Órgão julgador: Turma Cível, unânime, rel. Des. James Eduardo Oliveira, j. em 29.4.2015).
Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006
Ementa
AGRAVO – Documento:7074408 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5106767-20.2024.8.24.0930/SC DESPACHO/DECISÃO M. M. interpôs APELAÇÃO contra a sentença proferida nos autos da ação revisional, que tramitou no Juízo de Direito da Unidade Estadual de Direito Bancário, na qual foi julgado procedente, em parte, o intento autoral, com a ordem para redução dos juros remuneratórios à média de mercado, bem como a condenação da ré na repetição simples do que foi pago em excesso. Bradou a recorrente que faz jus à restituição dobrada do que lhe foi cobrado indevidamente, que devem ser descaracterizados os efeitos da mora e que os honorários sucumbenciais comportam fixação por apreciação equitativa.
(TJSC; Processo nº 5106767-20.2024.8.24.0930; Recurso: Agravo; Relator: ; Órgão julgador: Turma Cível, unânime, rel. Des. James Eduardo Oliveira, j. em 29.4.2015).; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7074408 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5106767-20.2024.8.24.0930/SC
DESPACHO/DECISÃO
M. M. interpôs APELAÇÃO contra a sentença proferida nos autos da ação revisional, que tramitou no Juízo de Direito da Unidade Estadual de Direito Bancário, na qual foi julgado procedente, em parte, o intento autoral, com a ordem para redução dos juros remuneratórios à média de mercado, bem como a condenação da ré na repetição simples do que foi pago em excesso.
Bradou a recorrente que faz jus à restituição dobrada do que lhe foi cobrado indevidamente, que devem ser descaracterizados os efeitos da mora e que os honorários sucumbenciais comportam fixação por apreciação equitativa.
Na sequência, CREFISA S/A – CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS interpôs APELAÇÃO aventando, de início, a nulidade da sentença por falta de fundamentação e por cerceamento de defesa porque, na sua ótica, além de faltar substância ao veredito, a aferição das abusividades ventiladas na inicial depende de dilação probatória. Incursionando no mérito, defendeu que a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil não pode ser utilizada como único parâmetro para aferição de abusividades. Por isso, com apego no brocardo jurídico pacta sunt servanda, asseverou que os juros remuneratórios não comportam revisão porque, além de terem sido expressamente aceitos, não revelam abusividade diante do perfil de alto risco da contratante. Por fim, alegou que não cabe a devolução do que já foi pago.
Após apresentadas as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.
1. Somente a total ausência de fundamentação acarreta a nulidade do decisum. A economia dela, não. Se está justificada, ainda que de passagem, a revisão contratual e a mitigação da taxa compensatória, a decisão está suficientemente fundamentada, não podendo ser acoimada nula (TJSC – Apelação Cível nº 0303637-12.2016.8.24.0023, da Capital, Sétima Câmara de Direito Civil, unânime, rel. Des. Carlos Roberto da Silva, j. em 13.10.2022).
Objetivamente, "não há falar em nulidade da sentença por falta de fundamentação se dela constam as razões de decidir, permitindo o exercício do direito à ampla defesa e ao contraditório. Eventual ausência de enfrentamento, ponto a ponto, de argumentos impertinentes ou incabíveis à discussão, não a torna nula" (TJMG – Apelação Cível nº 1.0000.19.133312-9/001, de Governador Valadares, 2ª Câmara Cível, unânime, relatora Desembargadora Maria Inês Souza, j. em 04.10.2022).
2. A controvérsia invocada em grau de recurso hospeda discussão acerca da (i)legalidade das disposições contratuais pactuadas no negócio jurídico sacramentado entre as partes. A solução disso independe da produção de prova porque se trata de matéria exclusivamente de direito, de modo que a documentação arregimentada aos autos é suficiente para estabelecer vetores de orientação ao desate da quaestio.
"Longe de traduzir cerceamento de defesa, o julgamento antecipado da lide é uma exigência legal quando o cenário do litígio descortina o predomínio da matéria de direito e a suficiente elucidação da matéria de fato" (TJDFT – Apelação Cível nº 20140510043097, de Planaltina, Quarta Turma Cível, unânime, rel. Des. James Eduardo Oliveira, j. em 29.4.2015).
Indo além, "inocorre cerceamento de defesa quando o juiz, fundamentado no livre convencimento motivado, dispensa prova inútil, protelatória ou desnecessária ao deslinde da quaestio" (TJSC – Apelação Cível nº 0302656-79.2017.8.24.0012, de Caçador, Segunda Câmara de Direito Civil, unânime, rel. Des. Monteiro Rocha, j. em 5.4.2023).
Logo, sem que tenha havido afronta a qualquer dos substratos do contraditório, não se há falar em nulidade da sentença por cerceamento de defesa.
3. Pelo princípio da autonomia da vontade, os capazes podem contratar sem amarras. Entretanto, tal princípio não é aplicável indistintamente, de modo que deve-se atentar para os limites da ordem pública e da função social do contrato (CC, art. 421). De igual modo, o pacta sunt servanda, mandamento jurídico que preconiza que o acordo de vontades faz lei entre as partes, também deve ser flexibilizado a fim de inibir-se a estipulação de cláusulas que porventura desequilibrem a relação contratual, pondo o consumidor em desvantagem exagerada (CDC, art. 51, inc. IV) ou, ainda, que tornem a obrigação excessivamente onerosa para o contratante (CDC, art. 51, § 1º, inc. III) (nesse sentido: TJSP – Apelação Cível nº 1002044-39.2022.8.26.0572, de São Joaquim da Barras, Trigésima Sétima Câmara de Direito Privado, unânime, rel. Des. Sérgio Gomes, j. em 9.1.2023).
Essa linha de raciocínio ganha força na medida em que se notam disposições contratuais que vão de encontro a normas de ordem pública e de interesse social, como as previstas no Código de Defesa do Consumidor (CDC, art. 1º), as quais são inderrogáveis ainda que essa fosse a vontade dos interessados (José Geraldo Brito Filomeno, "Direitos do Consumidor", 15ª ed., São Paulo: Atlas, 2018, pág. 13).
Indo direto ao ponto, é possível, de forma excepcional, a revisão da taxa de juros remuneratórios posta em contratos de mútuo – sobre os quais incidirão as regras emanadas da legislação consumerista – desde que a abusividade fique cabalmente demonstrada, ou seja, quando o consumidor for posto em desvantagem exagerada (STJ – Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.920.112/PR, Terceira Turma, unânime, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. em 21.2.2022).
M. M. entabulou contrato de empréstimo pessoal com Crefisa S/A e, acoimando de abusivos os juros remuneratórios estipulados, busca a revisão do pacto e a mitigação da respectiva taxa.
Sabe-se que "a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade" (STJ – Súmula nº 382) e que a taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil representa mero referencial para a constatação de excessividades. É somente perante as particularidades iridescentes do caso concreto que a onerosidade do percentual compensatório poderá ser apurada. Para isso, levar-se-á em consideração circunstâncias, tais qual "o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos" (STJ – Recurso Especial nº 1.821.182/RS, Quarta Turma, unânime, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, j. em 29.6.2022).
Desvela-se do instrumento contratual sacramentado entre Maria e Crefisa que os juros remuneratórios pactuados destoam significativamente da contemporânea média de mercado e, ainda que tenha tido oportunidade para fazê-lo, a instituição financeira não comprovou que a anabolização dos compensatórios foi pautada em concretas condições desfavoráveis para a concessão do crédito. Na verdade, a narrativa ventilada pela ré é genérica, abstrata, e, por isso, não tem o condão de justificar a incidência de taxas elevadas.
Eis a discrepância identificada:
ContratoDataJuros pactuadosMédia de mercadoSérie Bacen011960213723 (Evento 17, CONTR6)20.3.202422% a.m e 987,22% a.a5,78% a.m e 96,32% a.a25464 e 20742 - Crédito pessoal não consignado
Diante da nítida onerosidade excessiva a que a consumidora foi exposta no referido contrato, as taxas de juros remuneratórios devem ser minoradas para equivalerem à contemporânea média de mercado (TJSC – Apelação nº 5002301-06.2020.8.24.0189, de Santa Rosa do Sul, Quinta Câmara de Direito Comercial, unânime, relatora Desembargadora Soraya Nunes Lins, j. em 25.4.2024), sendo que "a procedência dos pedidos formulados em ação revisional de contrato bancário possibilita tanto a compensação de créditos quanto a devolução da quantia paga indevidamente, em obediência ao princípio que veda o enriquecimento ilícito" (STJ – Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.679.635/PR, Quarta Turma, unânime, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, j. em 10.8.2020).
O entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça é o de que a restituição dos valores pagos em excesso pelo consumidor dar-se-á na forma simples, ou seja, sem a dobra visada, o que só teria chance de emplacar se identificada a má-fé da instituição financeira, que, entretanto, não se presume (STJ – Agravo Interno nos Embargos de Declaração no Recurso Especial nº 1.534.561/PR, Terceira Turma, unânime, relatora Ministra Nancy Andrighi, j. em 27.4.2017).
Assim, porque não houve a comprovação da má-fé na atuação da Crefisa S/A, improcede o pleito de repetição dobrada do indébito.
4. Comprovada a abusividade de encargo cobrado no período da normalidade contratual, deve ser descaracterizada a mora do consumidor, conforme entendimento estabelecido no Tema 28 do Superior Tribunal de Justiça ["o reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora"].
Ademais, dada a revogação da Súmula nº 66 deste Tribunal, o afastamento da mora prescinde do depósito do valor incontroverso da dívida.
5. Quanto aos honorários sucumbenciais, também tem razão a autora/recorrente. Porque o proveito econômico obtido foi irrisório pois resultante de revisão de taxas de juros remuneratórios de empréstimo de reduzido valor, o estipêndio do patrono da vencedora deve ser fixado por apreciação equitativa, na forma do artigo 85, §8º do Código de Processo Civil (veja-se, a respeito: TJSC – Apelação Cível nº 5015594-74.2021.8.24.0038, de Joinville, Quinta Câmara de Direito Comercial, unânime, relatora Desembargadora Soraya Nunes Lins, j. em 30.3.2023). Ponderando-se os critérios irradiados do §2º do referido dispositivo da lei processual, os honorários sucumbenciais devem ser fixados em R$ 1.500,00, a serem pagos pela Crefisa S/A em prol do advogado de Maria.
6. Desprovido o recurso da ré, majoro em R$ 300,00 os honorários recursais (CPC, art. 85, § 11), os quais, somados aos R$ 1.500,00 já estipulados, totalizam R$ 1.800,00.
À luz do exposto, conheço dos recursos e, com fulcro no disposto no artigo 932, inciso VIII, do CPC c/c artigo 132, incisos XV e XVI, do RITJSC, nego provimento ao intento da Crefisa S/A e dou provimento à pretensão recursal de Maria para ordenar a descaracterização dos efeitos da mora e fixar em R$ 1.500,00 os honorários sucumbenciais devidos ao patrono da autora, atualizados daqui para frente.
assinado por ROBERTO LEPPER, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7074408v3 e do código CRC ebe7a0e8.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROBERTO LEPPER
Data e Hora: 13/11/2025, às 19:54:21
5106767-20.2024.8.24.0930 7074408 .V3
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 09:08:16.
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