STJ – RECURSO ESPECIAL Nº 2129380 - MG (2024/0083240-5)
ersa acerca do prazo prescricional a ser aplicado nos casos de pretensão punitiva disciplinar aplicada pela Polícia Civil do Estado de Minas Gerais e, ainda, sobre a possibilidade ou não de interrupção do prazo prescricional pela instauração de sindicância meramente apuratória" (fls. 1.066/1.067). A alteração do julgado, conforme pretendido nas razões recursais, demandaria, necessariamente, a análise da legislação local, providência vedada em recurso especial. Desse modo, aplico à espécie, por analogia, o enunciado 280 da Súmula do Supremo Tribunal Federal ("Por ofensa ao direito local não cabe recurso extraordinário"). É pacífico o entendimento desta Corte Superior de que os mesmos óbices impostos à admissão do recurso pela alínea a do permissivo constitucional impedem a análise recursal pela alínea c; em razão disso fica prejudicada a apreciação do dissídio jurisprudencial referente ao mesmo dispositivo de lei federal apontado como violado ou à tese jurídica. A propósito, confiram-se as decisões proferidas nestes processos: (1) Aglnt no REsp 1.878.337/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 16/12/2020, DJe de 18/12/2020; e (2) Aglnt no REsp 1.503.880/PE, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 27/2/2018, DJe de 8/3/2018. Ante o exposto, conheço em parte do recurso especial e, nesta extensão, a ele nego provimento. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 05 de novembro de 2025. MINISTRO PAULO SÉRGIO DOMINGUES Relator
Decisão completa:
RECURSO ESPECIAL Nº 2129380 - MG (2024/0083240-5)
RELATOR : MINISTRO PAULO SÉRGIO DOMINGUES
RECORRENTE : JOSE EVANGELISTA GONCALVES
ADVOGADOS : RUTH SALVADOR SILVA PASSOS E OUTRO(S) - ES011577
TIAGO HUDSON DA SILVA OLIVEIRA - MG158470
RECORRIDO : ESTADO DE MINAS GERAIS
PROCURADORA : IZABELLA FERREIRA FABBRI NUNES - MG143518
DECISÃO
Trata-se de recurso especial interposto por JOSE EVANGELISTA
GONCALVES, com fundamento no art. 105, inciso III, alíneas a e c, da Constituição
Federal, no qual se insurge contra o acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO
DE MINAS GERAIS assim ementado (fl. 1.064):
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ORDINÁRIA – CASSAÇÃO DE
APOSENTADORIA – POLICIAL CIVIL – SUSPENSÃO – IRDR nº
1.0000.16.038002-8/000 – RECURSO ESPECIAL INADMITIDO –
PRECEDENTE PERSUASIVO – PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA –
INOCORRÊNCIA – DANO MORAL – RESPONSABILIDADE CIVIL DO
ESTADO - FATO ADMINISTRATIVO OU CONDUTA DE AGENTE PÚBLICO,
DANO EFETIVO E NEXO DE CAUSALIDADE – INEXISTÊNCIA DE
EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA – DANO NÃO COMPROVADO –
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA – RECURSO DESPROVIDO.
O Recurso Especial interposto contra o IRDR nº 1.0000.16.038002-8/000
não possui efeito suspensivo, pois inadmitido pela Primeira Vice- Presidência
deste Tribunal de Justiça, podendo ser aplicado como precedente persuasivo.
O prazo prescricional para o exercício da pretensão punitiva disciplinar
da Administração Pública, no âmbito da Polícia Civil do Estado de Minas
Gerais, é de 2 (dois) anos para as penas de repreensão, multa e suspensão e
4 (quatro) anos para as penas de demissão, cassação de aposentadoria e
colocação em disponibilidade. Precedente IRDR 1.0000.16.038002-8/000, de
Relatoria da e. Des.(a) Albergaria Costa. Não havendo indícios nos autos de
que, de fato, o interregno legal para sanção administrativa aplicada ao apelante
tenha sido suplantado na via administrativa, mostram-se necessária a
manutenção da sentença que julgou improcedente os pedidos autorais.
A responsabilidade civil do Estado é, em regra, objetiva para atos
administrativos comissivos ou omissivos, como estabelecido no art. 37, §6º, da
Constituição da República de 1988.
Não comprovados os vícios alegados pela parte autora no PAD que
cassou a sua aposentadoria, bem como não demonstrado o dano moral
sofrido, inexiste o dever de indenizar por parte do Estado.
Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (fls. 1.178/1.185).
Nas razões de seu recurso, a parte recorrente sustenta a ocorrência, além de
dissídio jurisprudencial, da violação dos arts. 489, § 1º, III, IV, e VI, e 1.022 do Código de
Processo Civil (CPC) e 189, 202 e 205 do Código Civil (CC). Alega o seguinte:
(1) a ocorrência de negativa de prestação jurisdicional; e
(2) o prazo prescricional para a pretensão punitiva da administração
pública deve ser contado a partir da ciência do fato pela autoridade
competente, e a interrupção da prescrição só pode ocorrer uma única vez.
Nesse sentido, o Tribunal de origem desconsiderou que o prazo prescricional
foi interrompido pela instauração da sindicância administrativa, mas não
poderia ser novamente interrompido pela instauração do Processo
Administrativo Disciplinar (PAD).
Requer o provimento recursal, para que seja acolhido o argumento de ofensa
aos arts. 489 e 1.022 do CPC ou, alternativamente, a declaração de "nulidade do
procedimento administrativo disciplinar que cassou a aposentadoria do Recorrente,
restabelecendo em definitivo a condição de aposentado deste, com a normalização e
manutenção do pagamento das prestações previdenciárias e todos seus reflexos" (fl.
1.237).
A parte adversa apresentou contrarrazões (fls. 1.307/1.320).
O recurso foi admitido (fls. 1.324/1.326).
É o relatório.
Na origem, cuida-se de ação ordinária declaratória de nulidade de ato
administrativo, cumulada com pedido de tutela de evidência, ajuizada por José
Evangelista Gonçalves, visando ao restabelecimento de sua aposentadoria cassada por
meio de processo administrativo disciplinar. O autor sustenta a ocorrência de prescrição
da pretensão punitiva da administração pública.
A parte opôs embargos de declaração na origem com estes argumentos (fls.
1.152/1.153):
Vejamos que a interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer
uma vez, ocorreu com a Sindicância ADMINISTRATIVA, nada importando a
promoção em Processo Administrativo disciplinar.
Tal assertiva se dá pelo fato de que os prazos prescricionais definidos no
direito administrativo, como, por exemplo, os prazos elencados no IRDR
1.0000.16.038002-8/000, detém 3 (três) possibilidades de interrupção (30 dias
após a inst. da SI e 240 dias da instauração de Sindicância Adm e/ou Processo
Administrativo), porém, necessário destacar que só se interrompem uma vez e,
ocorrente o fato interruptivo, fica prejudicado o lapso que fluiu anteriormente,
reinicia-se a contagem e, o novo prazo, é peremptório e não mais se sujeita à
paralisação.
Ao apreciar o recurso integrativo, o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
MINAS GERAIS decidiu o seguinte (fls. 1.181/1.182):
Voltando ao caso em comento, verifico que o v. acórdão impugnado não
contém qualquer vício que exija a correção através de Embargos de
Declaração.
Isso porque, ao contrário do alegado pelo Embargante, restou
consignado no v. acórdão vergastado que, no que tange à prescrição da
sanção punitiva aplicada ao Recorrente, em que pese tenha me manifestado
quando do agravo de instrumento, sequencial 001, no sentido de haver indícios
da referida prescrição, a referida manifestação se deu em sede liminar,
versando aquele recurso sobre a concessão de tutela de urgência, e,
revisitando o caderno processual, após o regular trâmite do processo na
instância originária, tenho que ela não encontra- se evidenciada, “in casu”,
porquanto, respaldando-se na tese jurídica firmada por este e. Tribunal de
Justiça, quando do julgamento do IRDR nº 1.0000.16.038002-8/000, Tema
nº23, utilizado como precedente persuasivo, para as penas de cassação de
aposentadoria, o prazo prescricional seria de 4 (quatro) anos, interrompendo-
se com a instauração da sindicância apuratória/investigativa, bem como com a
instauração de Processo Administrativo Disciplinar – PAD.
Restou fundamentado no acórdão atacado que o marco interruptivo do
prazo prescricional se deu com a instauração da sindicância e, posteriormente
instaurando-se processo administrativo disciplinar, dentro do prazo legal, foi,
mais uma vez, interrompido o prazo prescricional.
Na presente hipótese, observo que o Tribunal de origem resolveu a
controvérsia ao assentar que o prazo prescricional para a aplicação da pena de cassação
de aposentadoria é de 4 (quatro) anos, sendo interrompido com a instauração da sin
dicância investigativa e do Processo Administrativo Disciplinar – PAD.
Inexiste a alegada violação dos arts. 489 e 1.022 do CPC, pois a prestação
jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, consoante se depreende da
análise do acórdão recorrido. O Tribunal de origem apreciou fundamentadamente a
controvérsia, não padecendo o julgado de erro material, omissão, contradição ou
obscuridade.
É importante ressaltar que julgamento diverso do pretendido, como neste
caso, não implica ofensa aos dispositivos de lei invocados.
Nos termos do acórdão recorrido, o Tribunal de origem assim se manifestou
sobre a controvérsia (fls. 1.067/1.073):
No âmbito do Estado de Minas Gerais, a Lei nº 5.406/1969, Lei Orgânica
da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais, prevê, expressamente, a pena de
cassação de aposentadoria, quando da prática de falta grave capaz de ensejar
a pena de demissão, “verbis”:
“Art. 154 - São penas disciplinares:
(...)
VI - cassação de aposentadoria ou disponibilidade.
(...)
Art. 160 - Será aplicada a pena de cassação de aposentadoria ou
disponibilidade se ficar provado que o servidor policial inativo:
I - praticou, quando em atividade, falta grave e que é cominada
nesta lei a pena de demissão ou de demissão a bem do serviço público;
II - aceitou ilegalmente cargo ou função pública;
III - aceitou representação de Estado estrangeiro, sem prévia
autorização do Presidente da República; e
IV - praticou, quando convocado para o exercício efetivo de
funções policiais, nos termos legais e regulamentares, quaisquer
transgressões puníveis com demissão a bem do serviço público.” (GN)
As transgressões disciplinares, por sua vez, restaram estabelecidas nos
art. 150 e 152 da referida Lei que, ainda, previu, nos art. 158 e 159, as faltas
graves passíveis de demissão ou de demissão a bem do serviço público, que
justificam a cassação da aposentadoria.
No caso, conforme consta dos autos, o Autor/Apelante teria praticado ato
ilícito, quando ainda no exercício de sua função como Policial Civil (evento 11).
[...]
Continuando, no que tange à prescrição da sanção punitiva aplicada ao
Recorrente, em que pese tenha me manifestado quando do agravo de
instrumento, sequencial 001, no sentido de haver indícios da referida
prescrição, revisitando o caderno processual, após o regular trâmite do
processo na instância originária, tenho que ela não encontra-se evidenciada,
“in casu”.
A tese jurídica firmada no julgamento do IRDR nº 1.0000.16.038002-8
/000, que, repisa-se, utiliza-se apenas como precedente persuasivo,
estabeleceu que, para as penas de cassação de aposentadoria, o prazo
prescricional seria de 4 (quatro) anos, interrompendo-se com a
instauração da sindicância apuratória/investigativa, bem como com a
instauração de Processo Administrativo Disciplinar – PAD, nos termos
seguintes:
“1) O prazo prescricional para o exercício da pretensão punitiva da
Administração Pública para a aplicação de sanções contra as
transgressões disciplinares praticadas pelos membros da Polícia Civil do
Estado de Minas Gerais é de: a) 2 (dois) anos para as penas de
repreensão, multa e suspensão e; b) 4 (quatro) anos para as penas de
demissão, cassação de aposentadoria e colocação em disponibilidade;
2) Interrompe-se a fluência do prazo pela instauração de qualquer
procedimento tendente à apuração dos fatos e/ou aplicação da pena,
seja uma sindicância apuratória/investigativa, uma sindicância acusatória
/punitiva ou um processo administrativo disciplinar (PAD);
3) A instauração da sindicância ou do PAD interrompe a contagem
do prazo de prescrição pelo período de processamento do procedimento
disciplinar, que é, no âmbito da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais,
de a) 240 dias para o PAD ou sindicância acusatória/punitiva, a contar da
citação do acusado; b) 30 dias para a sindicância apuratória
/investigativa, a contar da data da sua instauração; findo os quais retoma-
se a contagem do prazo, pela integra. (TJMG - IRDR - Cv
1.0000.16.038002-8/000, Relator(a): Des.(a) Albergaria Costa , 1ª Seção
Cível, julgamento em 17/10/2018, publicação da súmula em 29/10/2018)”
Voltando-me aos autos, tem-se que o marco interruptivo do prazo
prescricional se deu com a instauração da sindicância no dia 08/02/2010,
que, somado ao prazo de 30 dias legalmente previsto para sua conclusão,
teria até 08/03/2014 para a aplicação da pena apropriada (evento 6)
Ocorre que, concluída a sindicância, foi instaurado processo
administrativo disciplinar em 02/05/2013, sendo mais uma vez, portanto,
interrompido o prazo prescricional.
Com efeito, a pena de cassação da aposentadoria do Autor/Apelante foi
aplicada em 14/06/2016, data anterior ao término do prazo prescricional de 04
(quatro) anos a contar da data de instauração do PAD supramencionada,
somada aos 240 (duzentos e quarenta) dias legalmente previstos.
Nesse contexto, delineados os marcos interruptivos no curso do feito,
vislumbro que a pretensão punitiva estatal não se encontrava prescrita -
destaquei.
Da leitura do acórdão recorrido, constato que o mérito recursal foi decidido à
luz da interpretação da Lei 5.406/1969 (Lei Orgânica da Polícia Civil do Estado de Minas
Gerais) e das teses firmadas no julgamento do IRDR 1.0000.16.038002-8/000, "que
versa acerca do prazo prescricional a ser aplicado nos casos de pretensão punitiva
disciplinar aplicada pela Polícia Civil do Estado de Minas Gerais e, ainda, sobre a
possibilidade ou não de interrupção do prazo prescricional pela instauração de
sindicância meramente apuratória" (fls. 1.066/1.067).
A alteração do julgado, conforme pretendido nas razões recursais,
demandaria, necessariamente, a análise da legislação local, providência vedada em
recurso especial.
Desse modo, aplico à espécie, por analogia, o enunciado 280 da Súmula do
Supremo Tribunal Federal ("Por ofensa ao direito local não cabe recurso extraordinário").
É pacífico o entendimento desta Corte Superior de que os mesmos óbices
impostos à admissão do recurso pela alínea a do permissivo constitucional impedem a
análise recursal pela alínea c; em razão disso fica prejudicada a apreciação do dissídio
jurisprudencial referente ao mesmo dispositivo de lei federal apontado como violado ou à
tese jurídica.
A propósito, confiram-se as decisões proferidas nestes processos: (1) Aglnt no
REsp 1.878.337/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em
16/12/2020, DJe de 18/12/2020; e (2) Aglnt no REsp 1.503.880/PE, relator Ministro
Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 27/2/2018, DJe de 8/3/2018.
Ante o exposto, conheço em parte do recurso especial e, nesta extensão, a ele
nego provimento.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 05 de novembro de 2025.
MINISTRO PAULO SÉRGIO DOMINGUES
Relator