AGRAVO DE INSTRUMENTO – Documento:6930367 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5059858-79.2021.8.24.0038/SC RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA RELATÓRIO De pronto, tenho por bem adotar o relatório da sentença, pois além de refletir fielmente a narrativa fática em apreço, garante celeridade ao trâmite processual (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), in verbis: Cuido de ação ajuizada por MC TRADE IMPORTADORA E EXPORTADORA EIRELI em desfavor de ELO SOLUCOES LOGISTICAS INTEGRADAS EIRELI, ambas devidamente qualificadas. Relata a parte autora, em suma, que: a) é empresa que atua com importação de cargas a pedido de clientes;
(TJSC; Processo nº 5059858-79.2021.8.24.0038; Recurso: AGRAVO DE INSTRUMENTO; Relator: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 13 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6930367 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5059858-79.2021.8.24.0038/SC
RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
RELATÓRIO
De pronto, tenho por bem adotar o relatório da sentença, pois além de refletir fielmente a narrativa fática em apreço, garante celeridade ao trâmite processual (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), in verbis:
Cuido de ação ajuizada por MC TRADE IMPORTADORA E EXPORTADORA EIRELI em desfavor de ELO SOLUCOES LOGISTICAS INTEGRADAS EIRELI, ambas devidamente qualificadas.
Relata a parte autora, em suma, que:
a) é empresa que atua com importação de cargas a pedido de clientes;
b) prestou serviços para a empresa RJ Pescados, cujas mercadorias importadas restaram endossadas para esta última em 02.09.2021;
c) em 03.09.2021, por meio de consulta ao sistema de notas do município, constatou existirem notas fiscais emitidas em seu nome pela empresa requerida, em razão do depósito das cargas importadas em benefício da empresa RJ Pescados;
d) entrou em contato com funcionários da empresa RJ Pescados, solicitando o pagamento dos serviços para evitar que os títulos fossem levados a protesto, uma vez que só foi contratada para prestar serviços de importação, mas foi informado que a empresa passava por dificuldades financeiras que impediam o pagamento;
e) não pediu o cancelamento das notas fiscais porque foram emitidas em julho de 2021 e em setembro do mesmo ano não era mais possível fazê-lo;
f) a empresa requerida e RJ Pescados realizaram tratativas por e-mail visando a resolução extrajudicial do débito, sem sucesso;
g) notificou extrajudicialmente a parte requerida e recebeu contranotificação afirmando que os débitos seriam levados a protesto;
h) teve seu nome inscrito em cadastro de devedores, o que lhe gerou abalo moral.
Nesses termos, postulou, inclusive em sede de tutela de urgência, o cancelamento da inscrição do nome da autora nos cadastros de inadimplentes relacionada ao débito discutido nos autos, sob pena de multa diária. No mérito, requereu a confirmação da tutela, com a procedência do pleito para declarar a inexistência da dívida, além da condenação da ré ao pagamento de compensação por danos morais, além das demais cominações de praxe. Juntou documentos.
A tutela postulada foi deferida no Evento 8.
Citada (Evento 39, CERT2) a ré ELO SOLUCOES LOGISTICAS INTEGRADAS EIRELI apresentou contestação cumulada com reconvenção, onde alegou, preliminarmente, pela incompetência territorial e impugnação do valor da causa.
No mérito propriamente dito, refutou integralmente a pretensão deduzida na exordial, sob o argumento de que a autora figura como consignatária dos conhecimentos de embarque acostados na exordial, de modo a ser seu o dever de efetuar o pagamento das despesas de armazenagem contratados, independente de atuar por conta e ordem de terceiro.
Em sede de reconvenção, asseverou não haver contrato formal entre a autora e a ré acerca do armazenamento dos contêineres TRIU8090370, CXRU1184870 e TTNU8404645, mas na proposta comercial encaminhada à autora por meio da empresa PS COMEX consta expressamente dispositivo que considera aceite comercial a entrada das mercadorias no terminal indicado pela ré (Evento 40, DOCUMENTACAO10), o que de fato ocorreu no caso dos autos e é prática usual aduaneira.
Nesses termos, requereu o acolhimento das preliminares, a improcedência da ação principal e a procedência da reconvenção, com a condenação da autora ao pagamento do débito representado pelas notas fiscais n. 8333, 8334 e 8731, devidamente corrigido, além das condenações de costume. Juntou documentos.
Houve réplica e resposta à reconvenção (Evento 45), onde a autora/reconvinda afirma que a empresa PS COMEX foi contratada pela real adquirente RJ Pescados, e não pela autora, de modo a não ser responsável pelo suposto aceite no armazenamento realizado por terceiro.
Houve ainda manifestação da ré acerca da resposta à reconvenção (Evento 50).
Intimadas as partes acerca das provas que ainda desejam produzir (Evento 53), a ré postulou a oitiva de uma testemunha (Evento 58); a autora, por sua vez, deixou o prazo transcorrer em branco (Evento 59).
No Evento 61 a 8ª Vara Cível da Comarca de Joinville acolheu a preliminar de incompetência territorial e remeteu os autos à Comarca de Itajaí/SC.
Já no Evento 73 o presente feito foi saneado, momento em que restou determinada a retificação do valor da causa para R$ 225.668,00, delimitadas as questões de fato relevantes para o julgamento da causa e designada audiência de instrução e julgamento, para oitiva da testemunha arrolada pela ré.
Na audiência aprazada (Evento 82), foi ouvida referida testemunha e concedido prazo para apresentação de alegações finais, apresentadas pelas partes nos Eventos 89 (ré) e 91 (autora).
Intimada (Evento 93), a autora procedeu o recolhimento das custas iniciais complementares (Eventos 100 e 101).
Após, sobreveio a parte dispositiva da sentença (evento 103, SENT1), nos seguintes termos:
Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC e resolvendo o mérito:
I - JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por MC TRADE IMPORTADORA E EXPORTADORA EIRELI em desfavor de ELO SOLUCOES LOGISTICAS INTEGRADAS EIRELI e REVOGO a tutela concedida no Evento 8.
Condeno a parte autora ao pagamento de custas, bem como honorários advocatícios, os quais fixo em 15% sobre o valor atualizado da causa, com fulcro no art. 85, § 2º, do CPC.
II - JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por ELO SOLUCOES LOGISTICAS INTEGRADAS EIRELI em desfavor de MC TRADE IMPORTADORA E EXPORTADORA EIRELI, para CONDENAR a parte autora/reconvinda ao pagamento do valor de R$ 170.688,00 a título de armazenagem, o qual deverá sofrer correção monetária e ser acrescido de juros de mora a contar de cada vencimento (art. 397, do CC).
Condeno a reconvinda ao pagamento de custas, bem como honorários advocatícios, os quais fixo em 15% sobre o valor da condenação, com fulcro no art. 85, § 2º, do CPC.
Acerca dos consectários legais, a correção monetária deve se dar, segundo o histórico de indexadores do iCGJ, observando-se a aplicação do INPC até 29.08.2024, e do IPCA a partir de 30.08.2024, nos termos do art. 389, parágrafo único, do Código Civil.
O valor deverá ser acrescido, ainda, de juros de mora, observado o índice de 1% ao mês até 29.08.2024, e, após 30.08.2024, a variação da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), deduzido o índice de atualização monetária (art. 406, § 1º, do Código Civil).
Irresignada, a autora/reconvinda interpôs recurso de apelação (evento 112, APELAÇÃO1), em que defende a reforma da decisão guerreada, uma vez que teria sido ignorada "a distinção crucial entre a figura do consignatário em um conhecimento de embarque e a responsabilidade contratual inerente à prestação de serviços de armazenagem, especialmente no contexto de uma operação de importação por conta e ordem de terceiros, conforme cláusula 4.1 do contrato de importação de mercadorias por conta e ordem de terceiros (evento 1 – doc. nomeado como CONTR4)" (pág. 10).
Afirma que na qualidade de importadora por conta e ordem de terceiros, agiu sob mandato expresso da RJ Pescados, que seria a verdadeira adquirente das mercadorias. Ressalta que a simples menção de seu nome como consignatária "não a transforma automaticamente em devedora dos serviços prestados à real adquirente RJ PESCADOS" (pág. 11).
Pondera que a imputação a si da responsabilidade da dívida contraída por terceiro, sem que tenha expressamente anuído ou se beneficiado diretamente dos serviços, configura enriquecimento ilícito da parte ré/reconvinte.
Informa, ainda, que "na data de 02/09/2021 foi realizado o endosso da consignação das mercadorias referentes à nota fiscal 8731, a qual no valor de R$ 53.561,88, emitida em 11/08/2021, com boleto emitido para 18/08/2021 e apontamento de protesto para 15/09/2021, ou seja, a emissão da nota fiscal foi anterior ao próprio endosso das mercadorias à empresa requerente, fato este que faz prova inequívoca de que não houve aceite tácito da requerente, ora apelante, posto que recebeu o endosso da consignação das mercadorias em quando as mesmas já se encontravam armazenadas no recinto alfandegado da BRASFRIGO, local onde atua a empresa ELO SOLUÇÕES, requerido nos autos principais." (pág. 12, com destaque no original), de modo que não poderia contratar armazenagem sem possuir o endosso da mercadoria consignando a si.
Por outro lado, menciona que a sentença igualmente ocorreu em equívoco "ao considerar que a ausência de contrato formal de armazenagem não descaracteriza a obrigação de pagamento, fundamentando-se em uma suposta prática comercial usual de aceite tácito em decorrência de aceite de terceira, PS COMEX, contratada somente pela adquirente RJ PESCADOS" (pág. 13).
Enfatiza que em momento algum manifestou sua concordância com qualquer proposta de armazenagem, razão pela qual a "simples entrada da mercadoria no terminal, desacompanhada de qualquer manifestação de vontade da AOC, não pode ser interpretada como aceitação das condições propostas pela ELO SOLUÇÕES LOGÍSTICAS INTEGRADAS EIRELI." (pág. 14)
No mais, afirma que a sentença também comporta reforma no que tange à distribuição do ônus da prova, uma vez que teria demonstrado, de forma consistente, que sua atuação se restringiu à intermediação da importação, agindo por conta e ordem da RJ Pescados, em data posterior à emissão da nota fiscal pois, reitere-se, recebeu o endosso das mercadorias na data de 02/09/2021, data posterior a emissão das notas e posterior a armazenagem, vez que não encaminhou as mercadorias para o recinto alfandegado.
Assevera que a "contratação tácita supostamente avençada é impossível, eis que a nota fiscal 8731, a qual no valor de R$ 53.561,88, foi emitida em 11/08/2021, 3 semanas antes do próprio endosso, ou seja, antes da mercadoria ser consignada a empresa requerente AOC, esta carga se encontrava no recinto alfandegado a muito tempo." (pág. 15), sendo que a responsabilidade final pelos custos deveria cair sobre a RJ Pescados, diante da relação comercial estabelecida entre ambas, devidamente comprovada nos autos (evento 1, CONTR4).
Por fim, relata que há equivoco na decisão ao atribuir-lhe a responsabilidade por um suposto aceite tácito das condições de armazenagem, fundamentando-se em uma relação contratual inexistente. Diz que a decisão combatida ignora a empresa PS Comex, peça central na argumentação da Apelada, foi contratada diretamente pela RJ Pescados, a real adquirente das mercadorias, e não pela Apelante, de modo que deve ser reformada para afastar a sua responsabilização pelos danos relativos à armazenagem das mercadorias.
Assim, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, para que seja reconhecida a exclusiva responsabilidade da real adquirente das mercadorias - RJ Pescados - bem como a legitimidade desta para arcar com todas as despesas inerentes às mercadorias, declarando-se a inexistência do débito referente às notas fiscais nº 8333, 8334 e 8731, correspondente ao valor de R$ 170.688,00 (cento e setenta mil, seiscentos e oitenta e oito reais) a título de armazenagem.
Por conseguinte, requer a condenação da requerida, ora apelada, ao pagamento de indenização por danos morais, em valor a ser arbitrado por este Egrégio Tribunal, considerando que a apelada atribui responsabilidade à apelante com base em aceite de terceira; a inversão do ônus sucumbencial e, ainda, a total improcedência da reconvenção apresentada pela requerida, ora apelada, com a condenação da mesma ao pagamento das custas processuais e de honorários.
Com as contrarrazões (evento 118, CONTRAZ1) e declinada a competência para uma das Câmaras de Direito Comercial (evento 6, DESPADEC1), vieram-me os autos conclusos.
Este é o relatório.
VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Trata-se de recurso de apelação cível interposto por AOC IMPORTS COMÉRCIO E DISTRIBUIÇÃO EIRELI contra sentença que, na "Ação de Obrigação de Fazer com Reparação por Danos Morais com Pedido Liminar Inaudita Altera Parte por Inscrição Indevida em Cadastro Restritivo de Crédito", julgou improcedentes os pedidos exordiais por si formulados e, por outro lado, julgou procedente a reconvenção apresentada por por ELO SOLUCOES LOGISTICAS INTEGRADAS EIRELI, condenando aquela ao pagamento do valor de R$ 170.688,00 a título de armazenagem, devidamente corrigido, como também ao pagamento do ônus sucumbencial em ambas as demandas.
Em suma, a controvérsia recursal gira em torno da responsabilidade da autora/reconvinda pelas despesas de armazenagem de mercadorias importadas por conta e ordem de terceiros, bem como da legitimidade da inscrição de seu nome nos cadastros de inadimplentes que teria gerado o direito ao recebimento de indenização por danos morais.
A apelante sustenta que, por atuar como importadora por conta e ordem de terceiros, não poderia ser responsabilizada pelas despesas de armazenagem, as quais deveriam recair exclusivamente sobre a real adquirente, RJ Pescados.
Alega que a simples menção de seu nome como consignatária nos conhecimentos de embarque não configura vínculo contratual com a empresa apelada, tampouco aceite tácito da prestação dos serviços.
Razão, contudo, não assiste à recorrente.
Na hipótese, observa-se do "contrato de importação de mercadorias por conta e ordem de terceiros", juntado aos autos pela autora, que a importadora AOC Imports Comércio e Distribuição EIRELI assumiu expressamente a responsabilidade pelas despesas decorrentes de sobre-estadia de contêiner, ainda que relacionadas ao processo de liberação de mercadoria e/ou mercadorias já enviadas e amparadas pela respectiva nota fiscal de remessa, bem como de mercadorias em processo de perdimento junto a Receita Federal, além de outros custos inerentes à operação (cláusula "4.1", evento 1, CONTR4, págs. 4 e 5).
Desse modo, ainda que a autora/apelante tenha atuado como mera mandatária da real adquirente das mercadorias (RJ Pescados), os conhecimentos de embarque marítimo (bills of lading) evidenciam que figurou como consignatária nos BLs nº HWVN21021004A e HWVN21021003A (evento 1, NFISCAL5, pág. 2; evento 1, NFISCAL6, pág. 5, respectivamente), evidenciando, portanto, se tratar da destinatária formal das mercadorias acondicionadas nos contêineres CXRU1184870, TRIU8090370 e TTNU8404645.
Assim, infere-se que, por consequência lógica, a apelante assumiu a responsabilidade direta e solidária decorrente da contratação realizada em nome próprio perante o armador.
Aliás, a jurisprudência deste Tribunal reconhece que o consignatário é responsável pelas despesas de transporte e armazenagem, ainda que a operação se dê por conta e ordem de terceiros.
Nesse sentido, colhe-se julgado deste Colegiado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE COBRANÇA. DECISÃO QUE REJEITOU PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E INDEFERIU A TUTELA ANTECIPADA. INSURGÊNCIA DA EMPRESA REQUERIDA.
ARGUIÇÃO DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. A CONSIDERAR O MOMENTO PROCESSUAL, NÃO ACOLHIMENTO. MODALIDADE DE IMPORTAÇÃO POR CONTA E ORDEM DE TERCEIRO. DEMANDADA, ORA AGRAVANTE, QUE FIGUROU NO CONHECIMENTO DE EMBARQUE MARÍTIMO (BILL OF LADING) NA QUALIDADE DE CONSIGNATÁRIA, OU SEJA, A RESPONSÁVEL PELA RETIRADA DAS MERCADORIAS. COM ISSO, VERIFICA-SE SUA PERMANÊNCIA NO POLO PASSIVO. PORTANTO, CONSIDERANDO SUA RESPONSABILIDADE PARA COM OS BENS, FICAM PREJUDICADOS OS DEMAIS PLEITOS RECURSAIS.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5052194-43.2023.8.24.0000, do , rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 30-11-2023, grifei).
Igualmente, desta Corte de Justiça:
APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE MARÍTIMO. AÇÃO DE COBRANÇA DE SOBRE-ESTADIA (DEMURRAGE). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ (CONSIGNATÁRIA). 1 - PRELIMINARES. 1.1 - ILEGITIMIDADE PASSIVA. ALEGAÇÃO DA RÉ DE QUE FOI CONTRATADA COMO "TRADING COMPANY" PELA EMPRESA IMPORTADORA (CO-RÉ) PARA PRESTAR O SERVIÇO DE IMPORTAÇÃO POR CONTA E ORDEM DE TERCEIROS. NÃO ACOLHIMENTO. RÉ QUE FIGUROU NO CONHECIMENTO DE EMBARQUE (BILL OF LADING) COMO DESTINATÁRIA DAS MERCADORIAS (CONSIGNEE). LEGITIMIDADE PARA FIGURAR NO POLO PASSIVO DA AÇÃO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA PELO PAGAMENTO DE TODOS OS ENCARGOS. EVENTUAL RESPONSABILIDADE DA EMPRESA IMPORTADORA PARA COM A RÉ QUE DEVE SER OBJETO DE RESOLUÇÃO EM AÇÃO AUTÔNOMA. PRELIMINAR REJEITADA. [...] RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0305954-79.2018.8.24.0033, do , rel. Dinart Francisco Machado, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 12-09-2024, grifei).
E, ainda:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. IMPORTAÇÃO POR CONTA E ORDEM DE TERCEIRO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA RÉ.
PRELIMINAR. TESE DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. AFASTAMENTO. APELANTE QUE FIGUROU COMO CONSIGNATÁRIA NO CONHECIMENTO DE EMBARQUE (BILL OF LADING). RESPONSABILIDADE, EM TESE, PELO PAGAMENTO DAS DESPESAS COBRADAS. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA. PREFACIAL AFASTADA. [...]
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0300385-53.2016.8.24.0135, do , rel. Vitoraldo Bridi, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 05-10-2023, grifei).
Como corolário lógico, a consignatária responde pelas obrigações decorrentes da operação de importação, as quais abrangem o pagamento das despesas portuárias e de armazenagem, ainda que tenha atuado por conta e ordem de terceiro.
Ademais, ainda que o endosso da carga tenha ocorrido em 02/09/2021, é fato incontroverso que as mercadorias foram internalizadas e armazenadas sob consignação da apelante, de modo que o aceite tácito da proposta comercial da parte apelada/reconvinte se perfectibilizou com a entrada dos contêineres no recinto alfandegado, como previsto na "Proposta Comercial para Armazenamento e Movimentação de Carga - FCL RF", colacionada no evento 40, DOCUMENTACAO10.
Desse modo, é irrelevante a data do endosso ou eventual ajuste particular entre a apelante e a RJ Pescados, pois tais circunstâncias não afastam a obrigação direta perante a empresa prestadora do serviço de armazenagem.
Aliás, a emissão das notas fiscais em nome da apelante decorreu, como bem observado pelo juízo singular, de prática comercial consolidada, segundo a qual o importador formal permanece responsável pelas obrigações decorrentes da operação até a efetiva transferência da titularidade da carga, a qual não tem o condão de afastar a responsabilidade pela ausência de contrato formal de armazenagem.
De mais a mais, a própria documentação acostada aos autos (evento 1, ANEXO10) evidencia que a apelante tinha pleno conhecimento das cobranças e chegou a manter tratativas com a RJ Pescados visando à assunção dos débitos, o que reforça sua ciência e concordância tácita com a obrigação.
Não bastasse isso, a Cláusula 4.6 do contrato de importação prevê expressamente a possibilidade de reembolso das despesas de armazenagem junto à real adquirente, o que pressupõe, de forma inequívoca, que a obrigação inicial recaía sobre a apelante.
Tais elementos afastam a alegação de surpresa e invalidam a narrativa de inexistência de vínculo contratual, situação que evidencia que a parte apelante, além de plenamente ciente das cobranças, reconhecia sua posição jurídica como responsável formal pelas mercadorias até a ocorrência do perdimento.
No tocante à alegação de que a empresa PS Comex teria atuado sem poderes de representação, não se verifica qualquer prova capaz de corroborar tal afirmação, sendo certo que a intermediadora exerceu função de facilitadora da operação logística e aduaneira, com o objetivo de prover a comunicação entre o importador e o armazém, em conformidade com a prática usual do comércio exterior.
Diante de tais premissas, não se verifica nos autos qualquer indício de conduta dolosa ou de extrapolação dos poderes de negociação da empresa reconvinte.
No caso, a responsabilidade da apelante não se funda em eventual anuência formal da PS Comex, mas decorre de sua própria conduta ao permitir que as mercadorias fossem encaminhadas ao terminal alfandegado indicado, dando origem às cobranças correspondentes, circunstância que reforça a ideia de que a obrigação recai sobre quem detém a titularidade formal das mercadorias e assume o risco decorrente da operação de importação.
Destarte, não configurada qualquer irregularidade na atuação da empresa apelada, tampouco abuso na cobrança, a inscrição do nome da AOC Imports nos cadastros de inadimplentes mostra-se legítima, vez que decorrente de débito efetivo e regularmente constituído e, por conseguinte, não há falar em configuração de ato ilícito, tampouco em dano moral indenizável, mormente porque a negativação é resultante do inadimplemento contratual.
Por fim, cumpre asseverar que a sentença examinou detidamente o conjunto probatório, destacando que as notas fiscais nº 8333 e 8334 (emitidas em 09.07.2021) e nº 8731 (emitida em 11.08.2021) correspondem exatamente ao período em que a apelante figurou como consignatária das mercadorias, até 02.09.2021, data em que se consumou o perdimento e a consequente transferência da titularidade em favor da União. (evento 103, SENT1)
No que concerne à reconvenção, verifica-se que a ré/reconvinte comprovou a prestação dos serviços de armazenagem e o inadimplemento da contraparte, apresentando notas fiscais, comprovantes e correspondências eletrônicas.
A autora, por sua vez, limitou-se a negar genericamente a relação jurídica, sem apresentar qualquer prova em sentido contrário, não se desincumbindo do ônus que lhe cabia (art. 373, I, do CPC).
Portanto, a par dos entendimentos retrocitados, é de ser mantida incólume a sentença guerreada.
Superada a questão de fundo e levando-se em conta o disposto no art. 85, §§1º e 11, do Código de Processo Civil, necessário sejam fixados os honorários recursais, in verbis:
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
§ 1º São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente.
[...]
§ 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento.
Nesse diapasão, o Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5059858-79.2021.8.24.0038/SC
RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. "AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS COM PEDIDO LIMINAR INAUDITA ALTERA PARTE POR INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO RESTRITIVO DE CRÉDITO". CONTRATO DE IMPORTAÇÃO POR CONTA E ORDEM DE TERCEIROS. DÉBITO REFERENTE A SERVIÇOS DE ARMAZENAGEM PORTUÁRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS PRINCIPAIS E de PROCEDÊNCIA DA RECONVENÇÃO. INSURGÊNCIA DA AUTORA/RECONVINDA.
pretenso reconhecimento da ilegitimidade para o pagamento das despesas de armazenagem. alegação DE QUE O PAGAMENTO CABERIA À EMPRESA RJ PESCADOS, REAL ADQUIRENTE DAS MERCADORIAS. tese insubsistente. empresa autora que é a consignatária formal da carga indicada nos conhecimentos de embarque com responsabilidade direta perante o prestador do serviço de armazenagem, ainda que a operação tenha ocorrido por conta e ordem de terceiros, sendo inoponíveis os contratos particulares firmados entre importador e adquirente. Precedentes desta corte.
ARGUIÇÃO DE QUE AS MERCADORIAS JÁ SE ENCONTRAVAM ARMAZENADAS ANTES DO ENDOSSO DA CONSIGNAÇÃO QUE NÃO TEM O CONDÃO DE ALTERAR A RESPONSABILIDADE DA PARTE AUTORA, eis que caracterizado o aceite tácito pela entrada da carga no terminal indicado, nos termos da proposta comercial juntada aos autos. Prática usual no comércio exterior, que conduz à comprovação da prestação do serviço e à legalidade da cobrança dos valores dela decorrentes. outrossim, atuação irregular de empresa intermediária inocorrente. ausência de demonstração de extrapolação de poderes ou má-fé da apelada. responsabilização mantida.
RECONVENÇÃO. COBRANÇA DE DESPESAS DE ARMAZENAGEM. parte ré/reconvinte que comprovou a prestação dos serviços de armazenagem e o inadimplemento da contraparte, apresentando notas fiscais, comprovantes e correspondências eletrônicas. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO que se impõe.
SENTENÇA ESCORREITA.
HONORÁRIOS RECURSAIS. OBEDIÊNCIA AO DISPOSTO NOS §§ 1º E 11º DO ARTIGO 85 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. NECESSIDADE DE FIXAÇÃO ANTE O DESPROVIMENTO DO RECLAMO. PRECEDENTES.
RECURSO CONHECIDO E desPROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Câmara de Direito Comercial do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por JOSÉ MAURÍCIO LISBOA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6930368v12 e do código CRC 8574c63d.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
Data e Hora: 06/11/2025, às 13:35:23
5059858-79.2021.8.24.0038 6930368 .V12
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 08:59:17.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 06/11/2025 A 13/11/2025
Apelação Nº 5059858-79.2021.8.24.0038/SC
RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
PRESIDENTE: Desembargador MARIANO DO NASCIMENTO
PROCURADOR(A): CARLOS ALBERTO DE CARVALHO ROSA
Certifico que este processo foi incluído como item 135 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 20/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 06/11/2025 às 00:00 e encerrada em 06/11/2025 às 15:49.
Certifico que a 1ª Câmara de Direito Comercial, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 1ª CÂMARA DE DIREITO COMERCIAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
Votante: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
Votante: Desembargador MARIANO DO NASCIMENTO
Votante: Desembargador LUIZ ZANELATO
PRISCILA DA ROCHA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 08:59:17.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas