AGRAVO DE INSTRUMENTO – Documento:7077249 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5005979-29.2024.8.24.0079/SC DESPACHO/DECISÃO Trata-se de recursos de apelação cível interpostos por G. C. M. e FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO contra a sentença proferida pelo 16º Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário que, nos autos da "ação de indenização por cobrança indevida", julgou procedentes os pedidos iniciais (36.1). Nas razões recursais, a autora pleiteia a reforma da sentença, com o objetivo de ver a instituição financeira condenada ao pagamento de indenização por danos morais, em razão da suposta prática de venda casada dos seguros incluídos nos contratos discutidos na presente demanda (45.1).
(TJSC; Processo nº 5005979-29.2024.8.24.0079; Recurso: Agravo de Instrumento; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7077249 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5005979-29.2024.8.24.0079/SC
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de recursos de apelação cível interpostos por G. C. M. e FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO contra a sentença proferida pelo 16º Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário que, nos autos da "ação de indenização por cobrança indevida", julgou procedentes os pedidos iniciais (36.1).
Nas razões recursais, a autora pleiteia a reforma da sentença, com o objetivo de ver a instituição financeira condenada ao pagamento de indenização por danos morais, em razão da suposta prática de venda casada dos seguros incluídos nos contratos discutidos na presente demanda (45.1).
Por sua vez, a instituição financeira: 1) questiona a concessão do benefício da justiça gratuita à autora; 2) alega a inexistência de interesse de agir, diante da ausência de tentativa prévia de solução administrativa da controvérsia; 3) defende a regularidade da contratação dos seguros; 4) sustenta que não há valores a serem restituídos; 4) argumenta que, na hipótese de manutenção da sentença, deve ser realizada a compensação de valores e observadas as disposições da Lei n. 14.905/2024 quanto aos consectários legais; 5) requer a redução dos honorários advocatícios fixados a título de sucumbência (49.1).
Apresentadas contrarrazões (58.1 e 69.1), os autos ascenderam a este egrégio .
Dito isso, passa-se à análise dos recursos.
1. Apelação cível interposta pela instituição financeira
1.1 Impugnação à justiça gratuita
Inicialmente, observa-se que a instituição financeira apresentou impugnação à concessão do benefício à parte autora, contudo, limitou-se a formular alegações genéricas e desacompanhadas de qualquer elemento probatório.
Por outro lado, os documentos juntados aos autos pela autora demonstram sua condição de hipossuficiência, sendo oportuno destacar que a comprovação de miserabilidade não é requisito para a obtenção da gratuidade da justiça, conforme entendimento consolidado (Agravo de Instrumento n. 5058571-98.2021.8.24.0000/SC, rel. Des. Saul Steil).
Assim, diante da ausência de documentação apta a fundamentar a impugnação, impõe-se a manutenção do benefício concedido à parte autora.
1.2 Interesse de agir
Sustenta a recorrente que a parte autora deixou de tentar solucionar extrajudicialmente sua demanda, arrastando a ação ao judiciário injustificadamente.
Pois bem. Destaca-se que a Constituição Federal dispõe, no art. 5º, inciso XXXV, que "a lei não excluirá da apreciação do Acerca do assunto, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery lecionam:
[...] existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático. Verifica-se o interesse processual quando o direito tiver sido ameaçado ou efetivamente violado" (Código de Processo Civil Comentado. 12. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 607).
Ademais, no presente caso, além do feito já ter sido devidamente instruído, percebe-se que a pretensão inaugural foi contestada pelo banco (Evento 19), restando caracterizada a pretensão resistida que evidencia o interesse de agir.
Não bastasse, houve o conhecimento da lide pelo Juízo de origem, tendo sido exaurida a primeira instância com o devido pronunciamento judicial de mérito.
Vale registrar, ainda, que a relação entre as partes é de natureza consumerista, devendo ser analisado sob a égide do Código de Defesa do Consumidor. O referido Diploma é claro ao estabelecer que a proteção judicial é direito básico do hipossuficiente, independente da eventual utilização das vias administrativas:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
[...]
VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados.
Em situações semelhantes, esta Corte decidiu:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DEDUZIDOS NA EXORDIAL. INCONFORMISMO DA CONSUMIDORA.
TESES VERTIDAS EM CONTRARRAZÕES
[...]
AVENTADA AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. PREFACIAL REPELIDA. CONDIÇÕES DA AÇÃO QUE DEVEM SER VERIFICADAS EM COGNIÇÃO SUMÁRIA QUANDO DA ANÁLISE DA PETIÇÃO INICIAL, CONFORME TEORIA DA ASSERÇÃO ADOTADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MECANISMOS EXTRAJUDICIAIS DE COMPOSIÇÃO DE CONFLITOS QUE NÃO PODEM SER IMPOSTOS AO CONSUMIDOR. PRESCINDIBILIDADE DO EXAURIMENTO DAS VIAS ADMINISTRATIVAS. ART. 6º, VII, DO CÓDIGO CONSUMERISTA E ART. 5º, XXXV, DA CARTA PRIMAVERA QUE SE IMPÕEM, SOB PENA DE VIOLAR OS PRINCÍPIOS DO ACESSO À JUSTIÇA E DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO.
[...]
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5090125-69.2024.8.24.0930, do , rel. José Carlos Carstens Kohler, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 05-08-2025)
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES.
I - PRELIMINARES EM CONTRARRAZÕES DO RÉU
[...]
2 - ALEGAÇÃO DE CARÊNCIA DE AÇÃO, PELA AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. NÃO ACOLHIMENTO. DESNECESSIDADE DE PRÉVIO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. PRETENSÃO RESISTIDA PELO BANCO. PRELIMINAR AFASTADA.
[...]
RECURSO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PROVIDO.
RECURSO DA PARTE RÉ CONHECIDO EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5025308-30.2023.8.24.0930, do , rel. Dinart Francisco Machado, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 30-01-2025)
E, de minha relatoria:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATOS VINCULADOS À CONTA CORRENTE. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA REQUERIDA.
FALTA DE INTERESSE DE AGIR. TESE ARREDADA. INCABÍVEL IMPOR AO AUTOR O PRÉVIO ESGOTAMENTO DAS VIAS ADMINISTRATIVAS. ALÉM DISSO, DEMANDA QUE BUSCA A REVISÃO CONTRATUAL, E NÃO A SIMPLES EXIBIÇÃO DAS AVENÇAS. INTERESSE DE AGIR BEM CONFIGURADO.
[...]
(Apelação Cível 5002721-28.2021.8.24.0075, Rel. Desa. Soraya Nunes Lins, j. 04-04-2024).
A par de tais considerações, tem-se a prescindibilidade do exaurimento da via administrativa, bem como a consequente impossibilidade do reconhecimento da aventada ausência de interesse de agir, sob pena de violar os princípios do acesso à justiça e da inafastabilidade da jurisdição.
Logo, bem configurado está o interesse de agir.
1.3 Seguros
A instituição financeira defende a legalidade dos seguros, tendo em vista que contratados pela autora de forma facultativa.
Acerca da abusividade da cláusula que prevê a cobrança do seguro, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp n. 1.639.320/SP, afeto ao rito dos recursos repetitivos, firmou a seguinte tese:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 972/STJ. DIREITO BANCÁRIO. DESPESA DE PRÉ-GRAVAME. VALIDADE NOS CONTRATOS CELEBRADOS ATÉ 25/02/2011. SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. VENDA CASADA. RESTRIÇÃO À ESCOLHA DA SEGURADORA. ANALOGIA COM O ENTENDIMENTO DA SÚMULA 473/STJ. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. NÃO OCORRÊNCIA. ENCARGOS ACESSÓRIOS. 1.
DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA: Contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das relações de consumo. 2. TESES FIXADAS PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 2.1 - Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da despesa com o registro do pré-gravame, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula pactuada no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva .
2.2 - Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada.
2.3 - A abusividade de encargos acessórios do contrato não descaracteriza a mora. 3. CASO CONCRETO.
3.1. Aplicação da tese 2.3 ao caso concreto, mantendo-se a procedência da ação de reintegração de posse do bem arrendado.
4. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.
(REsp n. 1.639.320/SP, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, julgado em 12/12/2018, DJe de 17/12/2018 - grifou-se).
Tendo por norte tais premissas, portanto, para que não reste configurada "venda casada", necessário que seja assegurado ao consumidor a liberdade de contratação.
Analisando a documentação acostada, observa-se que, nos contratos, há cláusula expressa prevendo a possibilidade de cobrança do seguro:
8. SEGURO PRESTAMISTA: O CREDOR disponibiliza ao EMITENTE, integrante do Grupo Segurável, a oferta do Microsseguro Prestamista. Para aceitá-la o EMITENTE deve manifestar a opção “sim” no campo próprio ou “não” caso não deseje contratar. Na hipótese de contratação do Microsseguro Prestamista pelo EMITENTE, integrante do Grupo Segurável, ao assinar a CCB, declara para todos os fins de direito que, teve o acesso prévio, ciência e concorda integralmente com os termos das Condições Gerais e Especiais do Microsseguro contratado, e autoriza, o CREDOR a divulgar as informações constantes desta Cédula de Crédito Bancário (CCB), bem como cópia da mesma à Seguradora. (19.7, 19.8 e 19.9)
Além disso, há termo de adesão em apartado aos contratos, com as especificações da contratação (19.10, 19.11 e 19.12).
À vista disso, entende-se que a adesão aos seguros foi uma opção da consumidora, de modo que não há abusividade na cobrança do encargo.
Nesse contexto, colhem-se precedentes desta Egrégia Quinta Câmara de Direito Comercial que versam, inclusive, sobre a recorrente Facta Financeira S.A. Crédito, Financiamento e Investimento: Apelação Cível n. 5127790-22.2024.8.24.0930, de minha relatoria, julgada em 28/8/2025; e Apelação Cível n. 5113203-92.2024.8.24.0930, sob relatoria do Desembargador Márcio Rocha Cardoso, julgada em 14/4/2025.
Feitas tais considerações, a sentença deve ser reformada, para reconhecer a validade da contratação dos seguros.
2. Apelação cível interposta pela autora
Considerando o desfecho do julgamento da apelação cível apresentada pela instituição financeira — que resultou na improcedência da demanda —, torna-se prejudicada a análise do recurso interposto pela autora.
3. Ônus da sucumbência
Em razão do acolhimento parcial do recurso da parte requerida, impõe-se a redistribuição dos encargos sucumbenciais, cabendo à autora o pagamento integral das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais permanecem no valor originalmente fixado na sentença. Ressalta-se que a exigibilidade dessas verbas está suspensa, em virtude da concessão do benefício da justiça gratuita à autora (11.1).
4. Conclusão
Ante o exposto, com fundamento no art. 932 do CPC c/c art. 132 do RITJSC, dou parcial provimento ao recurso interposto pela instituição financeira, para reconhecer a validade da contratação dos seguros; julgo prejudicado o exame do recurso interposto pela autora; e redistribuo os ônus da sucumbência, nos termos acima referidos.
Intimem-se.
Transitada em julgado, devolvam-se os autos à origem.
assinado por SORAYA NUNES LINS, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7077249v29 e do código CRC 8c4e7d2d.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SORAYA NUNES LINS
Data e Hora: 14/11/2025, às 07:34:19
5005979-29.2024.8.24.0079 7077249 .V29
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 08:52:50.
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