STJ – HABEAS CORPUS Nº 1046822 - SP (2025/0417174-7)
penas reclusivas, acrescida de um quinto, tornando-a definitiva em 04 anos, 09 meses e 18 dias de reclusão e mais o pagamento de 15 dias-multa. Caracterizado o concurso material, as penas foram somadas, totalizando para Abrão os 05 anos, 09 meses e 18 dias de reclusão, além de 06 meses de prisão simples, mais o pagamento de 25 dias- multa.” Não se verifica, portanto qualquer menção ao tema pela Corte local, o qual assentou ter havido o concurso formal de delitos. Desse modo, "como os argumentos apresentados pela Defesa não foram examinados pelo Tribunal de origem no acórdão ora impugnado, as matérias não podem ser apreciadas por esta Corte nesta oportunidade, sob pena de indevida supressão de instância" (AgRg no HC n. 820.927/RJ, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 11/9/2023, DJe de 14/9/2023.). No mesmo sentido, é entendimento da Corte Maior que “[o] exaurimento da instância recorrida é, como regra, pressuposto para ensejar a competência do Supremo Tribunal Federal, conforme vem sendo reiteradamente proclamado por esta Corte (HC 129.142, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Rel. p/ Acórdão Min. ALEXANDRE DE MORAES Primeira Turma, DJe de 10/8/2017; RHC 111.935, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 30/9/2013; HC 97.009, Rel. p/ Acórdão: Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, DJe de 4/4/2014; HC 118.189, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, DJe de 24/4/2014)”. (HC n. 179.085, Rel. Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma, julgado em 5/8/2020, DJe 25/9/2020). Por tais razões, ausente flagrante constrangimento ilegal, e tratando-se de habeas corpus substitutivo de recurso adequado, a impetração não deve ser conhecida. Com fundamento no art. 34, XX, do RISTJ, não conheço do habeas corpus. Intimem-se. Brasília, 04 de novembro de 2025. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA Relator
Decisão completa:
HABEAS CORPUS Nº 1046822 - SP (2025/0417174-7)
RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA
IMPETRANTE : ROBERTO BRZEZINSKI NETO
ADVOGADOS : ROBERTO BRZEZINSKI NETO - PR025777
HERMÍNIA GERALDINA FERREIRA DE CARVALHO -
PR070622
GABRIELA TONIN BRUSAMARELLO - PR112475
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE : ABRAO BALADI NETO
PACIENTE : ALINE FERNANDA DA COSTA
PACIENTE : DORALICE DE ARAÚJO DA COSTA
CORRÉU : ROBERTO BALADI JUNIOR
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de ABRÃO BALADI NETO,
ALINE FERNANDA COSTA e DORALICE DE ARAÚJO COSTA contra acórdão do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (Apelação Criminal n. 1014675-
97.2021.8.26.0071).
Extrai-se dos autos que, em primeira instância, ABRÃO BALADI NETO foi
condenado pela prática da contravenção penal do jogo do bicho (art. 58 do Decreto-
lei n. 6.259/44), de três crimes de lavagem de dinheiro, com aumento do § 4º do art. 1º da
Lei n. 9.613/1998 e reconhecimento de continuidade delitiva (art. 71 do CP), e de
associação criminosa (art. 288 do CP), à pena de 5 anos, 9 meses e 18 dias de reclusão, em
regime inicial semiaberto, e 6 meses de prisão simples, em regime inicial aberto, além de
25 dias-multa (e-STJ fls. 137/141). ALINE FERNANDA COSTA e DORALICE DE
ARAÚJO COSTA foram condenadas pelos delitos de contravenção penal do jogo do bicho
(art. 58 do Decreto-lei n. 6.259/44), lavagem de dinheiro (art. 1º, § 4º, da Lei n. 9.613/1998)
e associação criminosa (art. 288 do CP), cada uma à pena de 5 anos de reclusão, em regime
inicial semiaberto, e 6 meses de prisão simples, em regime inicial aberto, além de 23 dias-
multa (e-STJ fls. 138/139 e 139/140). Foi assegurado aos condenados o direito de recorrer
em liberdade (e-STJ fls. 138/140).
Irresignada, a defesa interpôs apelações, arguindo preliminares de
incompetência territorial e ofensa ao juiz natural, bem como nulidade por fundamentação
supostamente baseada em elementos inquisitoriais. No mérito, requereu a absolvição por
insuficiência probatória (e-STJ fls. 143/146).
O Tribunal a quo negou provimento às apelações, em acórdão assim ementado
(e-STJ fl. 143):
APELAÇÃO CRIMINAL. CONTRAVENÇÃO PENAL DE JOGO DO BICHO,
LAVAGEM DE DINHEIRO e ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. Preliminares
defensivas: Incompetência territorial e ofensa ao juiz natural. Inocorrência.
Delitos cometidos pelo “Grupo Baladi” na Cidade de Bauru e região.
Investigação realizada toda na mesma localidade. Interceptação telefônica,
quebra do sigilo fiscal e bancário, mandados de busca e apreensão todos
autorizados pelo Juízo da Vara Criminal da Comarca de Bauru. Nulidade
relativa que deve ser alegada oportunamente. No caso, em especial, os mesmos
causídicos recorrentes já eram os procuradores nomeados pelos réus desde a
atuação no PIC e se mantiveram inertes até as alegações finais. Ausência de
prejuízo. Mérito. Absolvição dos recorrentes em razão da inexistência de provas
de todos os crimes. Impossibilidade. Provas seguras de autoria e materialidade
de cada um dos delitos. Palavras coerentes e seguras das testemunhas,
corroboradas pelas interceptações telefônicas, quebras de sigilo fiscal e
bancário e apreensão de documentos e equipamento eletrônicos na posse dos
réus. Validade. Responsabilização inevitável. Legalidade e compatibilidade
evidenciadas. Conjunto probatório seguro e coeso. Condenações mantidas.
Penas e regimes prisionais fixados dentro dos limites legais e de forma
fundamentada. RECURSOS NÃO PROVIDOS.
Posteriormente, foram opostos embargos de declaração visando ao
reconhecimento de nulidade por ausência de intimação dos advogados acerca da inclusão
do feito em pauta virtual, os quais foram rejeitados (e-STJ fl. 4).
No presente writ, a defesa alega, em síntese, a atipicidade da associação
criminosa relativamente às pacientes ALINE FERNANDA COSTA e DORALICE DE
ARAÚJO COSTA, por entender que o vínculo se destinou à prática de apenas um crime de
lavagem de dinheiro e de contravenção penal de jogo de azar, o que não preencheria a
pluralidade de “crimes” exigida pelo art. 288 do CP (e-STJ fls. 5/8).
Sustenta, ainda, bis in idem na dosimetria de ABRÃO BALADI NETO, em
razão da aplicação concomitante da causa de aumento do § 4º do art. 1º da
Lei n. 9.613/1998 (reiteração) e da continuidade delitiva do art. 71 do CP (e-STJ fls. 9/13).
Requer o trancamento da imputação do art. 288 do CP em relação às pacientes
ALINE FERNANDA COSTA e DORALICE DE ARAÚJO COSTA e a redução da pena
de ABRÃO BALADI NETO pelo afastamento do alegado bis in idem (e-STJ fl. 14).
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo não conhecimento ou pela
denegação da ordem, por parecer assim ementado (e-STJ fl. 167):
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. CONTRAVENÇÃO PENAL DE JOGO
DO BICHO, LAVAGEM DE DINHEIRO E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA.
ATIPICIDADE. NÃO ACOLHIMENTO. PLURALIDADE DE DELITOS E
PRÁTICA REITERADA DEVIDAMENTE CONFIGURADAS PARA OS FINS
DO ART. 288 DO CP. DOSIMETRIA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO
FÁTICO-PROBATÓRIO. VIA INADEQUADA. AUSÊNCIA DE
CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO
DO HABEAS CORPUS E, CASO CONHECIDO, PELA DENEGAÇÃO DA
ORDEM.
É o relatório. Decido.
Inicialmente, o Superior Tribunal de Justiça, seguindo o entendimento firmado
pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, como forma de racionalizar o emprego
do habeas corpus e prestigiar o sistema recursal, não admite a sua impetração em
substituição ao recurso próprio. Cumpre analisar, contudo, em cada caso, a existência de
ameaça ou coação à liberdade de locomoção do paciente, em razão de manifesta
ilegalidade, abuso de poder ou teratologia na decisão impugnada, a ensejar a concessão da
ordem de ofício.
Na espécie, embora a impetrante não tenha adotado a via processual adequada,
para que não haja prejuízo à defesa do paciente, passo à análise da pretensão formulada na
inicial, a fim de verificar a existência de eventual constrangimento ilegal.
No caso, a impetração veicula duas teses: (i) atipicidade da associação criminosa
(art. 288 do CP) em relação às pacientes ALINE FERNANDA COSTA e DORALICE DE
ARAÚJO COSTA; e (ii) bis in idem na dosimetria aplicada a ABRÃO BALADI NETO,
pela cumulação do art. 1º, § 4º, da Lei n. 9.613/1998 com o art. 71 do CP.
A respeito da associação criminosa, o magistrado sentenciante delineou o tema
nos seguintes termos (e-STJ fls. 136):
“Por fim, o Ministério Público imputou a todos os réus o crime pertencimento a
organização criminosa voltada à prática de crimes de lavagem de dinheiro.
Ocorre que esse crime não restou configurado.
De acordo com a disposição contida no art. 1º, § 1º, da Lei n. 12.850/2013,
considera-se organização criminosa a associação de delinquentes constituída
por, no mínimo, quatro pessoas, e no caso dos autos, como já visto, só se logrou
comprovar a atuação conjunta de três pessoas para o cometimento de crimes de
lavagem de dinheiro, quais sejam, os réus Abrão, Aline e Doralice. No que toca
aos demais acusados (Roberto e Larissa), não ficou suficientemente
demonstrada a integração às práticas do grupo, tendentes à ocultação e
dissimulação de dinheiro originado da contravenção penal.
Mas ainda que assim não fosse, o ajuntamento de pessoas para a lavagem de
dinheiro, tal como constituído no caso presente, não configuraria o crime de
pertencimento a organização criminosa.
Com efeito, a organização criminosa, conforme delineada no § 1º do art. 1º da
Lei n. 12.850/2013, difere da associação criminosa (Código Penal, art. 288) e
do mero concurso de agentes (idem, art. 29) por tratar-se de uma modalidade
mais complexa e sofisticada de codelinquência. A lei exige, para a tipificação
do crime em questão, que a reunião de criminosos seja marcada pela
estruturação ordenada do organismo, caracterizada pela divisão de tarefas
entre os seus integrantes, o que aponta para a necessidade de verdadeiro
sistema hierarquizado, com estamentos distintos, diversamente do que se dá
com a associação criminosa, cuja caracterização se satisfaz com a simples
reunião de pessoas, com caráter estável e permanente, para fins criminosos.
No caso presente, o agrupamento de pessoas (que, repita-se, ficou limitado a
Abrão, Aline e Doralice) não tinha as características que o legislador delineou
para a organização criminosa. Tratou-se de consórcio criminoso marcado pela
simplicidade e pela atuação assistemática, que permaneceu ainda distante do
modelo legal de organização criminosa.
Não obstante isso, é inegável que esse agrupamento formado por Abrão, Aline e
Doralice, voltado para o cometimento de crimes de lavagem de dinheiro,
amolda-se ao tipo penal do art. 288 do Código Penal. Tratou-se de associação
de três pessoas que, embora caracterizado pela ausência de complexidade e
sofisticação, tinha, inegavelmente, os aspectos de estabilidade e permanência,
não se podendo perder de vista que atuação desses três acusados, realizando a
estruturação e mescla, prolongou-se no tempo.”
O Tribunal de origem, ao manter a condenação pelo art. 288 do CP, explicitou
(e-STJ fls. 157/158):
“Embora os corréus Roberto e Larissa tenham sido absolvidos dessa acusação,
é certo que a atuação dos réus Abrão, Aline e Doralice não ficou isolada,
porquanto foram identificadas reiteradas condutas criminosas praticadas de
forma associada entre os três acusados, tudo para a prática reiterada do crime
de lavagem de dinheiro, inclusive em outro estado da federação. Como
destacado, anteriormente, Abrão era o líder na exploração direta do jogo de
azar, sendo assessorado por seu irmão, Roberto Baladi Júnior, sua esposa
Aline e sua sogra Doralice, todos em posição superiores, uma vez que,
gerenciavam indivíduos, não identificados, em funções operacionais de venda
de apostas e recolhimento e depósito de valores arrecadados (fls. 1929/2056),
razão pela qual precisavam realizar diversas e constantes transferências de
valores entre seus integrantes, sem qualquer lastro ou declaração fiscal,
resultando em registros de valores expressivos oriundos de depósitos e
compensações de cheques pulverizados, grande parte sem identificação de
origem, evidenciando a necessidade de lavagem desse dinheiro (fls. 1153/1928
e 2105/2205). Aliás, é certo que a caracterização do crime de associação
criminosa não exige a participação no delito fim, como há muito já vem
decidindo o Superior Tribunal de Justiça: “A associação criminosa é crime
formal, que se caracteriza pela simples reunião estável de três ou mais pessoas
com a finalidade de cometer um ou alguns ilícitos. Não se exige, para sua
consumação, a efetiva execução de delitos autônomos” (RHC 75.641/RJ,
Relator Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, Julgado em 05/11/2019,
DJE de 11/11/2019). As interceptações telefônicas apontaram a atuação
sistemática e reiterada dos três acusados, corroboradas pelas informações
detalhadas resultantes da apreensão dos documentos e aparelhos celulares dos
réus, dos quais foi possível extrair subsídios para comprovar, não só a prática
do jogo do bicho, como a sistêmica lavagem de dinheiro, inclusive em outro
estado por alguns anos, e consequentemente revelar a organização e
estabilidade do grupo, do qual Abrão, inegavelmente, exercia a liderança, pois
nas conversas captadas demonstrava possuir conhecimento elevado sobre a
rotina das apostas e da movimentação financeira, além de poder de mando em
relação aos demais comparsas. Os apelantes deixaram claro que estavam
vinculados à associação criminosa destinada ao delito e lavagem de dinheiro
oriundo, em regra da exploração do jogo do bicho, além de participar
diretamente em ações delituosas que se perpetraram por mais de nove anos,
entre 2012 e 2020. Ressalta-se que houve um prévio ajuste para a abertura e
utilização de contas bancárias, criação de empresas e aquisição de bens móveis
e imóveis, inclusive em outro estado da federação, além do “modus operandi”
mais evidente de depósitos rotineiros em dinheiro, sem identificação, tudo para
que fosse circulado o dinheiro gerado ilicitamente das apostas em jogo do
bicho, evidenciando a colaboração entre os apelantes para consumação dos
crimes de lavagem de dinheiro. Assim sendo, não há dúvidas sobre a
caracterização do crime de associação, resultando demonstrado o vínculo
estável entre os apelantes e os demais corréus e indivíduos não identificados
para a exploração de jogo do bicho. E note-se que a prova coligida nos autos é
clara e uníssona no sentido de que eles possuíam vínculo de parentesco, ou
seja, inegavelmente já se conheciam e uniram-se com o prévio e único intuito de
lavar dinheiro resultante da prática de contravenção. Nesse passo, diante de
tais evidências e da ausência de outras que as fragilizem, o conjunto probatório
revela-se sólido e consistente quanto a associação criminosa imputada aos
apelantes, prevista no artigo 288, do Código Penal, de modo que o édito
condenatório era mesmo de rigor, sendo o pleito de absolvição ou
desclassificação para outro delito impossível de se cogitar. Portanto, inviável,
diante elementos de convicção colhidos ao longo da “persecutio criminis”, a
modificação da sentença condenatória.”
Com efeito, como bem ressaltado pelo representante do Parquet, verifica-se que
cada uma dessas operações, praticadas de forma contínua e sistemática, constitui um
crime de lavagem de dinheiro autônomo. A finalidade era, na verdade, a prática de uma
série indeterminada de crimes da mesma espécie, o que satisfaz plenamente a exigência de
pluralidade contida no tipo penal do art. 288 do Código Penal. A norma não exige que a
associação vise a crimes de espécies distintas, mas sim a "cometer crimes", no plural (e-
STJ fl. 171).
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA E FURTO QUALIFICADO. JULGAMENTO
MONOCRÁTICO. POSSIBILIDADE. ABSOLVIÇÃO NO DELITO DO ART. 288,
CAPUT, DO CP. IMPOSSIBILIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO DO FURTO
MEDIANTE FRAUDE PARA ESTELIONATO. AUSÊNCIA DE VONTADE DE
DESPOJAMENTO DO BEM. SÚMULA 7/STJ. CONTINUIDADE DELITIVA.
INAPLICABILIDADE. HABITUALIDADE E REITERAÇÃO EM CRIMES
PATRIMONIAIS. AGRAVO DESPROVIDO.
1. A prolação de decisão monocrática está autorizada pelo Regimento Interno
do Superior Tribunal de Justiça, bem como pelo Código de Processo Civil, em
seu art. 932. Além disso, a decisão sempre poderá ser levada a julgamento do
Colegiado, por meio da interposição de agravo regimental, o que afasta
qualquer vício suscitado pelo agravante.
2. É firme o entendimento desta Corte Superior de que, para caracterização do
delito do art. 288, caput, do Código Penal, é necessário, além da reunião de
três ou mais pessoas, que haja um vínculo associativo estável e permanente
para a prática de crimes.
No caso, o Tribunal de origem, com base em extenso acervo fático-probatório,
demonstrou o vínculo associativo entre os agentes para cometer crimes
patrimoniais, de forma que desconstituir esse entendimento demandaria ampla
incursão nos autos, o que é vedado pela Súmula 7 do STJ.
3. A Corte de origem concluiu que as vítimas não tinham intenção de se
despojarem definitivamente de seus bens, pois acreditavam que seus cartões
seriam devolvidos às esferas de seus patrimônios.
Destarte, ocorreu uma efetiva subtração, estando configurado o furto mediante
fraude. Reformar a conclusão alcançada pela instância ordinária demandaria
necessário revolvimento fático-probatório, vedado pela Súmula 7/STJ.
4. A posição adotada pelo Tribunal a quo se coaduna com a pacífica
jurisprudência desta Corte de Justiça no sentido de que a habitualidade e a
reiteração delitivas impedem o reconhecimento do crime continuado.
5. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no AREsp n. 2.429.606/DF, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta
Turma, julgado em 20/8/2024, DJe de 26/8/2024.)
E, para rever tal moldura, seria necessário fazer incursão em matéria fático-
probatória, tarefa inviável nessa via.
Como se não bastasse, trata-se de delito autônomo, no qual não é necessário
que os crimes sejam efetivamente praticados para que o crime de associação criminosa seja
configurado.
Acerca do tema:
DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS.
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA E SIGILO TELEMÁTICO. RELATÓRIOS
DE INTELIGÊNCIA FINANCEIRA. RECURSO NÃO PROVIDO.
I. Caso em exame
1. Recurso em habeas corpus interposto contra o acórdão da Segunda Câmara
Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná que concedeu parcialmente a ordem
para declarar nula a quebra de sigilo telemático anterior a julho de 2016 e
determinou a suspensão do processo criminal em relação aos fatos imputados
como falsidade ideológica.
2. Os recorrentes alegam a ilicitude da interceptação telefônica, do sigilo
telemático e dos relatórios de inteligência financeira, além da nulidade da
decisão de recebimento da denúncia e do trancamento da ação penal.
II. Questão em discussão
3. A questão em discussão consiste em saber se a interceptação telefônica e o
acesso a dados telemáticos foram realizados de forma ilegal, baseando-se
apenas em denúncias anônimas, e se houve quebra indevida de sigilo bancário
com o envio de relatórios de inteligência financeira.
4. Outra questão em discussão é a alegação de inépcia da denúncia por
ausência de lançamento do crédito tributário, em violação da Súmula
Vinculante 24/STF, e a atipicidade da conduta imputada como associação
criminosa.
III. Razões de decidir
5. A interceptação telefônica foi considerada legal, pois foi fundamentada em
um conjunto robusto de elementos indiciários, não apenas em denúncias
anônimas, e seguiu as formalidades legais.
6. O acesso aos dados telemáticos não configurou fishing expedition, pois houve
delimitação do objeto investigado e autorização judicial, não sendo necessária
a especificação de um marco temporal para dados estáticos.
7. O envio de relatórios de inteligência financeira foi autorizado judicialmente,
não havendo ilegalidade, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal
sobre o compartilhamento de tais dados.
8. A questão da nulidade da decisão de recebimento da denúncia não foi objeto
de deliberação no ato apontado como coator, inviabilizando sua análise nesta
instância.
9. A associação criminosa foi considerada crime autônomo, não dependendo da
efetiva prática de crimes tributários para sua caracterização.
IV. Dispositivo e tese
10. Recurso não provido.
Tese de julgamento: "1. A interceptação telefônica é legal quando
fundamentada em elementos indiciários robustos e não apenas em denúncias
anônimas. 2. O acesso a dados telemáticos não requer limitação temporal
quando se trata de dados estáticos, desde que haja autorização judicial. 3. O
envio de relatórios de inteligência financeira com autorização judicial não
configura quebra indevida de sigilo bancário. 4. A associação criminosa é
crime autônomo e não depende da prática de crimes tributários para sua
caracterização."
Dispositivos relevantes citados: Lei nº 9.296/1996, art. 2º, II;
Lei nº 12.965/2014.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 822.879
/SP, Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 12/9/2024; STJ, HC
460.958/MG, Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 20/4/2021; STF,
RE 1.055.941, Repercussão Geral.
(RHC n. 200.318/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma,
julgado em 30/4/2025, DJEN de 7/5/2025.)
Além disso, a intervenção, em sede de habeas corpus, na dosimetria da pena é
restrita a hipóteses de manifesta ilegalidade, reconhecíveis de plano, o que não se verifica
na espécie (AgRg no HC n. 974.351/BA, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro,
Sexta Turma, julgado em 14/5/2025, DJEN de 20/5/2025). A impetração, nessa parte,
pretende reabrir discussão de mérito típica de recurso próprio.
Quanto ao alegado bis in idem na dosimetria da lavagem de capitais aplicada a
ABRÃO BALADI NETO, em razão da incidência da causa de aumento de pena prevista no
§ 4º do art. 1º da Lei n. 9.613/98 e do crime continuado, o acórdão, ao examinar o conjunto
sancionatório, manteve o quadro repressivo delineado, assentando (e-STJ fl. 159):
“Em atenção aos critérios norteadores do artigo 59, do Código Penal, para
todos os réus, o Juízo a quo fixou as basilares nos mínimos legais, ou seja, em
06 meses de prisão simples para a contravenção de jogo do bicho, 03 anos de
reclusão e pagamento de 10 dias-multa para o crime de lavagem de dinheiro e
01 ano de reclusão para o delito de associação criminosa. Na segunda fase, as
penas permaneceram inalteradas, ante a ausência de atenuantes e agravantes.
Na terceira fase, presente a causa de aumento de pena prevista no artigo
primeiro, parágrafo quarto, da Lei 9613/98, por conta de o crime ter sido
cometidos de forma reiterada (aproximadamente por nove anos, entre 2012 e
2020), razão pela qual as reprimendas do crime de lavagem foram
modicamente elevadas em um terço, perfazendo 04 anos de reclusão e
pagamento de 13 dias-multa, enquanto para os outros dois delitos, permaneceu
inalterada, tornando-as definitivas nos termos anteriores. Em seguida, foi
reconhecido o concurso formal entre os três crimes de lavagem praticados por
Abrão, sendo aplicada somente uma das penas reclusivas, acrescida de um
quinto, tornando-a definitiva em 04 anos, 09 meses e 18 dias de reclusão e mais
o pagamento de 15 dias-multa. Caracterizado o concurso material, as penas
foram somadas, totalizando para Abrão os 05 anos, 09 meses e 18 dias de
reclusão, além de 06 meses de prisão simples, mais o pagamento de 25 dias-
multa.”
Não se verifica, portanto qualquer menção ao tema pela Corte local, o qual
assentou ter havido o concurso formal de delitos.
Desse modo, "como os argumentos apresentados pela Defesa não foram
examinados pelo Tribunal de origem no acórdão ora impugnado, as matérias não podem ser
apreciadas por esta Corte nesta oportunidade, sob pena de indevida supressão de instância"
(AgRg no HC n. 820.927/RJ, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em
11/9/2023, DJe de 14/9/2023.).
No mesmo sentido, é entendimento da Corte Maior que “[o] exaurimento da
instância recorrida é, como regra, pressuposto para ensejar a competência do Supremo
Tribunal Federal, conforme vem sendo reiteradamente proclamado por esta Corte (HC
129.142, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Rel. p/ Acórdão Min. ALEXANDRE DE
MORAES Primeira Turma, DJe de 10/8/2017; RHC 111.935, Rel. Min. LUIZ FUX,
Primeira Turma, DJe de 30/9/2013; HC 97.009, Rel. p/ Acórdão: Min. TEORI
ZAVASCKI, Tribunal Pleno, DJe de 4/4/2014; HC 118.189, Rel. Min. RICARDO
LEWANDOWSKI, Segunda Turma, DJe de 24/4/2014)”. (HC n. 179.085, Rel. Ministro
Marco Aurélio, Primeira Turma, julgado em 5/8/2020, DJe 25/9/2020).
Por tais razões, ausente flagrante constrangimento ilegal, e tratando-se de
habeas corpus substitutivo de recurso adequado, a impetração não deve ser conhecida.
Com fundamento no art. 34, XX, do RISTJ, não conheço do habeas corpus.
Intimem-se.
Brasília, 04 de novembro de 2025.
Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA
Relator