Trecho útil da decisão:

STJ – RECURSO ESPECIAL Nº 2179992 - SP (2024/0412391-0)

Decisão completa:

                                  RECURSO ESPECIAL Nº 2179992 - SP (2024/0412391-0)

          RELATOR                          : MINISTRO HUMBERTO MARTINS
          RECORRENTE                       : ROBERTO GONCALVES DE AQUINO
          ADVOGADOS                        : RONAN AUGUSTO BRAVO LELIS - SP298953
                                             GABRIEL MOURA AGUIAR - SP365001
                                             SILVIA CORREA DE AQUINO - SP279781
          RECORRIDO                        : PREVENTE CONSULTORIA E ASSESSORIA S/C LTDA
          RECORRIDO                        : VALMIR DE OLIVEIRA SANTOS
          ADVOGADO                         : MARCO ANTONIO BARREIRA - SP116637

                                                                         DECISÃO



                                Cuida-se de recurso especial interposto por ROBERTO GONCALVES DE
          AQUINO, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição
          Federal, contra acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO
          PAULO, em fase de cumprimento de sentença decorrente de ação de indenização por
          danos materiais e morais.
                                O julgado negou provimento ao recurso de agravo de instrumento do
          recorrente nos termos da seguinte ementa (fls. 229 - 235):

                                                                "PRESTAÇÃO          DE      SERVIÇOS.          AÇÃO      DE
                                                                INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS.
                                                                CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. REQUERIMENTO DE
                                                                PENHORA SOBRE IMÓVEIS. ASSERTIVA DA
                                                                OCORRÊNCIA DE FRAUDE DE EXECUÇÃO.
                                                                ALIENAÇÃO DOS BENS ANOS ANTES DA
                                                                PROPOSITURA DA AÇÃO. FRAUDE DE EXECUÇÃO
                                                                NÃO CONFIGURADA. BENS DE TITULARIDADE DO
                                                                CÔNJUGE DO EXECUTADO. PLEITO DE PENHORA DA
                                                                PARTE IDEAL. POSSIBILIDADE. PLEITO DE
                                                                PENHORA DE IMÓVEL QUE SERIA BEM DE FAMÍLIA
                                                                DO EXECUTADO. AUSÊNCIA DE PROVA DA
                                                                TITULARIDADE E DE FRAUDE À LEI 8.009/90.
                                                                INADMISSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE
                                                                PROVIDO. 1. Os elementos constantes dos autos permitem
                                                                confirmar que a transferência dos imóveis ocorreu vários
                                                                anos antes da propositura da ação principal, de modo que não


 
                                                                há como reconhecer a fraude de execução. 2. Por outro lado,
                                                                observa-se que o executado é casado sob o regime da
                                                                comunhão de bens, sendo possível a penhora sobre a
                                                                respectiva meação de veículo e de crédito em nome de seu
                                                                cônjuge. 3. Com relação ao imóvel que seria bem de família
                                                                do executado, a prova produzida não permite que se alcance
                                                                qualquer conclusão a respeito da titularidade do imóvel e da
                                                                eventual fraude praticada por ele."

                                Rejeitados os embargos de declaração opostos (fls. 242 - 245).
                                No presente recurso especial, o recorrente sustenta negativa de vigência aos
          arts. 792 e 797 do CPC e ao art. 4º da Lei n. 8.009/90, aduzindo ser possível o
          reconhecimento de fraude à execução relativamente aos imóveis alienados aos filhos do
          executado e à suposta blindagem patrimonial realizada no curso da execução; a penhora do
          imóvel indicado como residência atual do recorrido, alegadamente imóvel de elevado
          valor, com incidência da exceção prevista no art. 4º da Lei n. 8.009/90; e subsidiariamente,
          o deferimento da penhora no rosto dos autos de crédito em nome da esposa do executado,
          casados sob comunhão parcial de bens (fls. 247 - 257).
                                Decorrido o prazo para contrarrazões (fls. 267 - 267), sobreveio o juízo de
          admissibilidade positivo da instância de origem (fls. 268 - 269).
                                É, no essencial, o relatório.
                                No que se refere à alegada ofensa ao art. 4º da Lei n. 8.009/1990, o recurso
          não merece prosperar.
                                O Tribunal de origem, com base no acervo fático-probatório dos autos,
          consignou inexistirem elementos capazes de demonstrar que o imóvel indicado pelo
          recorrente seria de titularidade do executado ou que haveria alteração de domicílio com o
          intuito de fraudar credores, afastando, assim, a incidência da exceção prevista na legislação
          de regência.
                                A modificação desse entendimento demandaria o reexame das provas
          constantes dos autos, providência sabidamente inviável em sede de recurso especial,
          conforme orientação consolidada na Súmula 7/STJ.
                                Ademais, o acórdão recorrido encontra-se em harmonia com a jurisprudência
          desta Corte Superior quanto à impenhorabilidade do bem de família e ao ônus probatório
          da parte que invoca sua proteção, circunstância que atrai a incidência da Súmula 83/STJ.
                                Nesse sentido:

                                                                DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO EM
                                                                RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO
                                                                EXTRAJUDICIAL.     BEM    DE     FAMÍLIA.
                                                                IMPENHORABILIDADE.     NECESSIDADE    DE
                                                                AVALIAÇÃO PRÉVIA. ÔNUS DA PROVA. INCUMBE
                                                                AO CREDOR O ÔNUS DA PROVA QUANTO À


 
                                                                DESCARACTERIZAÇÃO DO BEM DE FAMÍLIA.
                                                                DECISÃO ALINHADA COM A JURISPRUDÊNCIA
                                                                DESTE TRIBUNAL. SUMULA 83 DO STJ. DECISÃO
                                                                MOTIVADA E SUFICIENTE, SOBRE OS PONTOS
                                                                RELEVANTES E NECESSÁRIOS AO
                                                                DESLINDE DA CONTROVÉRSIA. OFENSA AO 489 e
                                                                1.022 DO CPC AFASTADA. REVISÃO DO QUADRO
                                                                FÁTICO PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SUMULA
                                                                7 DO STJ. RECURSO NÃO CONHECIDO.
                                                                I. Caso em exame
                                                                1. Agravo em recurso especial interposto contra decisão que
                                                                inadmitiu recurso especial fundamentado na alínea "a" do
                                                                art. 105, III, da Constituição Federal, em execução de título
                                                                extrajudicial, no qual se discute a necessidade de avaliação de
                                                                imóvel antes de decidir sobre sua impenhorabilidade como
                                                                bem de família.
                                                                2. A decisão recorrida determinou a avaliação do imóvel para
                                                                verificar suas características .
                                                                3. O recorrente sustenta que a avaliação é desnecessária,
                                                                morosa e custosa, e que a análise da impenhorabilidade
                                                                deveria preceder a avaliação.
                                                                II. Questão em discussão
                                                                4. A questão em discussão consiste em saber se a
                                                                determinação de avaliação do imóvel antes de decidir sobre
                                                                sua impenhorabilidade como bem de família é válida,
                                                                considerando os custos e o tempo envolvidos.
                                                                III. Razões de decidir
                                                                5. Perícia determinada para avaliar a (im)penhorabilidade do
                                                                bem e sua natureza de bem de família.
                                                                6. A análise da necessidade de avaliação do imóvel envolve
                                                                reexame de fatos e provas, procedimento vedado em recurso
                                                                especial, conforme a Súmula 7 do STJ.
                                                                7. A decisão recorrida está alinhada à jurisprudência do STJ,
                                                                no sentido de que incumbe ao credor o ônus da prova quanto
                                                                à descaracterização do bem de família, o que atrai a
                                                                incidência do comando da Súmula n. 83 deste Superior
                                                                Tribunal de Justiça.
                                                                8. A alegação de afronta aos artigos 489 e 1.022 do CPC foi
                                                                afastada, pois o Tribunal de origem fundamentou
                                                                adequadamente sua decisão, não havendo omissão,
                                                                obscuridade ou contradição.
                                                                IV. Dispositivo 9. Resultado do Julgamento: Recurso não
                                                                conhecido.
                                                                (AREsp n. 2.809.469/MT, relatora Ministra Daniela Teixeira,
                                                                Terceira Turma, julgado em 20/10/2025, DJEN de
                                                                23/10/2025. )


                                                                Ementa: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO
                                                                INTERNO EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
                                                                EXECUÇÃO. PENHORA DE IMÓVEL RESIDENCIAL.
                                                                BEM DE FAMÍLIA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS
                                                                ARTS. 489 E 1.022 DO CPC. REEXAME DE FATOS E
                                                                PROVAS. SÚMULAS 7 E 83 DO STJ. RECURSO
                                                                DESPROVIDO.


 
                                                                I. CASO EM EXAME:
                                                                1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática do
                                                                relator, Ministro Marco Aurélio Bellizze, que negou
                                                                seguimento a recurso especial, sob os fundamentos de
                                                                ausência de violação aos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015,
                                                                reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel como bem
                                                                de família e incidência das Súmulas 7 e 83 do STJ. A parte
                                                                agravante sustentou o cumprimento dos requisitos legais para
                                                                o conhecimento e provimento do recurso, ao passo que a
                                                                parte agravada, embora intimada, não se manifestou. II.
                                                                QUESTÃO EM DISCUSSÃO
                                                                2. Há quatro questões em discussão: (i) aferir se houve
                                                                negativa de prestação jurisdicional por omissão, contradição
                                                                ou obscuridade no acórdão recorrido; (ii) examinar se o
                                                                imóvel penhorado ostenta a condição de bem de família; (iii)
                                                                verificar se a alegação de valor elevado do bem afastaria sua
                                                                impenhorabilidade; e (iv) definir se o acolhimento da tese
                                                                recursal demandaria reexame de fatos e provas. III. RAZÕES
                                                                DE DECIDIR
                                                                3. Não se configura violação aos arts. 489 e 1.022 do
                                                                CPC/2015 quando o tribunal de origem examina de forma
                                                                fundamentada as questões essenciais ao deslinde da
                                                                controvérsia, ainda que em sentido contrário aos interesses da
                                                                parte.
                                                                4. O acórdão recorrido reconhece, com base em documentos
                                                                constantes dos autos, que o imóvel penhorado é utilizado
                                                                como residência do executado e de sua família, o que
                                                                configura bem de família, nos termos da Lei nº 8.009/1990.
                                                                5. A jurisprudência pacífica do STJ estabelece que o valor
                                                                elevado do imóvel não afasta, por si só, a proteção conferida
                                                                pelo regime de impenhorabilidade legal, sendo irrelevante o
                                                                padrão do bem para fins de exclusão da salvaguarda legal.
                                                                6. A pretensão recursal de descaracterização do bem de
                                                                família exige reexame do conjunto fático-probatório dos
                                                                autos, providência vedada em sede de recurso especial,
                                                                conforme a Súmula 7 do STJ.
                                                                7. Aplica-se ainda a Súmula 83 do STJ, pois a decisão
                                                                agravada está em consonância com a jurisprudência
                                                                consolidada desta Corte Superior, que reconhece a
                                                                impenhorabilidade do bem de família mesmo nos casos de
                                                                imóveis de alto padrão. IV. RECURSO DESPROVIDO.
                                                                (AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.738.880/DF, relatora
                                                                Ministra Daniela Teixeira, Terceira Turma, julgado em
                                                                13/10/2025, DJEN de 16/10/2025.)

                                No que se refere à alegada fraude à execução e impossibilidade de constrição
          dos bens da cônjuge, também não prospera o apelo.
                                O Tribunal estadual assentou que as alienações dos bens supostamente
          utilizadas para frustração da execução ocorreram muitos anos antes da propositura da ação
          originária, não havendo prova segura de que o executado tivesse se desfeito do patrimônio
          com o intuito de se furtar ao adimplemento de eventual condenação.



 
                                Da mesma forma, reconheceu que outro dos imóveis jamais constou em nome
          do devedor, e que não havia lastro probatório suficiente para caracterizar blindagem
          patrimonial ou fraude de execução:

                                                                Ocorre que o agravante não juntou certidão atualizada da
                                                                matrícula do imóvel, quer nos autos principais, quer neste
                                                                âmbito. Além disso, formulou alegação genérica no sentido
                                                                de que “o agravado transferiu, intencionalmente, sua moradia
                                                                para residência de alto valor com o exato propósito de fraudar
                                                                seus credores” (fls. 12). Os elementos apresentados nos autos
                                                                não permitem que se faça qualquer análise a respeito da
                                                                titularidade do imóvel e da eventual fraude praticada pelo
                                                                executado.

                                Alterar tais premissas demandaria inevitavelmente o revolvimento do
          conjunto fático-probatório dos autos, também vedado pela Súmula 7/STJ. A jurisprudência
          desta Corte Superior orienta-se no mesmo sentido:

                                                                DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO EM
                                                                RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.
                                                                PENHORA DE IMÓVEL. BEM DE FAMÍLIA.
                                                                IMPENHORABILIDADE. FRAUDE À EXECUÇÃO.
                                                                REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ.
                                                                1. Insurge-se a recorrente contra acórdão que manteve o
                                                                reconhecimento da impenhorabilidade de imóvel residencial,
                                                                afastando a alegação de fraude à execução em face da
                                                                executada pessoa física.
                                                                2. Alega a agravante violação aos arts. 137, 790, inciso VII, e
                                                                792, § 3º, do Código de Processo Civil, bem como ao art. 4º
                                                                da Lei nº 8.009/90, sustentando que a oneração do bem como
                                                                residência familiar, ocorrida em 2010, configuraria fraude à
                                                                execução, uma vez realizada após a citação da pessoa jurídica
                                                                executada em 2009.
                                                                3. Concluiu o Tribunal de Justiça, mediante análise soberana
                                                                do conjunto probatório, pela inexistência de fraude à
                                                                execução, estabelecendo como premissas fáticas que: (a) o
                                                                imóvel foi adquirido pela executada em 2007, antes mesmo
                                                                do ajuizamento da ação de cobrança em 2009; (b) o bem
                                                                serve efetivamente como residência permanente da devedora;
                                                                (c) não logrou a parte exequente demonstrar que a executada
                                                                possuía outros imóveis ou que não residia habitualmente no
                                                                local.
                                                                4. Objetiva a recorrente o reconhecimento de fraude à
                                                                execução com base na alegada má-fé na oneração do imóvel
                                                                em 2010, pretensão que demanda, necessariamente, a revisão
                                                                das conclusões fáticas firmadas pela instância ordinária.
                                                                5. Vedado se mostra, em sede de recurso especial, o reexame
                                                                de fatos e provas para modificar as premissas estabelecidas
                                                                pelo acórdão recorrido, consoante o óbice da Súmula 7 desta
                                                                Corte Superior.
                                                                6. Agravo conhecido para negar provimento ao recurso
                                                                especial.


 
                                                                (AREsp n. 2.790.971/SP, relator Ministro Moura Ribeiro,
                                                                Terceira Turma, julgado em 13/10/2025, DJEN de
                                                                17/10/2025. )

                                                                AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO
                                                                ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO.
                                                                PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA Nº 211/STJ.
                                                                IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL.
                                                                AFASTADA. FRAUDE À EXECUÇÃO RECONHECIDA.
                                                                REVISÃO. SÚMULA Nº 7/STJ.
                                                                DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. PREJUDICADA.
                                                                1. A falta de prequestionamento da matéria suscitada no
                                                                recurso especial, a despeito da oposição de declaratórios,
                                                                impede seu conhecimento, a teor da Súmula nº 211/STJ.
                                                                2. Na hipótese, rever a conclusão do acórdão recorrido de que
                                                                a garantia de impenhorabilidade do imóvel objeto da ação
                                                                deve ser afastada diante do reconhecimento de fraude à
                                                                execução demandaria o revolvimento do acervo fático-
                                                                probatório dos autos, procedimento inviável ante a natureza
                                                                excepcional da via eleita, a teor do disposto na
                                                                Súmula nº 7/STJ. 3. A ausência de prequestionamento e a
                                                                necessidade de reexame da matéria fática impedem a
                                                                admissão do recurso especial tanto pela alínea "a" quanto
                                                                pela alínea "c" do permissivo constitucional.
                                                                4. Agravo interno não provido.
                                                                (AgInt no AREsp n. 2.372.422/PR, relator Ministro Ricardo
                                                                Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 30/9/2024,
                                                                DJe de 3/10/2024.)

                                Dessa forma, estando o acórdão recorrido em consonância com o
          entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça e sendo inviável o reexame do
          contexto probatório delineado pela instância ordinária, incidem os óbices das Súmulas 7 e
          83 desta Corte, o que impede o conhecimento do recurso especial pela alínea “a” do
          permissivo constitucional.
                                Por fim, cumpre salientar que a incidência da Súmula 7/STJ prejudica o
          exame da divergência jurisprudencial, inviabilizando o conhecimento do recurso também
          sob o fundamento da alínea “c” do inciso III do art. 105 da Constituição Federal.
                                Ante o exposto, não conheço do recurso especial.
                                Deixo de majorar os honorários advocatícios por tratar-se, na origem, de
          recurso interposto contra decisão interlocutória, na qual não houve prévia fixação de
          honorários.
                                Publique-se. Intimem-se.

                               Brasília, 04 de novembro de 2025.




 
                                                            Ministro Humberto Martins
                                                                      Relator