Decisão TJSC

Processo: 5003447-74.2025.8.24.0038

Recurso: conflito

Relator: Desembargador SÉRGIO RIZELO

Órgão julgador: Turmas do Superior , por todas as suas Câmaras Criminais, delibera reiteradamente pela constitucionalidade do art. 2º, II, da Lei 8.137/90. Nesse sentido, dentre muitas: Apelações Criminais 0900191-44.2015.8.24.0036, Rel. Des. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, j. 9.8.18; 0003057-80.2014.8.24.0005, Rel. Des. Luiz César Schweitzer, j. 15.3.18; 0910550-81.2014.8.24.0038, Rel. Des. Paulo Roberto Sartorato, j. 15.2.16; 0904143-59.2014.8.24; Relª. Desª. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt, j. 15.2.16; 0001734-34.2012.8.24.0062, Rel. Des. Volnei Celso Tomazini, j. 4.2.16; 0008165-10.2012.8.24.0022, Rel. Des. Ernani Guetten de Almeida, j. 28.1.16; 2013.014151-9, Rel. Des. Ricardo Roesler, j. 5.11.13; 2013.010555-1, 2014.082876-2, Relª. Desª. Marli Mosimann Vargas, j. 1º.12.15; 2015.046388-2, Rel. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho, j. 17.11.15; e 2015.064389-9, Rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, j. 12.11.15.

Data do julgamento: 18 de novembro de 2025

Ementa

CONFLITO – Documento:6976615 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 5003447-74.2025.8.24.0038/SC RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO RELATÓRIO Na Comarca de Joinville, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra S. M., imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/90, por cinco vezes, na forma do art. 71, caput, ambos do Código Penal, nos seguintes termos: Na condição de sócio-administrador da empresa ''Mercado L .C. Ltda.'', CNPJ n. 05.432.392/0001-81, Inscrição Estadual n. 25.450.043-9, estabelecida na Rua Iririú, n. 352, Sala A, Bairro Saguaçu, Joinville/SC, o denunciado deixou de efetuar, no prazo legal, referente ao período de apuração dos meses de março, abril, maio, setembro e outubro de 2021, conforme documentos geradores da Dívida Ativa n. 230038608167, inscrita em 22/11/2023, o recolhimento de R$ 23.386,31 ...

(TJSC; Processo nº 5003447-74.2025.8.24.0038; Recurso: conflito; Relator: Desembargador SÉRGIO RIZELO; Órgão julgador: Turmas do Superior , por todas as suas Câmaras Criminais, delibera reiteradamente pela constitucionalidade do art. 2º, II, da Lei 8.137/90. Nesse sentido, dentre muitas: Apelações Criminais 0900191-44.2015.8.24.0036, Rel. Des. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, j. 9.8.18; 0003057-80.2014.8.24.0005, Rel. Des. Luiz César Schweitzer, j. 15.3.18; 0910550-81.2014.8.24.0038, Rel. Des. Paulo Roberto Sartorato, j. 15.2.16; 0904143-59.2014.8.24; Relª. Desª. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt, j. 15.2.16; 0001734-34.2012.8.24.0062, Rel. Des. Volnei Celso Tomazini, j. 4.2.16; 0008165-10.2012.8.24.0022, Rel. Des. Ernani Guetten de Almeida, j. 28.1.16; 2013.014151-9, Rel. Des. Ricardo Roesler, j. 5.11.13; 2013.010555-1, 2014.082876-2, Relª. Desª. Marli Mosimann Vargas, j. 1º.12.15; 2015.046388-2, Rel. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho, j. 17.11.15; e 2015.064389-9, Rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, j. 12.11.15.; Data do Julgamento: 18 de novembro de 2025)

Texto completo da decisão

Documento:6976615 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 5003447-74.2025.8.24.0038/SC RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO RELATÓRIO Na Comarca de Joinville, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra S. M., imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/90, por cinco vezes, na forma do art. 71, caput, ambos do Código Penal, nos seguintes termos: Na condição de sócio-administrador da empresa ''Mercado L .C. Ltda.'', CNPJ n. 05.432.392/0001-81, Inscrição Estadual n. 25.450.043-9, estabelecida na Rua Iririú, n. 352, Sala A, Bairro Saguaçu, Joinville/SC, o denunciado deixou de efetuar, no prazo legal, referente ao período de apuração dos meses de março, abril, maio, setembro e outubro de 2021, conforme documentos geradores da Dívida Ativa n. 230038608167, inscrita em 22/11/2023, o recolhimento de R$ 23.386,31 (vinte e três mil trezentos e oitenta e seis reais e trinta e um centavos) de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS, locupletando-se ilicitamente mediante apropriação do valor, em prejuízo do estado de Santa Catarina (evento 1, DOC1). Concluída a instrução, a Doutora Juíza de Direito Marta Regina Jahnel julgou procedente a exordial acusatória e condenou S. M. à pena de 8 meses de detenção, a ser cumprida em regime inicialmente semiaberto, e de 15 dias-multa, pelo cometimento do delito previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/90, por cinco vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal (evento 53, DOC1). Insatisfeito, S. M. deflagrou recurso de apelação. Alega a ausência de dolo de intenção fraudulenta, estando configurada tão somente inadimplência tributária causada por dificuldades financeiras. Pondera não haver espaço para o reconhecimento da continuidade delitiva. Ataca o reconhecimento dos maus antecedentes e sublinha ser possível a fixação do regime inicial aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Sob tais argumentos requer a proclamação da sua absolvição "por não constituir o fato infração penal", "por ausência de participação na conduta e por ausência de dolo específico, tratando-se de mero inadimplemento de obrigação tributária própria, com cumprimento das obrigações acessórias", e, "subsidiariamente, [...] que seja substituída a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, nos termos do art. 44 do Código Penal" (evento 64, DOC1). O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (evento 85, DOC1). A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Humberto Francisco Scharf Vieira, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (evento 10, DOC1). VOTO O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido. 1. A conduta narrada na denúncia configura o crime previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/90, consistente em "deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos". Embora não se desconheça a existência de divergências doutrinária e jurisprudencial, entende-se que o ICMS inclui-se na categoria de tributo indireto, na qual o ônus da incidência tributária é transferido pelo contribuinte a terceiro, por meio da sua inclusão no preço da mercadoria. Andreas Eisele esclarece: Tal identificação decorre do fato de que, nos tributos indiretos (aqueles nos quais o contribuinte transfere sua repercussão financeira para terceiro), o sujeito passivo da obrigação tributária pode cobrar (ou, eventualmente, receber) de terceiro, a carga econômica correspondente ao valor do tributo, motivo pelo qual não suporta (em tese) seu custo (mediante o mecanismo da repercussão). Exemplo dessa situação ocorre no ICMS, eis que o contribuinte, ao vender uma mercadoria, destaca na nota fiscal o valor correspondente ao imposto que integrará o preço que será pago pelo adquirente. Nessa relação, o comprador é denominado de (forma alegórica) como "contribuinte de fato", porque pagará ao vendedor o valor representativo do ICMS contabilmente incluído no preço, embora não seja, efetivamente, contribuinte do tributo, pois o único sujeito passivo da obrigação tributária é o vendedor, denominado (também de forma ilustrativa) como "contribuinte direto". Caso o contribuinte (vendedor) receba o preço da mercadoria (no qual se encontra inserido o valor correspondente ao ICMS) pago pelo adquirente e não efetue o recolhimento do tributo no prazo legalmente estabelecido, estaria, em tese, obtendo uma vantagem econômica ilícita decorrente do recebimento de um valor que deveria repassar aos cofres públicos e que manteve em seu âmbito de disponibilidade (Crimes contra a ordem tributária. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2002. p. 175). Pedro Roberto Decomain consoa: O puro e simples não recolhimento do ICMS pelo contribuinte figura o crime previsto pelo art. 2º, II, da Lei 8.137/90. [...] Numa primeira abordagem, de cunho eminentemente econômico, deixando de parte discussões doutrinárias sobre os tributos conhecidos como diretos e indiretos, e levando em conta apenas o aspecto econômico a partir do qual são conceituadas essas espécies, ou seja, atentos ao fato de que existem tributos cujo ônus é imediatamente repassado pelo contribuinte a terceiro, em contrapartida a outros em que tal não ocorre, e sabendo-se que o ICMS inclui-se na categoria dos indiretos, ou seja, daqueles cujo montante é cobrado pelo contribuinte ao adquirente dos produtos tributados, encontrando-se a incidência tributária previamente embutida no próprio preço da mercadoria vendida, conclui-se que o não recolhimento do ICMS no prazo previsto pela legislação implica a ocorrência desse crime. O contribuinte efetivamente repassou ao adquirente da mercadoria tributada o ônus representado pelo ICMS. Cobrou-o, portanto, a terceiro, devendo recolher aos cofres públicos o montante assim apurado. Se não o faz, comete crime examinado (Crimes contra a ordem tributária. Belo Horizonte: Forum, 2010. p. 360-361). Quando deixa de recolher aos cofres públicos, em tempo, o montante pago pelo contribuinte de fato, o contribuinte de direito incide na prática vedada no tipo sob exame, e essa é a hipótese dos autos. Celso Ribeiro Bastos pontua: A falta de recolhimento do tributo, na forma do tipificada no n. II do art. 2º da Lei 8.137/90, acarreta, portanto, duas implicações: a) civil: conduta omissiva do agente que o coloca em mora - culpa exclusiva; b) penal: apropriação indébita de valor do qual o agente estava na posse precária ou provisória para recolher e transferi-lo ao legítimo titular (Fazenda Pública). Assim sendo, a falta de recolhimento de ICMS oportunamente declarado nas guias adequadas e relativo a dívida por operações próprias do contribuinte, poderá configurar o crime previsto no art. 2º, inciso II da Lei 8.137/90. Só não configurará tal crime, quando a falta de recolhimento ocorrer em virtude de fato relevante e inevitável (caso fortuito ou força maior), independentemente, portanto, da vontade do agente" (apud Leis penais e sua interpretação jurisprudencial, coord. RUI STOCO. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 678). Ainda se extraem da obra supracitada valiosas lições: Não há controvérsia de que contribuinte de fato do ICMS é o consumidor final e não o vendedor ou comprador, ou seja "quem arca com o ônus tributário" (cf. Rubens Gomes de Souza, Compêndio de legislação tributária, Resenha Tributária, S. Paulo, 1975, p. 91). Ora, se este embute no preço final de venda valor que o ressarce do imposto que irá pagar oportunamente, ressuma claro que ocorreu uma retenção de fato e, então, configurado estará o delito previsto no inciso II, do art. 2º da Lei 8.137/90, considerando que houve, induvidosamente, redução do valor devido e, portanto, sonegação fiscal. Por essa razão, é que Yoshiaki Ichihara acrescenta, em adminículo ao nosso entender sobre a questão, que "nesta dimensão das coisas, o contribuinte recolhe o imposto sobre o valor acrescido e portanto, ao deixar de recolher o ICMS tipifica o comportamento como sendo 'deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição sindical, desconta ou cobrado''' (Crimes contra a ordem tributária, Centro de Extensão Universitária e Ed. Revista dos Tribunais, S. Paulo, Pesquisas Tributárias nº 1., 1995, Coordenação de Ives Gandra da Silva Martins, p. 145)" (p. 679). Havia divergência entre as Turmas do Superior , por todas as suas Câmaras Criminais, delibera reiteradamente pela constitucionalidade do art. 2º, II, da Lei 8.137/90. Nesse sentido, dentre muitas: Apelações Criminais 0900191-44.2015.8.24.0036, Rel. Des. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, j. 9.8.18; 0003057-80.2014.8.24.0005, Rel. Des. Luiz César Schweitzer, j. 15.3.18; 0910550-81.2014.8.24.0038, Rel. Des. Paulo Roberto Sartorato, j. 15.2.16; 0904143-59.2014.8.24; Relª. Desª. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt, j. 15.2.16; 0001734-34.2012.8.24.0062, Rel. Des. Volnei Celso Tomazini, j. 4.2.16; 0008165-10.2012.8.24.0022, Rel. Des. Ernani Guetten de Almeida, j. 28.1.16; 2013.014151-9, Rel. Des. Ricardo Roesler, j. 5.11.13; 2013.010555-1, 2014.082876-2, Relª. Desª. Marli Mosimann Vargas, j. 1º.12.15; 2015.046388-2, Rel. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho, j. 17.11.15; e 2015.064389-9, Rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, j. 12.11.15. Colhe-se desta Segunda Câmara Criminal: I - A Constituição Federal de 1988 consagrou em solo pátrio as concepções garantistas há muito desejadas, relevando o papel do Poder Público como concretizador dos direitos fundamentais sociais e individuais, a fim de que se atinjam os objetivos irrogados para a República Federativa do Brasil no art. 3º da Carta Magna (construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação). Tal desiderato só pode ser alcançado mediante o equilíbrio financeiro do governo, cuja principal fonte de receita advém da arrecadação de impostos, a ponto de tornar a sonegação fiscal ofensa a um bem jurídico relevantíssimo, de modo a justificar a incidência de normas penais no combate desta prática. III - Não há falar-se em comparações entre o direito privado, submetido às normas de coordenação e, por outro lado, o direito público, direcionado por normas de subordinação e no qual se encontram o direito tributário e o penal. Assim, a imposição de tributos em nada se relaciona com as relações negociais entre particulares, derivando do jus imperium e visando a possibilidade de realização pelo Estado das ações governamentais imprescindíveis à satisfação das necessidades da população. Nesta toada, inviável a equiparação da proibição da prisão civil por dívida, restrita às hipóteses previstas na Constituição Federal e expurgada como possibilidade de sanção por inadimplemento contratual em negócio jurídico firmado entre particulares, com a segregação decorrente da conduta fraudulenta do não repasse ao estado daquilo que lhe é devido por força de lei, e que, nos casos de tributos indiretos, é suportado pelo consumidor final, figurando o sujeito passivo da obrigação como mero repassador. IV - Resta claro que a conduta descrita no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90 não fere os preceitos constitucionais, pontualmente o da proibição de prisão civil por dívida garantido aos jurisdicionados no art. 5º, LXVIII, da CF/88, em virtude da importância sobrelevada do bem jurídico tutelado e das diferenças substanciais entre as relações negociais de particulares e as relações tributárias (Ap. Crim. 2011.049033-7, Relª. Desª. Salete Silva Sommariva, j. 6.12.11). Também não há conflito com relação à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, promulgada pelo Decreto 678/92, que em seu art. 7, 7 estabelece que "Ninguém deve ser detido por dívida", excetuados "os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar": Tampouco há que se falar em atipicidade da conduta sob julgamento por inobservância aos preceitos da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, uma vez que o STF já teve a oportunidade de avaliar a compatibilidade dos crimes contra a ordem tributária com a vedação da prisão por dívidas (ARE 1.294.738-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 24/03/2021) (Ap. Crim. 5005175-10.2021.8.24.0033, Relª. Desª. Ana Lia Moura Lisboa Carneiro, j. 12.12.24). E: ARGUIÇÃO DE AFRONTA DO TIPO PENAL AO DISPOSTO NA CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. DÍVIDA DE NATUREZA TRIBUTÁRIA QUE NÃO SE CONFUNDE COM DE NATUREZA CIVIL. INADIMPLEMENTO QUE PREJUDICA TODA A COLETIVIDADE ELEVADO À CATEGORIA DE CRIME. AFRONTA À CARTA MAGNA OU AO PACTO INTERNACIONAL INEXISTENTE. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STF EM REPERCUSSÃO GERAL NO ARE 999425/SC (Ap. Crim. 5004965-59.2020.8.24.0011, Rel. Des. Leopoldo Augusto Brüggemann, j. 12.9.23). Portanto, não há ofensa ao art. 5º, LXVII, da Constituição Federal, que veda a prisão por dívida civil, com exceção da inadimplência de obrigação alimentícia (uma vez que, jurisprudencialmente, excluiu-se a possibilidade quanto ao depositário infiel). A respeito, cumpre mencionar entendimento encampado por Pedro Roberto Decomain, que, referindo-se ao art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, esclarece: Poderia surgir discussão quanto à constitucionalidade desse inciso, diante da proibição da prisão civil por dívidas, inserida no artigo 5º, LXVII, da Constituição da República. Ocorre que, aqui, não se está a punir, no inciso da lei de que se cuida, pura e simplesmente a inadimplência tributária, mas sim a prática de não ser recolhido ao verdadeiro destinatário o valor que o contribuinte cobrou, precisamente para esse fim, de um terceiro (op. cit. p. 457). Mais adiante Decomain frisa que, "não se trata de prisão civil, mas sim de prisão de natureza punitiva, pela prática de um crime". Com efeito, a vedação constitucional diz respeito à prisão de devedor civil com o único objetivo de compeli-lo ao pagamento do débito; ou seja, apenas a prisão decorrente diretamente de dívida civil é que é vedada pela Constituição Federal. O Supremo Tribunal Federal assim se pronunciou acerca da constitucionalidade do disposto no art. 2º, II, da Lei 8.137/90: É certo que o ordenamento constitucional brasileiro, em preceito destinado especificamente ao legislador comum, proíbe a instituição de prisão civil por dívida, ressalvadas as hipóteses de infidelidade depositária e de inadimplemento de obrigação alimentar (CF, art. 5º, LXVIII). Observo, no entanto, que a prisão de que trata o art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, longe de reduzir-se ao perfil jurídico e à noção conceitual de prisão meramente civil, qualifica-se como sanção de caráter penal resultante, quanto à sua imponibilidade, da prática de comportamento juridicamente definido como ato delituoso. A norma legal em questão encerra, na realidade, uma típica hipótese de prisão penal, cujos elementos essenciais permitem distingui-la, especialmente em função de sua finalidade e de sua natureza mesma, do instituto da prisão civil, circunstância esta que, ao menos em caráter delibatório, parece tornar impertinente a alegação de que o Estado, ao editar o art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90 (que define pena criminal, em decorrência da prática de delito contra a ordem tributária), teria transgredido, segundo sustentam os impetrantes, a cláusula vedatória inscrita no art. 5º, LXVII, da Carta Política, que proíbe - ressalvadas as hipóteses previstas no preceito constitucional em referência - a prisão civil por dívida. [...] Assim sendo, tendo presente a relevante circunstância de que a norma legal, cuja constitucionalidade está sendo questionada incidenter tantum, definiu hipótese de sanção penal (penal criminal), por delito contra a ordem tributária, e considerando que o art. 2º, II, da lei n. 8.137/90, por isso mesmo, nenhuma prescrição veicula sobre o instituto da prisão civil por dívida, indefiro o pedido de medida liminar (HC 77.631, Rel. Min. Celso de Mello, j. 3.8.98). Mais recentemente o entendimento foi reiterado em sede de repercussão geral: PENAL E CONSTITUCIONAL. CRIMES PREVISTOS NA LEI 8.137/1990. PRISÃO CIVIL POR DÍVIDA. OFENSA AO ART. 5º, LXVII, DA CONSTITUIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. CONFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. I - O Tribunal reconheceu a existência de repercussão geral da matéria debatida nos presentes autos, para reafirmar a jurisprudência desta Corte, no sentido de que a os crimes previstos na Lei 8.137/1990 não violam o disposto no art. 5º, LXVII, da Constituição. II - Julgamento de mérito conforme precedentes. III - Recurso extraordinário desprovido (ARE 999.425 RG, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 2.3.17). Outro não é o posicionamento encampado pelo Superior revelam que o Recorrente era sócio administrador da empresa nos períodos descritos na denúncia (evento 1, DOC3, p. 17-18 e 21-23). Ademais, a autoria foi confessada pelo Apelante S. M. em Juízo, quando admitiu o não pagamento dos tributos, justificando-os com as dificuldades financeiras que a empresa atravessava, o que o fez optar pelo pagamento de despesas diversas (evento 58, DOC1). Com isso, está provada a autoria. 3. Como visto, o Supremo Tribunal Federal, em 18.12.19, fixou a tese de que "o contribuinte que deixa de recolher, de forma contumaz e com dolo de apropriação, o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/1990" (RHC 163.334, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 18.12.19). A ementa do precedente esclarece que "somente se considera criminosa a inadimplência sistemática, contumaz, verdadeiro modus operandi do empresário, seja para enriquecimento ilícito, para lesar a concorrência ou para financiar as próprias atividades". A Magna Corte já decidiu que "o fato de o inadimplemento tributário ter ocorrido mensalmente, por seis vezes, à míngua de dados circunstanciais que agreguem informações a esse respeito, não caracteriza, por si só, a contumácia do devedor" (RHC 192.854 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, j. 2.10.23). O Superior , rel. Vania Petermann, Quinta Câmara Criminal, j. 06-02-2025)" (evento 53, DOC1). A imposição do regime inicial semiaberto, mesmo que S. M. seja primário e a pena inferior a quatro anos, é permitida pelo art. 33, § 3º, do Código Penal. Nessa linha, do Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 5003447-74.2025.8.24.0038/SC RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO EMENTA APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. FALTA DE RECOLHIMENTO DE ICMS EM CONTINUIDADE DELITIVA (LEI 8.137/90, ART. 2º, II, NA FORMA DO 71, CAPUT, DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO ACUSADO. 1. ATIPICIDADE. INADIMPLÊNCIA FISCAL. 2. PROVA DA AUTORIA. CONTRATO SOCIAL. ADMINISTRADOR DA PESSOA JURÍDICA. PAGAMENTO DOS TRIBUTOS. CONFISSÃO. 3. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO DE APROPRIAÇÃO. INADIMPLEMENTO PROLONGADO. CAPITAL SOCIAL. 4.  CRIME ÚNICO. CONSUMAÇÃO MENSAL. CONTINUIDADE DELITIVA. 5. REGIME PRISIONAL. PENA INFERIOR A QUATRO ANOS. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL. SEMIABERTO (CP, ART. 33, § 3º). SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. ANTECEDENTES. SUFICIÊNCIA (CP, ART. 44, CAPUT, III). 1. O ICMS inclui-se na categoria de tributo indireto, na qual o ônus da incidência tributária é transferido pelo contribuinte a terceiro, por meio da sua inclusão no preço da mercadoria ou no valor da prestação de serviços, de modo que, ao cobrá-lo, declará-lo e não repassá-lo aos cofres públicos, o sujeito passivo pratica a elementar de não recolhimento de tributo "descontado ou cobrado" prevista no art. 2º, II, da Lei 8.137/90, seja em operações próprias ou por substituição tributária, ao passo que a criminalização da conduta não padece de inconvencionalidade ou inconstitucionalidade e não se assemelha à prisão civil por dívida, porquanto é penalmente relevante e não se equipara à mera inadimplência fiscal. 2. A infração penal-tributária consistente em inadimplir ou não arrecadar corretamente o imposto aproveita aos proprietários e administradores da pessoa jurídica, os quais detêm o controle final do fato porque decidem sobre sua prática e suas circunstâncias, de modo que a disposição estatutária que atribui ao acusado, na época dos fatos, a administração da empresa, é suficiente, em regra, à comprovação da autoria, sendo dela o encargo de desconstituir a conclusão lógica que do escrito e comprovado sobressai, o que não ocorre quando ele confessa em juízo a administração financeira da empresa e o não pagamento dos tributos. 3. Há dolo de apropriação se o débito tributário supera o valor do capital social integralizado, está inscrito em dívida ativa há dois anos e não houve nenhuma tentativa de regularização. 4. A consumação do delito de omissão no pagamento de ICMS ocorre em cada mês no qual o tributo não foi recolhido no dia do vencimento, hipótese em que incide a continuidade delitiva, não sendo cabível a consideração de crime único. 5. É adequado o regime prisional semiaberto ao início do cumprimento da pena privativa de liberdade inferior a quatro anos se o acusado ostenta duas condenações aptas a configurar maus antecedentes. 6. Não se mostra insuficiente a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos de prestação de serviços à comunidade ao réu condenado por omissão no recolhimento do ICMS declarado, ainda que ele ostente duas condenações decorrentes da prática do mesmo delito em períodos próximos, nas quais foi aplicada limitação de fim de semana. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara Criminal do decidiu, por maioria, vencido em parte o Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para substituir a pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade, mantidos os demais comandos sentenciais, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Florianópolis, 18 de novembro de 2025. assinado por SÉRGIO RIZELO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6976616v9 e do código CRC c93e9548. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): SÉRGIO RIZELO Data e Hora: 11/11/2025, às 15:30:21     5003447-74.2025.8.24.0038 6976616 .V9 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 08:41:34. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 11/11/2025 A 18/11/2025 Apelação Criminal Nº 5003447-74.2025.8.24.0038/SC RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO PRESIDENTE: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO PROCURADOR(A): ARY CAPELLA NETO Certifico que este processo foi incluído como item 56 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 11/11/2025 às 00:00 e encerrada em 11/11/2025 às 15:27. Certifico que a 2ª Câmara Criminal, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão: APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR SÉRGIO RIZELO NO SENTIDO DE CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO PARA SUBSTITUIR A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE, MANTIDOS OS DEMAIS COMANDOS SENTENCIAIS, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELA DESEMBARGADORA HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO E A DIVERGÊNCIA PARCIAL INAUGURADA PELO DESEMBARGADOR NORIVAL ACÁCIO ENGEL QUANTO À SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVA DE DIREITOS, A 2ª CÂMARA CRIMINAL DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDO EM PARTE O DESEMBARGADOR NORIVAL ACÁCIO ENGEL, CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO PARA SUBSTITUIR A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE, MANTIDOS OS DEMAIS COMANDOS SENTENCIAIS, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador SÉRGIO RIZELO Votante: Desembargador SÉRGIO RIZELO Votante: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL Votante: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO RAMON MACHADO DA SILVA Secretário MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES Divergência - Gab. 04 - 2ª Câmara Criminal - Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL. Divirjo do Excelentíssimo Relator, Desembargador Sérgio Rizelo, quanto à substituição da pena corporal por restritiva de direitos. Isso porque, entendo que os maus antecedentes pela prática do mesmo ilícito indicam a insuficiência da medida, ainda que as sonegações tenham ocorrido em datas próximas. Isso porque, ao que tudo indica, o réu reiterou na conduta por longo período, sendo beneficiado com a substituição nos processos anteriores, nao sendo recomendável que, novamente, tenha a reprimenda substituída. Exceto isso, acompanho o relator. Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 08:41:34. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas