AGRAVO DE INSTRUMENTO – Documento:7048790 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5005604-29.2023.8.24.0090/SC DESPACHO/DECISÃO Cuida-se de Apelação interposta por D. A. D. S., em objeção à sentença que na Ação de Indenização por Danos Morais n. 5005604-29.2023.8.24.0090 ajuizada contra Interligação Elétrica Biguaçu S/A., julgou improcedentes os pedidos, nos seguintes termos: Trata-se de ação de indenização por danos morais e materiais proposta por D. A. D. S., pescador artesanal, em face de ISA CTEEP S.A., Tractebel Energia S.A. (Engie Brasil) e ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica. O autor alega que a instalação da linha de transmissão de energia elétrica entre Biguaçu e Ratones, com trecho subaquático na Baía Norte de Florianópolis, causará prejuízos à atividade pesqueira local, da qual depende para seu sustento.
(TJSC; Processo nº 5005604-29.2023.8.24.0090; Recurso: Agravo de Instrumento; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7048790 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5005604-29.2023.8.24.0090/SC
DESPACHO/DECISÃO
Cuida-se de Apelação interposta por D. A. D. S., em objeção à sentença que na Ação de Indenização por Danos Morais n. 5005604-29.2023.8.24.0090 ajuizada contra Interligação Elétrica Biguaçu S/A., julgou improcedentes os pedidos, nos seguintes termos:
Trata-se de ação de indenização por danos morais e materiais proposta por D. A. D. S., pescador artesanal, em face de ISA CTEEP S.A., Tractebel Energia S.A. (Engie Brasil) e ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica.
O autor alega que a instalação da linha de transmissão de energia elétrica entre Biguaçu e Ratones, com trecho subaquático na Baía Norte de Florianópolis, causará prejuízos à atividade pesqueira local, da qual depende para seu sustento.
Sustenta que houve omissão de informações por parte das rés, ausência de estudos de impacto ambiental acessíveis à comunidade e que a obra afetará diretamente a qualidade da água e a fauna marinha, prejudicando a pesca e a imagem dos produtos comercializados.
Requer indenização por danos materiais (lucros cessantes) no valor de R$ 1.100,00 mensais durante o período das obras e R$ 10.000,00 por danos morais.
[...]
Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo improcedentes os pedidos formulados por D. A. D. S. em face de INTERLIGACAO ELETRICA BIGUACU S.A.
Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC, cuja exigibilidade, no entanto, fica suspensa, na forma do art. 98, § 3º do Código de Processo Civil, tendo em vista que o autor é beneficiário da justiça gratuita.
Descontente, D. A. D. S. porfia que:
[...] requereu a realização de perícia técnica, uma vez que foi demonstrado que a travessia trouxe impacto para a vida marinha no local, tanto que foram juntados documentos que comprovam tal impacto.
A realização de perícia multiprofissional e promovida com o devido contraditório e ampla defesa, sobretudo pela participação de várias associações de pescadores, a própria ré, Ministério Público Federal, IMA-Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina, ANEEL-Agência Nacional de Energia Elétrica e União, certamente trará maior segurança em seu resultado, uma vez que todos os possíveis interessados na apuração de eventual impcato quanto à travessia do cabo poderão fiscalizar, acompanhar e impugnar a prova pericial.
[...] a fim de trazer maior segurança para o julgamento da presente demanda, assim como de modo a garantir a produção da prova técnica, é plenamente possível a utilização de prova emprestada, para que seja utilizado o laudo a ser produzido nos autos n. 5014671-87.2021.4.04.7200 como prova emprestada, em substituição à prova técnica a ser produzida nos presentes autos.
[...] para definir o real impacto da implantação do empreendimento na atividade pesqueira, a única alternativa é a prova pericial, a qual é a única prova capaz de mensurar a extensão do impacto, prazo de duração e a perda para a atividade pesqueira, para o presente e para o futuro.
[...] não foi proferido despacho saneador para que o recorrente pudesse requerer a produção de prova testemunhal e pericial, caracterizando flagrante cerceamento de defesa, pois não há como o recorrente comprovar o dano sofrido sem a produção de tais provas.
Nestes termos, brada pelo conhecimento e provimento do Apelo.
Na sequência sobrevieram as contrarrazões, onde Interligação Elétrica Biguaçu S/A. refuta uma a uma todas as teses manejadas, vozeando pelo desprovimento da irresignação apresentada.
Em apertada síntese, é o relatório.
Conheço do recurso porque, além de tempestivo, atende aos demais pressupostos de admissibilidade.
O Código de Processo Civil - à luz do princípio da celeridade e do dever de os Tribunais manterem sua jurisprudência “estável, íntegra e coerente” (art. 926, caput) -, preconiza, em seu art. 932, incs. IV e V, hipóteses de análise unipessoal do mérito recursal.
No mesmo sentido, o Regimento Interno deste , as partes foram intimadas para informar sobre as dificuldades quanto à liquidação e dilação da prova (Evento 36).
Ato contínuo, Interligação Elétrica Biguaçu S/A. requereu o julgamento antecipado do feito (Evento 46), enquanto D. A. D. S. postulou a produção de prova pericial, além do trâmite do processo perante uma das Varas Cíveis (Evento 47).
Redistribuídos os autos à 5ª Vara Cível da comarca da Capital, a justiça gratuita foi indeferida (Evento 72), sendo tal decisão revertida no Agravo de Instrumento n. 5066243-55.2024.8.24.0000.
Empós, o togado singular indeferiu a prova pericial, ao argumento de que o pedido formulado pelo autor "carece de especificação quanto ao objeto, método ou finalidade da vistoria técnica pretendida" e, na mesma ocasião, julgou improcedentes os pedidos, sob o fundamento de que "a análise dos autos revela ausência de comprovação mínima dos danos efetivos sofridos. A despeito da prova da condição de pescador profissional artesanal, a pretensão veio desacompanhada da indicação precisa do local em que exercida a atividade pesqueira, das espécies capturadas, do volume de produção ou da renda auferida antes e depois da obra questionada" (Evento 92).
Insatisfeito, D. A. D. S. defende que "não foi proferido despacho saneador para que o recorrente pudesse requerer a produção de prova testemunhal e pericial, caracterizando flagrante cerceamento de defesa, pois não há como comprovar o dano sofrido sem a produção de tais provas".
Pois bem.
Sem tardança, antecipo: a irresignação viceja!
O art. 370, caput, do CPC, determina que "caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito".
In casu, em que pese a obtenção das licenças ambientais necessárias para a implantação da linha de transmissão, isso não enseja a automática presunção de inexistência de danos à atividade pesqueira, os quais devem ser apurados em fase instrutória.
Nesse contexto, compreendo que a própria Ação Civil Pública n. 5014671-87.2021.4.04.7200, proposta por Federação dos Pescadores do Estado de Santa Catarina, Colônia de Pescadores da Armação da Piedade, Colônia de Pescadores Z-23 e Colônia de Pescadores de São José Z-28 - em trâmite perante a Justiça Federal -, atesta minimamente o direito do autor, porquanto demonstra que há mais de 200 (duzentos) pescadores objetivando a mesma indenização, não se tratando de mera aventura jurídica aqui intentada.
Outrossim, friso que a referida demanda encontra-se em fase instrutória, tendo recentemente sido elaborados os laudos periciais pelos profissionais competentes. Logo, ao contrário do assinalado pelo juízo a quo, não há que falar em perda de utilidade e relevância da perícia diante do transcurso do tempo.
Dessa forma, revela-se imprescindível a realização de perícia - ou a utilização de prova emprestada -, para esclarecer se a colocação dos cabos submarinos pela empresa ré efetivamente acarretou malefícios de ordem ambiental que vieram a impactar na atividade profissional do autor.
Afinal, "a dispensa da perícia em casos de alta complexidade técnica configura cerceamento de defesa e compromete a validade da instrução processual, uma vez que é imprescindível para a valoração objetiva dos danos e evita nulidade futura da sentença" (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5075907-76.2025.8.24.0000, rel. Des. Jaime Ramos, Terceira Câmara de Direito Público, j. em 21/10/2025).
Nesse viés:
DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO EM AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. INSTITUIÇÃO DE PARQUE MUNICIPAL QUE ABRANGE ÁREA DE PROPRIEDADE PARTICULAR. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGIMENTO AUTORAL. ACOLHIMENTO DA PRELIMINAR DE CERCEIO DE DEFESA MERCÊ DO INDEFERIMENTO DA PROVA PERICIAL PLEITEADA PELO ACIONANTE. IMPRESCINDIBILDAIDE DE SUA PRODUÇÃO. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Ação indenizatória por desapropriação indireta ajuizada em face da instituição do Parque do Passo, pelo Município de Mafra, com declaração de utilidade pública de área de propriedade do autor, que restou julgada improcedente, sem a realização de prova pericial, embora expressamente requerida pelo autor, e essencial ao adequado deslinde do feito. 2. Cerceamento de defesa evidenciado, ante a ausência de elementos técnicos capazes de esclarecer a natureza jurídica e a extensão da intervenção estatal, até porque há julgado desta Corte, alusivo à criação do mesmo Parque, onde houve perícia, com decisão favorável ao administrado (TJSC, Apelação n. 0301440-30.2016.8.24.0041, rel. Des. Diogo Nicolau Pítsica, 4ª Câmara de Direito Público, j. em 17/1/2023). 3. Desconstituição da sentença recorrida com o retorno dos autos à origem para a regular instrução do feito, realizndo-se a imprescindível de prova pericial. (TJSC, Apelação n. 5000312-45.2025.8.24.0041, rel. Des. Joao Henrique Blasi, Segunda Câmara de Direito Público, j. em 21/10/2025) (grifei).
Logo, constata-se a ocorrência de cerceamento de defesa, decorrente do julgamento antecipado da lide, sem a devida instrução probatória, notadamente quanto à produção de prova técnica indispensável à adequada resolução da controvérsia.
No que concerne, "não se pode admitir um julgamento prematuro, sem oportunizar às partes a produção das provas tendentes a confirmar o direito alegado. Ao decidir antecipadamente a lide, dispensando a produção das provas, o juízo monocrático violou os preceptivos da lei processual que asseguram o amplo exercício da defesa, mediante a produção de provas que se revelarem pertinentes e necessárias ao julgamento da controvérsia" (Apelação / Reexame Necessário n. 0010175-87.2013.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. em 11-7-2017)" (TJSC, Apelação Cível n. 5001039-54.2020.8.24.0081, rel. Des. Júlio César Knoll, Terceira Câmara de Direito Público, j. monocrático em 26/08/2025).
Ex positis et ipso facti, casso o veredicto, determinando o retorno dos autos à origem, para a produção de prova pericial.
Incabíveis honorários recursais, visto que "'a majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação' (STJ, REsp n. 1865553/PR, rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, Tema n. 1.059, j. 9-11-2023)" (TJSC, Apelação n. 5073767-92.2025.8.24.0930, rel. Des. Rubens Schulz, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. em 30/10/2025).
Dessarte, com arrimo no art. 932 do CPC c/c o art. 132 do RITJESC, conheço do recurso e dou-lhe provimento.
Publique-se. Intimem-se.
assinado por LUIZ FERNANDO BOLLER, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7048790v20 e do código CRC f6582dc8.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO BOLLER
Data e Hora: 14/11/2025, às 13:07:54
5005604-29.2023.8.24.0090 7048790 .V20
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 08:52:51.
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