RECURSO ESPECIAL – Documento:7083065 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL EM Agravo de Instrumento Nº 5023149-23.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO TALKANDWRITE INFORMÁTICA LTDA. interpôs recurso especial, com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal (evento 77, RECESPEC1). O apelo visa reformar acórdão proferido pela 1ª Câmara de Direito Civil, assim resumido (evento 46, ACOR2): AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. VEÍCULO AUTOMOTOR REGISTRADO EM NOME DA PESSOA JURÍDICA RECORRENTE. INDEFERIMENTO DE TUTELA ANTECIPADA. RECORRIDO QUE É SÓCIO E EX-ADMINISTRADOR DA PESSOA JURÍDICA. POSSE DECORRENTE DE RELAÇÃO SOCIETÁRIA AINDA VIGENTE. INEXISTÊNCIA DE PROVA DE QUE A POSSE EXERCIDA PELO AGRAVADO SEJA ILEGÍTIMA OU TENHA SE DADO MEDIANTE VIOLÊNCIA, CLANDESTINIDADE OU ABUSO DE CONFIANÇA, ELEMENTOS ESSENCIAIS À CARACTERIZAÇÃO DO ESBULHO POSSESSÓRIO (CP...
(TJSC; Processo nº 5023149-23.2025.8.24.0000; Recurso: RECURSO ESPECIAL; Relator: ; Órgão julgador: Turma, j. em 11-12-2023).; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7083065 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RECURSO ESPECIAL EM Agravo de Instrumento Nº 5023149-23.2025.8.24.0000/SC
DESPACHO/DECISÃO
TALKANDWRITE INFORMÁTICA LTDA. interpôs recurso especial, com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal (evento 77, RECESPEC1).
O apelo visa reformar acórdão proferido pela 1ª Câmara de Direito Civil, assim resumido (evento 46, ACOR2):
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. VEÍCULO AUTOMOTOR REGISTRADO EM NOME DA PESSOA JURÍDICA RECORRENTE. INDEFERIMENTO DE TUTELA ANTECIPADA. RECORRIDO QUE É SÓCIO E EX-ADMINISTRADOR DA PESSOA JURÍDICA. POSSE DECORRENTE DE RELAÇÃO SOCIETÁRIA AINDA VIGENTE. INEXISTÊNCIA DE PROVA DE QUE A POSSE EXERCIDA PELO AGRAVADO SEJA ILEGÍTIMA OU TENHA SE DADO MEDIANTE VIOLÊNCIA, CLANDESTINIDADE OU ABUSO DE CONFIANÇA, ELEMENTOS ESSENCIAIS À CARACTERIZAÇÃO DO ESBULHO POSSESSÓRIO (CPC, ART. 561, II). ADEMAIS, ALEGAÇÃO DE ACORDO SOCIETÁRIO VERBAL ENTRE OS SÓCIOS PARA COMPRA DE VEÍCULOS. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA, SENDO INCABÍVEL A CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR EM SEDE DE COGNIÇÃO SUMÁRIA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PREJUDICADOS.
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (evento 67, ACOR2).
Quanto à primeira controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte alega violação ao art. 1.022, I e II, do Código de Processo Civil, no que se refere à existência de contradição e omissão no acórdão, apontando incompatibilidade lógica entre as premissas reconhecidas (propriedade, destituição, notificação, recusa) e a conclusão pela inexistência de esbulho, além de omissão acerca da aplicação dos limites legais dos direitos patrimoniais dos sócios.
Quanto à segunda controvérsia, pelas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, a parte alega violação e interpretação divergente aos arts. 561 e 562 do Código de Processo Civil, no que concerne à presença dos requisitos para o deferimento da liminar de reintegração de posse, afirmando que o acórdão reconheceu todos os elementos necessários (propriedade, posse, esbulho e data), mas contraditoriamente concluiu pela inexistência de esbulho possessório.
Quanto à terceira controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte alega violação ao art. 373, II, do Código de Processo Civil, no tocante à distribuição do ônus da prova, afirmando que o acórdão inverteu indevidamente o ônus ao exigir que a recorrente comprovasse a inexistência de acordo verbal (fato negativo), quando caberia ao recorrido comprovar tal fato modificativo do direito.
Quanto à quarta controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte alega violação aos arts. 1.006, 1.007, 1.017, 1.200, 1.228 e 1.231 do Código Civil, relativamente à caracterização do esbulho possessório e aos direitos do sócio minoritário, argumentando que a mera condição de sócio não confere o direito de uso de bens sociais, especialmente após destituição do cargo de administrador e recusa expressa de devolução.
Quanto à quinta controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte limitou-se a suscitar violação aos arts. 1.006 do Código Civil e 489, §1º, IV, do Código de Processo Civil, sem identificar a questão controvertida.
Cumprida a fase do art. 1.030, caput, do Código de Processo Civil.
É o relatório.
Considerando que a exigência de demonstração da relevância das questões federais, nos termos do art. 105, § 2º, da Constituição Federal, ainda carece de regulamentação, e preenchidos os requisitos extrínsecos, passa-se à análise da admissibilidade recursal.
Quanto à primeira controvérsia, o apelo nobre não merece ser admitido. Em juízo preliminar de admissibilidade, verifica-se que o acórdão recorrido enfrentou adequadamente os pontos necessários à resolução da controvérsia, não se constatando, neste exame inicial, omissão, negativa de prestação jurisdicional ou deficiência de fundamentação. Dessa forma, a pretensão recursal, aparentemente, dirige-se ao reexame da matéria já apreciada.
Observa-se que a Câmara analisou expressamente as teses da parte recorrente, concluindo que: a) não há contradição no julgado, pois o voto destacou que, embora comprovada a titularidade registral do veículo pela recorrente e a notificação de restituição, a posse exercida pelo recorrido decorre de contexto societário ainda vigente, havendo alegação de ajuste entre os sócios quanto ao uso dos bens, de modo que não se vislumbrou, neste momento processual, prova de que a manutenção da posse ocorreu por violência, clandestinidade ou abuso de confiança; b) quanto à questão dos limites dos direitos patrimoniais, o acórdão enfrentou a matéria ao fundamentar que a permanência como sócio e a alegação de acordo verbal entre os sócios criavam controvérsia fática que impedia, naquele momento, o reconhecimento do esbulho; c) no tocante ao ônus da prova, o acórdão não atribuiu expressamente à recorrente o ônus de comprovar fato negativo, mas considerou que as alegações contrapostas geravam necessidade de instrução probatória.
De acordo com o Superior Tribunal de Justiça, "não configura ofensa ao art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015 o fato de o Tribunal de origem, embora sem examinar individualmente cada um dos argumentos suscitados pela parte recorrente, adotar fundamentação contrária à pretensão da parte, suficiente para decidir integralmente a controvérsia" (AgInt no AREsp n. 2.415.071/SP, rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, j. em 11-12-2023).
Quanto à segunda controvérsia, a admissão do presente recurso pelas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional é obstada pelos enunciados das Súmulas 7 do Superior Tribunal de Justiça e 735 do Supremo Tribunal Federal, por analogia.
Assim se afirma porque a conclusão a que chegou a Câmara (manutenção da decisão que indeferiu a tutela de antecipada) está sustentada nos elementos fático-probatórios trazidos ao processo, de sorte que, para se chegar a entendimento diverso, seria indispensável o revolvimento da matéria probatória, o que é vedado na via do recurso especial (Súmula 7/STJ).
Consta do decisório recorrido (evento 46, RELVOTO1):
Donde é possível concluir pela indispensabilidade da demonstração do fumus boni juris e do periculum in mora, para o deferimento imediato da tutela perseguida.
Aliado a isso, como já fundamentado na decisão que indeferiu a tutela recursal, é consabido que para a concessão da medida devem restar configurados os requisitos do arts. 561 e 562 do Código de Ritos (posse, turbação ou esbulho e sua data e continuação ou perda da posse) [...].
[...]
No caso em análise, como já fundamentado na decisão do evento 7, à qual reproduzo a fim de evitar tautologia,
a autora é proprietária do veículo veículo VW/T - Cross TSI, Placa RYM6D88, Renavam 1369692134, Chassi n. 9BWBH6BF5R4040446, que se encontra na posse do réu, ora agravado, o qual foi fazia uso do bem exclusivamente na condição de administrador no exerício do cargo de administrador, o qual foi destituído.
Em razão disso, o réu foi notificado para restituir o veículo, aportando contranotificação datada de 20/12/2024 com a recusa da devolução. Veja-se:
Com efeito, a recorrente consta como proprietária no dossiê do veículo perante o Detran/SC (Evento 1, DOCUMENTACAO9, e1), no entanto, conquanto o recorrido tenha sido destituído do cargo de administrador da empresa, permanece como sócio minoritário da pessoa jurídica (Evento 1, DOCUMENTACAO3, e1), havendo alegação, ainda, que o veículo foi adquirido em nome da pessoa jurídica, mas para uso pessoal, mediante ajuste entre os sócios.
Em contrarrazões o recorrente afirma que "a posse pelo agravado resultou e resulta de decisão consolidada proveniente do exercício regular da administração da sociedade em período pretérito, perdurando até a presente data, na qual o agravado, então gestor da empresa, assim acordou com o seu outro e único sócio, Marcelo Rezende Amaral, naquela oportunidade a aquisição do bem para si (agravado), já com o repasse imediato da posse da concessionária para si (agravado) e autorização para posteriormente transferência da propriedade do bem, conforme se verá durante a instrução do feito. Exatamente como ocorreu com o sócio Marcelo Rezende Amaral quando da aquisição do veículo Jeep Compass." (grifei).
E continua: "A agravante, através da representação de seu sócio Marcelo Rezende Amaral, age contraditoriamente e de má fé, pois durante anos reconheceu a legitimidade do agravado como possuidor e proprietário do bem liƟgioso, sem que nunca qualquer outra pessoa tivesse utilizado tal veículo. E nem poderia ser diferente, pois assim foi ajustado, tanto que ele próprio também procedeu da mesma maneira, adquirindo, através da agravante, o veículo Jeep Compass. Após a súbita tentativa de retirar do agravado todas as prerrogativas de sócio administrador, sem decisão definitiva sobre a dissolução societária ou administrador da empresa, tenta agora alterar decisão anterior da sociedade que conferiu ao agravado a posse e a propriedade sobre referido veículo, caracterizando exercício abusivo de suposto direito."
Ademais, ainda que o recorrente sustente que o veículo foi disponibilizado ao agravado exclusivamente em razão do exercício da administração da sociedade, e que, com a destituição deste cargo, teria ocorrido o esbulho possessório, como corretamente pontuado pelo Juízo de origem, "verifico dos autos que o réu, em que pese ter sido destituído no cargo de administrador, ainda é sócio da empresa (1.3). Além do mais, após notificação do réu, este contranotificou a autora, sob o argumento de não proceder a alegação que o carro é de propriedade daquela. Portanto, denota-se das provas constantes nos autos que não ficou demonstrado satisfatoriamente o esbulho possessório. Isso porque não há, nesta fase processual, provas de que a parte ré tenha se utilizado de violência, clandestinidade ou abuso de confiança, elementos caracterizadores do esbulho."
Diante desse contexto, nesta fase embrionária do processo, não obstante a notificação extrajudicial, não há qualquer elemento probatório que evidencie o uso de violência, clandestinidade ou abuso de confiança por parte do agravado no exercício da posse do bem, razão pela qual não se configura, por ora, o esbulho possessório.
Tal circunstância reforça a necessidade de instrução processual como assinalado pelo Magistrado, sobretudo diante do fato de que a posse exercida pelo agravado decorre de relação societária ainda vigente, havendo alegação de acordo verbal pretérito entre os sócios para aquisição de veículos, ocasião em que o sócio Marcelo Rezende Amaral teria adquirido um automóvel Jeep Compass, supostamente em nome da pessoa jurídica (grifou-se).
Com efeito, "rever a conclusão a respeito do preenchimento dos requisitos da tutela de urgência demandaria revolvimento de fatos e provas, o que encontra óbice na Súmula n. 7/STJ" (AgInt no AREsp n. 2.232.728/MG, rel. Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, j. em 27-11-2023).
Em reforço, cumpre destacar que a Corte Superior, na linha do que dispõe o enunciado da Súmula 735 do STF ("Não cabe recurso extraordinário contra acórdão que defere medida liminar"), entende que a presença ou não dos requisitos para a concessão da medida de urgência (antecipação dos efeitos da tutela ou liminar) não podem ser revistas em grau de recurso especial, diante do caráter provisório da decisão.
Asssim norteia a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
Não se tem aberta a instância especial para a análise da verificação dos requisitos da tutela provisória de urgência, seja porque necessária a reapreciação do contexto fático-probatório dos autos, incidindo o Enunciado n. 7/STJ, seja em virtude da natureza provisória do provimento judicial (Súmula 735/STF). (AgInt no AREsp n. 2.672.309/RJ, rel. Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, j. em 17-3-2025).
Quanto à terceira controvérsia, não se mostra viável a admissão do apelo nobre pela alínea "a" do permissivo constitucional. Constata-se que o dispositivo indicado não foi objeto de apreciação pela instância ordinária, mesmo após a oposição de embargos de declaração.
Nesse contexto, revela-se a ausência de prequestionamento, na medida em que o conteúdo normativo dos preceitos legais tidos por violados não foi enfrentado pelo acórdão recorrido, o que atrai, por analogia, os óbices das Súmulas 211 do STJ e 282 do STF.
De acordo com a jurisprudência do STJ, "o prequestionamento é exigência inafastável contida na própria previsão constitucional, impondo-se como um dos principais pressupostos ao conhecimento do recurso especial, inclusive para as matérias de ordem pública" (AgInt no AREsp n. 2.541.737/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. em 24-6-2024).
Quanto à quarta controvérsia, o recurso não comporta admissão pela alínea "a" do permissivo constitucional. Verifica-se que a parte aparentemente não se desincumbiu de demonstrar a impugnação específica ao fundamento do acórdão recorrido, segundo o qual não ficou demonstrado satisfatoriamente o esbulho possessório nesta fase processual, uma vez que não haveria elementos probatórios que evidenciassem o uso de violência, clandestinidade ou abuso de confiança por parte do agravado no exercício da posse do bem, sendo necessária instrução probatória, sobretudo diante do fato de que a posse exercida pelo agravado decorre de relação societária ainda vigente e da alegação de acordo verbal entre os sócios.
Constata-se que, nas razões recursais, a parte argumenta que os direitos patrimoniais do sócio são limitados à participação nos lucros e no acervo social em caso de liquidação, não incluindo o uso de bens sociais para fins pessoais, especialmente quando há discordância dos demais sócios, e que a recusa expressa de devolução após cessação da finalidade do uso configuraria abuso de confiança e esbulho possessório.
No entanto, tal tese, desacompanhada de outros elementos ou referências capazes de confirmá-la, não aparenta ser suficiente para afastar as premissas adotadas pelo acórdão recorrido, de ausência de prova suficiente do esbulho nesta fase processual e na necessidade de instrução probatória para esclarecer a controvérsia fática.
O Superior Tribunal de Justiça tem firme posicionamento segundo o qual a falta de combate a fundamento suficiente para manter o acórdão recorrido justifica a aplicação, por analogia, da Súmula 283 do STF.
Quanto à quinta controvérsia, o apelo especial não merece ser admitido pela alínea "a" do permissivo constitucional, por óbice da Súmula 284 do STF, por analogia, diante da fundamentação deficitária. A parte recorrente teceu alegações genéricas, sem desenvolver argumentos para demonstrar de que forma ocorreu a suscitada violação pela decisão recorrida, o que impossibilita a exata compreensão da controvérsia.
Nesse sentido, extrai-se dos julgados da Corte Superior:
A mera citação de dispositivos de lei federal tidos por violados, desacompanhada de fundamentação clara e objetiva acerca de como teria ocorrido a violação pelo acórdão recorrido, evidencia a deficiência na fundamentação do recurso, a atrair o óbice da Súmula 284 do Supremo Tribunal Federal (AgInt no AREsp n. 685.627/SP, rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, j. em 14-5-2024).
Ante o exposto, com fundamento no art. 1.030, V, do Código de Processo Civil, NÃO ADMITO o recurso especial do evento 77, RECESPEC1.
Intimem-se.
assinado por JANICE GOULART GARCIA UBIALLI, 3° Vice-Presidente, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7083065v15 e do código CRC 193a0412.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JANICE GOULART GARCIA UBIALLI
Data e Hora: 14/11/2025, às 15:06:40
5023149-23.2025.8.24.0000 7083065 .V15
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 08:53:17.
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