RECURSO ESPECIAL – Documento:7083558 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL EM Apelação Nº 0301237-73.2017.8.24.0125/SC DESPACHO/DECISÃO M. D. L. F. interpôs recurso especial, com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal (evento 91, RECESPEC1). O apelo visa reformar acórdão proferido pela 6ª Câmara de Direito Civil, assim resumido (evento 51, ACOR2): DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÕES DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO E EMBARGOS À EXECUÇÃO. IRRESIGNAÇÃO DOS REQUERIDOS NAQUELE E DA EMBARGANTE NESTE. VALOR RETIDO PELA CONSTRUTORA A TÍTULO DE VERBA RESCISÓRIA QUE NÃO PODE SER CUMULADO COM PERDAS E DANOS. VALOR DE EXPRESSIVA MONTA. IMPROCEDÊNCIA DA CONSIGNAÇÃO. CESSÃO DE CRÉDITO REFERENTE ÀS NOTAS PROMISSÓRIAS CONSIDERADA NULA. ILEGITIMIDADE DA CESSIONÁRIA PARA AJUIZAR EXECUÇÃO. EMBARGOS À EXECUÇÃO PROCEDENTES COM CONSEQUENTE ENTINÇÃO DA EXECUÇÃO. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔN...
(TJSC; Processo nº 0301237-73.2017.8.24.0125; Recurso: RECURSO ESPECIAL; Relator: ; Órgão julgador: Turma, j. em 13-12-2021).; Data do Julgamento: 15 de setembro de 2016)
Texto completo da decisão
Documento:7083558 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RECURSO ESPECIAL EM Apelação Nº 0301237-73.2017.8.24.0125/SC
DESPACHO/DECISÃO
M. D. L. F. interpôs recurso especial, com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal (evento 91, RECESPEC1).
O apelo visa reformar acórdão proferido pela 6ª Câmara de Direito Civil, assim resumido (evento 51, ACOR2):
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÕES DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO E EMBARGOS À EXECUÇÃO. IRRESIGNAÇÃO DOS REQUERIDOS NAQUELE E DA EMBARGANTE NESTE. VALOR RETIDO PELA CONSTRUTORA A TÍTULO DE VERBA RESCISÓRIA QUE NÃO PODE SER CUMULADO COM PERDAS E DANOS. VALOR DE EXPRESSIVA MONTA. IMPROCEDÊNCIA DA CONSIGNAÇÃO. CESSÃO DE CRÉDITO REFERENTE ÀS NOTAS PROMISSÓRIAS CONSIDERADA NULA. ILEGITIMIDADE DA CESSIONÁRIA PARA AJUIZAR EXECUÇÃO. EMBARGOS À EXECUÇÃO PROCEDENTES COM CONSEQUENTE ENTINÇÃO DA EXECUÇÃO. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. INVIÁVEL A FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS.
I. CASO EM EXAME: Ação de consignação em pagamento c/c declaratória de inexigibilidade com pedido de tutela de urgência, ajuizada por construtora contra os promissários compradores, visando a consignação de valores e a declaração de inexigibilidade de notas promissórias, em razão de avarias no imóvel que pretendem deduzir dos valores devidos. Embargos à execução opostos pela construtora contra a cessionária de crédito, alegando nulidade da cessão de crédito.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: A questão em discussão consiste em determinar: (i) a responsabilidade pelos danos no imóvel após a entrega das chaves; (ii) se o valor retido pela construtora a título de verba rescisória pode ser cumulado com perdas e danos; (iii) a validade da cessão de crédito realizada entre os promissários compradores e a cessionária.
III. RAZÕES DE DECIDIR: (iii) A retenção de valores pela construtora, a título de indenização, já compreende os reparos necessários no imóvel, conforme previsto no contrato de rescisão. (iv) A cessão de crédito foi considerada simulada, sendo nula, devido à inconsistência das alegações e à ausência de tradição dos títulos originais.
IV. DISPOSITIVO: Recurso conhecido e parcialmente provido. Reformada a sentença para julgar improcedentes os pedidos formulados na ação de consignação em pagamento c/c declaratória de inexigibilidade com pedido de tutela de urgência, com o consequente afastamento da condenação ao pagamento dos danos no imóvel e levantamento da suspensão da exigibilidade das notas promissórias. Mantida a nulidade da cessão de crédito e a extinção da execução. Redistribuição dos ônus de sucumbência. Inviável a fixação de honorários recursais.
Teses de julgamento:
“1. A retenção de valores pela construtora, a título de indenização, já compreende os reparos necessários no imóvel.”
“2. A má-fé na elaboração da "cessão de crédito" enseja a ilicitude do referido instrumento, configurando-se nula de pleno direito."
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (evento 78, RELVOTO1).
Quanto à primeira controvérsia, pelas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, a parte alega violação e interpretação divergente do art. 290 do Código Civil, no que diz respeito à eficácia de cessão de crédito desacompanhada do título.
Quanto à segunda controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte alega violação ao art. 291 do Código Civil, sustentando que a Câmara "tratou a cessão comum como se fosse endosso cambiário e impôs requisito que legalmente não é exigível para a eficácia entre cedente/cessionário e devedor que foi notificado (ou que teve ciência no processo)."
Quanto à terceira controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte alega violação ao art. 371 do Código de Processo Civil, no que tange à carência probatória ao reconhecimento da simulação da cessão de crédito.
Quanto à quarta controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte alega violação ao art. 489, §1º, do Código de Processo Civil, no que concerne à omissão/deficiência de fundamentação acerca de elementos essenciais que conferem validade ao negócio jurídico.
Quanto à quinta controvérsia, no tópico "Sobre a alegação de “simulação” e o erro de direito (limite do reexame factual)", a parte sustenta que "há erro de direito na aplicação do conceito de simulação (art. 167), porque o julgado não demonstrou (às claras e de modo fundamentado) que a conduta revestia-se de elementos que justificassem a aplicação automática da nulidade absoluta, nem confrontou plenamente as provas do instrumento de cessão."
Cumprida a fase do art. 1.030, caput, do Código de Processo Civil.
É o relatório.
Considerando que a exigência de demonstração da relevância das questões federais, nos termos do art. 105, § 2º, da Constituição Federal, ainda carece de regulamentação, e preenchidos os requisitos extrínsecos, passa-se à análise da admissibilidade recursal.
Quanto às primeira e segunda controvérsias, o recurso não comporta admissão pela alínea "a" do permissivo constitucional. Verifica-se que a parte aparentemente não se desincumbiu de demonstrar a impugnação específica ao fundamento do acórdão recorrido, segundo o qual "A má-fé na elaboração da 'cessão de crédito' enseja a ilicitude do referido instrumento, configurando-se nula de pleno direito" (evento 51, ACOR2).
Constata-se que, nas razões recursais, a parte argumenta que "a corte tratou a cessão comum como se fosse endosso cambiário e impôs requisito que legalmente não é exigível para a eficácia entre cedente/cessionário e devedor que foi notificado (ou que teve ciência no processo)" (evento 91, RECESPEC1, p. 3).
No entanto, tal tese, desacompanhada de outros elementos ou referências capazes de confirmá-la, não aparenta ser suficiente para afastar as premissas adotadas pelo acórdão recorrido.
O Superior Tribunal de Justiça tem firme posicionamento segundo o qual a falta de combate a fundamento suficiente para manter o acórdão recorrido justifica a aplicação, por analogia, da Súmula 283 do STF.
Além disso, o apelo especial não reúne condições de ascender à superior instância pela alínea "c" do permissivo constitucional (primeira controvérsia), por força da Súmula 284 do STF, por analogia. A parte recorrente não colacionou nenhum acórdão paradigma, a fim comprovar o dissídio jurisprudencial nos moldes dos arts. 1.029, § 1º, do CPC e 255, § 1º, do RISTJ. Cita-se precedente:
Em relação à admissibilidade do recurso especial pela alínea "c" do permissivo constitucional, conquanto listada, a parte agravante não colaciona qualquer acórdão serviente de paradigma, muito menos realiza o indispensável cotejo analítico entre os julgados, descurando-se das exigências dos arts. 1.029, §1º, do CPC/2015 e 255, §1º, do RISTJ. (AgInt no AREsp n. 1867324/MT, rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. em 13-12-2021).
Quanto à terceira controvérsia, a admissão do apelo especial pela alínea "a" do permissivo constitucional esbarra no veto da Súmula 7 do STJ.
Sustenta a parte recorrente, em síntese, que "o Tribunal de justiça fundamentou a nulidade na “aparente” simulação com base em indícios (proximidade temporal e manifestações processuais) sem enfrentar com clareza e suficiente fundamentação as provas documentais e os argumentos trazidos pela Recorrente (instrumento de cessão, documentos de notificação / atos processuais, prova testemunhal e histórico de negociação" (evento 91, RECESPEC1, p. 4-5).
Contudo, a análise da pretensão deduzida nas razões recursais, que visa desconstituir a conclusão do órgão julgador de que a cessão de crédito realizada entre as partes foi simulada e, portanto, nula, exigiria o revolvimento das premissas fático-probatórias delineadas pela Câmara, nos seguintes termos (evento 51, RELVOTO1):
Em relação ao pleito de reforma da sentença prolatada na ação de execução e embargos à execução, não merecem provimento.
A apelante Maria de Lourdes Pereira alega que firmou contrato de cessão onerosa de contrato particular sobre o crédito contratual, promissória e compensação, para receber de S. D. S. M., seu irmão, e F. M. Machado, valor que estes lhe deviam em decorrência de empréstimo. Entrou com ação de execução para cobrar da apelada as notas promissórias devidas.
A apelada opôs embargos à execução, alegando a simulação do negócio de cessão de crédito entre as partes, sob a alegação de que "o cedente do título que - frisa-se, não tem nenhuma relação processual com este processo e, portanto, sequer é parte legítima para apresentar os respectivos títulos em juízo - os apresentou perante o juízo." Ainda, para corroborar a tese de simulação, alega que o contrato de cessão foi realizado em 15 de setembro de 2016, apenas duas semanas após a distribuição da ação de consignação pela construtora, em 01/09/2016.
Ademais, aduz que a apelante Maria teria pleno conhecimento da controvérsia sobre os títulos de crédito negociados, tanto que o próprio contrato de cessão informa, expressamente, em sua cláusula primeira, § 2°, que a cessionária deveria ingressar com ação judicial, protesto, ou cobrança para receber da empresa devedora.
Houve audiência de instrução, na qual foram ouvidas duas testemunhas e colhido o depoimento pessoal da apelante Maria, cujo teor demonstrou a fragilidade da celebração do contrato de cessão. Colhe-se o trecho da sentença que abordou o depoimento:
Quando questionada sobre sua ligação com Silvio, a embargada disse que trabalharam juntos em determinada época e se viam frequentemente, "mas não tinha nada a ver". Mais adiante, a embargada esclareceu ser irmã de Silvio. Indagada sobre a sua profissão e sobre a origem do dinheiro emprestado, a embargada informou que atualmente não trabalha, mas à época do empréstimo era "secretária do Candeias", mas sem carteira assinada. Que o dinheiro emprestado é decorrente de economias da embargada e do marido, mas que ambos não declaram imposto de renda. Afirmou que os valores, apesar de serem da embargada/cessionária, estariam na posse dos filhos, que então deram, cada um, certa quantia. Assegurou que não fez depósito bancário, mas sim que "deu na mão" o dinheiro a Silvio. Verdade é que as respostas foram evasivas e não lograram esclarecer como se deu o suposto empréstimo.
Não bastante, a embargada disse que emprestou o dinheiro a Silvio em janeiro de 2015: "... como ele tinha esse dinheiro pra receber do Russi, eu emprestei sessenta e um pra ele, depois eu tinha mais um pouco de reserva e ele me pediu novamente, e eu emprestei novamente pra ele, contando com o dinheiro do Russi". Ocorre que, mais uma vez, o depoimento torna-se inconsistente, já que a rescisão do contrato com a Construtora Russi deu-se apenas em abril de 2016 (Evento 1, INF16). Embora tenha justificado que já estava "em negociação de entregar o apartamento", a narrativa, aliada às demais respostas, é frágil.
Demonstrada a inconsistência das alegações da apelante, que sequer soube informar com precisão o valor emprestado para o irmão, aduzindo ainda que o fez em dinheiro, o que causa grande estranhamento por se tratar de quantia significativamente alta, entendo correto o julgamento do juízo a quo quanto à invalidade do negócio jurídico de cessão de crédito.
É de notório conhecimento que os títulos de crédito possuem como características essenciais a autonomia, a literalidade e a cartularidade. Quanto à cartularidade, trata-se da necessidade do documento em mãos, ou seja, é a existência física do título, a cártula.
Diante da necessidade da cessão de crédito estar sempre acompanhada do título original (contrato, cheque, nota promissória), causa também estranhamento o fato de que quem entregou os títulos, no caso as notas promissórias, em juízo, quando solicitado, foi o apelante Sílvio, que, em tese, já havia cedido o crédito para Maria, de modo que não deveria mais estar na posse de tais cártulas.
Corroborando tal entendimento, a testemunha Ricardo afirmou em seu depoimento: que fizeram a proposta de descontar dos valores das promissórias os valores dos orçamentos dos reparos, mas que Sílvio ignorou as propostas; que Sílvio teria dito que se a construtora não o pagasse, passaria as notas para uma amiga e que então seriam obrigados a pagar o valor total na Justiça (evento 46, DOC70).
Diante do exposto, o acervo probatório demonstra que a cessão de crédito realizada entre as partes foi simulada, portanto, nula, de modo que a sentença que reconheceu sua nulidade, reconhecendo a ilegitimidade da apelante Maria para ajuizar a execução e extinguiu a demanda sem resolução do mérito, deve ser mantida no ponto.
Cumpre enfatizar que "o recurso especial não se destina ao rejulgamento da causa, mas à interpretação e uniformização da lei federal, não sendo terceira instância revisora" (AREsp n. 2.637.949/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, j. em 17-12-2024).
Quanto à quarta controvérsia, o apelo excepcional não reúne condições de ascender à superior instância, por força da Súmula 284 do Supremo Tribunal Federal, por analogia, porquanto deficitária sua fundamentação. A parte recorrente não particularizou o inciso do parágrafo primeiro sobre o qual recairia a referida ofensa ao art. 489 do Código de Processo Civil, o que impede a exata compreensão da controvérsia
Decidiu o STJ em caso análogo:
A alegação de ofensa a normas legais sem a individualização precisa e compreensível do dispositivo legal supostamente ofendido, isto é, sem a específica indicação numérica do artigo de lei, parágrafos e incisos e das alíneas, e a citação de passagem de artigos sem a efetiva demonstração da contrariedade de lei federal impedem o conhecimento do recurso especial por deficiência de fundamentação, aplicando-se o disposto na Súmula n. 284 do STF" (AgInt no REsp n. 2.038.626/PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, DJEN de 17-2-2025).
Quanto à quinta controvérsia, mostra-se inviável a abertura da via especial por aplicação da Súmula 284 do STF, por analogia, diante fundamentação deficitária. As razões recursais não indicam, de forma clara e inequívoca, os dispositivos da legislação federal que teriam sido violados ou receberam interpretação divergente pela decisão recorrida.
Cita-se decisão em caso assemelhado:
A fundamentação do recurso especial foi deficiente quanto ao pedido de danos morais, pois não indicou de forma clara os dispositivos legais supostamente violados, atraindo a aplicação da Súmula 284 do Supremo Tribunal Federal. (AgInt no AREsp n. 2.743.125/PE, relª. Ministra Daniela Teixeira, Terceira Turma, j. em 14-4-2025).
Ante o exposto, com fundamento no art. 1.030, V, do Código de Processo Civil, NÃO ADMITO o recurso especial do evento 91, RECESPEC1.
Intimem-se.
assinado por JANICE GOULART GARCIA UBIALLI, 3° Vice-Presidente, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7083558v7 e do código CRC 72ae2f0b.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JANICE GOULART GARCIA UBIALLI
Data e Hora: 14/11/2025, às 11:28:04
0301237-73.2017.8.24.0125 7083558 .V7
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 08:43:30.
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