RECURSO – Documento:7044466 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5024891-79.2024.8.24.0045/SC RELATOR: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO RELATÓRIO Em atenção aos princípios da economia e da celeridade processual, adoto o relatório da sentença (evento 23 da origem): E. V. A. ajuizou ação de conhecimento, submetida ao procedimento comum, contra UNIÃO BRASILEIRA DE APOSENTADOS DA PREVIDÊNCIA, ambas devidamente qualificadas e representadas no feito. Em suma, alegou que vem sofrendo descontos mensais em seu benefício previdenciário, promovidos por UNIÃO BRASILEIRA DE APOSENTADOS DA PREVIDÊNCIA. Afirmou que jamais autorizou os descontos em seus proventos. Ao final, postulou a declaração de inexistência de relação jurídica entre as partes, a restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente e a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais. Juntou documentos.
(TJSC; Processo nº 5024891-79.2024.8.24.0045; Recurso: Recurso; Relator: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7044466 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5024891-79.2024.8.24.0045/SC
RELATOR: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO
RELATÓRIO
Em atenção aos princípios da economia e da celeridade processual, adoto o relatório da sentença (evento 23 da origem):
E. V. A. ajuizou ação de conhecimento, submetida ao procedimento comum, contra UNIÃO BRASILEIRA DE APOSENTADOS DA PREVIDÊNCIA, ambas devidamente qualificadas e representadas no feito.
Em suma, alegou que vem sofrendo descontos mensais em seu benefício previdenciário, promovidos por UNIÃO BRASILEIRA DE APOSENTADOS DA PREVIDÊNCIA. Afirmou que jamais autorizou os descontos em seus proventos. Ao final, postulou a declaração de inexistência de relação jurídica entre as partes, a restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente e a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais. Juntou documentos.
Regularmente citada, a ré apresentou resposta sob a forma de contestação. Não suscitou preliminares nem prejudiciais do mérito. No mérito, contrapôs-se aos argumentos e pedidos articulados na petição inicial. Requereu a concessão a gratuidade de justiça; a condenação da autora às penas por litigância de má-fé; a improcedência de todos os pedidos elencados na exordial. Juntou documentos.
Houve réplica.
Vieram-me os autos conclusos.
Sentenciando, o Magistrado a quo julgou a lide nos seguintes termos:
Ante o exposto, rejeito os pedidos articulados na petição inicial.
Condeno a autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 15% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2.º do CPC, observada a suspensão de que trata o § 3.º do art. 98 do CPC (EV. 5).
Fica a ré ciente do desejo da autora de não se manter associada, o que basta para justificar a desfiliação.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Após o trânsito em julgado, arquive-se, com as devidas baixas.
Irresignada, a parte autora interpôs recurso de apelação aduzindo que a sentença merece reforma por ter desconsiderado a ausência de comprovação da hipossuficiência da parte ré para concessão da justiça gratuita, bem como por validar contrato firmado mediante vício de consentimento, com cláusulas genéricas e ausência de informações claras sobre os benefícios oferecidos. Requer a revogação da gratuidade de justiça concedida à ré, a condenação ao pagamento das custas e honorários advocatícios, e o reconhecimento da nulidade contratual por falha no dever de informação e prática abusiva. Pleiteia ainda a devolução em dobro dos valores descontados indevidamente, com correção monetária e juros desde cada desconto, conforme jurisprudência do STJ. Requer, por fim, a condenação da ré ao pagamento de danos morais, fixados em R$ 10.000,00, em razão dos prejuízos financeiros e emocionais sofridos pela autora.
É o relatório.
VOTO
Ab initio, o reclamo em voga comporta conhecimento, porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade.
Do apelo
Da preliminar
A parte apelante sustenta, em sede preliminar, o indevido deferimento do benefício da gratuidade da justiça à parte ré, sob o argumento de inexistir comprovação da alegada hipossuficiência econômica.
Inicialmente, é importante destacar que a justiça gratuita é um direito fundamental assegurado pela Constituição Federal e regulamentado pelo Código de Processo Civil. O artigo 98 do CPC dispõe:
Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.
No caso em tela, em que pese os argumentos da requerida sobre a ausência de comprovação da condição de miserabilidade econômica da parte apelada, conforme preceitua o artigo 99, § 2º, do CPC, o ônus de comprovar a capacidade financeira do beneficiário recai sobre a parte impugnante, e não sobre o beneficiário. Ou seja, cabe à Recorrente demonstrar de forma inequívoca que a Recorrida possui condições financeiras suficientes para arcar com as custas do processo sem prejuízo do sustento próprio e familiar.
Ora, "é da parte que impugna a concessão do benefício da gratuidade judicial ao outro litigante o ônus de comprovar com exclusividade que o beneficiário da justiça gratuita conta com condições financeiras suficientes para arcar com as custas do processo e com os honorários advocatícios sem prejuízo do próprio sustento ou do de sua família. Sendo frágeis as provas acostadas, mantém-se o deferimento do benefício, que poderá ser revogado a qualquer momento, desde que comprovada a suficiente capacidade financeira do impugnado" (TJSC, 2ª Cam. Dir. Civ., Rel. Des. Trindade dos Santos, Ap. Civ. n. 2013.088216-5, de Criciúma, j. 13-2-2014).
Ainda, no mesmo sentido:
APELAÇÃO EM AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDENCIA. INCONFORMISMO DA PARTE REQUERIDA.
IMPUGNAÇÃO À JUSTIÇA GRATUITA. AUSÊNCIA DE HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA. INACOLHIMENTO. INEXISTÊNCIA DE PROVA. ÔNUS DO IMPUGNANTE. IMPUGNAÇÃO REJEITADA. PRETENSÃO DE REFORMA DA SENTENÇA PARA JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO DE AFASTAMENTO DA COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA EM CUMULAÇÃO COM OS DEMAIS ENCARGOS MORATÓRIOS. INVIABILIDADE. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA PACTUADA EM CUMULAÇÃO COM JUROS MORATÓRIOS. SENTENÇA MANTIDA NO PONTO. APELO ADESIVO DA AUTORA. ÔNUS SUCUMBENCIAL. PRETENDIDA READEQUAÇÃO PROPORCIONAL DOS ÔNUS ENTRE AS PARTES. PARTE AUTORA QUE SUCUMBIU EM QUASE A TOTALIDADE DE SEUS PEDIDOS. APLICAÇÃO DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 86 DO CPC. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA. ÔNUS SUCUMBENCIAIS DEVIDOS À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ. HONORÁRIOS RECURSAIS CABÍVEIS DIANTE DA SUCUMBÊNCIA DA PARTE AUTORA.
DESCABIMENTO DE HONORÁRIOS RECURSAIS À PARTE RÉ. AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO NA ORIGEM.
RECURSO DA PARTE RÉ CONHECIDO E DESPROVIDO.
RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0000346-14.2013.8.24.0078, do , rel. Andrea Cristina Rodrigues Studer, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 20-04-2023 - grifei).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E DE COBRANÇA E INDENIZATÓRIA. ALEGADA CELEBRAÇÃO DE CONTRATO VERBAL DE COMPRA E VENDA DE TRATOR COM O DEMANDADO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DO AUTOR.
PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA. INDEFERIMENTO POR ESTE RELATOR. RECURSO, POSTERIORMENTE, PREPARADO. PREJUDICADA ANÁLISE DO PEDIDO E DA IMPUGNAÇÃO FEITA EM SEDE DE CONTRARRAZÕES.
MÉRITO. JUNTADA DE DOCUMENTOS NOVOS EM SEDE RECURSAL PELO AUTOR. PRESSUPOSTOS DO ART 435 DO CPC NÃO ATENDIDOS. PRECLUSÃO TEMPORAL VERIFICADA. PROVA, ADEMAIS, IMPRESTÁVEL AO ÊXITO DA DEMANDA. CONTRATO VERBAL REALIZADO ENTRE AS PARTE. AUTOR QUE NÃO LOGROU ÊXITO EM DEMONSTRAR, SEQUER MINIMAMENTE, OS TERMOS DO NEGÓCIO. ÔNUS DA PROVA QUE LHE INCUMBIA (ART. 333, I, DO CPC/73). PEDIDO AFASTADO.
ACORDO PARCIAL HOMOLOGADO NA SENTENÇA. REDISTRIBUIÇÃO DAS VERBAS SUCUMBENCIAIS. IMPOSSIBILIDADE. SUCUMBÊNCIA CORRETAMENTE ATRIBUÍDA AO AUTOR E HONORÁRIOS ESTABELECIDOS EM PERCENTUAL SOBRE O VALOR DOS PEDIDOS REMANESCENTES, DOS QUAIS RESTOU VENCIDO. SENTENÇA MANTIDA.
PRETENDIDO INDEFERIMENTO DA JUSTIÇA GRATUITA CONFERIDA AO RÉU. ANTERIOR IMPUGNAÇÃO À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO QUE FOI REJEITADA PELO JUÍZO DE ORIGEM. NOVOS ARGUMENTOS ATINENTES À CONDIÇÃO FINANCEIRA FAVORÁVEL DO DEMANDADO. INSUBSISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS DE PROVA CONCRETOS PARA A CASSAÇÃO DA BENESSE, ÔNUS QUE COMPETIA À PARTE IMPUGNANTE. MERAS CONJECTURAS INSUFICIENTES PARA REVOGAÇÃO PERSEGUIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO (ART. 85, §11 DO CPC). RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0301708-38.2016.8.24.0024, do , rel. Álvaro Luiz Pereira de Andrade, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 30-03-2023 - grifei).
No caso concreto, embora a parte ré seja formalmente constituída como associação civil sem fins lucrativos e de natureza filantrópica, não há nos autos elementos que demonstrem, de forma inequívoca, sua capacidade financeira a ponto de justificar a revogação da gratuidade da justiça.
Deve-se ter em conta que o simples fato de a entidade atuar em âmbito nacional e auferir receitas oriundas de sua atividade institucional não implica, automaticamente, suficiência econômica para suportar as despesas processuais, notadamente quando sua finalidade estatutária é voltada a fins sociais e assistenciais, sem distribuição de lucros.
Assim, inexistem nos autos quaisquer elementos que afastem a presunção relativa conferida pelo artigo 99, § 3º, do CPC/2015, revelando-se suficientes os documentos já acostados para indicar a hipossuficiência financeira da parte ré.
Por conseguinte, mantém-se o deferimento do benefício da gratuidade da justiça, ressalvando-se a possibilidade de futura revogação, caso sobrevenham provas concretas de alteração da situação econômica da entidade.
Mérito
Compulsando-se o feito originário, extrai-se cuidar de ação declaratória de inexistência de débito cumulada com pedido de indenização por danos morais e materiais, proposta por E. V. A. em face da associação UNIBAP, visando ver reconhecida a nulidade da adesão contratual e obter a restituição dos valores descontados indevidamente de seu benefício previdenciário.
A sentença objurgada, sobre a questão, decidiu pela improcedência dos pedidos iniciais, reconhecendo a validade do contrato e condenando a autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios.
A controvérsia, portanto, cinge-se em averiguar a existência de vício de consentimento na adesão contratual, a falha no dever de informação por parte da ré, e a legalidade dos descontos realizados.
De início, cumpre assinalar que as disposições do Código de Defesa do Consumidor são plenamente aplicáveis às relações firmadas entre o associado e a associação demandada, sobretudo quando esta, ainda que formalmente constituída como pessoa jurídica sem fins lucrativos, atua no mercado mediante contraprestação pecuniária, oferecendo serviços remunerados, a exemplo da intermediação de contratos e de convênios voltados a aposentados e pensionistas.
Nessa perspectiva, a despeito da forma jurídica de associação civil, o vínculo estabelecido entre as partes possui natureza materialmente consumerista, uma vez que o autor figura como destinatário final dos serviços, ao passo que a ré assume a posição de fornecedora, na medida em que disponibiliza serviços mediante pagamento, atraindo a incidência das normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor (arts. 2º e 3º do CDC).
Essa compreensão, que se firmou como orientação desta Câmara, decorre da necessidade de se adequar o regime jurídico das relações entre aposentados e entidades representativas às diretrizes de transparência, boa-fé e equilíbrio contratual próprias do microssistema consumerista. A aparência de vínculo associativo não afasta a realidade econômica da prestação de serviços mediante retribuição financeira.
Neste sentido já decidiu este Tribunal:
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou procedentes os pedidos de declaração de inexistência de relação jurídica, repetição de indébito e indenização por danos morais.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
2. As questões em discussão consistem em saber: (i) se é aplicável o Código de Defesa do Consumidor à relação entre as partes; (ii) se é devida a repetição do indébito; (iii) se houve dano moral indenizável; e (iv) como devem ser distribuídos os ônus sucumbenciais.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A associação sem fins lucrativos pode ser considerada fornecedora por equiparação se desenvolver atividades no mercado de consumo, estando sujeita, neste caso, às normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Precedentes do STJ e desta Câmara.
4. Mantida a restituição na forma simples, conforme modulação de efeitos estabelecida pelo STJ no EAREsp 600663/RS para cobranças realizadas antes de 30/03/2021.
5. Aos casos de desconto indevido de contribuição associativa aplica-se, por analogia, a tese fixada no Tema 25 de IRDR do TJSC, que afasta a presunção de dano moral em casos de desconto indevido em benefício previdenciário decorrente de contrato de empréstimo consignado declarado inexistente. No presente caso, em que o desconto mensal era inferior a 5% do benefício previdenciário recebido, não há falar em danos morais. [...] (TJSC, Apelação n. 5013491-24.2020.8.24.0008, rel. Leone Carlos Martins Junior, Terceira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 12/11/2024).
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou procedentes os pedidos de declaração de inexistência de relação jurídica, repetição de indébito e indenização por danos morais.
2. Fato relevante. Descontos mensais indevidos de R$ 19,08 no benefício previdenciário da autora, realizados pela associação ré durante oito meses.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
3. As questões em discussão consistem em saber: (i) se é aplicável o Código de Defesa do Consumidor à relação entre as partes; (ii) se é devida a repetição do indébito; (iii) se houve dano moral indenizável; e (iv) como devem ser distribuídos os ônus sucumbenciais.
III. RAZÕES DE DECIDIR
4. Aplicabilidade do CDC. A associação ré, embora sem fins lucrativos, é considerada fornecedora por equiparação, pois desenvolve atividades no mercado de consumo, estando sujeita às normas do CDC. [...] (TJSC, Apelação n. 5002104-94.2022.8.24.0055, rel. Giancarlo Bremer Nones, Terceira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 1º/10/2024).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS COM REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DESCONTOS REALIZADOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO POR ASSOCIAÇÃO DE APOSENTADOS (ABRAPPS). RÉ QUE FIGURA COMO FORNECEDORA E AUTORA CONSUMIDORA POR EQUIPARAÇÃO. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DEFENDIDO O NÃO CABIMENTO DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO E SUBSIDIARIAMENTE DA FORMA DOBRADA. ACOLHIMENTO PARCIAL. DEVOLUÇÃO DOS VALORES DESCONTADOS INDEVIDAMENTE QUE SE IMPÕE PARA EVITAR ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. FORMA DE RESTITUIÇÃO. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, QUE MODULOU OS EFEITOS DA DECISÃO PARA HIPÓTESES OCORRIDAS APÓS A PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO. REPETIÇÃO NA FORMA SIMPLES DOS DESCONTOS QUE INICIARAM EM PERÍODO ANTERIOR À MENCIONADA DECISÃO. DEDUÇÕES POSTERIORES AO DECISUM QUE DEVERÃO SER OBJETO DE RESTITUIÇÃO NA FORMA DOBRADA. POSTULADO O AFASTAMENTO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SITUAÇÃO DOS AUTOS QUE NÃO CONFIGURA ABALO ANÍMICO PRESUMIDO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE QUE O EPISÓDIO OBTEVE DESDOBRAMENTOS SIGNIFICATIVOS NA VIDA DA ACIONANTE. HIPÓTESE QUE SE TRADUZIU EM MERO INCÔMODO. PEDIDO DE ALTERAÇÃO DO TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA SOBRE A INDENIZAÇÃO, POR CONSEGUINTE, PREJUDICADO. ÔNUS SUCUMBENCIAIS REDISTRIBUÍDOS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO (TJSC, Apelação n. 5001424-71.2020.8.24.0058, rel. Des. Renato Luiz Carvalho Roberge, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 1º/8/2023).
Superada essa questão, passo à análise do mérito propriamente dito.
No caso em apreço, a autora afirma jamais ter autorizado os descontos realizados em seu benefício previdenciário pela União Brasileira de Aposentados da Previdência (UNIBAP), sustentando que desconhecia o teor do termo de adesão e que não recebeu qualquer contraprestação pelos valores cobrados.
A análise dos autos revela que a autora firmou termo de filiação em 28/07/2020, devidamente assinado de próprio punho (evento 12, OUT7), no qual autorizou expressamente o desconto mensal em folha para manutenção do vínculo associativo. Vejamos:
A simples alegação de desconhecimento do conteúdo contratual, desacompanhada de prova idônea e consistente, não basta para infirmar a validade de um ato jurídico perfeito, cuja formação decorreu de manifestação expressa e voluntária de vontade. Conforme dispõe o artigo 138 do Código Civil, o erro somente autoriza a anulação do negócio jurídico quando se mostrar essencial e reconhecível pela outra parte, o que pressupõe demonstração concreta de circunstâncias capazes de comprometer a liberdade de consentimento — situação que, no caso em exame, não restou comprovada.
Embora a autora sustente ter sido induzida ao erro, os elementos probatórios indicam a regularidade da adesão, inexistindo indício de fraude, dolo ou coação. Ademais, o contrato contém previsão expressa de possibilidade de cancelamento a qualquer tempo, mediante simples requerimento, o que afasta a alegação de imposição unilateral e reforça o caráter voluntário do vínculo associativo.
Ainda que reconhecida a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, não há prova de conduta abusiva ou de falha substancial no dever de informação capaz de comprometer a validade da contratação. O instrumento firmado contém menção expressa à natureza associativa da relação e aos objetivos institucionais da entidade, o que revela transparência mínima suficiente ao atendimento do princípio da informação.
A genérica insatisfação com os benefícios ofertados não se confunde com ausência de consentimento ou com prática lesiva, especialmente quando inexistem indícios de ardil ou coação.
É certo que a falta de utilização dos serviços oferecidos não invalida a adesão ao quadro associativo, pois a eficácia do vínculo independe da fruição individual dos benefícios, bastando a disponibilidade objetiva dos serviços prestados pela entidade. Trata-se de característica própria das relações associativas e de convênios de adesão, nas quais o proveito é potencial e não necessariamente concreto.
Dessa forma, os descontos realizados dentro dos parâmetros contratualmente previstos e autorizados pela filiada não configuram cobrança indevida. Em consequência, não há falar em repetição do indébito ou em indenização por danos morais, ausente qualquer ato ilícito ou violação aos deveres de lealdade e boa-fé objetiva que justificasse a responsabilização civil da ré.
Honorários recursais
Dito isso, considerando o desprovimento do recurso da parte autora, necessária a fixação de honorários recursais em proveito do causídico da parte demandada, os quais arbitro em 2% sobre o valor da causa (STJ, EDcl no AgInt no REsp 1.573.573/RJ).
Todavia, a exigibilidade dos encargos de sucumbência fica suspensa.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
assinado por JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7044466v7 e do código CRC f1ea92fb.
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Documento:7044467 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5024891-79.2024.8.24.0045/SC
RELATOR: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO
EMENTA
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. VÍNCULO ASSOCIATIVO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
Ação declaratória de inexistência de relação jurídica cumulada com pedido de repetição de indébito e indenização por danos morais, proposta por beneficiária previdenciária em face de associação civil, em razão de descontos mensais realizados em seu benefício. A autora alegou ausência de autorização para os descontos e vício de consentimento na adesão contratual. A sentença julgou improcedentes os pedidos, reconhecendo a validade do contrato e mantendo a gratuidade de justiça concedida à ré. Recurso de apelação interposto pela parte autora.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
(i) saber se é aplicável o Código de Defesa do Consumidor à relação entre as partes;
(ii) se é devida a repetição do indébito;
(iii) se houve dano moral indenizável;
(iv) como devem ser distribuídos os ônus sucumbenciais.
III. RAZÕES DE DECIDIR
A associação sem fins lucrativos que atua no mercado de consumo pode ser considerada fornecedora por equiparação, atraindo a incidência do Código de Defesa do Consumidor.
A adesão contratual foi realizada mediante manifestação expressa e voluntária da autora, não havendo prova de vício de consentimento, fraude ou coação.
Os descontos realizados foram autorizados e previstos contratualmente, não configurando cobrança indevida.
Ausente demonstração de conduta abusiva ou falha substancial no dever de informação, não se reconhece o direito à indenização por danos morais.
Mantida a gratuidade de justiça concedida à parte ré, por ausência de prova inequívoca de suficiência econômica.
Fixação de honorários recursais em favor do patrono da parte apelada, com suspensão da exigibilidade.
IV. DISPOSITIVO E TESE
Recurso conhecido e desprovido.
Tese de julgamento:
“1. A associação sem fins lucrativos que oferece serviços mediante contraprestação pode ser considerada fornecedora por equiparação, sujeitando-se ao Código de Defesa do Consumidor.”
“2. A adesão contratual regularmente firmada e autorizada não configura vício de consentimento nem cobrança indevida.”
“3. A ausência de prova de conduta abusiva ou falha substancial no dever de informação afasta o direito à indenização por danos morais.”
“4. A gratuidade de justiça concedida à parte ré deve ser mantida, ante a ausência de prova inequívoca de suficiência econômica.”
Dispositivos relevantes citados:
CPC, arts. 85, §2º e §11; 86, parágrafo único; 98; 99, §2º e §3º; CC, art. 138; CDC, arts. 2º e 3º.
Jurisprudência relevante citada:
TJSC, Apelação n. 5013491-24.2020.8.24.0008, Rel. Leone Carlos Martins Junior, Terceira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 12.11.2024.
TJSC, Apelação n. 5002104-94.2022.8.24.0055, Rel. Giancarlo Bremer Nones, Terceira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 01.10.2024.
TJSC, Apelação n. 5001424-71.2020.8.24.0058, Rel. Des. Renato Luiz Carvalho Roberge, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 01.08.2023.
STJ, EDcl no AgInt no REsp 1.573.573/RJ.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7044467v4 e do código CRC f05e28a8.
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 13/11/2025 A 21/11/2025
Apelação Nº 5024891-79.2024.8.24.0045/SC
RELATOR: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO
PRESIDENTE: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO
PROCURADOR(A): PAULO CEZAR RAMOS DE OLIVEIRA
Certifico que este processo foi incluído como item 39 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 13/11/2025 às 00:00 e encerrada em 13/11/2025 às 17:45.
Certifico que a 4ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 4ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO
Votante: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO
Votante: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA
Votante: Desembargadora ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA
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