STJ – RECURSO ESPECIAL Nº 2191917 - SP (2024/0474055-1)
sta Corte, atraindo a incidência da Súmula 568/STJ. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ESTELIONATO. ACORDOS FIRMADOS COM AS VÍTIMAS APÓS O OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. NÃO INTERFERÊNCIA NA PERSECUÇÃO PENAL. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Nos termos da norma prevista no artigo 25 do Código de Processo Penal, o ato de retratação da representação possui limite temporal específico e bem definido, qual seja, o oferecimento da denúncia. Firmado acordo entre as vítimas e os autores do delito após esse marco, tem- se que a representação concedida anteriormente pelos ofendidos já era irretratável na ocasião do trato. Precedentes. 2. O momento do recebimento da denúncia se dá, nos termos do artigo 396 do Código de Processo Penal, após o oferecimento da acusação e antes da apresentação de resposta à acusação, ou seja, seguindo-se o juízo de absolvição sumária, em que há apenas a confirmação do recebimento da exordial acusatória. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 847.466/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 16/10/2023, DJe de 19/10/2023.) Ante o exposto, com fundamento nos arts. 253, parágrafo único, I, e 255, § 4º, III, do RISTJ, não conheço do agravo em recurso especial e dou provimento ao recurso especial para cassar o acórdão recorrido e determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que, afastada a preliminar de decadência, prossiga no julgamento do mérito das apelações, como entender de direito. Publique-se. Brasília, 03 de novembro de 2025. Ministro Sebastião Reis Júnior Relator
Decisão completa:
RECURSO ESPECIAL Nº 2191917 - SP (2024/0474055-1)
RELATOR : MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR
RECORRENTE : ITAU UNIBANCO S.A - ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO
ADVOGADOS : RAFAEL DE SOUZA LIRA - SP294504
FLÁVIA LIMA DE OLIVEIRA - SP358719
JULIANA HADDAD DE SOUZA CAMPOS - SP322175
FRANCISCO MIZIARA LOPES DE SIQUEIRA - SP431541
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
RECORRIDO : VICTOR RUBENS SOUZA CORREA
RECORRIDO : ANDERSON CESAR POCAYA
ADVOGADO : ALEX SANTANA DOS SANTOS - SP404690
AGRAVANTE : ITAU UNIBANCO S.A - ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO
ADVOGADOS : RAFAEL DE SOUZA LIRA - SP294504
FLÁVIA LIMA DE OLIVEIRA - SP358719
JULIANA HADDAD DE SOUZA CAMPOS - SP322175
FRANCISCO MIZIARA LOPES DE SIQUEIRA - SP431541
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
AGRAVADO : VICTOR RUBENS SOUZA CORREA
AGRAVADO : ANDERSON CESAR POCAYA
ADVOGADO : ALEX SANTANA DOS SANTOS - SP404690
EMENTA
RECURSO ESPECIAL E AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL.
PROCESSUAL PENAL. ESTELIONATO. LEI N. 13.964/2019. AÇÃO PENAL
PÚBLICA CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO. AGRAVO INTERPOSTO
EM RAZÃO DA ADMISSIBILIDADE PARCIAL DO RECURSO ESPECIAL.
NÃO CABIMENTO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DAS SÚMULAS 292 E 528,
AMBAS DO STF. RETROATIVIDADE. BOLETIM DE OCORRÊNCIA.
MANIFESTAÇÃO INEQUÍVOCA DA VÍTIMA. SUFICIÊNCIA. RETRATAÇÃO
DA REPRESENTAÇÃO APÓS O OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. ART. 25
DO CPP. DECADÊNCIA NÃO CONFIGURADA.
Agravo em recurso especial não conhecido. Recurso especial provido nos
termos do dispositivo.
DECISÃO
Trata-se de recurso especial e de agravo em recurso especial interpostos por
ITAU UNIBANCO S.A, na qualidade de assistente de acusação, com fundamento no
art. 105, III, a, da Constituição Federal, contra o acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO na Apelação Criminal n. 1534104-
27.2019.8.26.0050 (fls. 638/645).
No recurso especial, a parte recorrente alegou, em síntese, violação dos arts.
171, § 5º, do Código Penal, e 25 do Código de Processo Penal. Sustenta que o Tribunal
de origem, ao declarar extinta a punibilidade dos réus pela decadência, desconsiderou a
existência de representação válida e a impossibilidade de retratação após o oferecimento
da denúncia (fls. 652/662).
Oferecidas contrarrazões (fls. 667/671 e 675/691), o recurso especial foi
parcialmente admitido na origem.
Em face da referida decisão, na parte que inadmitiu parcialmente o apelo
nobre, foi interposto agravo em recurso especial (fls. 701/705).
O Ministério Público Federal opinou pelo conhecimento e provimento do
recurso especial (fls. 762/765).
É o relatório.
De início, quanto ao agravo interposto, ressalto que não cabe este tipo de
recurso contra decisão que admite parcialmente recurso especial, uma vez que, em
razão da admissão parcial do reclamo, este subirá a esta Corte, ocasião em que se
procederá ao refazimento do juízo de admissibilidade da íntegra do recurso. Aplicam-se,
por analogia, as Súmulas 292 e 528/STF.
Quanto ao recurso especial, a insurgência comporta acolhimento.
Com efeito, ao que se observa, a controvérsia cinge-se a definir se, no caso
de crime de estelionato praticado antes da vigência da Lei n. 13.964/2019, a
manifestação da vítima em juízo, no sentido de não ter mais interesse na persecução
penal, tem o condão de levar à extinção da punibilidade pela decadência, mesmo após o
oferecimento da denúncia e a prévia lavratura de boletim de ocorrência.
Conforme se extrai dos autos, a vítima, poucos dias após ter sido alvo da
fraude, compareceu à autoridade policial para noticiar os fatos, o que deu ensejo à
lavratura do respectivo boletim de ocorrência (fls. 3/4).
A jurisprudência desta Corte Superior, em harmonia com o entendimento do
Supremo Tribunal Federal, é firme no sentido de que a representação, como condição de
procedibilidade, não exige formalismo. Basta que haja manifestação inequívoca da
vítima, ou de seu representante legal, no sentido de que o autor do crime seja
processado.
Nesse contexto, o registro do boletim de ocorrência é considerado ato mais
que suficiente para expressar tal vontade. Confira-se:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
ESTELIONATO. VIOLAÇÃO DO ART. 171, § 5º, DO CP. TESE DE EXTINÇÃO DA
PUNIBILIDADE ANTE A AUSÊNCIA DE REPRESENTAÇÃO FORMAL DA VÍTIMA.
MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA. IRRETROATIVIDADE. ENTENDIMENTO DA
TERCEIRA SEÇÃO. COMPARECIMENTO DA VÍTIMA E DEPOIMENTO EM SEDE
POLICIAL. DESNECESSIDADE DE REPRESENTAÇÃO FORMAL. PRECEDENTES
DESTA CORTE E DO STF.
1. A Terceira Seção firmou a orientação de que a exigência de representação
da vítima como pré-requisito para a ação penal por estelionato - introduzida pelo
Pacote Anticrime (Lei n. 13.964/2019) - não pode ser aplicada retroativamente para
beneficiar o réu nos processos que já estavam em curso.
2. Ainda que fosse possível acolher a tese defensiva (retroatividade), não falar
em ausência de condição de procedibilidade para a ação penal, pois a representação
já consta dos autos, extraída do comparecimento da vítima e do seu depoimento em
sede policial, circunstância apta a indicar a inequívoca manifestação de vontade de
ver apurado o fato delituoso, sendo desnecessária representação formal
(Precedentes do STJ e do STF).
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no AREsp n. 1.755.469/MS, de minha relatoria, Sexta Turma, julgado em
4/5/2021, DJe de 10/5/2021.)
Do mesmo modo é o entendimento da Corte Suprema:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO. CRIME DE
ESTELIONATO (ART. 171 DO CP). AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA A
PARTIR DA LEI 13.964/2019. MANIFESTAÇÃO INEQUÍVOCA DO OFENDIDO NO
SENTIDO DE VER INICIADA A PERSECUÇÃO PENAL. CONSTRANGIMENTO
ILEGAL NÃO EVIDENCIADO.
1 . [...] Ficou consignado, ainda, que “em cada caso concreto deverá o juízo
verificar se houve manifestação da vítima no sentido da persecução penal, que deve
ser entendida como representação”.
[...]
3. A jurisprudência desta SUPREMA CORTE consolidou-se no sentido de que
“A representação, nos crimes de ação penal pública condicionada, é ato que
dispensa maiores formalidades, bastando a inequívoca manifestação de vontade da
vítima, ou de quem tenha qualidade para representá-la, no sentido de ver apurados
os fatos acoimados de criminosos” (Inq 3438, Relator (a): ROSA WEBER, Primeira
Turma, DJe 10/2/2015).
4. Agravo Regimental provido.
(RHC n. 236.152/SC AgR, relator Ministro Cristiano Zanin, Primeira Turma, julgado
em 15/4/2024, DJe de 22/5/2024.)
Portanto, a lavratura do boletim de ocorrência pela vítima constituiu ato válido
de representação, cumprindo a condição de procedibilidade para a ação penal.
Ademais, o Tribunal de origem fundamentou a extinção da punibilidade na
manifestação da vítima em audiência, ocorrida em 10/5/2023, na qual afirmou não ter
interesse no prosseguimento do feito.
Contudo, tal retratação é juridicamente ineficaz, uma vez que o art. 25 do
Código de Processo Penal é taxativo ao dispor que a representação será irretratável,
depois de oferecida a denúncia.
Por oportuno, confiram-se os seguintes trechos (fls. 643/644):
[...]
Do boletim de ocorrência juntado aos autos não se extrai vontade inequívoca
da vítima em ver processados e punidos criminalmente os acusados. Confira-se:
[...]
No caso, além de não haver representação da vítima conforme requerido pelo
MP, em juízo, em contrário, há depoimento produzido sob o crivo do contraditório no
qual a vítima disse não ter interesse no prosseguimento da ação penal.
[...]
Assim, ultrapassado o prazo decadencial e diante da declaração da vítima em
juízo negando a representação, operou-se a perda do direito de punir do Estado.
[...]
Ao que se observa, a denúncia foi oferecida e recebida muito antes da referida
audiência, o que torna preclusa a possibilidade de retratação por parte da vítima.
Dessa forma, ao desconsiderar a validade do boletim de ocorrência como ato
de representação e ao acolher a retratação extemporânea da vítima, o acórdão recorrido
negou vigência ao art. 25 do Código de Processo Penal e divergiu da jurisprudência
consolidada desta Corte, atraindo a incidência da Súmula 568/STJ.
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO
CRIMINOSA. ESTELIONATO. ACORDOS FIRMADOS COM AS VÍTIMAS APÓS O
OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. NÃO INTERFERÊNCIA NA PERSECUÇÃO
PENAL. AGRAVO DESPROVIDO.
1. Nos termos da norma prevista no artigo 25 do Código de Processo Penal, o
ato de retratação da representação possui limite temporal específico e bem definido,
qual seja, o oferecimento da denúncia.
Firmado acordo entre as vítimas e os autores do delito após esse marco, tem-
se que a representação concedida anteriormente pelos ofendidos já era irretratável
na ocasião do trato. Precedentes.
2. O momento do recebimento da denúncia se dá, nos termos do artigo 396 do
Código de Processo Penal, após o oferecimento da acusação e antes da
apresentação de resposta à acusação, ou seja, seguindo-se o juízo de absolvição
sumária, em que há apenas a confirmação do recebimento da exordial acusatória.
Precedentes.
3. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC n. 847.466/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma,
julgado em 16/10/2023, DJe de 19/10/2023.)
Ante o exposto, com fundamento nos arts. 253, parágrafo único, I, e 255, § 4º,
III, do RISTJ, não conheço do agravo em recurso especial e dou provimento ao
recurso especial para cassar o acórdão recorrido e determinar o retorno dos autos ao
Tribunal de origem, a fim de que, afastada a preliminar de decadência, prossiga no
julgamento do mérito das apelações, como entender de direito.
Publique-se.
Brasília, 03 de novembro de 2025.
Ministro Sebastião Reis Júnior
Relator