Decisão TJSC

Processo: 5102644-76.2024.8.24.0930

Recurso: agravo

Relator: [...]

Órgão julgador: Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média

Data do julgamento: 03 de julho de 2024

Ementa

AGRAVO – Documento:7077221 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5102644-76.2024.8.24.0930/SC DESPACHO/DECISÃO 1. Relatório J. C. P. e BANCO AGIBANK S.A interpuseram recursos de apelação em face da sentença proferida pelo 16º Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário, que julgou procedentes os pedidos formulados nos autos da ação revisional subjacente, nos seguintes termos (evento 23, SENT1): Vistos etc. Trata-se de ação revisional de taxa de juros ajuizada por J. C. P. em face de BANCO AGIBANK S.A. Alegou a parte autora, em síntese, que celebrou com a parte ré contrato(s) de empréstimo pessoal, no(s) qual(is) foram incluídas cláusulas abusivas e que merecem revisão. Pleiteia a adequação da(s) avença(s) aos parâmetros permitidos pela lei, com a revisão das cláusulas abusivas, especialmente aquelas relacionadas aos juros remuneratórios. Requereu a procedência dos pedidos. Junto...

(TJSC; Processo nº 5102644-76.2024.8.24.0930; Recurso: agravo; Relator: [...]; Órgão julgador: Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média; Data do Julgamento: 03 de julho de 2024)

Texto completo da decisão

Documento:7077221 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5102644-76.2024.8.24.0930/SC DESPACHO/DECISÃO 1. Relatório J. C. P. e BANCO AGIBANK S.A interpuseram recursos de apelação em face da sentença proferida pelo 16º Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário, que julgou procedentes os pedidos formulados nos autos da ação revisional subjacente, nos seguintes termos (evento 23, SENT1): Vistos etc. Trata-se de ação revisional de taxa de juros ajuizada por J. C. P. em face de BANCO AGIBANK S.A. Alegou a parte autora, em síntese, que celebrou com a parte ré contrato(s) de empréstimo pessoal, no(s) qual(is) foram incluídas cláusulas abusivas e que merecem revisão. Pleiteia a adequação da(s) avença(s) aos parâmetros permitidos pela lei, com a revisão das cláusulas abusivas, especialmente aquelas relacionadas aos juros remuneratórios. Requereu a procedência dos pedidos. Juntou documentos.  Citada, a parte ré apresentou contestação, na qual alegou, em preliminar, a multiplicidade de ações semelhantes ajuizadas pela parte autora e a falta de interesse de agir. No mérito, defendeu a legalidade do(s) contrato(s) firmado(s) entre as partes e a inexistência de abusividade dos encargos. Juntou documentos.  Houve réplica. Os autos vieram conclusos.  É o relatório. Decido.  A solução do feito passa unicamente pelo exame de prova documental, que possui momento oportuno para produção, mais especificamente a primeira oportunidade que couber a cada parte se manifestar nos autos (art. 434 do CPC). Por essa razão, resta autorizado o julgamento antecipado da lide, sem que se possa cogitar de cerceamento de defesa.  Da falta de interesse de agir diante da ausência de resolução pela via administrativa De início, verifica-se que a instituição financeira ré alega que a parte autora não trouxe aos autos documentos que comprovem a tentativa de solução do litígio de forma extrajudicial.  No entanto, o exaurimento da via extrajudicial não é requisito para a propositura de demanda dessa natureza, motivo pelo qual a prefacial merece ser afastada.  A respeito do assunto, colhe-se da jurisprudência catarinense: DIREITO COMERCIAL, BANCÁRIO, DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL - OBRIGAÇÕES - RESPONSABILIDADE CIVIL - DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR ABALO DE CRÉDITO E CANCELAMENTO DE NEGATIVAÇÃO - INSCRIÇÃO NEGATIVA INDEVIDA - DÉBITO INEXISTENTE - PROCEDÊNCIA EM 1º GRAU - RECURSO DO RÉU - 1. PRELIMINAR - AUSÊNCIA DE PRETENSÃO RESISTIDA POR FALTA DE BUSCA DE COMPOSIÇÃO EXTRAJUDICIAL - AFASTAMENTO - BAIXA PROBABILIDADE DE ÊXITO DE ACORDO - CONCILIAÇÃO QUE SEMPRE ESTÁ DISPONÍVEL ÀS PARTES - PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA - 2. MÉRITO - DEVER DE INDENIZAR INEXISTENTE - INACOLHIMENTO - AUSÊNCIA DE QUALQUER PROVA DE EXISTÊNCIA DA DÍVIDA - ÔNUS DO RÉU - IMPOSSIBILIDADE DO AUTOR FAZER PROVA NEGATIVA - INSCRIÇÃO IRREGULAR - INDENIZAÇÃO DEVIDA - RECURSO DE AMBAS AS PARTES - 3. ALTERAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO - ACOLHIMENTO PARCIAL DO PEDIDO DE MAJORAÇÃO DO AUTOR - VALOR NÃO PROPORCIONAL E RAZOÁVEL AOS PARÂMETROS DESTA CÂMARA - VERBA MAJORADA - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE - APELO DO RÉU IMPROVIDO - APELO DO AUTOR PROVIDO EM PARTE.   1. A pretensão resistida é concretizada na peça contestatória e a conciliação é possível em qualquer momento processual, não impedindo que as partes entrem em acordo, se assim o quiserem.   2. Comete ilícito aquele que, sem provar origem de suposta dívida de consumidor, inscreve-o nos cadastros de inadimplentes, acarretando-lhe abalo de crédito presumido.   3. Majora-se o quantum indenizatório que não atende ao binômio razoabilidade/proporcionalidade, fixando-se valor que não seja fonte de lucro à vítima e que não gere ruína financeira ao ofensor. (TJSC, Apelação Cível n. 0301366-76.2017.8.24.0061, de São Francisco do Sul, rel. Monteiro Rocha, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 21-03-2019). Fracionamento de Ações A cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, é ato facultativo do autor confome previsto no art. 327, do CPC, in verbis: "Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão". Nesse sentido, colhe-se da recente jurisprudência do : APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. MÉRITO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. PRESSUPOSTOS DOS ARTIGOS 319 E 320 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL SATISFEITOS. INEXISTÊNCIA DE IRREGULARIDADES. DECISÃO MODIFICADA. INGRESSO EM JUÍZO COM MAIS DE UMA AÇÃO CONTRA A MESMA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. CUMULAÇÃO DOS PEDIDOS NO MESMO PROCESSO QUE É UMA FACULDADE CONFERIDA À PARTE E NÃO UMA OBRIGAÇÃO. NEGÓCIOS JURÍDICOS DISTINTOS. DETERMINAÇÃO PARA REUNIR TODAS AS QUESTÕES NO MESMO FEITO QUE NÃO ENCONTRA AMPARO LEGAL. PRECEDENTES DESTA CORTE. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. SUCUMBÊNCIA REDISTRIBUÍDA. HONORÁRIOS RECURSAIS NÃO INCIDENTES. (ART. 85, § 11, CPC). RECURSO PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5108048-45.2023.8.24.0930, do , rel. Antonio Augusto Baggio e Ubaldo, Primeira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 13-06-2024 - sem grifo no original). Destarte, rejeito a preliminar.  Superada tal questão, passa-se à análise do mérito da demanda.  Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor  Em se tratando de contrato bancário, incidente o Código de Defesa do Consumidor, figurando a parte autora, pessoa física ou jurídica, como consumidora e a instituição financeira como prestadora de serviços. O Superior : CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. REVISÃO. IMPROCEDÊNCIA. APELO DO DEMANDANTE. JUROS REMUNERATÓRIOS. VERIFICAÇÃO DA ABUSIVIDADE QUE SE PAUTA NA TAXA MÉDIA DE MERCADO, ADMITIDA CERTA VARIAÇÃO. ORIENTAÇÃO DO STJ. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. ABUSIVIDADE EVIDENCIADA NA HIPÓTESE. REPARO DA SENTENÇA. Na esteira do entendimento delineado pelo STJ - que admite a revisão do percentual dos juros remuneratórios quando aplicável o CDC ao caso e quando exista abusividade no pacto -, esta Câmara julgadora tem admitido como parâmetro para aferir a abusividade a flexibilização da taxa de juros remuneratórios até o percentual de 10% (dez por cento) acima da taxa média divulgada pelo Banco Central. READEQUAÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA, ANTE A REFORMA DA SENTENÇA. Reformada a sentença, ainda que parcialmente, é imperiosa a readequação dos ônus sucumbenciais. APELO PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000524-57.2021.8.24.0930, do , rel. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 18-05-2023). No caso, conforme dados transcritos na tabela abaixo, os juros remuneratórios foram assim calculados: Número do contrato 1265551517 - Evento n. 1 - contrato 7 Tipo de contrato 25464 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado 20742- Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado Juros Pactuados (%) 9,49% ao mês e 196,82% ao ano  Data do Contrato 03/07/2024 Juros BACEN na data (%) 5,91% ao mês e 99,16% ao ano  Taxa média do Bacen na data do contrato + 10% 6,50% ao mês e 109,07% ao ano Dessa forma, no(s) contrato(s) celebrado(s) pela parte autora com o banco réu, os juros foram superiores a 10% da média mensal divulgada pelo Banco Central para a espécie e o período da contratação, o que recomenda a sua revisão. Ainda que se considere a alegação de que a operação apresenta alto risco de inadimplência, não há nos autos elementos probatórios que demonstrem que a parte autora, no momento da contratação, estava em situação financeira desfavorável. Nesse sentido, o se pronunciou em caso semelhante: "[...] em todo caso, dificilmente se compreenderia que o cenário concretamente delineado é de risco suficiente para justificar as extremadas taxas de juros remuneratórios praticadas pela requerida/apelante, equivalentes a mais de seis vezes o índice médio do tipo de operação. As chances de inadimplemento são cruciais para o mercado de crédito, e é natural que induzam a elevação dos preços, mas não podem servir de pretexto para índices remuneratórios absolutamente divorciados da normalidade, que chegam, como no caso, a quase 1.000,00% ao ano" (TJSC, Apelação n. 5061190-87.2022.8.24.0930, do , rel. Silvio Franco, Primeira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 31-10-2024). Da repetição de indébito O valor indevidamente recebido pela instituição financeira deve ser repetido à parte adversa, com juros e correção monetária, sob pena de enriquecimento indevido, sendo admitida a sua compensação com eventual saldo devedor. A repetição deve ser feita de forma simples, e não em dobro, por se tratar de cobrança calcada em erro justificável, decorrente da interpretação do que se reputava contratualmente correto. Nesse norte: REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CABIMENTO. EXISTÊNCIA DE ENCARGO ABUSIVO. DEVER DE PROMOVER A DEVOLUÇÃO DOS VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE, NA FORMA SIMPLES, DIANTE DE ENGANO JUSTIFICÁVEL DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INCIDÊNCIA DE CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA SOBRE TAL MONTANTE. VEDAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA (TJSC, AC 5009761-09.2019.8.24.0018, Rel. Des. Guilherme Nunes Born, j. 10.09.2020). Isso posto, com fulcro no art. 487, I, do CPC, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por J. C. P. em face de BANCO AGIBANK S.A para:  a) limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil acrescida de 10% em relação ao(s) contrato(s) impugnado(s) nos autos, nos termos da fundamentação; e b) determinar a repetição simples de eventual indébito ou compensação pela instituição financeira, conforme o capítulo anterior desta sentença, os quais deverão ser corrigidos pelo INPC desde o desembolso e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, desde a citação. A partir de 30.08.2024, os valores deverão ser atualizados pelo IPCA e acrescidos da taxa legal de juros, isto é, taxa referencial SELIC deduzido o IPCA (CC, art. 406, § 1º). CONDENO a parte ré ao pagamento integral das custas e dos honorários, os quais fixo, por apreciação equitativa, em R$ 2.000,00 (dois mil reais), em razão do valor atribuído à causa, nos termos do art. 85, §8º, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.  Oportunamente, arquivem-se. Inconformados, ambos os litigantes interpuseram recurso de apelação. Em suas razões recursais, argumenta a autora, em síntese, que: (a) a taxa de juros remuneratórios deve ser limitada ao valor da taxa média de mercado divulgada pelo Bacen sem o acréscimo de 10% determinado na sentença; (b) devem os honorários sucumbenciais serem arbitrados pelo critério da equidade e de acordo com a tabela da OAB/SC, consoante art. 85, § 8º-A, do CPC/2015. Pugna pelo provimento do recurso com a reforma parcial da decisão objurgada (evento 46, APELAÇÃO1). Por sua vez, em seu apelo, argumenta a instituição financeira ré: (a) a inexistência de abusividade nos encargos previstos no ajuste sob revisão, devendo a taxa de juros ser mantida no percentual contratado; (b) incabível a repetição de indébito porque nada cobrou de ilegal da parte adversa; e (c) os honorários sucumbenciais foram fixados em quantia fixa, quando deveriam corresponder a percentual do valor da causa, se encontrando, ademais, em patamar excessivo (evento 49, APELAÇÃO2). Foram apresentadas contrarrazões pela autora (evento 63, CONTRAZAP1). Vieram os autos conclusos. É o relatório. 2. Decisão         O Código de Processo Civil, com o intuito de promover a celeridade da prestação jurisdicional, trouxe a possibilidade julgamento monocrático em determinadas circunstâncias, dentre as quais se destaca: Art. 932. Incumbe ao relator: [...] IV - negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior , rel. Mariano do Nascimento, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 24-07-2025). Ademais, qualquer que seja a decisão do relator, é assegurado a parte, nos termos do art. 1.021, do CPC, a interposição de agravo interno. No entanto, cumpre destacar que em eventual manejo deste recurso, "o recorrente impugnará especificadamente os fundamentos da decisão agravada" (§ 1º do art. 1.021), "[...] de forma a demonstrar que não se trata de recurso inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante, sob pena de, não o fazendo, não ter o seu agravo interno conhecido." (TJSC, Agravo Interno n. 4025718-24.2019.8.24.0000, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 13-02-2020). Portanto, diante do exposto, afigura-se cabível o julgamento do presente reclamo, na forma do art. 932, do CPC, já que a discussão de mérito é resolvida segundo entendimento firmado pela Corte Superior em julgamento de recursos repetitivos. 2.1. Juízo de admissibilidade Considerando que a parte autora apresentou procuração atualizada, específica e devidamente assinada, tem-se por regularizada a representação processual, nos termos do artigo 105 do Código de Processo Civil. A análise do mérito do recurso tem repercussão no juízo de sua admissibilidade, de modo que o exame se dá de forma conjunta a seguir. 2.2. Juízo de mérito 2.2.1 Ponto comum em ambos os recursos Juros remuneratórios Neste ponto, enquanto a instituição financeira afirma que as taxas de juros remuneratórios previstas no ajuste sob revisão não são abusivas e, portanto, merecem ser mantidas no patamar contratado, a autora afirma que o magistrado deveria ter limitado as taxas às médias divulgadas pelo Bacen para o período de contratação, e não limitado a média do Bacen acrescido de 10%. Acerca da limitação à taxa de juros, é de se reconhecer inicialmente que, tanto o Supremo Tribunal Federal já se manifestou no sentido de que as disposições da lei da usura não se aplicariam às taxas de juros cobradas nas operações realizadas por instituições financeiras (Súmula 596), quanto o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Resp n. 1.061.530 pela sistemática dos recursos representativos de controvérsia, firmou entendimento no sentido de que a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade. É regular, portanto, a taxa de juros pactuada de acordo com a taxa média praticada no mercado, divulgada pelo Banco Central. Não se desconhece, neste sentido, que toda média, necessariamente, é formada por valores que dela discrepam para mais ou para menos, de maneira que pelo seu próprio conceito, não pode ela constituir um teto à taxa pactuada, mas apenas servir como um parâmetro de comparação. Por isso mesmo, não será abusiva a taxa que, ainda acima da média, encontre-se inserida num patamar razoável de tolerância. Tal variação, aliás, é da própria natureza das taxas de juros, pois como esclarece o Banco Central: As taxas de juros apresentadas correspondem à média das taxas praticadas nas diversas operações realizadas pelas instituições financeiras, em cada modalidade. Em uma mesma modalidade, as taxas de juros podem diferir entre clientes de uma mesma instituição financeira. Taxas de juros variam de acordo com fatores diversos, tais como o valor e a qualidade das garantias apresentadas na operação, a proporção do pagamento de entrada da operação, o histórico e a situação cadastral de cada cliente, o prazo da operação, entre outros. Diante disso, firmou o STJ entendimento segundo o qual não consideram abusivas taxas de juros que não superem demasiadamente a média praticada pelo mercado, como vale destacar de julgamento de Recurso Especial realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos: [...] ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS  a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada, art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. [...] (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009, grifou-se) Sobre a matéria, porque pertinente ao caso, extrai-se do corpo do acórdão de julgamento do referido Recurso Especial o seguinte excerto: [...] Inicialmente, destaque-se que, para este exame, a meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional para a Selic – taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – é insatisfatória. Ela apenas indica o menor custo, ou um dos menores custos, para a captação de recursos pelas instituições que compõem o Sistema Financeiro Nacional. Sua adoção como parâmetro de abusividade elimina o 'spread' e não resolve as intrincadas questões inerentes ao preço do empréstimo. Por essas razões, conforme destacado, o STJ em diversos precedentes tem afastado a taxa Selic como parâmetro de limitação de juros. Descartados índices ou taxas fixos, é razoável que os instrumentos para aferição da abusividade sejam buscados no próprio mercado financeiro. Assim, a análise da abusividade ganhou muito quando o Banco Central do Brasil passou, em outubro de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras nas operações de crédito realizadas com recursos livres (conf. Circular nº 2957, de 30.12.1999). As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer pessoa através da rede mundial de computadores [...], são segregadas de acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade de empréstimo realizada ('hot money', desconto de duplicatas, desconto de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário, aquisição de bens, 'vendor', cheque especial, crédito pessoal, entre outros). A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo regulatório atual, a taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre abusividade. Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é, para ser um valor fixo. Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros. A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média. Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos. [...] (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009, grifou-se). Ainda, firmou entendimento a Corte Superior no sentido da impossibilidade de se adotar previamente um limite estanque acima da média para se aferir a abusividade dos juros remuneratórios, devendo a análise de eventual onerosidade excessiva e discrepância em relação à média se dar a partir do contexto de cada caso, como se extrai: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO. CONTRATO BANCÁRIO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 11, 489 E 1.022 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. NÃO OCORRÊNCIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. CARÊNCIA DE AÇÃO. SENTENÇA COLETIVA. LIMITAÇÃO DO JUROS REMUNERATÓRIOS À TAXA MÉDIA DE MERCADO, ACRESCIDA DE UM QUINTO. NÃO CABIMENTO. ORIENTAÇÃO FIRMADA NO RESP N. 1.061.530/RS. ABUSIVIDADE. AFERIÇÃO EM CADA CASO CONCRETO. 1. O acórdão recorrido analisou todas as questões necessárias ao deslinde da controvérsia, não se configurando omissão, contradição ou negativa de prestação jurisdicional. 2. De acordo com a orientação adotada no julgamento do REsp. 1.061.530/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1°, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto." 3. Prevaleceu o entendimento de que a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central para cada segmento de crédito é referencial útil para o controle da abusividade, mas o simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa média de mercado não significa, por si só, abuso. Ao contrário, a média de mercado não pode ser considerada o limite, justamente porque é média; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco. Foi expressamente rejeitada a possibilidade de o Na linha dos precedentes da Corte Superior, há de se levar em conta, assim, as peculiaridades do caso concreto, a saber a natureza e as características do empréstimo contratado (tipo de crédito, valor tomado, prazo de pagamento, forma de cobrança, tipo de garantia), o risco envolvido na operação de crédito, o perfil de risco do tomador e seu relacionamento com a casa bancária, a estrutura e porte da instituição financeira e outras peculiaridades que possam influenciar o custo de captação e o custo de operações da demandada, de maneira que tais características irão definir na situação concreta um percentual de superação da taxa média que se considere dentro do razoável, somente sendo cabível a revisão nas hipóteses em que configurada cabal e irrefutável abusividade/onerosidade, sob pena de, ao se definir como abusivas taxas com pouca margem de discrepância da taxa média, e sem a devida análise das circunstâncias concretas, incidir-se em indevido tabelamento de preços, em patente violação aos princípios constitucionais da livre iniciativa e livre concorrência. O contrato sob litígio (n. 1265551517) foi firmado em 03 de julho de 2024, o qual prevê juros remuneratórios de 9,49% a.m. e 196,82% a.a. (evento 1, CONTR7), enquanto a média de mercado prevista pelo Banco Central para operações similares foi de de 5,91% a.m e 99,16% a.a. (Séries n. 25464 e 20742 - Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado). Embora as taxas contratadas ultrapassem a média de mercado, tal circunstância não caracterizou abusividade, visto que o descolamento acima da média consistiu em apenas 60,58% na taxa mensal e 98,49% na taxa anual, em média. Essa diferença se justifica, ainda, em razão das características do caso concreto, que envolve empréstimo não consignado, ou seja, sem garantias, com prazo de pagamento que ultrapassa um ano, concedido a pessoa que demonstra baixa disponibilidade de renda e limitada capacidade financeira, visto que beneficiária da gratuidade da justiça. Essas circunstâncias, concatenadas, agravam o risco do negócio, evidenciado que a diferença dos juros remuneratórios pactuados em relação à média de mercado discrepância não é capaz de colocar o mutuário em desvantagem exagerada. Por sinal, a diferença constatada no caso em relação à media de mercado, situa-se abaixo da faixa de tolerância admitida em precedentes da Corte Superior de Justiça, por sinal, citados no recurso especial repetitivo 1.061.530/RS (até uma vez e meia; ao dobro; ao triplo da média Bacen), desta forma não caracterizando abusividade, haja vista que esta análise se dá no âmbito de uma economia de mercado, como a vigente no país, que é regida pelo princípio constitucional da livre concorrência (art. 170, IV, CF). Daí porque, é de se dar provimento ao recurso da instituição financeira, reformando a sentença para o fim de permitir a manutenção da cobrança da taxa de juros remuneratórios contratada, diante do que resulta prejudicada a análise do recurso da parte autora, por perda do objeto. Por conseguinte, mantidas referidas taxas, e sem qualquer revisão contratual, desaparece o fundamento utilizado pelo juízo de origem para determinar a repetição de indébito, de maneira que tal medida deve ser, assim, afastada, com o provimento do recurso do banco também no ponto. 3. Honorários recursais Com o provimento do recurso do banco réu, os pedidos formulados na inicial restaram improcedentes. Nesse contexto, com base no parágrafo único do art. 86, do CPC, deve a demandante responder integralmente pelo pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes últimos fixados em R$ 2.000,00 (dois mil reais) pelo juízo singular, restando prejudicados os pleitos de majoração e minoração da verba sucumbencial formulado pelos litigantes. A exigibilidade das verbas, todavia, se mantém suspensa, por ser a autora beneficiária da gratuidade da justiça deferida na origem. Por fim, destaca-se que sem aplicação ao caso a norma prevista no art. 85, §11 do CPC, porquanto a autora não havia sido condenada ao pagamento de honorários de sucumbência na origem. 4. Dispositivo Ante o exposto, com fundamento no art. 932, IV, do Código de Processo Civil de 2015, e no art. 132, X e XVI, do Regimento Interno deste Tribunal, (i) conheço do recurso da parte ré e dou-lhe provimento para, em reforma da sentença, manter os juros remuneratórios pactuados no contrato, afastar a condenação na repetição do indébito e, por conseguinte, julgar improcedentes os pedidos formulados na ação, atribuindo os ônus sucumbenciais fixados na sentença exclusivamente à parte demandante, cuja exigibilidade permanece suspensa por força da justiça gratuita; (b) não conheço o recurso da autora, por prejudicado. Publique-se. Intimem-se. assinado por LUIZ ZANELATO, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7077221v14 e do código CRC 6b014d49. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): LUIZ ZANELATO Data e Hora: 14/11/2025, às 19:29:14     5102644-76.2024.8.24.0930 7077221 .V14 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 08:55:01. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas