RECURSO ESPECIAL – Documento:7012178 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5017932-22.2025.8.24.0930/SC RELATOR: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO RELATÓRIO L. C. D. S. interpôs recurso de apelação contra a sentença que julgou procedentes os pedidos contra ela formulados na ação de busca e apreensão, ajuizada por AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. O dispositivo da sentença restou assim redigido (evento 45, SENT1): ANTE O EXPOSTO, confirmo a tutela de urgência e julgo procedentes os pedidos, consolidando a propriedade e a posse plena do veículo descrito na petição inicial nas mãos da parte requerente.
(TJSC; Processo nº 5017932-22.2025.8.24.0930; Recurso: RECURSO ESPECIAL; Relator: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 13 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:7012178 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5017932-22.2025.8.24.0930/SC
RELATOR: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO
RELATÓRIO
L. C. D. S. interpôs recurso de apelação contra a sentença que julgou procedentes os pedidos contra ela formulados na ação de busca e apreensão, ajuizada por AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.
O dispositivo da sentença restou assim redigido (evento 45, SENT1):
ANTE O EXPOSTO, confirmo a tutela de urgência e julgo procedentes os pedidos, consolidando a propriedade e a posse plena do veículo descrito na petição inicial nas mãos da parte requerente.
Condeno a parte ré ao pagamento das custas e dos honorários, estes arbitrados em 15% do valor atualizado da causa (art. 85, § 2º, do CPC), cuja exigibilidade suspendo por força da Justiça Gratuita.
Eventual saldo devedor em favor de alguma das partes, após a alienação extrajudicial do bem, deverá ser perseguido em via autônoma, acompanhada da devida prestação de contas (vide STJ, AgInt no AgInt no AREsp 2195038, Rel. Min. Moura Ribeiro, j. 09/03/2023).
Providencie-se o levantamento de eventuais restrições realizadas pelo Renajud, CNIB, Serasajud ou sistemas similares.
Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se.
Em suas razões recursais (evento 45, SENT1), sustenta a parte apelante, em síntese, a ilegalidade da cobrança do seguro prestamista, por configurar venda casada, além da abusividade dos juros remuneratórios, pugnando pela revisão contratual e aplicação da taxa média de mercado. Argumenta, também, que a cobrança de encargos abusivos descaracteriza a mora, nos termos do Tema 28 do STJ (REsp 1.061.530/RS), sendo desnecessário o depósito do valor incontroverso. Requer, assim, a reforma integral da sentença, com o afastamento da cobrança do seguro, a redução dos juros remuneratórios, a descaracterização da mora e, por conseguinte, a improcedência da ação de busca e apreensão, com devolução do veículo ou indenização equivalente ao valor de tabela FIPE, além da readequação das custas e honorários sucumbenciais.
Sem contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Presentes os requisitos de admissibilidade, conhece-se do recurso.
1 Dos juros remuneratórios
Inicialmente, ressalta-se que está pacificada a questão de que a cobrança de juros remuneratórios superiores a 12% (doze por cento) ao ano por instituições financeiras não constitui abusividade, consoante Súmula 596 do STF, Súmula 382 do STJ e Temas 25 e 26 do STJ.
Ainda, nos termos do Tema 27 do STJ, "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto".
Em complemento, seguem os entendimentos consolidados nos Enunciados ns. I e IV do Grupo de Câmaras de Direito Comercial desta Corte sobre o tema:
I - Nos contratos bancários, com exceção das cédulas de crédito e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12% (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil.
IV - Na aplicação da taxa média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, serão observados os princípios da menor onerosidade ao consumidor, da razoabilidade e da proporcionalidade.(grifou-se)
No que se refere aos juros remuneratórios, este Órgão Julgador possuía entendimento firmado no sentido de não reputar excessiva a taxa de juros contratada quando ligeiramente superior à média de mercado, admitindo-se, para tanto, a variação de até 10% (dez por cento) em relação à taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil para contratos da mesma espécie.
Entretanto, recentemente, este Órgão Fracionário passou a adotar o entendimento de que não se caracteriza como abusiva a taxa de juros quando superior à média de mercado, desde que a variação não ultrapasse o limite de 50% (cinquenta por cento) da taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil para contratos da mesma natureza.
A partir desse limite, entende-se que o consumidor passa a sofrer prejuízo, porquanto submetido à desvantagem exagerada em benefício do fornecedor, devendo a instituição financeira, em linhas gerais, comprovar, de forma cabal e antes da sentença, "entre outros fatores, a situação da economia na época da contratação, o custo da captação dos recursos, o risco envolvido na operação, o relacionamento mantido com o banco e as garantias ofertadas" (STJ, REsp n. 2.009.614/SC, rela. Mina. Nancy Andrighi, j. 27-9-2022), a justificar a manutenção dos percentuais contratados, já que envolvem informações relativas ao seu negócio e, por decorrência, não são habitualmente informadas ao consumidor no momento da contratação.
Quanto à limitação da taxa de juros à média de mercado, no caso em apreço, traz-se o quadro resumo abaixo para sintetizar as taxas de juros remuneratórios pactuadas e as taxas médias de juros praticada pelo mercado, conforme divulgado no sítio do Bacen (https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries), para os respectivos períodos de contratação:
Taxa ContratadaTaxa Média Bacen Evento dos autosInstrumentoData
Contrataçãoao mêsao anoao mêsao anoTipo de operação Bacenevento 1, CONTR559529914812-5-20232,83%39,71%72,08%28,08%operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Aquisição de veículos
Do cotejo dos encargos acima, verifica-se que os juros remuneratórios pactuados superam diminutamente a taxa média do Bacen para o período em questão, estando dentro parâmetro adotado por esta Terceira Câmara de Direito Comercial para aferição da abusividade, de até 50% acima da taxa divulgada pelo Bacen.
Logo, não há falar em abusividade dos juros remuneratórios contratados.
Recurso desprovido no ponto.
2 Do seguro prestamista e da assistência limitada
A respeito do tema, o Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5017932-22.2025.8.24.0930/SC
RELATOR: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE RÉ.
1 - JUROS REMUNERATÓRIOS. POSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DO BACEN, QUANDO CONSTATADA ABUSIVIDADE. CONTRATO QUE APRESENTA JUROS REMUNERATÓRIOS COM TAXAS PACTUADAS EM VARIAÇÃO NÃO CONSIDERAVELMENTE SUPERIOR À TAXA MÉDIA DO BACEN PARA A ESPÉCIE DE OPERAÇÃO NO PERÍODO DA CONTRATAÇÃO, EM CONFORMIDADE COM O ENTENDIMENTO RECENTEMENTE ADOTADO POR ESTE ÓRGÃO JULGADOR. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO NO PONTO.
2 - SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA (PRESTAMISTA) E ASSISTÊNCIA LIMITADA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE LIBERDADE DE CONTRATAÇÃO DO CONSUMIDOR. EXEGESE DO RECURSO ESPECIAL N. 1.639.320/SP (TEMA REPETITIVO 972). VENDA CASADA. RECURSO PROVIDO NO PONTO. RECONHECIMENTO DA ILEGALIDADE QUE, TODAVIA, NÃO ENSEJA A DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA, NOS TERMOS DO TEMA REPETITIVO 28 DO STJ, QUE PRESSUPÕE A EXISTÊNCIA DE ENCARGOS ABUSIVOS NO PERÍODO DA NORMALIDADE (JUROS REMUNERATÓRIOS E/OU DA CAPITALIZAÇÃO DE JUROS).
3 - REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CONSEQUÊNCIA LÓGICA DO RECONHECIMENTO DA ABUSIVIDADE CONTRATUAL. DEVER DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ DE RESTITUIR OS VALORES COBRADOS A MAIOR, NA FORMA SIMPLES, ADMITIDA A COMPENSAÇÃO. ATUALIZAÇÃO DO INDÉBITO QUE DEVE OCORRER: A) ATÉ 29-8-2024, CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC (PROVIMENTO N. 13 DE 24-11-1995, DA CGJ-TJ/SC), A CONTAR DE CADA PAGAMENTO INDEVIDO, ALÉM DE JUROS DE MORA DE 1% (UM POR CENTO) AO MÊS (REDAÇÃO ORIGINÁRIA DO ART. 406 DO CÓDIGO CIVIL E DO ART. 161, § 1º, DO CTN), A CONTAR DA CITAÇÃO; E B) A PARTIR DE 30-8-2024, ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA PELO IPCA E JUROS DE MORA PELA TAXA LEGAL (TAXA SELIC COM A DEDUÇÃO DO IPCA), CONSOANTE ARTS. 389 E 406, § 1°, DO CC, COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N. 14.905/2024. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO NO PONTO, PARA DETERMINAR A REPETIÇÃO NA FORMA SIMPLES.
4 - ÔNUS SUCUMBENCIAL MANTIDO, POIS A PARTE AUTORA DECAIU DE PARTE MÍNIMA DOS PEDIDOS (ART. 86, PARÁGRAFO ÚNICO, CPC/2015). EXIGIBILIDADE QUE DEVE PERMANECER SUSPENSA, NA FORMA DO ART. 98, § 3°, CPC/2015, EM RAZÃO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA CONCEDIDA À PARTE RÉ.
5 - HONORÁRIOS RECURSAIS. PARCIAL PROVIMENTO DO APELO. INAPLICABILIDADE DA MAJORAÇÃO PREVISTA NO ART. 85, § 11, DO CPC/2015.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Câmara de Direito Comercial do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, para: a) reconhecer a abusividade da cobrança do seguro prestamista e de assistência limitada; e b) determinar a repetição/compensação do indébito dessas cobranças na forma simples, a ser atualizado da seguinte forma: b.1) até 29-8-2024, correção monetária pelo INPC, a contar de cada pagamento indevido, além de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação; e b.2) a partir de 30-8-2024, passa a incidir correção monetária pelo IPCA e juros de mora pela taxa legal (SELIC com a dedução do IPCA), consoante arts. 389 e 406, § 1°, do CC, com as alterações introduzidas pela Lei n. 14.905/2024. Custas legais, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por DINART FRANCISCO MACHADO, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7012179v7 e do código CRC 756ed652.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): DINART FRANCISCO MACHADO
Data e Hora: 14/11/2025, às 10:06:28
5017932-22.2025.8.24.0930 7012179 .V7
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Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 13/11/2025
Apelação Nº 5017932-22.2025.8.24.0930/SC
RELATOR: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO
PRESIDENTE: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO
PROCURADOR(A): VANIA AUGUSTA CELLA PIAZZA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 13/11/2025, na sequência 180, disponibilizada no DJe de 27/10/2025.
Certifico que a 3ª Câmara de Direito Comercial, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª CÂMARA DE DIREITO COMERCIAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, PARA: A) RECONHECER A ABUSIVIDADE DA COBRANÇA DO SEGURO PRESTAMISTA E DE ASSISTÊNCIA LIMITADA; E B) DETERMINAR A REPETIÇÃO/COMPENSAÇÃO DO INDÉBITO DESSAS COBRANÇAS NA FORMA SIMPLES, A SER ATUALIZADO DA SEGUINTE FORMA: B.1) ATÉ 29-8-2024, CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC, A CONTAR DE CADA PAGAMENTO INDEVIDO, ALÉM DE JUROS DE MORA DE 1% (UM POR CENTO) AO MÊS, A CONTAR DA CITAÇÃO; E B.2) A PARTIR DE 30-8-2024, PASSA A INCIDIR CORREÇÃO MONETÁRIA PELO IPCA E JUROS DE MORA PELA TAXA LEGAL (SELIC COM A DEDUÇÃO DO IPCA), CONSOANTE ARTS. 389 E 406, § 1°, DO CC, COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N. 14.905/2024. CUSTAS LEGAIS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO
Votante: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO
Votante: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI
Votante: Desembargador GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA
ANTONIO SHIGUEO NAKAZIMA JUNIOR
Secretário
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