAHAMAS. DANOS À
ATIVIDADE PESQUEIRA.PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO INDIVIDUAL.
AJUIZAMENTO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICAPARA APURAÇÃO DAS
RESPONSABILIDADES. MARCO DE INTERRUPÇÃO DAPRESCRIÇÃO DA
PRETENSÃO DA AÇÃO INDIVIDUAL. NULIDADE POR NEGATIVA
DEPRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA
DEPREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ACÓRDÃO EM HARMONIA
COMJURISPRUDÊNCIA DOMINANTE NO STJ. SÚMULA 83 DO STJ.
INCIDÊNCIA.REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO E PROBATÓRIO DOS
AUTOS. SÚMULA 7 DOSTJ. INCIDÊNCIA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Não há que falar em violação ao art. 1022 Código de Processo Civil/15 quando
amatéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que
emitiupronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido diverso à
pretensãoda parte recorrente.
[...]
(AgInt no AREsp n. 1.832.549/RS, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta
Turma,julgado em 16/8/2021, DJe de 24/8/2021.) [grifou-se]
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM
RECURSOESPECIAL. PRESTAÇÃO JURISDICIONAL ADEQUADA. ALIENAÇÃO
FIDUCIÁRIA.AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA.
CONDIÇÃO DEPROCEDIBILIDADE. DECISÃO MANTIDA.
1. Inexiste afronta ao art. 1.022 do CPC/2015 quando o acórdão recorrido
pronuncia-se, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas nos
autos,manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar
aconclusão adotada pelo Juízo.
[...]
(AgInt no AREsp n. 1.455.461/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta
Turma,julgado em 27/6/2022, DJe de 1/7/2022.) [grifou-se]
Como se vê, não se vislumbra omissão ou contradição no julgado, porquanto o
acórdão restou devida e suficientemente fundamentado sobre as questões necessárias
ao deslinde da controvérsia, não havendo falar em ofensa aos referidos dispositivos.
Na mesma linha, precedentes: AgRg no REsp 1291104/MG, Rel. Ministro
RAULARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 02/06/2016; AgRg no Ag
1252154/SP,Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 23/06/2015,
DJe 30/06/2015; REsp1395221/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA,
julgado em 05/09/2013, DJe17/09/2013.
Inexiste, portanto, violação ao artigo 489 do CPC, visto que a matéria fora
apreciada pelo Tribunal de origem, cuja fundamentação foi clara e suficiente para o
deslinde da controvérsia.
2. recurso especial sustenta, em primeiro plano, a violação ao art. 505, caput,
do Código de Processo Civil, sob a alegação de que o acórdão estadual utilizou como
fundamento a validade e a eficácia do termo de quitação e renúncia, matéria que já
estaria preclusa (pro judicato), por ter sido afastada em decisão saneadora não recorrida.
Em segundo plano, alega-se a violação literal ao art. 51, incisos I, XV e XVII,
do CDC, ratificando a tese de nulidade absoluta da cláusula de quitação e renúncia
contida no "Termo de Ajuste de Obrigações Recíprocas", por se tratar de cláusula
abusiva que exonera o fornecedor de responsabilidade por vício (operação irregular e
ausência de suitability) e limita o acesso do consumidor ao Poder Judiciário.
Da análise pormenorizada dos autos, depreende-se que, para se acolher a
tese dos recorrentes e concluir de forma diversa do Tribunal de Justiça do Estado do
Paraná sobre qualquer destes pontos, seria imprescindível o reexame aprofundado dos
elementos fáticos e contratuais da lide.
O Tribunal de origem, soberano na análise das provas, concluiu pela validade
e eficácia da transação extrajudicial celebrada entre as partes, considerando-a um ato
jurídico bilateral que, mediante concessões mútuas, sanou o vício da operação original e,
por conseguinte, afastou a pretensão indenizatória. Para chegar a essa conclusão, o
Colegiado analisou o Termo de Ajuste e o contexto de sua assinatura, notadamente para
verificar a ausência de vício de consentimento e a delimitação expressa da
responsabilidade assumida pela corretora em 50% dos custos da liquidação.
Nesse diapasão, o acórdão recorrido rechaçou a tese de preclusão, ao
interpretar os termos da decisão saneadora de primeiro grau. Concluiu a Corte a quo que
a decisão em saneador apenas afastou a preliminar de falta de interesse de agir in status
assertionis, remetendo a análise da eficácia do Termo de Ajuste — o qual envolvia a
comprovação da ausência de prejuízo — para ser resolvida por ocasião do julgamento do
mérito, o que, de fato, ocorreu. Assim, para infirmar essa conclusão, e reconhecer que a
decisão saneadora de fato gerou a preclusão da matéria de mérito (quitação e renúncia),
seria necessário reinterpretar o alcance da decisão interlocutória frente ao conjunto fático-
probatório e o julgamento final, o que atrai a vedação da Súmula 7/STJ. Vide (fl. 816, e-
STJ):
Com efeito, é insubsistente a alegada preclusão da matéria examinada pelo
acórdão embargado ao argumento de já ter sido analisada na decisão saneadora
(mov. 92.1), a qual assim dispôs:
1-b) Da mesma forma, não há como se cogitar o acolhimento, neste
momento processual, da alegação de falta de interesse.
Segundo o professor Luiz Guilherme Marinoni “As condições da ação devem
ser aferidas in status assertionis, isto é à vista das afirmações do
demandante, sem tomar em conta as provas produzidas no processo”
(Código de processo civil comentado artigo por artigo – Luiz Guilherme
Marinoni, Daniel Mitidiero. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008,
pág. 261).
O mesmo autor adverte: “É por isso que as condições da ação devem ser
aferidas com base na afirmação do autor, ou seja, no início do desenrolar do
procedimento. Não se trata de fazer um julgamento sumário (fundado em
conhecimento sumário) das condições da ação, como se elas pudessem
voltar a ser apreciadas mais tarde, com base em outras provas. O que
importa é a afirmação do autor, e não a correspondência entre a afirmação e
a realidade, que já é problema de mérito.” (Teoria Geral do processo / Luiz
Guilherme Marinoni. 2 ed. rev. e atual. – São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2007. – (Curso de processo civil; v. 1), págs. 185/186).
Dessa forma, diante da argumentação de que a quitação e renúncia estariam
vinculadas à ausência de prejuízos, não tendo essa condição se verificado,
imperioso reconhecer a impossibilidade de extinção prematura da demanda.
Existindo comprovação das alegações apresentadas pela parte requerida,
não há que se cogitar falta de interesse, mas, sim, o julgamento de
improcedência da demanda.
Como se percebe, diversamente do que pretendem fazer crer os embargantes, não
ocorreu novo julgamento em relação à preliminar de falta de interesse de agir
afastada pela decisão saneadora, tanto que o processo não foi extinto sem
julgamento de mérito.
Em outras palavras, significa dizer que a alegada preclusão não aproveita o
embargante, assim como também não aproveitou ao embargado, que deixou de
recorrer, pois a única interpretação possível da decisão da ilustre magistrada é no
sentido de que a falta de interesse de agir foi afastada porque se vislumbrou que o
banco trouxe na sua defesa apenas indícios de que não teria havido prejuízos aos
autores e que estes indícios deveriam ser apurados no decorrer da instrução
processual.
No que tange à alegada violação ao art. 51 do CDC, o Tribunal de Justiça do
Paraná também realizou uma análise detida dos autos e apontou que se tratou de
inovação recursal, ao passo que na exordial não teria sido escopo da petição inicial. Vide
(fl. 813, e-STJ):
Nesse particular, convém pontuar que referida tese de nulidade da cláusula de
quitação e renúncia por violação aos incisos XV e XVII do art. 51 do CDC, a qual
sequer constituiu o escopo da petição inicial, surgiu apenas por ocasião das
contrarrazões ao recurso de apelação (mov. 270.1), caracterizando verdadeira
inovação da causa de pedir, em afronta ao art. 141 do CPC.
Inclusive, essa circunstância restou devidamente ressalvada no acórdão de mov.
26.1, no sentido de que: “(...) ausente alegação de ilegalidade ou de vício de
consentimento em relação aos termos de Ajuste de Obrigações Recíprocas (mov.
1.6 e 1.7) por ocasião da petição inicial, não cabe aos recorrentes fazê-lo agora e
sede recursal, ainda que sob à ótica do CDC”.
Ao adentrar o mérito, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, ao analisar
o contrato (Termo de Ajuste) frente ao contexto fático, concluiu que inexistiu violação ao
art. 51 do CDC, ao passo que o inciso XVII do art. 51 do CDC teria sido incluído
posteriormente ao acordo, o que o tornaria inaplicável ao caso, assim como realizou a
interpretação sistemática do art. 51 do CDC com os arts. 113 e 841 ambos do Código
Civil, apontou a ausência de vício de consentimento, fundamentou que não haveria nas
provas documental e oral qualquer circunstância que contrarie a conclusão de inexistir no
acordo termo que o condicionasse à ausência de prejuízo e que a interpretação das
cláusulas contratuais não comportam a interpretração dada pela parte ora recorrente.
Vide (fls 813-817, e-STJ):
No entanto, presumindo-se possível extrapolar os limites até aqui expostos, resta
perquirir se, no caso concreto, a cláusula de quitação e renuncia violou o disposto
nos incisos XV e XVII do art. 51 do CDC. A resposta é negativa.
A começar pelo inciso XVII do art. 51, denota-se que sequer incide ou pode ser
aplicado no caso concreto, uma vez que sua redação foi introduzida no CDC pela
Lei nº 14.181/2021, a qual passou a vigorar somente a partir de 02/07/2021, ou
seja, muito posteriormente à assinatura dos termos de Ajuste de Obrigações
recíprocas de mov. 1.6 e 1.7 (11 e 12/01/2017), razão pela qual referida regra não
poderia retroagir para alterar negócio jurídico constituído anteriormente.
Como é cediço, quando a lei nova prevê expressamente a regra de retroatividade
mínima (ou mitigada – art. 3º da Lei nº 14.181/2021), esta passa a incidir apenas
sob os efeitos futuros dos atos jurídicos constituídos sob o regime da lei antiga,
como é o exemplo clássico dos contratos de prestação continuada (v. g. ADI 493,
STF), circunstância que, como se percebe, não ocorre no caso em apreço, na
medida em que os termos de ajuste firmados respectivamente em 11 e 12/01/2017
foram efetivamente consumados em 30/01/2017, com a liberação dos recursos
previstos na cláusula 1.3 do ajuste, sem qualquer pendência de fato futuro.
Por sua vez, o exame do acervo probatório coligido, também não permite concluir
que a cláusula de renúncia e quitação seja passível de nulidade por suposta
violação ao inciso XV do art. 51 do CDC, ou seja, em virtude de cláusula contratual
relacionada ao fornecimento de produto e serviço que esteja em desacordo com o
sistema de proteção do consumidor, até porque, de acordo com o caput do art. 7º,
os direitos previstos em referido Código não excluem outros decorrentes da
legislação interna ordinária, bem como dos que derivem dos princípios gerais do
direito, analogia, costumes e equidade, sob pena de evidente desvirtuamento dos
institutos.
De igual modo, também não se pode subverter o princípio da interpretação mais
favorável ao consumidor/aderente (CDC, art. 47; e CCB, art. 423) em detrimento
da norma geral de interpretação da boa-fé prevista no art. 113 do Código Civil.
A partir disso, por força do princípio da boa-fé objetiva (CCB, art. 113), é sabido
que eventual insatisfação com os termos da transação, diferentemente do que
ocorre nos contratos típicos de adesão, deveria ter sido questionada por ocasião
das tratativas, de modo que a insurgência posterior à assinatura do pacto passa a
violar o princípio que veda o comportamento contraditório.
Assim, apesar da incidência do CDC ao caso, tal fato, isoladamente, não é
suficiente para acarretar na procedência automática e indiscriminada da pretensão
inicial, na qual os recorrentes se limitaram a alegar a ausência de eficácia da
cláusula de quitação e renúncia, ao singelo argumento de estar ela condicionada à
ausência de prejuízos.
(...)
Sob essa perspectiva, convém complementar que a transação, tal como aquelas
constantes dos autos (mov. 1.6 e 1.7), é afeta aos direitos patrimoniais de caráter
privado (CCB, art. 841), dentre os quais se incluem os direitos de renúncia e de
quitação, bem como se caracteriza como ato jurídico bilateral com o objetivo de
extinguir ou prevenir litígios mediante concessões recíprocas.
Por essa razão, os termos de ajuste de mov. 1.6 e 1.7, na qualidade de acordos
extrajudiciais, não se confundem com as operações estruturadas que lhes deram
origem e, portanto, não compreendem o conceito de “cláusulas contratuais
relativas ao fornecimento de produtos e serviços” (CDC, art. 51, caput), de modo a
afastar a incidência da nulidade de que trata o art. 51, inciso I, do CDC.
(...)
Em resumo, considerando a diferenciação existente entre os contratos típicos de
adesão e a transação, a interpretação dessa última não pode se afastar das
características e do contexto de formação do acordo extrajudicial, no qual, por
natureza (CCB, art. 840), as partes acordam entre si mediante concessões mútuas.
(...)
Nesse contexto, conforme fundamentação já exposta no acórdão embargado, a
interpretação das cláusulas constantes dos termos de Ajuste de Obrigações
Recíprocas (mov. 1.6 e 1.7) demonstra que, por força do que dispõe o art. 840 do
CCB, a alegada falta de autorização para a operação estruturada ocorrida em
22/01/2016 foi definitivamente superada e retificada em 11 e 12 de janeiro de
2017 com a assinatura de referidos acordos, pelos quais os autores, de comum
acordo, não só autorizaram expressamente a liquidação antecipada da operação
como também renunciaram ao direito em que se funda a ação e deram ampla e
irrestrita quitação.
Por isso, sendo a transação o meio legal para que as partes extingam uma
incerteza obrigacional, não podem recair sobre ela os vícios questionados da
obrigação originária (operação estruturada), a exemplo das alegadas ausência de
autorização, irregularidade da contratação e transmissão do defeito do dever de
informação, visto que as cláusulas do acordo não padecem de nenhuma
ambiguidade, contradição, incerteza ou falha quanto ao entendimento das
situações limitativas de direitos.
Daí se depreende que, diversamente do que pretendem fazer crer os recorrentes,
inexiste qualquer ilegalidade ou ineficácia da composição envolvendo a renúncia
ao direito que se funda a ação, em razão da absoluta disponibilidade dos direitos
patrimoniais acordados, em relação aos quais não se vislumbra nenhum dos
defeitos e nenhuma das invalidades do negócio jurídico (CCB, artigos 145 a 188).
Com base nessas premissas, conclui-se pela insubsistência da tese alegada nas
razões recursais de nulidade da cláusula de renúncia e quitação por violação do
art. 47, do inciso XV do art. 51 do CDC ou do art. 423 do CCB, uma vez que
restou evidenciada a ausência de inconformismo dos autores quando da
assinatura dos termos de ajuste de mov. 1.6 e 1.7, realizada de livre e espontânea
vontade.
De resto, é fato público e notório que a operação na bolsa de valores é
condicionada à abertura de conta em corretora ou instituição financeira autorizada
a operar no pregão, ocasião em que se exige do titular o cadastro e a assinatura
de termo e de perfil de risco, pelos quais este passa a ter plena ciência de que os
investimentos realizados no mercado de ativos financeiros estão sujeitos a
diversos riscos aos quais o investidor livremente se submete, especialmente do
risco de perda total ou parcial do capital investido.
E em consequência disso, não bastasse a plena quitação dada pelos recorrentes,
também não se vislumbra dos termos de ajuste de mov. 1.6 e 1.7 a ocorrência de
qualquer prejuízo que possa ensejar a nulidade do pacto, uma vez que os próprios
autores admitiram na petição inicial (mov. 1.1, fls. 05, 3º parágrafo) ter havido o
“retorno de aproximadamente R$2.000.000,00 (dois milhões de reais)” por força
dos acordos firmados, enquanto que a operação estruturada objeto do litígio (mov.
50.2, fls. 02 e 04) envolveu a mobilização de aproximadamente R$ 1.026.570,00
(um milhão e vinte e seis mil e quinhentos e setenta reais).
Nesse aspecto, não se pode ignorar ser remota a chance de um investimento de
um milhão de reais dentre as diversas alternativas existentes no mercado retornar
em um ano um rendimento de aproximadamente R$ 973.430,00.
Destarte, diferentemente do que alegam os embargantes, não há nas provas
documental e oral qualquer circunstância que contrarie a conclusão de inexistir no
acordo termo que o condicionasse à ausência de prejuízo.
Portanto, conforme fundamentação já exposta no acórdão embargado, a leitura
das cláusulas constantes dos termos de Ajuste de Obrigações Recíprocas (mov.
1.6 e 1.7), à toda evidência, não comportam a interpretação exposta na petição
inicial, cuja narrativa expõe insurgências apenas em relação à operação
estruturada e não em relação aos acordos.
No mais, apesar da argumentação apresentada nas razões dos embargos de
declaração, os vícios de obscuridade e de omissão quanto à preclusão da
preliminar de ausência de interesse de agir decidida no item 1. b da decisão de
mov. 92.1 também não são capazes de ensejar a modificação do acórdão
embargado.
Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que
a pretensão que visa alterar o panorama fático-probatório estabelecido pelo Tribunal de
origem, a fim de sustentar a violação de lei federal, encontra óbice nos enunciados
sumulares. A desconstituição da premissa de que o acordo foi válido ou de que não
houve violação ao CDC seria incompatível com a via estreita do recurso especial,
conforme o teor das Súmulas 5 e 7 do STJ.
Dessa forma, a alteração das premissas firmadas pela Corte a quo — seja
para acolher a tese de preclusão, seja para declarar a nulidade do Termo de Ajuste por
violação a dispositivo do CDC — demandaria: (i) nova incursão nas cláusulas contratuais
celebradas entre as partes (Súmula 5/STJ) e (ii) reexame do conjunto fático-probatório
que levou o Tribunal, em segundo grau, a chancelar a validade da transação (
Súmula 7/STJ). Ambos os procedimentos são inviáveis na via especial.
Nesse sentido:
AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL - AÇÃO REVOCATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA
QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA PARTE
DEMANDADA.
1. A constituição do título ensejador da pretensão revocatória é anterior à
alienação feita pelo devedor. Logo, o acórdão estadual se harmoniza ao
entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que "para que o
credor possa anular o negócio jurídico havido em fraude, é preciso que seu crédito
tenha sido constituído antes da realização do negócio tido como fraudulento"
(AgInt no AREsp 1028709/RJ, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA
TURMA, julgado em 26/09/2017, DJe 13/10/2017). Aplicação, na hipótese, da
Súmula 83 do STJ.
2. A alteração das conclusões adotadas pela Corte de origem acerca da existência
de fraude contra credores, realizado mediante a análise dos fatos e a datação
específica dos marcos temporais, implica o reexame do conjunto fático-probatório
dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice disposto na
Súmula 7 do STJ.
3. A solidariedade decorre de pacto negocial ou da lei (art. 265 do CC/02) e, no
caso em concreto, verifica-se que o agravado/recorrido possui legitimamente, por
contrato, o direito de regresso em face do agravante/recorrente, porquanto, como
restou consignado, o recorrente é devedor solidário e contratualmente responsável
pelo eventual prejuízo da empresa que ambos eram sócios, sendo, portanto,
obrigado solidariamente pelo ressarcimento do dano, na forma da
responsabilidade civil.
4. O conteúdo normativo do dispositivo legal tido por violado, relativo à tese de
prescrição (art. 25 , II e IV, da Lei n.º 8.906/94), não foi objeto de exame pela
instância ordinária, mesmo após o julgamento dos embargos de declaração
opostos pelo ora recorrente. Ademais, nas razões do especial deixou o insurgente
de apontar eventual violação do artigo 1.022 do CPC/2015, razão pela qual incide,
na espécie, a Súmula 211 desta Corte Superior.
5. Agravo interno desprovido.
(AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.457.805/SP, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta
Turma, julgado em 3/10/2022, DJe de 6/10/2022.)
Confiram-se, ainda, os seguintes precedentes: AgInt no
AREsp n. 1.679.153/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 1º.
9.2020; AgInt no REsp n. 1.846.908/RJ, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta
Turma, DJe de 31.8.2020; AgInt no AREsp n. 1.581.363/RN, Rel. Ministro Herman
Benjamin, Segunda Turma, DJe de 21.8.2020; AgInt nos EDcl no REsp n. 1.848.786/SP,
Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 3.8.2020; AgInt no
AREsp n. 1.311.173/MS, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de
16.10.2020.
3. Do exposto, com amparo no artigo 932, incisos III e IV, 'a', do CPC/15,
conheço do agravo para, de plano, não conhecer do recurso especial.
Com base no art. 85, § 11, do CPC/2015, majoram-se os honorários
advocatícios sucumbenciais recursais em 2%.
Brasília, 05 de novembro de 2025.
Ministro Marco Buzzi
Relator