STJ – RECURSO ESPECIAL Nº 2189006 - SC (2024/0480016-7)
indenização dos danos causados pela infração penal requer pedido expresso na denúncia, indicação do valor pretendido e prova suficiente a sustentá-lo, possibilitando ao réu o direito de defesa". Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 387, IV; CPP, art. 619; e CPP, art. 647-A. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp 1.870.916/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 03.05.2022; STJ, AgRg no REsp 2.171.417/MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 17.12.2024. (AgRg no AREsp n. 2.755.902/SC, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 5/8/2025, DJEN de 14/8/2025, grifei.) Desse modo, para a condenação à reparação do dano material, devem ser observados os seguintes requisitos: a formulação de pedido expresso na peça acusatória e a indicação, pelo autor da ação penal, do valor pretendido a título de reparação do dano, seja ele moral ou material, possibilitando o exercício do contraditório. No caso em apreço, conforme ressaltado pelo Ministério Público Federal em sua manifestação, "embora conste da denúncia pedido indenizatório, não houve indicação expressa do valor mínimo a ser fixado a título de reparação do dano moral com fundamento no art. 387, IV, do CPP, circunstância que impede a manutenção da indenização na esfera penal". Ante o exposto, na forma do art. 34, XVIII, b, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, dou provimento ao recurso especial. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 31 de outubro de 2025. MINISTRO OG FERNANDES Relator
Decisão completa:
RECURSO ESPECIAL Nº 2189006 - SC (2024/0480016-7)
RELATOR : MINISTRO OG FERNANDES
RECORRENTE : TB
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA
CATARINA
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
DECISÃO
Trata-se de recurso especial interposto por T. B. contra acórdão assim
ementado (fls. 435-436):
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO.
ROUBOS CIRCUNSTANCIADOS (CP, ART. 157, CAPUT E § 2º,
VII). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO RÉU.
MÉRITO. ABSOLVIÇÃO. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE E
AUTORIA DEMONSTRADAS. DEPOIMENTOS DAS VÍTIMAS E
DE POLICIAIS. CONFISSÃO PARCIAL DO RÉU. MANUTENÇÃO
DA CONDENAÇÃO.
A confissão parcial do réu e os depoimentos prestados, em ambas
as fases processuais, pelas vítimas e pelos policiais, aliados às
demais provas constantes nos autos, constituem elementos
suficientes para a prolação do decreto condenatório.
DOSIMETRIA. PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME.
EXCLUSÃO. NÃO ACOLHIMENTO. ROUBO PRATICADO
DURANTE O REPOUSO NOTURNO. SITUAÇÃO QUE
DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA. AUMENTO MANTIDO.
Inegável que o roubo praticado durante a madrugada dificulta a
defesa da vítima, o que autoriza a fixação da pena-base acima do
mínimo legal pelas circunstâncias do delito.
SEGUNDA FASE. COMPENSAÇÃO INTEGRAL ENTRE
AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA E A ATENUANTE DA
CONFISSÃO ESPONTÂNEA. NÃO CABIMENTO.
MULTIRREINCIDÊNCIA, INCLUSIVE ESPECÍFICA.
COMPENSAÇÃO PARCIAL MANTIDA.
Embora possível a compensação entre a agravante da
reincidência e a atenuante da confissão espontânea, as
circunstâncias do caso concreto demonstram que a reincidência
deve prevalecer, porquanto o acusado registra múltiplas
condenações anteriores, inclusive pela prática de crime idêntico
(reincidência específica).
MINORAÇÃO DA FRAÇÃO APLICADA PELA
MULTIRREINCIDÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. UTILIZAÇÃO DO
CRITÉRIO PROGRESSIVO. MANUTENÇÃO.
"Esta Corte de Justiça vem aplicando um critério progressivo para
aplicação da fração de aumento quando presentes mais de uma
condenação transitada em julgado, aplicando-se 1/6 (um sexto)
para uma condenação; 1/5 (um quinto) para duas; 1/4 (um quarto)
para três; 1/3 (um terço) para quatro e 1/2 (um meio) para cinco ou
mais condenações (TJSC, AC n. 0000103-07.2017.8.24.0086,
rela. Desa. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt, Schaefer, j. em
23.11.2017).
QUESTÃO CONHECIDA DE OFÍCIO. FORMA DE
COMPENSAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO
ESPONTÂNEA COM A AGRAVANTE DA
MULTIRREICINDÊNCIA. EXCLUSÃO DE UMA DAS
CONDENAÇÕES. INVIABILIDADE. FORMA DE COMPENSAÇÃO
QUE PODE OCASIONAR INJUSTIÇAS E SER CONTRÁRIA À
LEI. READEQUAÇÃO DA PENA.
A forma de compensação aplicada na sentença, de desconsiderar,
em razão da confissão espontânea, uma das condenações que
caracterizam a reincidência para, posteriormente, definir a fração
de aumento da agravante com base no critério progressivo, pode
desobedecer o disposto no art. 65 do Código Penal, pois as
confissões espontâneas "sempre atenuam a pena".
Isso porque naqueles casos em que haja mais de 5 condenações,
a confissão em nada alterará a pena, haja vista que, acima dessa
quantidade de anteriores condenações, agrava-se a reprimenda
em 1/2.
E, por segurança jurídica, não há como manter a forma de
compensação realizada na sentença - de exclusão de uma das
condenações que caracterizam a multirreincidência - e, naquelas
hipóteses em que há mais de 5 condenações, aplicar
posicionamento diferente. Portanto, deve-se corrigir, de ofício, a
forma de cálculo da compensação da atenuante com a agravante,
devendo-se primeiro aplicar o aumento sobre a pena-base relativo
às agravantes para depois reduzir a sanção pelas atenuantes.
CONTINUIDADE DELITIVA. INSUBSISTÊNCIA. HABITUALIDADE
NA PRÁTICA DE CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO.
SENTENÇA MANTIDA NO PONTO.
A prática habitual de crimes pelo agente, demonstrando ser esse o
seu meio de vida, é motivo suficiente para descaracterizar o crime
continuado, implicando no reconhecimento do concurso material
de crimes.
REPARAÇÃO DE DANOS FIXADA COM FUNDAMENTO NO
ART. 387, IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PEDIDO
EXPRESSO NA DENÚNCIA. VALOR DEVIDAMENTE
FUNDAMENTADO. EXERCÍCIO DA AMPLA DEFESA E DO
CONTRADITÓRIO ASSEGURADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA.
"À exceção da reparação dos danos morais decorrentes de crimes
relativos à violência doméstica (Tema Repetitivo 983/STJ), a
fixação de valor mínimo indenizatório na sentença - seja por danos
materiais, seja por danos morais - '[...] exige o atendimento a três
requisitos cumulativos: (I) o pedido expresso na inicial; (II) a
indicação do montante pretendido; e (III) a realização de instrução
específica a fim de viabilizar ao réu o exercício da ampla defesa e
do contraditório' (REsp 1986672/SC, Rel. Ministro RIBEIRO
DANTAS, Terceira Seção, julgado em 08/11/2023, DJe
21/11/2023) ." (STJ, AgRg no REsp n. 2.008.575/RS, relator
Ministro Teodoro Silva Santos, Sexta Turma, julgado em 4/3/2024,
DJe de 7/3/2024).
Havendo pedido expresso na denúncia e sendo possível
vislumbrar, quando do seu oferecimento, os danos supostamente
causados, não há falar em afastamento do valor reparatório
previsto no art. 387, IV, do Código de Processo Penal.
GRATUIDADE DA JUSTIÇA. POSSIBILIDADE. RECORRENTE
ASSISTIDO PELA DEFENSORIA PÚBLICA ESTADUAL.
ALEGADA HIPOSSUFICIÊNCIA PRESUMIDA. CONCESSÃO DA
BENESSE.
Considerando que o réu é assistido pela Defensoria Pública e há
nos autos evidências que indicam a sua incapacidade financeira,
não se pode afastar a alegada hipossuficiência, razão pela qual a
Gratuidade da Justiça deve ser concedida. RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO. PENA REDUZIDA DE OFÍCIO.
Nas razões do recurso, a defesa questiona a condenação pela
reparação do dano, alegando que viola o contraditório, a ampla defesa e o
sistema acusatório, com exigência de pedido certo nos termos do art. 292, V, do
Código de Processo Civil.
Aduz a ausência de instrução específica e de debate processual sobre o
dano e seu montante (quantum debeatur), configurando decisão-surpresa vedada
pelo art. 10 do Código de Processo Civil e afrontando o contraditório e a ampla
defesa.
Requer o provimento do recurso, para afastar a condenação à
reparação dos danos por violação do art. 387, IV, do Código de Processo Penal.
Contrarrazões às fls. 464-467.
Parecer do Ministério Público Federal opinando pelo provimento do
recurso, nos termos da seguinte ementa (fl. 528):
RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL.
ROUBOS MAJORADOS. INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE
REPARAÇÃO MÍNIMA PELOS DANOS MORAIS CAUSADOS ÀS
VÍTIMAS (ART. 387, IV, DO CPP). NECESSIDADE DE PEDIDO
EXPRESSO NA DENÚNCIA COM INDICAÇÃO DO MONTANTE
INDENIZATÓRIO PRETENDIDO. OPORTUNIDADE PARA A
AMPLA DEFESA E O CONTRADITÓRIO. PRECEDENTES.
PARECER PELO CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO
RECURSO ESPECIAL PARA EXCLUIR A CONDENAÇÃO POR
DANOS MORAIS.
É o relatório.
No caso dos autos, a denúncia foi assim formulada (fls. 3-5):
FATO 1
No dia 17 de outubro de 2022, por volta das 6h26min, na Rua dos
Ferroviários, s./n., Bairro Oficinas, nesta Cidade e Comarca de
Tubarão, o denunciado T B, mediante grave ameaça contra a
vítima Severino Mendes da Silva, exercida com emprego de arma
branca, subtraiu para si coisas alheias móveis1.
Na ocasião, o denunciado solicitou uma corrida para o taxista
Severino Mendes da Silva e, ao chegarem no destino, mediante
grave ameaça exercida por meio da ostentação de uma faca,
subtraiu aproximadamente R$ 110,00 (cento e dez reais) em
dinheiro e 1 (um) relógio, 1 (um) telefone celular e a chave do
automóvel, objetos avaliados em R$ 1.590,00 (mil e quinhentos e
noventa reais), tudo de propriedade do ofendido, deixando o local
na posse mansa e pacífica dos bens.
FATO 2
No dia 18 de outubro de 2022, por volta das 00h05min, na Rua
Vidal Ramos, s./n., Centro, nesta Cidade e Comarca de Tubarão, o
denunciado T B, mediante grave ameaça contra a vítima Carlos
Alberto Machado, exercida com emprego de arma branca, subtraiu
para si coisas alheias móveis2.
Na ocasião, o denunciado solicitou uma corrida para o taxista
Carlos Alberto Machado e, ao chegarem no destino indicado,
colocou uma faca no pescoço da vítima e subtraiu
aproximadamente R$ 140,00 (cento e quarenta reais) em dinheiro
e 2 (dois) telefones celulares, estes avaliados no total de R$
3.000,00 (três mil reais), deixando o local na posse mansa e
pacífica dos bens.
CAPITULAÇÃO E REQUERIMENTOS
Assim agindo, o denunciado T B incorreu no preceito primário da
norma penal incriminadora descrita no artigo 157, § 2º, inciso VII,
do Código Penal, por duas vezes, razão pela qual o Ministério
Público oferece a presente denúncia, a qual requer seja recebida,
determinando-se a citação do denunciado para apresentar
resposta à acusação, prosseguindo-se, no restante do
processamento, nos termos do artigo 396 e seguintes do Código
de Processo Penal, com designação de audiência para inquirição
das pessoas adiante arroladas e interrogatório, até final
julgamento e condenação.
Pleiteia-se, ainda, a fixação de valor mínimo para reparação dos
danos causados pelas infrações, nos termos do artigo 387, inciso
IV, do Código de Processo Penal.
O acórdão teve a seguinte fundamentação (fl. 433):
Ora, as avaliações indiretas realizadas durante a fase extrajudicial,
apontaram que as vítimas S. M. d. S. e C. A. M. sofreram
prejuízos, respectivamente, de R$ 1.590,00 e de R$ 3.000,00
(evento 1, INQ1 - págs. 16 e 24).
Junto disso, o Ministério Público, tanto na denúncia (evento 1,
DENUNCIA1), quanto nas alegações finais (evento 138,
PROMOÇÃO1), efetuou pedido expresso de reparação de danos
para as vítimas, inclusive apontando a quantia que entendia
devida para cada uma delas, não havendo prejuízo da ampla
defesa ou do contraditório.
A respeito do tema, firmou-se a orientação de que, para a condenação
pela reparação do dano material, é necessário que haja pedido expresso do
Ministério Público, bem como que seja indicado o valor pretendido, a fim de que
se possibilite o exercício do contraditório e da ampla defesa.
A propósito:
DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL.
INTEMPESTIVIDADE DE RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS
DE DECLARAÇÃO NÃO CONHECIDOS. AGRAVO PROVIDO.
ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
I. Caso em exame
1. Agravo regimental interposto pelo Ministério Público Federal
contra decisão que deu parcial provimento ao recurso especial
para afastar a condenação a título de dano material, em razão da
ausência de especificação de valor referente ao pedido de danos
materiais contido na denúncia.
2. A parte agravante alega que os embargos de declaração
opostos em face do acórdão na origem não foram conhecidos,
razão pela qual não interromperam o prazo recursal, devendo ser
reconhecida a intempestividade do recurso especial.
II. Questão em discussão
3. A questão em discussão consiste em saber se a interposição de
embargos de declaração não conhecidos interrompe o prazo para
a interposição de recurso especial.
III. Razões de decidir
4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estabelece que
embargos de declaração não conhecidos, por serem intempestivos
ou manifestamente incabíveis, não interrompem o prazo para a
interposição de recurso especial.
5. No caso concreto, os embargos de declaração não foram
conhecidos diante da inovação recursal, não interrompendo o
prazo recursal, o que torna o recurso especial intempestivo.
Destarte, a decisão monocrática que conheceu e deu provimento
ao recurso especial deve ser reformada, não conhecendo do
recurso especial.
6. Entretanto, concede-se ordem de ofício para afastar da
condenação a fixação de indenização mínima a título de dano
material, ante a falta de especificação do valor na denúncia.
IV. Dispositivo e tese
7. Agravo provido para não conhecer do recurso especial, mas
conceder ordem de ofício.
Tese de julgamento: "1. Embargos de declaração não conhecidos,
por intempestividade ou manifesta incabibilidade, não interrompem
o prazo para a interposição de recurso especial. 2. A fixação de
valor mínimo para indenização dos danos causados pela
infração penal requer pedido expresso na denúncia, indicação
do valor pretendido e prova suficiente a sustentá-lo,
possibilitando ao réu o direito de defesa".
Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 387, IV; CPP, art. 619;
e CPP, art. 647-A. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no
AREsp 1.870.916/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta
Turma, julgado em 03.05.2022; STJ, AgRg no REsp 2.171.417/MG,
Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 17.12.2024.
(AgRg no AREsp n. 2.755.902/SC, relator Ministro Joel Ilan
Paciornik, Quinta Turma, julgado em 5/8/2025, DJEN de 14/8/2025,
grifei.)
Desse modo, para a condenação à reparação do dano material, devem
ser observados os seguintes requisitos: a formulação de pedido expresso na peça
acusatória e a indicação, pelo autor da ação penal, do valor pretendido a título de
reparação do dano, seja ele moral ou material, possibilitando o exercício do
contraditório.
No caso em apreço, conforme ressaltado pelo Ministério Público Federal
em sua manifestação, "embora conste da denúncia pedido indenizatório, não
houve indicação expressa do valor mínimo a ser fixado a título de reparação do
dano moral com fundamento no art. 387, IV, do CPP, circunstância que impede a
manutenção da indenização na esfera penal".
Ante o exposto, na forma do art. 34, XVIII, b, do Regimento Interno do
Superior Tribunal de Justiça, dou provimento ao recurso especial.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 31 de outubro de 2025.
MINISTRO OG FERNANDES
Relator