AGRAVO DE INSTRUMENTO – Documento:7024151 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 0308474-53.2019.8.24.0008/SC RELATOR: Juiz MARCELO CARLIN RELATÓRIO Trato de apelação cível interposta por Quinta da Neve Incorporação de Empreendimentos Imobiliários Ltda em face da sentença proferida nos autos n.º 0308474-53.2019.8.24.0008. Por brevidade, transcrevo, em relação à tramitação em primeira instância, o relatório da sentença (evento 77): A. R. C. D. S. E G. P. D. S., por advogado, ingressaram em juízo com AÇÃO INDENIZATÓIA POR DANOS MATERIAIS em relação a QUINTA DA NEVE INCORPORADORA DE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA E ABRAMAR INCORPORADORA LTDA.
(TJSC; Processo nº 0308474-53.2019.8.24.0008; Recurso: AGRAVO DE INSTRUMENTO; Relator: Juiz MARCELO CARLIN; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 13 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:7024151 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 0308474-53.2019.8.24.0008/SC
RELATOR: Juiz MARCELO CARLIN
RELATÓRIO
Trato de apelação cível interposta por Quinta da Neve Incorporação de Empreendimentos Imobiliários Ltda em face da sentença proferida nos autos n.º 0308474-53.2019.8.24.0008.
Por brevidade, transcrevo, em relação à tramitação em primeira instância, o relatório da sentença (evento 77):
A. R. C. D. S. E G. P. D. S., por advogado, ingressaram em juízo com AÇÃO INDENIZATÓIA POR DANOS MATERIAIS em relação a QUINTA DA NEVE INCORPORADORA DE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA E ABRAMAR INCORPORADORA LTDA.
Dizem que 17/04/2013 adquiriram das requeridas através de contrato de promessa de compra e venda, apartamento de número 77 do bloco C do Blumengatens Condomínio Residencial com prazo final de entrega para 31.12.2014 pelo valor de R$ 140.000,00.
O apartamento foi entregue em 20/07/2017, portanto com 27 meses de atraso, tempo em que tiveram que pagar aluguel quando poderiam estar morando no apartamento comprado.
Informam que na Justiça federal buscaram indenização por danos morais, ressarcimento pelos’ juros da obra”, e alugueis de 06/02/2016 até 20/07/2017, com êxito parcial.
Buscam com esta ação ressarcimento dos valores referentes alugueres de 01/01/2015 até 05/02/2016 e multa contratual por equidade.
Tece considerações sobre a legitimada das requeridas e aplicabilidade do código de defesa do consumidor, da responsabilidade solidária das requeridas, da nulidade da cláusula 12ª que prorroga dilação do prazo de entrega em 180 dias sem justificativa.
Pedem justiça gratuita, aplicação do CDC, solidariedade das requeridas, nulidade de cláusula, pagamento de indenização por danos materiais, multa por inadimplemento contratual e efeitos da sucumbência.
Deram valor à causa R$ 37.000,00.
Juntaram documentos.
Deferida justiça gratuita e aplicação do CDC com inversão do ônus da prova.
Contestação no evento 21.
Impugnam a justiça gratuita deferida aos autores, alegando ser ele, além de empregado, empresário.
Alegam ilegitimidade passiva da requerida ABRAMAR que nunca participou da relação negocial, pleiteando exclusão do polo passivo.
Impugnam o pedido de inversão do ônus da prova.
Sustentam que não cabe a nulidade de cláusula aceita pelas partes na contratação que permite a dilação do prazo de entrega.
Argumentam que de qualquer forma o prazo conta-se não da assinatura do instrumento, mas sim da obtenção do financiamento imobiliário com a agente financeira, prorrogação de que se utilizou a requerida, não havendo atraso.
Alegou ainda que crise financeira justifica o atraso.
Salienta não caber lucros cessantes porque o imóvel estaria dentro do programa Minha Casa Minha vida e os requerentes não poderia alugar ou usar como investimento, não havendo base para lucros cessantes.
Quanto à multa, salientam não haver previsão contratual.
De outro lado, não teria havido atraso e, ainda, não caberia o acumulo de lucros cessantes e multa por dupla penalização.
Pedem revogação da justiça gratuita com a penalidade pertinente, acolhimento das preliminares, improcedência da ação.
Juntaram documentos.
Vieram outras manifestações e documentos, com pedido de suspensão do andamento do feito por parte da requerida Quinta, por conta de deferimento de Recuperação Judicial e de justiça gratuita, o que foi refutado pelos requerentes.
É o relatório em síntese. Analiso e decido.
Conclusos os autos, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
Isto posto, este juízo:
JULGA extinto o processo em relação à requerida ABRAMAR INCORPORADORA LTDA sem resolução do mérito, com base no art. 485 VI do CPC, por ilegitimidade passiva, excluindo-a do polo passivo;
Também, JULGA PARCIALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO em relação a QUINTA DA NEVE INCORPORADORA DE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA. com base no art. 487 I do CPC para:
1 – Condenar a requerida ao ressarcimento dos valores pleiteados pelos autores a título de lucros cessantes referentes ao meses de 01/01/2015 até 05/02/2016 pelo atraso na entrega do imóvel – R$ 6.500,00, com correção monetária na forma usual forense desde o desembolso e juros de 1% ao mês a partir da citação;
2 – Condenar a requerida ao pagamento de 17,5% das custas e despesas processuais e honorários de advogado ao procurador da parte autora, no valor correspondente a 12% do valor da condenação contida no item 1;
3 – Condenar os requerentes ao pagamento de 82,5% das custas e despesas processuais e honorários aos advogados da requerida Abramar no valor correspondente a 10% do valor da causa corrigido e aos procuradores da Quinta da Neve no valor correspondente a 12% do valor pleiteado a título de multa contratual.
Os honorários não se compensam.
A sucumbência dos requerentes ficam sob condição suspensiva de exigibilidade em razão da justiça gratuita deferida – art. 98 par 3º do CPC.
Oportunamente arquive-se.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Irresignada, a ré Quinta da Neve Incorporação de Empreendimentos Imobiliários Ltda apelou (evento 75), pugnado, primeiramente, pela revogação do benefício da justiça gratuita em relação aos apelados. E, no mérito, requereu a reforma da sentença, sob a argumentação de que (i) não houve atraso na entrega do imóvel; e (ii) o caso não comporta a condenação ao pagamento de alugueres.
Contrarrazões apresentadas pela parte autora (evento 81).
Após, ascenderam os autos a esta Instância.
VOTO
1 Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
2 Nas razões recursais, a parte ré pugna, primeiramente, pela revogação do benefício da justiça gratuita em relação aos apelados.
O magistrado, ao prolatar a sentença, deliberou de forma expressa que: "Ao início do processo, ambos eram assalariados [no entanto]. No decorrer, ambos foram demitidos, com pedidos comprovados de seguro desemprego [e que são] Proprietários de um veículo popular antigo, moradores em habitação popular" (evento 63, colchetes acrescentados).
O magistrado também consignou expressamente que: "O fato de ser micro empresário e fazer doces não demonstra grande capacidade financeira".
Verifica-se, portanto, que o togado singular agiu com acerto, haja vista ter decidido em conformidade com o entendimento deste Tribunal, que reconhece ser devida a concessão da gratuidade da justiça quando a parte comprova dispor de renda modesta, aliada à ausência de indícios de riqueza:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DECISÃO QUE INDEFERIU A JUSTIÇA GRATUITA À AUTORA. RECURSO DESTA, ALEGANDO NÃO POSSUIR CONDIÇÕES FINANCEIRAS QUE POSSIBILITEM O CUSTEIO DAS DESPESAS PROCESSUAIS. ACOLHIMENTO. REQUERENTE QUE VIVE COM RENDA MÓDICA OBTIDA DE SEGURO-DESEMPREGO. ELEMENTOS DE RIQUEZA NÃO IDENTIFICADOS. NECESSIDADE DE DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO. REFORMA DA DECISÃO RECORRIDA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, AI 5006632-79.2021.8.24.0000, 4ª Câmara de Direito Civil, Relator para Acórdão HELIO DAVID VIEIRA FIGUEIRA DOS SANTOS, julgado em 12/08/2021).
Desse modo, mantém-se o benefício da gratuidade da justiça, razão pela qual o recurso não comporta provimento no ponto.
3 A recorrente sustenta que não houve atraso na entrega do imóvel, pois o prazo teria sido prorrogado em razão da extensão do contrato de financiamento junto à Caixa Econômica Federal.
Todavia, como bem consignou o magistrado de origem, o contrato celebrado entre as partes (evento 1, INF7) fixou data certa para o término da obra – 31/12/2014 – sem qualquer previsão de prorrogação por demora na obtenção de financiamento.
A tese da recorrente, portanto, não merece acolhida. O pacto firmado com a instituição financeira não alterou o contrato de compra e venda originário nem configura novação, prevalecendo o prazo originalmente ajustado entre as partes.
Nesse sentido, em ocasião similar, já decidiu este Tribunal no mesmo sentido, ressaltando a prevalência do conteúdo do pacto original e reconhecendo que o contrato firmado com a Caixa Econômica Federal não caracteriza novação:
AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. ATRASO INJUSTIFICADO NA ENTREGA DE OBRA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO RECURSAL DA CONSTRUTORA RÉ. AVENTADA AUSÊNCIA DE MORA. NÃO ACOLHIMENTO. PRORROGAÇÃO DO PRAZO QUE NÃO É ABUSIVA. TODAVIA NÃO COMPROVADA A OCORRÊNCIA DE CASO FORTUITO OU DE FORÇA MAIOR. ALEGAÇÃO DE QUE O PRAZO DE ENTREGA DO EMPREENDIMENTO É AQUELE ESTIPULADO NO CONTRATO FIRMADO COM O AGENTE FINANCEIRO, E NÃO O PREVISTO NO AJUSTE ANTERIOR, ENTABULADO ENTRE OS ORA LITIGANTES. INSUBSISTÊNCIA. PACTO FIRMADO COM A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL QUE SE CINGIU À CONCESSÃO DO MÚTUO IMOBILIÁRIO, SEM IMPLICAR EM NOVAÇÃO DO PRETÉRITO PACTO DE COMPRA E VENDA. PREVALÊNCIA DESTE. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL CONFIGURADO. MORA QUE PERDUROU ATÉ A ASSINATURA DE TERMO DE RECEBIMENTO DE CHAVES. PAGAMENTO DE MULTA AJUSTADA ENTRE AS PARTES. CLÁUSULA PENAL CORRETAMENTE APLICADA DIANTE DA MORA DA PROMITENTE VENDEDORA. ADEMAIS, RESSARCIMENTO PELOS PREJUÍZOS SOFRIDOS PELO AUTOR AO TER QUE ARCAR COM JUROS DE OBRA AO AGENTE FINANCEIRO DURANTE O PERÍODO DE ATRASO. IMPORTE QUE NÃO AMORTIZOU O DÉBITO. DEVER DE RESTITUIÇÃO EVIDENCIADO. SENTENÇA MANTIDA IN TOTUM. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. APELO DA RÉ DESPROVIDO. (TJSC, ApCiv 0006908-57.2016.8.24.0038, 3ª Câmara de Direito Civil, Relator para Acórdão Saul Steil, D.E. 21/11/2024, destaques acrescentados).
Logo, configurado o atraso, impõe-se a manutenção da condenação ao ressarcimento pelos lucros cessantes.
4 No mais, a apelante defende, ainda, que o caso não comporta a condenação ao pagamento de alugueis, sob o argumento de que não houve prejuízo comprovado.
A tese, contudo, também não prospera.
O entendimento consolidado no Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 0308474-53.2019.8.24.0008/SC
RELATOR: Juiz MARCELO CARLIN
EMENTA
DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL EM INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. PREVISÃO CONTRATUAL DE PRAZO CERTO. AUSÊNCIA DE CAUSA JUSTIFICADORA. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES. DESPROVIMENTO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente ação de indenização por danos materiais proposta pelos adquirentes de unidade habitacional.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há três questões em discussão: (i) saber se deve ser revogada a gratuidade de justiça deferida aos autores; (ii) saber se houve atraso na entrega do imóvel, diante de suposta prorrogação do prazo decorrente de financiamento com a Caixa Econômica Federal; e (iii) saber se é devida a indenização por lucros cessantes em razão do atraso na entrega.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. O benefício da gratuidade de justiça deve ser mantido, uma vez que não houve comprovação efetiva de alteração na situação financeira que justifique a revogação do benefício anteriormente concedido.
4. O contrato de promessa de compra e venda fixou prazo certo para a entrega do imóvel, sem previsão de prorrogação por demora em obtenção de financiamento, de modo que não há prova de causa excludente de responsabilidade da incorporadora.
5. O atraso injustificado configura inadimplemento contratual e enseja o dever de indenizar, sendo presumido o prejuízo do comprador pela privação do uso do bem, conforme o Tema n. 966 do STJ.
6. Diante do desprovimento do recurso, majoram-se os honorários em 5% (cinco por cento) sobre o valor devido pela recorrente a título de verba patronal advocatícia, nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
IV. DISPOSITIVO E TESE
7. Recurso conhecido e desprovido.
Tese de julgamento: 1. A prorrogação do prazo de financiamento não elide a mora da incorporadora, quando desacompanhada de fundamento contratual para tanto. 2. O atraso injustificado na entrega de imóvel enseja indenização por lucros cessantes presumidos, na forma de aluguéis mensais.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXV; CC, arts. 389 e 927; e CPC, art. 85, § 11.
Jurisprudência relevante citada: STJ, Tema 966; TJSC, Agravo de Instrumento n. 5006632-79.2021.8.24.0000, rel. Des. Hélio David Vieira Figueira dos Santos, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 12-08-2021; TJSC, Apelação Cível n. 0006908-57.2016.8.24.0038, rel. Des. Saul Steil, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 19-11-2024.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por MARCELO CARLIN, Juiz de Direito Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7024152v5 e do código CRC 30bd2582.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARCELO CARLIN
Data e Hora: 14/11/2025, às 16:57:40
0308474-53.2019.8.24.0008 7024152 .V5
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 09:13:20.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 13/11/2025 A 19/11/2025
Apelação Nº 0308474-53.2019.8.24.0008/SC
RELATOR: Juiz MARCELO CARLIN
PRESIDENTE: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
PROCURADOR(A): NEWTON HENRIQUE TRENNEPOHL
Certifico que este processo foi incluído como item 69 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 13/11/2025 às 00:00 e encerrada em 13/11/2025 às 19:29.
Certifico que a 2ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 2ª CÂMARA ESPECIAL DE ENFRENTAMENTO DE ACERVOS DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz MARCELO CARLIN
Votante: Juiz MARCELO CARLIN
Votante: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
Votante: Desembargador Substituto DAVIDSON JAHN MELLO
MARCIA CRISTINA ULSENHEIMER
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 09:13:20.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas