AGRAVO DE INSTRUMENTO – AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL FIRMADO COM INCORPORADORA. TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA PARA AUTORIZAR O DEPÓSITO JUDICIAL DAS PARCELAS MENSAIS TIDAS COMO INCONTROVERSAS E SUSPENDER OS EFEITOS DA MORA. REVOGAÇÃO POSTERIOR DA MEDIDA LIMINAR SEM FUNDAMENTAÇÃO ESPECÍFICA. AUSÊNCIA DE ENFRENTAMENTO DOS ELEMENTOS JÁ ANALISADOS NA DECISÃO ORIGINÁRIA. QUEBRA DE COERÊNCIA DECISÓRIA. VIOLAÇÃO AO ART. 489, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PROBABILIDADE DO DIREITO DEMONSTRADA POR MEIO DE LAUDO CONTÁBIL PARTICULAR. PLAUSIBILIDADE DA TESE DE ILEGALIDADE DA ADOÇÃO DA TABELA PRICE POR INCORPORADORA NÃO INTEGRANTE DO SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO. PRECEDENTES DO TJSC. RISCO DE DANO GRAVE CONFIGURADO DIANTE DA POSSIBILIDADE DE RESCISÃO CONTRATUAL, NEGATIVAÇÃO E VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA. REQUISITOS DO ART. 995, PARÁGRAFO ÚNICO, CUMPRIDOS. ...
(TJSC; Processo nº 5091501-33.2025.8.24.0000; Recurso: Agravo de Instrumento; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7051706 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Agravo de Instrumento Nº 5091501-33.2025.8.24.0000/SC
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de Agravo de Instrumento, interposto por FRECHAL CONSTRUÇÕES E INCORPORAÇÕES LTDA, contra a decisão proferida pelo juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Blumenau que, nos autos da "ação revisional de contrato c/c pedido de depósito judicial de parcela incontroversa" n. 5030941-04.2025.8.24.0008, deferiu em parte a tutela provisória de urgência para autorizar o depósito em juízo das parcelas vincendas, conforme valores apurados no parecer técnico e o depósito em juízo do valor integral das parcelas em atraso, conforme apurado no parecer técnico (evento 17, DESPADEC1).
A parte agravante requer a concessão do efeito suspensivo e, ao final, a procedência do recurso para reformar a decisão recorrida.
É o relatório essencial.
DECIDO.
Com efeito, in casu, sabe-se que, para a concessão do efeito suspensivo ao presente agravo de instrumento, faz-se necessária a comprovação de dois requisitos, quais sejam, o risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação e a probabilidade de provimento do recurso, conforme estabelece o parágrafo único do art. 995 do CPC, in verbis:
Art. 995. Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso.
Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso.
Da leitura do artigo, observa-se que a simples ausência de comprovação de apenas um dos requisitos, já impede a concessão do efeito suspensivo, pois os pressupostos são cumulativos.
Insurge-se a parte recorrente contra decisão do evento evento 17, DESPADEC1 da origem, alegando nas razões recursais, em apertada síntese, a) o incontroverso inadimplemento contratual dos Agravados desde a parcela vencida em 02/2025; b) inexistência do perigo de dano, considerando o longo período de pagamento regular (08/08/2016 até 15/02/2025) sem qualquer insurgência; c) inexistência da verossimilhança das alegações, face à fundamentação da decisão em parecer técnico unilateral; d) possibilidade de compensação posterior de valores; e) encontra-se sem receber sua contraprestação pela relação contratual existente com os agravados, os quais detêm a posse do imóvel sem nada pagar.
Razão não lhe assiste, por ora.
Na espécie, os agravados ajuizou a ação de revisão de contrato sustentando, em suma, que firmaram com a ré/agravante "instrumento particular de promessa de compra e venda n.° 7715 com alienação fiduciária" referente ao apartamento n° 2155, do Edifício Bruner, do empreendimento Piaget Residencial, localizado na cidade de Blumenau/SC, bem como da garagem n. 54.
Informou que há flagrante ilegalidade no valor cobrado pela ré, pois os juros estão sendo capitalizados de forma composta, sendo evidente a utilização da Tabela Price para a amortização do saldo devedor, o que é abusivo.
E, para comprovar o alegado, acostaram aos autos parecer técnico extrajudicial (evento 1, PARECER11), elaborado por economista inscrito sob o n. 3277 do Corecon/SC, no qual constou a utilização indevida da Tabela Price.
É cediço que o ordenamento jurídico pátrio, em regra, veda a prática do anatocismo, o que foi, inclusive, sumulado pelo Supremo Tribunal Federal que, mediante a edição do Enunciado n. 121, expressamente consignou:
"A contagem de juros sobre juros é vedada nos contratos de compra e venda de imóvel financiado diretamente com a construtora, ainda que expressamente convencionada".
Embora se admita a aplicação dos juros compostos em circunstâncias previamente estabelecidas e excepcionais - como ocorre na hipótese da Súmula 93 do STJ (cédulas de crédito rural, comercial e industrial) e nos contratos imobiliários cujo financiador integre o Sistema Financeiro da Habitação - SFH (Lei 4.380/1964) ou o Sistema de Financiamento Imobiliário - SFI (Lei 9.514/1997) - a hipótese dos autos a elas não se amolda, mesmo sopesadas as alterações trazidas pela Lei n. 10.931/04.
Isso porque as incorporadoras/construtoras não se inserem no rol de operadores do SFI - Sistema Financeiro Imobiliário e, ainda que alienem seus imóveis mediante a concessão direta do financiamento dos valores necessários ao adimplemento do preço, não se confundem com as instituições financeiras e securitizadoras a quem a lei confere tratamento especial. Nesse contexto, portanto, se lhes aplica a regra geral no sentido de vedar a cobrança de juros compostos.
LUIZ ANTÔNIO SCAVONE JÚNIOR, nos ensina que:
"A Tabela Price - como é conhecido o sistema francês de amortização - pode ser definida como o sistema em que, a partir do conceito de juros compostos (juros de juros), elabora-se um plano de amortização em parcelas periódicas, iguais e sucessivas, considerado o termo vencido. Nesse caso, as parcelas compor-se-ão de um valor referente aos juros, calculado sobre o saldo devedor amortizado, e outro referente à própria amortização. Trata-se de juros compostos na exata medida em que, sobre o saldo amortizado, é calculado o novo saldo, com base nos juros sobre aqueles aplicados, e, sobre este novo saldo amortizado, mais uma vez os juros e assim por diante. No caso de tabela Price, por definição, os juros são compostos (juros sobre juros). Temos, portanto, sistema de amortização francês e juros, quanto à capitalização, classificados como compostos (juros sobre juros)" (Os Contratos Imobiliários e a Previsão de Aplicação da Tabela Price - Anatocismo. Revista Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 28, p. 131-132, grifou-se).
Sobre a matéria, já decidiu este egrégio Tribunal:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL FIRMADO COM INCORPORADORA. TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA PARA AUTORIZAR O DEPÓSITO JUDICIAL DAS PARCELAS MENSAIS TIDAS COMO INCONTROVERSAS E SUSPENDER OS EFEITOS DA MORA. REVOGAÇÃO POSTERIOR DA MEDIDA LIMINAR SEM FUNDAMENTAÇÃO ESPECÍFICA. AUSÊNCIA DE ENFRENTAMENTO DOS ELEMENTOS JÁ ANALISADOS NA DECISÃO ORIGINÁRIA. QUEBRA DE COERÊNCIA DECISÓRIA. VIOLAÇÃO AO ART. 489, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PROBABILIDADE DO DIREITO DEMONSTRADA POR MEIO DE LAUDO CONTÁBIL PARTICULAR. PLAUSIBILIDADE DA TESE DE ILEGALIDADE DA ADOÇÃO DA TABELA PRICE POR INCORPORADORA NÃO INTEGRANTE DO SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO. PRECEDENTES DO TJSC. RISCO DE DANO GRAVE CONFIGURADO DIANTE DA POSSIBILIDADE DE RESCISÃO CONTRATUAL, NEGATIVAÇÃO E VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA. REQUISITOS DO ART. 995, PARÁGRAFO ÚNICO, CUMPRIDOS. RESTABELECIMENTO DA TUTELA ANTERIORMENTE CONCEDIDA. RECURSO PROVIDO. (TJSC, AI 5026230-77.2025.8.24.0000, 1ª Câmara de Direito Civil, Relator para Acórdão GUSTAVO HENRIQUE ARACHESKI, julgado em 28/08/2025)
Desse modo, ainda que em sede de cognição sumária, inegável a probabilidade do direito perseguido pelos autores, já que evidenciada a abusividade perpetrada na negociação havida entre as partes, ante o forte indício de utilização da Tabela Price como forma de amortização do financiamento contratado junto à ré. E, o perigo de dano reside no fato das parcelas serem cobradas mês a mês, o que poderá acarretar eventual rescisão de contrato ante o inadimplemento dos demandantes.
Portanto, evidenciada nos autos a presença cumulativa dos requisitos do art. 300, caput, do CPC, justifica-se a consignação em juízo dos valores que entendem os autores incontroversos, inclusive, para fins de obstar a agravada de protestar ou inserir o nome destes, quanto ao saldo remanescente, nos cadastros de proteção ao crédito, ao menos até instalado o contraditório, quando o magistrado singular poderá rever a matéria de acordo com as demais provas que vierem a ser produzidas nos autos.
Por tais razões, admite-se o processamento do agravo na sua forma de instrumento e, nos termos do art. 995, parágrafo único, c/c art. 1.019, inciso I, ambos do CPC/2015, indefere-se o efeito suspensivo almejado.
Comunique-se ao MM. Juízo a quo.
Intime-se a parte agravada, para, querendo, apresentar contrarrazões, consoante disposto no art. 1.019, II, do CPC.
Publique-se.
Intime-se.
assinado por CLÁUDIA LAMBERT DE FARIA, Diretora Judiciária, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7051706v5 e do código CRC 2e9b1304.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA LAMBERT DE FARIA
Data e Hora: 13/11/2025, às 13:27:03
5091501-33.2025.8.24.0000 7051706 .V5
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 09:00:04.
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