STJ – AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2837199 - SP (2024/0487205-1)
sso no presente caso, pois, se houvesse a presença de algum desses requisitos, o Recorrido teria ajuizado a demanda antes de deixar escoar o prazo de 1 ano e 4 meses. Não o tendo feito, ainda que se pudesse falar em perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, isso se deveria à inércia do próprio Recorrido, não podendo a Recorrente ser penalizada pela inércia da sua contraparte! A decisão recorrida, todavia, de forma expressa reportou-se aos fundamentos da decisão do juiz de primeiro grau, que afirmou "O risco ao resultado útil do processo consiste na própria indisponibilização do numerário e na dificuldade em resgatá-lo, caso os réus tenham atuado de forma fraudulenta ou temerária. A documentação que instrui a petição inicial demonstra que todos os réus atuaram no negócio jurídico, qualificando-se como sócios ou desenvolvedores do projeto Mafagafo, ao que deram grande publicidade" (fl. 617). Em tais condições, tem-se que a alteração do contexto fático descrito no acórdão recorrido pressupõe o reexame de provas, o que é vedado em recurso especial, nos termos da Súmula 7 do STJ. Ante o exposto, conheço do agravo para conhecer em parte do recurso especial e, nessa extensão, negar-lhe provimento. Deixo de majorar os honorários nos termos do art. 85, § 11, do CPC, tendo em vista que o recurso especial foi interposto nos autos de agravo de instrumento. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 04 de novembro de 2025. Ministro Humberto Martins Relator
Decisão completa:
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2837199 - SP (2024/0487205-1)
RELATOR : MINISTRO HUMBERTO MARTINS
AGRAVANTE : SCIENSA INOVACAO E ESTRATEGIA DIGITAL LTDA
ADVOGADA : JÉSSICA RICCI GAGO - SP228442
AGRAVADO : SAULO MARCOS DA SILVA
ADVOGADOS : GUSTAVO CARONI AVEROLDI - SP254907
GABRIEL HENRIQUE AVEROLDI MAGALHÃES - SP460318
DECISÃO
Cuida-se de agravo interposto por SCIENSA INOVAÇÃO E ESTRATÉGIA
DIGITAL LTDA. contra decisão que obstou a subida de recurso especial.
Extrai-se dos autos que a agravante interpôs recurso especial, com
fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão do
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO cuja ementa guarda os
seguintes termos (fls. 612-620):
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE
URGÊNCIA. AÇÃO INDENIZATÓRIA ENVOLVENDO
NFT'S (NON- FUNGIBLE TOKEN) E CRIPTOMOEDAS.
Decisão interlocutória que defere pedido de arresto cautelar
mantida. Presença dos requisitos do art. 301 do CPC/2015.
Há vastos elementos indiciários constantes dos autos a indicar
tanto a prática de pirâmide financeira na comercialização de
NFT's no jogo “Mafagafo” e na oferta pública de recompra
não cumprida pela plataforma, quanto a participação ativa da
agravante no desenvolvimento tecnológico do jogo e nas
publicidades realizadas, inclusive com menção a uma suposta
tentativa de desenvolver um “gamefi” que não se traduzisse
exatamente no que, ao que tudo indica, se revelou, isto é,
mecanismo velado de prática de pirâmide financeira. Há,
assim, probabilidade do direito. Além disso, há
demonstração, pelo autor, de que os réus tentaram apagar
postagens, certamente para evitar futura responsabilização, a
indicar a existência de risco de dano grave ou de difícil ou
impossível reparação. Precedentes em casos análogos.
Observação quanto à possibilidade de liberação dos valores,
se a agravante oferecer garantia idônea para ressarcir os
danos que a outra parte possa vir a sofrer em caso de
liberação dos valores, cabendo ao Juízo de primeiro grau a
avaliação da idoneidade da garantia. RECURSO NÃO
PROVIDO, COM OBSERVAÇÃO.
Negado provimento ao agravo interno (fls. 651-653).
Rejeitados os embargos de declaração opostos (fls. 667-669).
No presente recurso especial, a recorrente alega, preliminarmente, ofensa ao
art. 1.022 do CPC, porquanto, apesar da oposição dos embargos de declaração, o Tribunal
de origem não se pronunciou sobre pontos necessários ao deslinde da controvérsia. No
mérito, alega que o acórdão contrariou as disposições contidas nos artigos 298, 300 e 301
do Código de Processo Civil.
Sem contrarrazões ao recurso especial (fl. 705).
Sobreveio o juízo de admissibilidade negativo na instância de origem (fls.714-
716), o que ensejou a interposição do presente agravo.
Não apresentada contraminuta do agravo (fl. 739).
É, no essencial, o relatório.
Atendidos os pressupostos de admissibilidade do agravo, passo ao exame do
recurso especial.
Inicialmente, não há falar em ofensa aos arts. 489 e 1.022 do CPC, uma vez
que o Tribunal de origem, ao negar provimento ao agravo, deixou claro que (fls. 619-620):
Há vastos elementos indiciários constantes dos autos a indicar
tanto a prática de pirâmide financeira na comercialização de
NFT's no jogo “Mafagafo” e na oferta pública de recompra
não cumprida pela plataforma, quanto a participação ativa da
agravante no desenvolvimento tecnológico do jogo e nas
publicidades realizadas, inclusive com menção a uma suposta
tentativa de desenvolver um “gamefi” que não se traduzisse
exatamente no que, ao que tudo indica, se revelou, isto é,
mecanismo velado de prática de pirâmide financeira. Há,
assim, probabilidade do direito. Além disso, há
demonstração, pelo autor, de que os réus tentaram apagar
postagens, certamente para evitar futura responsabilização, a
indicar a existência de risco de dano grave ou de difícil ou
impossível reparação.
Observa-se, portanto, que a lide foi solucionada em conformidade com o que
foi apresentado em juízo. Verifica-se que o acórdão recorrido possui fundamentação
suficiente, inexistindo omissão ou contradição.
O que a parte recorrente aponta como "omissão" ou "falta de fundamentação"
traduz, na verdade, mero inconformismo com a tese jurídica adotada. O julgador não está
obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos e dispositivos legais invocados pelas
partes, quando já encontrou motivo suficiente para fundamentar sua decisão. O Poder
Judiciário não funciona como um órgão consultivo, obrigado a responder a um
"questionário" das partes.
A propósito, cito os seguintes precedentes:
PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA.
UTILIDADE PÚBLICA. CONCESSIONÁRIA DE
VEÍCULOS. RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO
ARTIGO 1022, II, DO CPC/15. INOCORRÊNCIA.
DEVOLUÇÃO TOTAL DA MATÉRIA EM REEXAME
NECESSÁRIO. SÚMULA 325/STJ. NECESSIDADE DE
ALUGAR IMÓVEL LINDEIRO PARA ALTERAR
ACESSO A LOJA. INDENIZAÇÃO AFASTADA PELO
TRIBUNAL DE ORIGEM. REVISÃO. SÚMULA 7/ STJ.
1. Os arts. 489, § 1º, e 1.022 do Código de Processo Civil não
foram ofendidos. A pretexto de apontar a existência de erros
materiais, omissão e premissas erradas, a parte agravante quer
modificar as conclusões adotadas pelo aresto vergastado a
partir das informações detalhadas do laudo pericial.
[...]
5. Agravo Interno não provido.
(AgInt no AREsp n. 1.974.188/RS, relator Ministro Herman
Benjamin, Segunda Turma, julgado em 17/10/2022, DJe de
4/11/2022. )
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. DANO
MORAL. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DO
SERVIÇO DE ÁGUA . DEMORA INJUSTIFICADA NO
RESTABELECIMENTO DO SERVIÇO. ARTS. 489, § 1º, E
1022, II, DO CPC. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA.
DEVER DE INDENIZAR. REQUISITOS PARA A
RESPONSABILIZAÇÃO DA CONCESSIONÁRIA.
ACÓRDÃO ANCORADO NO SUBSTRATO FÁTICO-
PROBATÓRIO DOS AUTOS. REVISÃO.
IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. VALOR DA
INDENIZAÇÃO. EXCESSO NÃO CARACTERIZADO.
1. Cuida-se de ação de procedimento ordinário ajuizada em
desfavor de SAMAR - Soluções Ambientais de Araçatuba,
com o fim de obter indenização pelos danos morais que alega
ter sofrido com suspensão do serviço de água na residência da
autora.
2. Verifica-se, inicialmente, não ter ocorrido ofensa aos
arts. 489, § 1º, e 1.022, II, do CPC, na medida em que o
Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as
questões que lhe foram submetidas e apreciou
integralmente a controvérsia posta nos autos.
[...]
6. Agravo interno não provido.
(AgInt no AREsp n. 2.118.594/SP, relator Ministro Sérgio
Kukina, Primeira Turma, julgado em 22/11/2022, DJe de
25/11/2022, grifo meu.)
No mérito, volta-se o presente recurso contra a concessão de medida
acautelatória em execução, alegando que estavam ausentes os requisitos para a medida, em
especial o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Afirma a parte
recorrente que (fl. 687):
[...] não há que se falar em perigo de dano ou risco ao
resultado útil do processo no presente caso, pois, se houvesse
a presença de algum desses requisitos, o Recorrido teria
ajuizado a demanda antes de deixar escoar o prazo de 1 ano e
4 meses. Não o tendo feito, ainda que se pudesse falar em
perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, isso se
deveria à inércia do próprio Recorrido, não podendo a
Recorrente ser penalizada pela inércia da sua contraparte!
A decisão recorrida, todavia, de forma expressa reportou-se aos fundamentos
da decisão do juiz de primeiro grau, que afirmou "O risco ao resultado útil do processo
consiste na própria indisponibilização do numerário e na dificuldade em resgatá-lo, caso os
réus tenham atuado de forma fraudulenta ou temerária. A documentação que instrui a
petição inicial demonstra que todos os réus atuaram no negócio jurídico, qualificando-se
como sócios ou desenvolvedores do projeto Mafagafo, ao que deram grande publicidade"
(fl. 617).
Em tais condições, tem-se que a alteração do contexto fático descrito no
acórdão recorrido pressupõe o reexame de provas, o que é vedado em recurso especial, nos
termos da Súmula 7 do STJ.
Ante o exposto, conheço do agravo para conhecer em parte do recurso
especial e, nessa extensão, negar-lhe provimento.
Deixo de majorar os honorários nos termos do art. 85, § 11, do CPC, tendo
em vista que o recurso especial foi interposto nos autos de agravo de instrumento.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 04 de novembro de 2025.
Ministro Humberto Martins
Relator