EMBARGOS – direito CIVIL. apelação cível. ACIDENTE DE TRÂNSITO. CULPA CONCORRENTE. parcial provimento.
I. CASO EM EXAME
1. Apelações cíveis interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente a ação indenizatória por dano materiais.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há seis questões em discussão: (i) saber se o laudo pericial produzido pela seguradora extrajudicialmente constitui meio de prova; (ii) saber se o réus são exclusivamente culpados pelo acidente de trânsito; (iii) saber qual a proporção dos danos que os réus devem indenizar; (iv) saber se os lucros cessantes da autora devem ser indenizados; (v) saber se deve ser adequada a limitação da responsabilidade da seguradora; (vi) saber se o salvado do sinistro deve ser descontado da indenização.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. O laudo de perícia extrajudicial, produzido unilateralmente a pedido da seguradora ré, não pode embasar exclusivamente a...
(TJSC; Processo nº 5011815-95.2021.8.24.0011; Recurso: embargos; Relator: Desembargador EDUARDO GALLO JR.; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 13 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6949427 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5011815-95.2021.8.24.0011/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
RELATÓRIO
TRANSBEN TRANSPORTES LTDA. propôs "ação de indenização por danos materiais causados por acidente de trânsito c/c lucros cessantes", perante o Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Brusque, contra BIANCHI TRANSPORTES EIRELI, M. A. D. A. F. e MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A.
Na inicial, narrou que: no dia 24/06/2021, por volta das 15h40min, na altura do Km 183 da BR 364, no município de Pimenta Bueno/RO, o veículo da autora (caminhão VOLVO/FH 460, Placa RDW8C29, e semi-reboque SR/FACHINI SRF LO, Placa REA5E79) foi abalroado pelo veículo da primeira requerida (caminhão MAN/TGX 29.480, Placa QCJ4378), conduzido pelo segundo requerido; a terceira requerida, na condição de seguradora da primeira requerida, é demandada em decorrência da cobertura contratual; o acidente foi causado pelo segundo réu, que colidiu na traseira do veículo da autora, conforme boletim de ocorrência lavrado pela autoridade policial; a autora acionou a seguradora para pagamento da indenização securitária, mas apenas parte dos danos foram reparados, já que foi negada a cobertura em relação aos danos ao caminhão; em razão dos danos ao veículo, o faturamento da autora decaiu no período posterior, o que também merece ser reparado. Ao final, requereu a procedência dos pedidos para condenar os requeridos ao pagamento de R$ 600.000,00 ou R$ 524.155,00, a título de indenização por danos emergentes, e de R$ 120.551,55, a título de indenização por lucros cessantes (evento 1, DOC1).
Citados, primeiro e segundo réus apresentaram contestação. Suscitaram a responsabilidade primária da seguradora ré e, no mérito, apontaram a ausência de culpa no acidente de trânsito, já que não haveria prova de que seu veículo colidiu no veículo da autora antes da colisão desta com terceiro; subsidiariamente, arguiram a culpa concorrente das partes; ainda, impugnaram os danos materiais ventilados na inicial (evento 26, DOC1).
Citada, a terceira requerida apresentou contestação. Alegou que não restou comprovada a culpa do veículo segurado, o que afasta a cobertura dos danos da autora; ainda, impugnou os danos materiais ventilados na inicial, bem como postulou a recuperação do salvado em caso de condenação (evento 33, DOC1).
Réplica ofertada (evento 38, DOC1, evento 41, DOC1).
O feito foi saneado, sendo deferida a produção da prova oral (evento 66, DOC1).
Audiências de instrução e julgamento realizadas no evento 147, DOC1 e evento 216, DOC1.
Alegações finais apresentadas pelos primeiro e segundo réus (evento 233, DOC1).
Na sentença, o Dr. Gilberto Gomes de Oliveira Junior julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos termos do dispositivo a seguir transcrito:
Ante o exposto, resolvo o mérito, nos termos do art. 487, inc. I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais, para:
a) CONDENAR os requeridos, M. A. D. A. F., BIANCHI TRANSPORTES EIRELI EPP e MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A., de forma solidária, ao pagamento de indenização por danos materiais, no valor de R$ 157.246,50 (cento e cinquenta e sete mil, duzentos e quarenta e seis reais e cinquenta centavos), correspondente a 30% (trinta por cento) do valor da Tabela FIPE vigente na data do sinistro (R$ 524.155,00), quantia que deverá ser corrigida pelos índices divulgados pela CGJ/SC (Provimento n. 24/2024), a partir da data do evento danoso (24/06/2021), acrescida de juros de mora, à razão de 1% (um por cento) ao mês, a partir da data do evento danoso, nos termos das Súmulas 43 e 54 do STJ;
b) JULGAR IMPROCEDENTES os demais pedidos (lucros cessantes).
Consigne-se que a seguradora requerida será responsabilizada nos limites da cobertura contratual de responsabilidade civil facultativa para danos materiais a terceiros, nos termos da apólice nº 4603001501831, cujos valores deverão ser atualizados nos termos da Súmula 632 do STJ.
Em razão do princípio da sucumbência, condeno a requerente ao pagamento proporcional de 80% (oitenta por cento) e os requeridos em 20% (vinte por cento) das despesas processuais pendentes, conforme arts. 86 e 87 do CPC.
Estão as partes, igualmente, obrigadas a indenizar as despesas adiantadas no curso do processo pela parte adversa, de forma proporcional à respectiva sucumbência, conforme art. 82, § 2º, do CPC.
Condeno a parte requerida ao pagamento de honorários sucumbenciais em favor do advogado da parte requerente no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor condenação (acrescido dos encargos moratórios), conforme art. 85, § 2.º do CPC.
Em razão da sucumbência recíproca, condeno o requerente ao pagamento de honorários sucumbenciais em favor do advogado do requerido, no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor de que sucumbiu de seu pedido condenatório, devidamente corrigido, nos termos do art. 85, § 2.º do CPC.
Havendo custas processuais quitadas e não utilizadas, autorizo, desde já, sua restituição à parte que efetuou o seu pagamento.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. (evento 237, DOC1)
Os embargos de declaração opostos pela seguradora ré (evento 246, DOC1) foram acolhidos nos seguintes termos:
Ante o exposto, CONHEÇO do presente recurso, em face de sua tempestividade, e o ACOLHO, para retificar o erro material apontado, e assim retificar o dispositivo, o seguinte parágrafo, na forma abaixo especificada, verbis:
Acrescentar à fundamentação:
"Conforme documentação apresentada pela embargante em sede de embargos de declaração, e não impugnada pela parte contrária, o valor do veículo VOLVO FH-460 6x2 2021 na Tabela FIPE de junho/2021 (mês do sinistro) correspondia a R$ 493.254,00 (quatrocentos e noventa e três mil, duzentos e cinquenta e quatro reais), e não R$ 524.155,00 como inicialmente considerado, que se refere ao valor de setembro/2021."
Substituir o parágrafo final da análise de danos materiais:
"Portanto, a indenização devida pelos requeridos deve ser fixada em R$ 147.976,20 (cento e quarenta e sete mil, novecentos e setenta e seis reais e vinte centavos), correspondente a 30% do valor da Tabela FIPE vigente na data do sinistro (30% de R$ 493.254,00), montante que reflete adequadamente a proporcionalidade da responsabilidade apurada no caso concreto."
Substituir a alínea "a" do dispositivo:
"a) CONDENAR os requeridos, M. A. D. A. F., BIANCHI TRANSPORTES EIRELI EPP e MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A., de forma solidária, ao pagamento de indenização por danos materiais, no valor de R$ 147.976,20 (cento e quarenta e sete mil, novecentos e setenta e seis reais e vinte centavos), correspondente a 30% (trinta por cento) do valor da Tabela FIPE vigente na data do sinistro (R$ 493.254,00) (...)"
[...]
No mais, permanece inalterada a decisão atacada. (evento 256, DOC1)
Irresignada, a autora interpôs apelação cível. Argumentou que: (i) a decisão impugnada incorreu em erro ao reconhecer culpa concorrente entre as partes, pois o conjunto probatório demonstraria de forma inequívoca a culpa exclusiva do condutor Marco Aurélio, que colidiu violentamente na traseira do caminhão da autora, arremessando-o contra o veículo à frente; (ii) o croqui do boletim de ocorrência confirmaria que as marcas de frenagem pertenciam ao veículo da empresa Bianchi, evidenciando a dinâmica descrita na inicial; (iii) o juízo a quo atribuiu valor indevido ao laudo pericial unilateral apresentado pelos réus, elaborado sem contraditório, cuja parcialidade inviabilizaria seu uso como elemento de convicção; (iv) a jurisprudência consolidou o entendimento de que se presume a culpa daquele que colide na traseira do veículo à sua frente; (v) ainda que reconhecida a culpa concorrente, o percentual de 30% atribuído aos réus seria desproporcional, devendo ser majorado para 70% diante da preponderância de culpa do motorista que trafegava na retaguarda; (vi) a paralisação de caminhão de transporte comercial gera presunção de prejuízo econômico, o que conduz à indenização dos lucros cessantes. Ao final, postulou o provimento do recurso (evento 253, DOC1 e evento 264, DOC1).
A seguradora ré também interpôs apelação cível, na qual argumentou que: (i) não restou comprovada culpa do condutor do veículo segurado, porquanto a colisão traseira ocorreu após o caminhão da autora ter colidido com o veículo à frente, o que teria provocado vazamento de óleo na pista e, consequentemente, a perda de aderência que ocasionou o segundo impacto; (ii) o conjunto probatório — especialmente o laudo técnico elaborado por engenheiro mecânico especializado e os depoimentos colhidos em audiência — demonstra que o acidente resultou de uma cadeia de eventos independentes e não de conduta culposa do segurado, impondo o reconhecimento de culpa exclusiva da autora; (iii) ainda que mantida a condenação, a responsabilidade da seguradora deve restringir-se ao limite residual da cobertura contratual de responsabilidade civil facultativa para danos materiais, deduzidos valores já pagos a título de conserto do semirreboque; (iv) o contrato de seguro deve ser interpretado restritivamente; (v) na hipótese de subsistir a condenação, deve ser abatido o valor do salvado do veículo sinistrado; (vi) os consectários legais devem observar a redação conferida pela Lei n. 14.905/2024 aos arts. 389 e 406 do Código Civil, aplicando-se o IPCA como índice de correção e a taxa Selic líquida como juros moratórios. Ao final, postulou o provimento do recurso (evento 268, DOC1).
Contrarrazões apresentadas pelos primeiro e segundo réu (evento 277, DOC1).
Contrarrazões apresentadas pelo autor, que suscitou a violação à dialeticidade recursal (evento 278, DOC1).
Este é o relatório.
VOTO
1. Admissibilidade e escopo do caso
Em contrarrazões, a parte autora pugnou pelo não conhecimento do recurso da seguradora em decorrência da violação ao princípio da dialeticidade.
Sobre o assunto, "A jurisprudência do Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5011815-95.2021.8.24.0011/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
EMENTA
ementa: direito CIVIL. apelação cível. ACIDENTE DE TRÂNSITO. CULPA CONCORRENTE. parcial provimento.
I. CASO EM EXAME
1. Apelações cíveis interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente a ação indenizatória por dano materiais.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há seis questões em discussão: (i) saber se o laudo pericial produzido pela seguradora extrajudicialmente constitui meio de prova; (ii) saber se o réus são exclusivamente culpados pelo acidente de trânsito; (iii) saber qual a proporção dos danos que os réus devem indenizar; (iv) saber se os lucros cessantes da autora devem ser indenizados; (v) saber se deve ser adequada a limitação da responsabilidade da seguradora; (vi) saber se o salvado do sinistro deve ser descontado da indenização.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. O laudo de perícia extrajudicial, produzido unilateralmente a pedido da seguradora ré, não pode embasar exclusivamente a admissão dos fatos ocorridos. Contudo, constitui elemento de convicção à disposição do magistrado, especialmente se as conclusões são corroboradas por outros elementos.
4. No caso, os elementos probatórios dos autos conduzem ao reconhecimento de que o veículo dos réus colidiu com o da autora após uma primeira colisão, entre esta e terceiro, a qual causou o derramamento de óleo na pista e prejudicou a frenagem efetiva. E havendo óleo na pista, derrui-se a presunção relativa de culpa exclusiva daquele que colide na traseira de outro veículo.
5. Contudo, não foi comprovado que a quantidade de óleo era excepcionalmente exagerada, de modo que não foi a única causa da impossibilidade de frenagem tempestiva, já que, de qualquer forma, o motorista réu deveria ter guardado maior distância do veículo da autora. Ademais, a própria seguradora reconheceu a culpa (ainda que parcial) do veículo dos réus, já que indenizou a parte autora pelos danos ao semirreboque. Portanto, houve culpa concorrente entre as partes.
6. Não há fórmula matemática para apurar a proporção exata da responsabilidade dos réus pelos danos ao veículo da autora. Considerando que a colisão em questão não foi a causa principal da perda total do caminhão da autora e que, para a colisão, os réus contribuíram apenas em parte, é adequado o percentual arbitrado pelo sentenciante.
7. Ainda que presumida a perda de faturamento da autora ante as avarias no seu veículo, não há como imputar aos réus, que não causaram os danos ensejadores da perda total do caminhão, responsabilidade pelos lucros cessantes.
8. É incontroverso nos autos que os danos ao semirreboque transportado pela autora no momento do acidente foram indenizados pela seguradora. Tendo em vista que tal indenização se refere ao mesmo evento coberto pela apólice securitária acionada, não há razão para não considerá-lá no montante total segurado, inclusive para fins de limitação da responsabilidade securitária.
9. Embora o salvado deva ser transferido à seguradora, isso restou inviabilizado no caso, já que a parte autora também foi responsabilizada por parte dos danos sofridos. Não se olvida que tal problema seria facilmente resolvido mediante compensação proporcional do valor do salvado, mas nenhuma prova foi produzida quanto ao montante, o que seria imprescindível para tal desiderato.
IV. DISPOSITIVO E TESE
10. Recurso da seguradora ré parcialmente provido. Recurso da autora desprovido.
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Jurisprudência relevante citada: TJSC, AC n. 5006351-09.2021.8.24.0135, Quarta Câmara de Direito Civil, rel. José Agenor de Aragão, j. 25.09.2025; TJSC, AC n. 0501824-50.2012.8.24.0008, Quarta Câmara de Direito Civil, Rel. Helio David Vieira Figueira dos Santos, j. 31.07.2023.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso da autora e dar parcial provimento ao recurso da seguradora ré, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6949428v5 e do código CRC 9539eb27.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR
Data e Hora: 13/11/2025, às 18:06:04
5011815-95.2021.8.24.0011 6949428 .V5
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 11/11/2025 A 18/11/2025
Apelação Nº 5011815-95.2021.8.24.0011/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
PRESIDENTE: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
PROCURADOR(A): ANTENOR CHINATO RIBEIRO
Certifico que este processo foi incluído como item 21 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 11/11/2025 às 00:00 e encerrada em 13/11/2025 às 12:32.
Certifico que a 6ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA SEGURADORA RÉ.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
Votante: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST
Votante: Desembargador JOAO DE NADAL
JULIANA DE ALANO SCHEFFER
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 09:01:38.
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