EMBARGOS – Documento:6971942 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5021890-64.2020.8.24.0033/SC RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA RELATÓRIO De pronto, tenho por bem adotar o relatório da sentença, pois além de refletir fielmente a narrativa fática em apreço, garante celeridade ao trâmite processual (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), in verbis: Trata-se de ação ajuizada por DANURI IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA em face de 3W DO BRASIL IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO S.A. Narra a autora que, em 29-4-2020, firmou com a parte ré contrato de Sociedade em Conta de Participação (SCP), com o escopo de realizar a importação e comercialização de testes rápidos de Covid-19. A autora, na qualidade de sócia participante, aportou capital no montante de R$ 1.500.000,00, cabendo à ré, na condição de sócia ostensiva, a operacionalização e a execução integral da importação.
(TJSC; Processo nº 5021890-64.2020.8.24.0033; Recurso: embargos; Relator: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6971942 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5021890-64.2020.8.24.0033/SC
RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
RELATÓRIO
De pronto, tenho por bem adotar o relatório da sentença, pois além de refletir fielmente a narrativa fática em apreço, garante celeridade ao trâmite processual (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), in verbis:
Trata-se de ação ajuizada por DANURI IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA em face de 3W DO BRASIL IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO S.A.
Narra a autora que, em 29-4-2020, firmou com a parte ré contrato de Sociedade em Conta de Participação (SCP), com o escopo de realizar a importação e comercialização de testes rápidos de Covid-19. A autora, na qualidade de sócia participante, aportou capital no montante de R$ 1.500.000,00, cabendo à ré, na condição de sócia ostensiva, a operacionalização e a execução integral da importação.
Aduz que a requerida não observou os deveres legais e contratuais inerentes à sua posição, deixando de realizar a separação contábil da SCP, utilizando os recursos investidos em nome próprio e realizando a operação de importação sem vincular expressamente a SCP junto à Receita Federal, o que culminou na apreensão das mercadorias e aplicação de pena de perdimento, nos termos da legislação aduaneira.
Ressaltou que não obteve qualquer retorno financeiro, tampouco ressarcimento parcial do valor investido, embora tenha promovido tentativas extrajudiciais de resolução da controvérsia. Alega que a conduta da requerida violou gravemente o contrato firmado e ensejou prejuízo direto à autora, impossibilitando a obtenção de qualquer resultado útil do negócio.
Postulou, assim, pela a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos materiais no valor total de R$ 1.650.000,00, correspondente à soma do valor aportado e da cláusula penal prevista no contrato (10% sobre o capital investido).
A tutela de urgência foi indeferida (Evento 7).
Citada, a ré apresentou contestação, na qual sustentou, em resumo, a legalidade dos atos praticados, a ausência de dolo ou culpa e a inexistência de responsabilidade exclusiva pela perda dos produtos importados. Alegou ainda que os riscos inerentes à operação foram assumidos por ambas as partes, nos moldes do contrato celebrado (Evento 111).
Sobreveio réplica, reafirmando os argumentos iniciais (Evento 115).
Sobreveio decisão de saneamento do feito (Evento 124), momento em que a preliminar arguida pela ré foi afastada, designando-se audiência de instrução e julgamento.
Na solenidade aprazada foi promovida a oitiva de apenas uma testemunha (Evento 138).
As partes apresentaram alegações finais (Eventos 148 e 152).
Após, sobreveio a parte dispositiva da sentença (evento 155, SENT1), nos seguintes termos:
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na exordial, a teor do art. 487, I, do CPC para, em consequência:
a) DECLARAR extinta a Sociedade em Conta de Participação firmada entre as partes em 29-4-2020, por impossibilidade de prosseguimento do objeto social; e
b) CONDENAR a parte ré ao pagamento de R$ 1.650.000,00, a título de reparação por danos materiais, acrescido de correção monetária, nos termos a seguir:
Acerca dos consectários legais, a correção monetária deve se dar, segundo o histórico de indexadores do iCGJ, observando-se a aplicação do INPC até 29.08.2024, e do IPCA a partir de 30.08.2024, nos termos do art. 389, parágrafo único, do Código Civil.
O valor deverá ser acrescido, ainda, de juros de mora, observado o índice de 1% ao mês até 29.08.2024, e, após 30.08.2024, a variação da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), deduzido o índice de atualização monetária (art. 406, § 1º, do Código Civil).
Ainda, condeno a parte ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% do valor da condenação (CPC, art. 85, 2°).
Foram opostos embargos de declaração pela autora Danuri Importação e Exportação Ltda. (evento 160, EMBDECL1), os quais foram conhecidos e rejeitados (evento 167, SENT1), oportunidade em que fora aplicada à embargante a multa de 2% (dois por cento) do valor atualizado da causa, em razão da oposição de embargos de declaração fora das hipóteses de cabimento previstas na legislação (CPC, art. 1.022, I a III).
Irresignadas, ambas as partes apelaram (evento 188, APELAÇÃO1 e evento 190, APELAÇÃO1).
A parte autora objetiva a reforma da sentença para complementá-la, sanando a omissão quanto ao termo inicial da correção monetária e dos juros de mora e, ainda, o afastamento da condenação ao pagamento da multa de 2%, uma vez que ausente qualquer traço de má-fé ou protelação na interposição dos embargos então opostos. Requer, ainda, o prequestionamento dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais apontados no recurso, para fins de eventual necessidade de interposição de recurso para as instâncias superiores.
Por seu turno, a ré 3W do Brasil Importação e Exportação S.A. pugna pela reforma da decisão, sob a assertiva de que "o risco do negócio, ordinariamente repartido, permaneceu presente durante todo o procedimento de importação. Este, aliás, se desenvolveu tal como acordado até a chegada dos produtos ao porto, ocasião em que a aduana resolveu averiguar o negócio havido." (evento 190, APELAÇÃO1, pág. 7)
Afirma ter procurado "reverter o quadro da conclusão administrativa da aduana através da apresentação de elementos de convicção voltados à confirmar a regularidade da importação, sendo, no entanto, desconsiderados pela autoridade aduaneira na oportunidade, conforme prova do evento 111, ANEXO3, tanto que obteve, no começo do processo, uma decisão favorável a qual, posteriormente, foi revertida no âmbito do devido processo legal" (evento 190, APELAÇÃO1, pág. 7), de modo que teria procurado aplicar todas as medidas ao seu alcance para minimizar as consequências da situação.
Assevera que, diante deste quadro, a perda do capital, "não pode ser tratada como um dano civil, até mesmo porque, conforme asseverado na defesa, há a definição do prejuízo e, portanto, da perda, pressupõe o debate societário acerca dos riscos do negócio e consequências decorrentes da atuação da aduaneira que obstou a continuidade da operação apresentada na declaração de importação" (evento 190, APELAÇÃO1, págs. 7 e 8), devendo ser encarada como uma consequência jurídica ocasionada pela aduana que interrompeu o curso do despacho aduaneiro, não configurando a responsabilidade civil ostensiva, mas sim questão societária a ser resolvida por meio de liquidação e prestação de contas.
Ressalta que o risco foi ordinário e deve ser partilhado, porquanto os mecanismos da Fazenda Nacional, com o fim de obstar a continuidade do desembaraço aduaneiro foram alheios à apelante, razão pela qual a pretensão deduzida na inicial, inclusive no tocante à percepção da cláusula penal, não poderia prosperar.
Assim, postula pelo conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença de primeiro grau, julgando improcedentes os pedidos iniciais, com a consequente inversão do ônus sucumbencial.
Com as contrarrazões apresentadas apenas pela parte autora (evento 196, CONTRAZAP1), os autos ascenderam a esta Corte, sendo, então, distribuídos ao Des. Silvio Dagoberto Orsatto que, diante das informações prestadas pela Diretoria de Cadastro e Distribuição Processual (evento 5, INF1), determinou a redistribuição a uma das Câmaras de Direito Comercial (evento 7, DESPADEC1), vindo-me, então, conclusos.
É o relatório.
VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos.
Tratam-se de recursos de apelações cíveis interpostos por Danuri Importação e Exportação Ltda. e 3W do Brasil Importação e Exportação S.A. contra a sentença que julgou procedente a "ação de reparação de danos materiais c/c indenização e restituição de valores investidos e pedido de tutela de urgencia / evidência" proposta pela primeira em face da segunda, para o fim de declarar extinta a Sociedade em Conta de Participação firmada entre as partes, por impossibilidade de prosseguimento do objeto social e condenar a ré ao pagamento de R$ 1.650.000,00, a título de reparação por danos materiais à autora, devidamente atualizado, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Do Apelo da Ré.
A recorrente sustenta que "o risco do negócio, ordinariamente repartido, permaneceu presente durante todo o procedimento de importação. Este, aliás, se desenvolveu tal como acordado até a chegada dos produtos ao porto, ocasião em que a aduana resolveu averiguar o negócio havido." (evento 190, APELAÇÃO1, pág. 7)
Afirma ter procurado "reverter o quadro da conclusão administrativa da aduana através da apresentação de elementos de convicção voltados à confirmar a regularidade da importação, sendo, no entanto, desconsiderados pela autoridade aduaneira na oportunidade, conforme prova do evento 111, ANEXO3, tanto que obteve, no começo do processo, uma decisão favorável a qual, posteriormente, foi revertida no âmbito do devido processo legal" (evento 190, APELAÇÃO1, pág. 7), de modo que teria procurado aplicar todas as medidas ao seu alcance para minimizar as consequências da situação.
Assevera que, diante deste quadro, a perda do capital, "não pode ser tratada como um dano civil, até mesmo porque, conforme asseverado na defesa, há a definição do prejuízo e, portanto, da perda, pressupõe o debate societário acerca dos riscos do negócio e consequências decorrentes da atuação da aduaneira que obstou a continuidade da operação apresentada na declaração de importação" (evento 190, APELAÇÃO1, págs. 7 e 8), devendo ser encarada como uma consequência jurídica ocasionada pela aduana que interrompeu o curso do despacho aduaneiro, não configurando a responsabilidade civil ostensiva, mas sim questão societária a ser resolvida por meio de liquidação e prestação de contas.
Ressalta que o risco foi ordinário e deve ser partilhado, porquanto os mecanismos da Fazenda Nacional, com o fim de obstar a continuidade do desembaraço aduaneiro foram alheios à apelante, razão pela qual a pretensão deduzida na inicial, inclusive no tocante à percepção da cláusula penal, não poderia prosperar.
Pois bem.
A sentença combatida reconheceu, com base no "auto de infração e termo de apreensão e guarda fiscal" (evento 1, OUT11), que a ré agiu com imprudência, imperícia e negligência na condução das operações de importação, descumprindo obrigações contratuais expressas no instrumento de constituição da Sociedade em Conta de Participação (SCP).
Com efeito, exsurge do processado que a Receita Federal lavrou referido auto e aplicou pena de perdimento às mercadorias importadas, em razão de "interposição fraudulenta na importação" (evento 1, OUT11, pág. 2), pela não comprovação da origem dos recursos utilizados na operação. Logo, a conduta da ré, ao não segregar contabilmente os patrimônios da SCP e ao tratar os recursos da sócia participante como próprios, violou as normas legais e contratuais acima elencadas, configurando ato ilícito nos termos do art. 186 do Código Civil.
Já a alegação de que os riscos do negócio deveriam ser partilhados não se sustenta diante da natureza da Sociedade em Conta de Participação, em que o sócio ostensivo responde exclusivamente pelas obrigações perante terceiros (art. 991, parágrafo único, do Código Civil), vejamos:
Art. 991. Na sociedade em conta de participação, a atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, participando os demais dos resultados correspondentes.
Parágrafo único. Obriga-se perante terceiro tão-somente o sócio ostensivo; e, exclusivamente perante este, o sócio participante, nos termos do contrato social.
A propósito, Marlon Tomazete define a sociedade em conta de participação como "uma sociedade oculta, que não aparece perante terceiros, sendo desprovida de personalidade jurídica. O que a caracteriza é a existência de dois tipos de sócios, quais sejam, o sócio ostensivo, que aparece e assume toda a responsabilidade perante terceiros, e o sócio participante (Também conhecido como sócio oculto, que não aparece perante terceiros e só tem responsabilidade perante o ostensivo, nos termos do ajuste entre eles" (Curso de Direito Empresarial: Teoria Geral e Direito Societário. volume I. São Paulo: Atlas, 2008. p. 280).
Por sua vez, José Carlos Carota elucida que "A conta de participação é, na realidade, um contrato de investimento comum, onde existem sócios ostensivos (empreendedor que participa com o capital e trabalho) que assumem a responsabilidade perante terceiros, e os sócios participantes ou ocultos que são os investidores" (A Sociedade em Conta de Participação e o Lucro Presumido. Revista Autônoma de Direito Privado. Curitiba: Juruá, n.5, jul/dez 2008. p. 230).
E, para arrematar, as lições de Amador Paes de Almeida:
Inexistindo sociedade comercial perante terceiros, girando os negócios exclusivamente em nome do sócio ostensivo, é evidente que só a este, e exclusivamente a este, cabe a gerência e administração dos negócios. Assim, o sócio-administrador é o próprio sócio ostensivo, que em seu nome e risco exerce o comércio. (Manual das Sociedades Comerciais. 16ª ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2007. p. 117/118).
Desse modo, como bem salientado pelo sentenciante, "o contrato firmado entre as partes estipula que a sócia ostensiva é responsável por cumprir a legislação vigente, notadamente a tributária, aduaneira e sanitária (cláusula 3.2), sendo-lhe imputável toda e qualquer falha que ocasione dano à SCP ou à sócia participante (cláusulas 3.2.1 e 5.3)" (evento 155, SENT1), vejamos:
3.2 Conforme previsto no item precedente, a venda/comercialização das mercadorias importadas também será efetuada pela SÓCIA OSTENSIVA, que agirá sempre em seu próprio nome, respeitando sempre a legislação vigente, em especial quanto às questões tributárias, sanitárias, aduaneiras e outras de qualquer natureza que devam ser observadas para a perfeita realização das operações.
3.2.1 A SÓCIA OSTENSIVA ficará será única responsável através de ação regressiva provocada pela SÓCIA PARTICIPANTE, pelos atos praticados por ingerência de atuação, inclusive, danos direitos e indiretos ocasionados à SÓCIA PARTICIPANTE e perante terceiros.
[...].
5.3 Pelo descumprimento de qualquer dispositivo descrito neste instrumento, responderá a parte infratora por uma penalidade de 10% (dez por cento) do capital social da SCP, a título multa por de infração contratual, a ser paga para cada parte prejudicada.
Portanto, ao estabelecer de forma precisa a responsabilidade objetiva da sócia ostensiva pelos atos praticados por ingerência de atuação, o instrumento contratual impõe que a má condução da operação, com violação de normas legais e contratuais, enseje responsabilidade civil direta, sendo plenamente cabível a reparação dos danos materiais sofridos pela sócia participante.
In casu, os atos de ingerência praticados pela sócia ostensiva restaram amplamente demonstrados no conjunto probatório, evidenciando-se, desde logo, que a ré deixou de segregar a contabilidade da Sociedade em Conta de Participação, ao tratar os valores aportados pela sócia participante como próprios, conduta esta, vedada pelas normas da Receita Federal, especialmente pela Instrução Normativa RFB n. 1.199/2011, que exige escrituração contábil segregada das operações da SCP, em contas ou subcontas distintas, ou, alternativamente, em livros contábeis próprios devidamente registrados.
Por outro lado, constata-se que a Declaração de Importação foi emitida unicamente em nome da ré, sem qualquer menção à Sociedade em Conta de Participação, o que configura interposição fraudulenta presumida, nos termos do art. 23, §2º, do Decreto-Lei n. 1.455/76, diante da ausência de comprovação quanto à origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados na operação.
Além das irregularidades formais já apontadas, verifica-se que, ao contrário do alegado pela parte apelante, esta não adotou providências efetivas para reverter a apreensão das mercadorias ou minimizar os prejuízos decorrentes, tampouco prestou contas quanto ao destino dos recursos ou às medidas supostamente adotadas.
Aliás, a prova oral colhida na origem (evento 138, TERMOAUD1) reforça essa conclusão, uma vez que a única testemunha — a auditora fiscal Rita de Cássia Spolaor — relatou, em síntese, que naquele período a ré não conseguiu comprovar a origem dos recursos utilizados na operação internacional e que a pena de perdimento aplicada pela Receita Federal decorreu da inércia da própria empresa, que deixou de apresentar defesa administrativa sob o argumento de que ingressaria diretamente em juízo (evento 138, VÍDEO2).
Logo, todo o conjunto probatório evidencia que o insucesso da operação não decorreu de fato externo ou fortuito, mas sim de ato próprio da sócia ostensiva, que, ao comprometer a viabilidade da operação por ato próprio e isolado, culminou na perda do capital investido e na inviabilidade do objeto social, não sendo possível, a toda evidência, afastar sua responsabilidade.
Ressalte-se, por fim, que não merece acolhida o argumento de que a controvérsia deveria ser solucionada por meio de liquidação e prestação de contas, uma vez que não se trata de partilha de resultados, mas sim de inadimplemento contratual e consequente responsabilização civil, matéria própria de ação indenizatória.
Dessa forma, diante da apreensão das mercadorias e da expiração da validade dos produtos, que inviabilizaram o prosseguimento do objeto social, impõe-se a extinção da sociedade e a consequente condenação da ré, nos termos do art. 1.034, II, do Código Civil, sendo inconteste sua responsabilidade, o que torna imperativa a manutenção da sentença no ponto.
Do recurso da Parte Autora.
Da omissão da sentença quanto à indicação do dies a quo de incidência da correção monetária.
A parte autora sustenta que "tanto os embargos como o presente recurso visam justamente permitir a atuação do Juízo dentro de sua competência legal e constitucional, para evitar contradições e omissões que comprometam a utilidade e exequibilidade da sentença." (evento 188, APELAÇÃO1, pág. 7), razão pela qual busca a complementação do julgado no particular.
Com efeito, colhe-se da parte dispositiva da sentença:
"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na exordial, a teor do art. 487, I, do CPC para, em consequência:
a) DECLARAR extinta a Sociedade em Conta de Participação firmada entre as partes em 29-4-2020, por impossibilidade de prosseguimento do objeto social; e
b) CONDENAR a parte ré ao pagamento de R$ 1.650.000,00, a título de reparação por danos materiais, acrescido de correção monetária, nos termos a seguir:
Acerca dos consectários legais, a correção monetária deve se dar, segundo o histórico de indexadores do iCGJ, observando-se a aplicação do INPC até 29.08.2024, e do IPCA a partir de 30.08.2024, nos termos do art. 389, parágrafo único, do Código Civil.
O valor deverá ser acrescido, ainda, de juros de mora, observado o índice de 1% ao mês até 29.08.2024, e, após 30.08.2024, a variação da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), deduzido o índice de atualização monetária (art. 406, § 1º, do Código Civil).
Ainda, condeno a parte ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% do valor da condenação (CPC, art. 85, 2°)."
Analisando-se o decisum objurgado, verifica-se que, efetivamente, não consta o marco inicial de ditos consectários legais, razão pela qual passo a fazê-lo, na forma do art. 1.013, § 3º, III, do Código de Processo Civil.
Desse modo, em se tratando de relação negocial contratual e reparação por danos materiais, a correção monetária opera-se do arbitramento (Súmula 362/STJ) e, por outro lado, os juros de mora operam-se desde a citação (art. 405, do CC).
A propósito, mutatis mutandis:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. TELEFONIA MÓVEL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DAS PARTES.APELO DA EMPRESA DE TELEFONIA RÉ. PERDAS E DANOS. IMPOSSIBILIDADE DE RESTABELECIMENTO DA LINHA TELEFÔNICA ORIGINAL. CONVERSÃO DA OBRIGAÇÃO QUE SE IMPÕE (ART. 499 DO CPC). DECISUM ACERTADO QUANTO AO PONTO. ALEGADA A INEXISTÊNCIA DE DANOS MORAIS. TESE RECHAÇADA. AUSÊNCIA DE SOLICITAÇÃO DO DEMANDANTE PARA CANCELAR A LINHA E O RESPECTIVO NÚMERO. REQUERIDA QUE NÃO JUSTIFICA A INDEVIDA SUSPENSÃO DO TERMINAL TELEFÔNICO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SITUAÇÃO QUE EXTRAPOLOU O MERO ABORRECIMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 14 DA LEI CONSUMERISTA E ARTS. 186 E 927 AMBOS DO CÓDIGO CIVIL. DEVER DE INDENIZAR CONGIFURADO. SENTENÇA MANTIDA NO TÓPICO.INSURGÊNCIA COMUM. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PLEITO DE MINORAÇÃO DO IMPORTE FIXADO PELO JUÍZO A QUO. VERBA FIXADA EM PRIMEIRO GRAU EM PATAMAR DESALINHADO AO CASO CONCRETO. REDUÇÃO PARA MONTANTE MELHOR HARMONIZADO COM AS CIRCUNSTÂNCIAS SUB EXAMINE E COM OS RECENTES JULGADOS DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA, GUARDANDO O NECESSÁRIO CARÁTER PEDAGÓGICO E INIBIDOR AO CASO CONCRETO. OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. REFORMA DA SENTENÇA NO TÓPICO.APELO DO AUTOR. INSURGÊNCIA QUANTO À TAXA SELIC E DIES A QUO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS. NECESSÁRIA ADOÇÃO DO INPC COMO INDEXADOR MONETÁRIO. PRECEDENTES DESTE AREÓPAGO E DA CORTE DA CIDADANIA. JUROS MORATÓRIOS QUE DEVEM FLUIR DESDE A CITAÇÃO, NOS TERMOS DO ART. 405 DO CÓDIGO CIVIL. REFORMA DO DECISUM QUANTO AO PONTO. CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DO ARBITRAMENTO DA VERBA (SÚMULA 362, STJ). RECURSO DA RÉ CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DO AUTOR CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0300278-84.2019.8.24.0076, do , rel. Luiz Felipe Schuch, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 25-02-2021, grifei).
Assim, necessária a reforma da sentença quanto à data de incidência da correção monetária e dos juros de mora.
Da multa imposta em sede de embargos de declaração.
Por fim, é de se acolher o pedido de afastamento da penalidade imposta a título de multa, uma vez que, considerada a narrativa constante nos embargos de declaração — ora acolhida —, não se configura pretensão protelatória por parte da apelante ao interpor referidos aclaratórios.
Do prequestionamento.
No que se refere ao aventado prequestionamento, oportuno salientar que é desnecessária a manifestação expressa acerca dos dispositivos legais e constitucionais alegados pela demandante, uma vez que o Magistrado não está obrigado a se pronunciar sobre todos os dispositivos legais inerentes à pretensão judicial quando houver nos autos elementos suficientes à formação de sua convicção.
Até porque, é cediço que "embora o aresto objurgado não tenha feito menção expressa ao dispositivo legal tido por violado, a tese jurídica a ser enfrentada ficou bem delimitada no julgamento realizado pelo Tribunal estadual, circunstância que indica a devolutividade da matéria ao Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5021890-64.2020.8.24.0033/SC
RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
EMENTA
APELAÇÕES CÍVEIS. "AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS C/C INDENIZAÇÃO E RESTITUIÇÃO DE VALORES INVESTIDOS E PEDIDO DE TUTELA DE URGêNCIA/EVIDÊNCIA". sociedade em conta de participação. sentença de procedência, que declarou extinta a sociedade em questão por impossibiliade de prosseguimento do objeto social e condenou a ré ao pagamento de indenização à título de reparação por danos materiais. insurgências de ambas as partes.
apelo da ré.
pretenso afastamento da responsabilidade civil, sob a assertiva de que a perda do capital não configuraria dano civil, mas questão societária a ser resolvida por meio de liquidação e prestação de contas. tese insubsistente. lavratura do auto de infração pela receita federal com a aplicação de perdimento das mercadorias importadas, que derivou da prática de interposição fraudulenta na importação, em que a parte demandada deixou de comprovar a origem dos recursos utilizados na operação. conduta que acabou por violar as normas legais e contratuais estabelecidas entre as partes. outrossim, impossibilidade de partilha dos riscos do negócio ao sócio participante, uma vez que o sócio ostensivo responde exclusivamente pelas obrigações perante terceiros. exegese do art. 991, parágrafo único, do código civil. contrato da sociedade em questão que estabelece a responsabilidade objetiva da sócia ostensiva pelos atos praticados por ingerência de atuação, os quais, foram devidamente comprovados nos autos. responsabilidade pelo pagamento dos danos materiais sofridos pela sócia participante inconteste. ademais, impossibilidade de cumprimento do objeto social do contrato, que conduz à resolução do contrato, com a atribuição do pagamento da cláusula penal. SENTENÇA escorreita.
apelo da autora.
Aventada omissão do julgado quanto ao dies a quo de incidência da correção monetária e dos juros de mora. acolhimento. sentença objurgada que deixou de fixar ditos marcos. HIPÓTESE DO ART. 1.013, 3º, III, DO CPC. correção monetária que deve fluir da sentença e juros de mora da citação.
INSURGÊNCIA QUANTO À MULTA IMPOSTA EM SEDE DE ACLARATÓRIOS, PREVISTA NO ART. 1.026, §2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AFASTAMENTO QUE SE IMPÕE, TENDO EM VISTA A INEXISTÊNCIA DE CUNHO PROTELATÓRIO DO REFERIDO RECLAMO.
HONORÁRIOS RECURSAIS. OBEDIÊNCIA AO DISPOSTO NOS §§ 1º E 11º DO ARTIGO 85 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. NECESSIDADE DE FIXAÇÃO ANTE O DESPROVIMENTO DO RECLAMO da ré. PRECEDENTES.
RECURSO da ré conhecido e desprovido.
recurso da autora conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Câmara de Direito Comercial do decidiu, por unanimidade, conhecer o recurso interposto pela parte ré e negar-lhe provimento, e conhecer do recurso da parte autora e dar-lhe provimento, a fim de, com fundamento no art. 1.013, § 3º, III, do Código de Processo Civil, fixar o dies a quo da correção monetária e dos juros de mora conforme fundamentação, bem como afastar a condenação ao pagamento da multa arbitrada, diante da ausência de caráter protelatório nos embargos anteriormente opostos, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 19 de novembro de 2025.
assinado por JOSÉ MAURÍCIO LISBOA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6971943v11 e do código CRC 221f3062.
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Signatário (a): JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
Data e Hora: 13/11/2025, às 14:57:14
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 13/11/2025 A 19/11/2025
Apelação Nº 5021890-64.2020.8.24.0033/SC
RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
PRESIDENTE: Desembargador MARIANO DO NASCIMENTO
Certifico que este processo foi incluído como item 135 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 13/11/2025 às 00:00 e encerrada em 13/11/2025 às 14:08.
Certifico que a 1ª Câmara de Direito Comercial, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 1ª CÂMARA DE DIREITO COMERCIAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER O RECURSO INTERPOSTO PELA PARTE RÉ E NEGAR-LHE PROVIMENTO, E CONHECER DO RECURSO DA PARTE AUTORA E DAR-LHE PROVIMENTO, A FIM DE, COM FUNDAMENTO NO ART. 1.013, § 3º, III, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, FIXAR O DIES A QUO DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA CONFORME FUNDAMENTAÇÃO, BEM COMO AFASTAR A CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DA MULTA ARBITRADA, DIANTE DA AUSÊNCIA DE CARÁTER PROTELATÓRIO NOS EMBARGOS ANTERIORMENTE OPOSTOS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
Votante: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA
Votante: Desembargador MARIANO DO NASCIMENTO
Votante: Desembargador LUIZ ZANELATO
PRISCILA DA ROCHA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 07:53:00.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas