(TJSC; Processo nº 5052208-60.2020.8.24.0023; Recurso: embargos; Relator: Desembargadora HAIDÉE DENISE GRIN; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 13 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6865728 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5052208-60.2020.8.24.0023/SC
RELATORA: Desembargadora HAIDÉE DENISE GRIN
RELATÓRIO
R. B. e I. C. F. B. propuseram "AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE, PERDAS E DANOS E TUTELA DE URGÊNCIA", perante a 6ª Vara Cível da Comarca de Florianópolis, contra A. N. Q. (evento 1, da origem).
Forte no princípio da celeridade e utilizando as ferramentas informatizadas, adota-se o relatório da sentença recorrida, por sintetizar o conteúdo dos autos (evento 394, da origem), in verbis:
I. C. F. B. e R. B. ajuizaram a presente "ação de rescisão contratual c/c pedido de reintegração de posse, perdas e danos e tutela de urgência" contra A. N. Q..
Alegaram os autores que, em meados de 2019, foram procurados pelo réu, que pretendia adquirir terreno com ampla área, na região do Ribeirão da Ilha.
Após negociações, em 13.09.2019 as partes firmaram contrato particular de compra e venda de terreno de área total de 97.201,83m², pelo preço de R$ 3.200.000,00.
Apresentaram a forma de pagamento: a) R$ 1.400.000,00 divididos, em 30 parcelas mensais de R$ 20.000,00, sendo a primeira de vencimento em 13.05.2019; 6 parcelas semestrais de R$ 133.300,00, sendo a primeira em 10.11.2019, e a última em 10.05.2022; e b) R$ 1.800.000,00 permutados em 10 apartamentos entre 50 e 60m², que deveriam ser construídos em local indicado pelos autores, no prazo máximo de entrega em 13.08.2020 e, se não fosse possível a entrega, o valor seria liquidado, no termo aprazado.
Afirmaram que receberam apenas 5 parcelas no valor de R$ 20.000,00, intempestivamente.
Discorreram sobre composição da corretagem, no total de R$ 108.000,00, a serem pagos à empresa do réu, por ele; sendo que aos autores coube o pagamento de R$ 84.000,00, dividido em 2 parcelas. Teriam sido pagos, pelos autores, R$ 20.000,00, sendo que outros R$ 20.000,00 foram compensados - o que totalizaria do valor sobre a corretagem R$ 192.000,00.
Discorreram sobre inadimplência do réu, e mora.
Afirmaram que, com artimanhas do réu, em meados de 05.2020, os autores acabaram anuindo com a venda de uma fração de 288m² para um terceiro; e que, recentemente, tomaram conhecimento de que o réu vende mais lotes a terceiros, de modo ilegal; e que os compradores, inclusive, iniciaram construções no local; e que o réu, inclusive, estaria construindo casa no local, para montar escritório de venda do loteamento irregular.
Discorreram sobre existência de perdas e danos; e multa contratual.
Pediram tutela provisória de urgência para averbação da existência da ação na matrícula do imóvel; para sua reintegração na posse do bem; paralisação das obras no terreno, com proibição do réu nele adentrar; e proibição de continuidade de anúncio de venda de qualquer fração do imóvel.
No mérito, pediram confirmação da tutela provisória de urgência; rescisão do contrato; condenação do réu ao pagamento de multa de 10%; e a condenação do réu ao pagamento de indenização por perdas e danos, a serem apurados.
Os autores aditaram a inicial, no Evento 6, para pedir restrição de veículo de placa FKZ 9998, via Renajud, sob o fundamento de que tal bem fora dado em pagamento ao réu, na ocasião da venda da única fração em que anuíram a alienação.
A decisão do Evento 8 postergou a análise a respeito da reintegração de posse pedida em sede de tutela provisória de urgência para momento posterior à resposta do réu; deferiu o pedido para paralisação das obras no terreno, e de proibição de anúncio, venda, promessa de transferência de fração do imóvel; e determinou que fosse determinada placa de aviso no imóvel.
Na sequência, a decisão do Evento 10 deferiu a inclusão de restrição de transferência do veículo de placa FKZ 9998.
Posteriormente, os autores pediram o cancelamento da restrição de transferência do automóvel (Evento 23), o que foi deferido.
Pediram os autores arresto de R$ 20.000,00, no Evento 43, o que foi indeferido (Evento 46).
Reiteraram os autores, no Evento 234, o pedido de reintegração de posse, em sede de tutela provisória de urgência, que foi indeferido no Evento 236.
Citado o réu por hora certa, no Evento 243.
Sendo revel, e não tendo constituído advogado, foi-lhe nomeado curador especial (Evento 263).
Compareceu o réu ao processo, e apresentou a contestação do Evento 282.
Preliminarmente, alegou ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, na falta de regularidade na notificação.
Alegou que, no ato da assinatura do negócio, foram pagos R$ 108.000,00, a título de comissão; 5 parcelas de R$ 20.000,00; e 10 cheques de R$ 6.000,00, quando na anuência da venda de lote a terceiro, num total de pagamento de R$ 268.000,00.
Impugnou notificação extrajudicial recebida, por si, alegando falsificação de sua assinatura.
Alegou ausência de descumprimento contratual, e de venda dos lotes.
Circunstanciou que os autores anuíram venda, e receberam cheques em pagamento; que o réu não está na posse de boa parte da área, sendo que houve a venda de 48 lotes, e que está usando cerca de 25 a 30mil m², disposto a negociar área remanescente.
Afirmou que os autores quem deveriam ter indicado a localização, para a edificação das 10 unidades de apartamento, que seriam sua obrigação, o que não fizeram.
No mérito, discorreu sobre surrectio, em razão de comportamento contraditório de parte dos autores, quando o réu legalizou o imóvel, tornou-o apto à construção, executa serviços de legalização, e venda do imóvel; e, agora, pretende recuperar a área.
Ainda, afirmou que os autores conferiram dilação tácita de prazo, ao réu, no negócio.
Afirmou que a pandemia de Covid seria causa de dilação de prazo para o cumprimento de suas obrigações.
Alegou que possui patrimônio superior ao valor objeto da controvérsia; que não possui posse de boa parte da área.
Discorreu sobre adimplemento substancial.
Pediu fosse a Prefeitura Municipal de Florianópolis oficiada a juntar o projeto aprovado; expedição de ofício ao Ministério Público, para apuração da assinatura que reputa forjada, em AR.
Ao fim, pediu a improcedência dos pedidos iniciais. Acostou documentação.
Houve réplica (Evento 288).
Decisão saneadora do Evento 292 indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência; decretou a revelia do réu; rejeitou a preliminar de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo; indeferiu oficiar à prefeitura e ao Ministério Público; fixou os pontos controvertidos; distribuiu ônus da prova; e oportunizou às partes a fase instrutória.
Pediu o réu oitiva de testemunhas, perícia grafotécnica e de engenharia, e seu próprio depoimento pessoal (Evento 298).
Por sua vez, pediram os autores o julgamento antecipado (Evento 304).
Decisão do Evento 306 deferiu tão somente a produção de prova testemunhal (Evento 306).
Rol de testemunhas do réu no Evento 313 e dos autores no Evento 314, ocasião em que pediram o depoimento pessoal do réu.
Deferido o depoimento pessoal do réu (Evento 316).
Audiência de instrução no Evento 358 - ocasião em que colhido depoimento pessoal do réu; testemunho e informes; encerrada a instrução; e oportunizado às partes a apresentação de alegações finais.
Alegações finais do réu no Evento 361; e dos autores no Evento 362.
Acostou o réu documentos de dita regularização da área (Evento 370 e 371).
Decisão do Evento 374 determinou que se aguardasse vinda conjunta dos autos das oposições n. 5058962-18.2020.8.24.0023 e 5059286-08.2020.8.24.0023.
Pediram os autores tutela provisória de urgência (Evento 382).
Decisão do Evento 384 indeferiu a liminar.
Vieram os autos conclusos para julgamento conjunto.
É o relatório.
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Oposição n. 5058962-18.2020.8.24.0023
ANDERSON SOUZA DIAS ajuizou, originariamente, "embargos de terceiro" contra R. B. e I. C. F. B..
Alegou o autor que tomou conhecimento que os réus buscam, por intermédio da ação de autos n. 5052208-60.2020.8.24.0023, rescindir contrato particular de compra e venda que firmaram com a pessoa de A. N. Q. e, com isso, serem reintegrados em imóvel no Ribeirão da Ilha, de matrícula n. 70.747 do 2º Ofício de Registro de Imóveis de Florianópoli-SC.
Afirmou que, em 16.03.2020, ele, autor, adquiriu de A. N. Q. terreno de 288,00m², que faz parte do imóvel no qual os réus R. B. e I. C. F. B. pretendem sua reintegração.
A sua unidade corresponderia a 0,296% da área total do imóvel matriculado de R. B. e I. C. F. B..
Alegou que na fase pré-negocial foi cauteloso, obtendo cópia de instrumento particular firmado pelos réus, e a matrícula do bem, nada havendo que desabonasse a aquisição.
Afirmou que, após a aquisição da unidade, realizou edificação, que se encontra em estado avançado, sem qualquer insurgência dos demandados, sendo que residem proximamente.
Discorreu sobre o cabimento dos embargos de terceiro; sua qualidade de terceiro; legitimidade passiva; e posse sobre parte do bem objeto de reintegração.
Pediu tutela provisória de urgência para ser mantido na posse do imóvel, e serem suspensos quaisquer atos constritivos, inibitórios ou reintegratórios.
No mérito, pediu a definitividade de sua posse no imóvel, com suspensão e afastamento, em definitivo, de todo e qualquer ato constritivo, inibitório ou reintegratório nos autos apensos n. 5052208-60.2020.8.24.0023.
Valorou a causa, e acostou documentação.
Acostou o embargante pedido administrativo de regularização da obra juntamente ao município (Evento 13).
Recebida a inicial enquanto oposição, e indeferida a liminar (Evento 14).
Pediu o opoente reconsideração da decisão (Evento 25).
Decisão do Evento 29 esclareceu a possibilidade de continuidade de sua posse.
Pediram os opostos R. B. e I. C. F. B. tutela provisória de urgência para exclusão do anúncio de venda do imóvel e afixação de placa demonstrando a impossibilidade de venda da unidade (Evento 37).
Citados, os opostos R. B. e I. C. F. B. apresentaram a contestação do Evento 38.
Circunstanciaram a negociação que tiveram com A. N. Q., para venda de área maior, em 13.05.2019.
O contrato firmado previa parcelamento extenso, que terminaria em 10.05.2022.
Contudo, o terceiro A. N. Q. não teria adimplido suas obrigações, o que ensejou o ajuizamento da ação de reintegração de posse de autos n. 5052208-60.2020.8.24.0023.
Afirmaram que o terceiro passou a alienar os lotes a pessoas estranhas ao contrato principal, sem seu consentimento - à exceção de uma única fração, que anuíram.
Afirmaram que o embargante não tomou devidas cautelas, na aquisição, sendo que o vendedor A. N. Q. era tão somente possuidor, e não proprietário; no IPTU do imóvel, nada se menciona do contrato; e que não haveria qualquer projeto de desmembramento aprovado perante prefeitura.
Afirmaram que o terceiro A. N. Q. já tinha sido notificado pelos embargados no dia 19.06.2020.
Impugnaram o dito pagamento da fração adquirida.
Ao fim, pediram a improcedência dos pedidos iniciais.
Houve réplica (Evento 43), em que alegada intempestividade da contestação, em razão de anterior ciência inequívoca, e acostados documentos.
Houve impugnação dos opostos (Evento 48).
Determinada a retificação do polo passivo da oposição, para inclusão da pessoa de A. N. Q. (Evento 50).
Citado, o oposto A. N. Q. apresentou contestação do Evento 204.
Alegou sua ilegitimidade passiva, por não ter dado causa à constrição do bem.
Discorreu sobre causalidade e irresponsabilidade quanto a ônus sucumbenciais.
Ao fim, pediu isenção das verbas sucumbenciais.
Houve réplica (Evento 214).
Decisão saneadora do Evento 216 rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva do oposto A. N. Q.; rejeitou a alegada intempestividade da contestação dos opostos R. B. e I. C. F. B.; indeferiu o pedido de exclusão do anúncio de venda do imóvel e afixação de placa; fixou pontos controvertidos; distribuiu ônus da prova; e oportunizou às partes indicarem as provas que teriam interesse em produzir.
Rol de testemunhas do oposto A. N. Q. no Evento 223.
Pediram os opostos R. B. e I. C. F. B. o julgamento antecipado; ou prova testemunhal e prova emprestada dos autos n. 5074298- 62.2020.8.24.0023 e n. 5067788-33.2020.8.24.0023.
Por sua vez, o opoente pediu o depoimento pessoal dos opostos, e prova testemunhal (Evento 225).
Deferida a realização da prova oral requerida (Evento 228).
Audiência de instrução no Evento 313, em que colhido depoimento pessoal do autor e dos opostos A. N. Q. e R. B. e testemunhos; encerrada a instrução; e oportunizado às partes a apresentação de alegações finais.
Alegações finais do oposto A. N. Q. no Evento 318; dos opostos R. B. e I. C. F. B. no Evento 319; e do opoente no Evento 320.
Vieram os autos conclusos para julgamento conjunto.
É o relatório.
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Oposição n. 5059286-08.2020.8.24.0023
NORTON COUTO COELHO ajuizou, originariamente, "embargos de terceiro" contra R. B. e I. C. F. B..
Discorreu sobre cabimento, e legitimidade.
Afirmou ser possuidor direto de fração de 420m², alvo de constrição judicial nos autos n. 5052208-60.2020.8.24.0023, de ação movida pelos embargados.
Alegou ser terceiro de boa-fé, que não figura nos autos de reintegração de posse, tendo adquirido o terreno em questão da pessoa de A. N. Q., mediante compra e venda de 29.06.2020, em data anterior à determinação de averbação da ação judicial na matrícula do terreno, ocorrida em 14.07.2020.
Circunstanciou haver casa de madeira, no imóvel, que integrou o negócio.
Afirmou que, pelo imóvel, pagou a A. N. Q. o valor de R$ 300.000,00, quitado em 01.07.2020, conforme termo.
Afirmou que, antes de concretizar o negócio, consultou registro de imóveis a fim de saber se havia pendência juntamente à matrícula imobiliária - que, à época, não havia.
Afirmou que tomou conhecimento de que o legítimo possuidor do bem era A. N. Q., por tê-lo adquirido em 13.05.2019.
Na ocasião da sua aquisição, haveria a informação de que o imóvel encontrava-se livre de qualquer ônus ou gravame, com condições para desmembramento da matrícula.
Afirmou que todas as medidas de cautela foram realizadas.
Contudo, dias após ter realizado o negócio, com assinatura de firma reconhecida e pagamento do valor integral, ao iniciar os trâmites de averbação do contrato na matrícula do terreno, tomou conhecimento do trâmite da ação de reintegração de posse apensa de autos n. 5052208-60.2020.8.24.0023, e da averbação da referida ação na matrícula.
Discorreu sobre boa-fé - a aquisição teria sido em 20.06.2020, e a constrição judicial ocorreu apenas em 14.07.2020.
Pediu, liminarmente, a manutenção de sua posse e suspensão da ação de autos n. 5052208-60.2020.8.24.0023.
No mérito, pediu a extinção da averbação judicial imposta no imóvel de matrícula 70.747 do 2º Ofício de Registro de Imóveis de Florianópolis-SC, e o cancelamento da ordem de constrição imposta.
Valorou a causa, e acostou documentação.
Deferida liminarmente suspensão das medidas constritivas na ação de reintegração de posse de autos n. 5052208-60.2020.8.24.0023.
Da decisão os embargados agravaram (Evento 12).
Pediram os embargados retratação da decisão (Evento 14), que foi indeferida (Evento 17).
Apresentaram os embargados a contestação do Evento 24.
Circunstanciaram a negociação que tiveram com A. N. Q., para venda de área maior, em 13.05.2019.
O contrato firmado previa parcelamento extenso, que terminaria em 10.05.2022.
Contudo, o terceiro A. N. Q. não teria adimplido suas obrigações, o que ensejou o ajuizamento da ação de reintegração de posse de autos n. 5052208-60.2020.8.24.0023.
Afirmaram que o terceiro passou a alienar os lotes a pessoas estranhas ao contrato principal, sem seu consentimento - à exceção de uma única fração, que anuíram.
Afirmaram que o embargante não tomou devidas cautelas, na aquisição, sendo que o vendedor A. N. Q. era tão somente possuidor, e não proprietário; no IPTU do imóvel, nada se menciona do contrato; e que não haveria qualquer projeto de desmembramento aprovado perante prefeitura.
Afirmaram que o terceiro A. N. Q. já tinha sido notificado pelos embargados no dia 19.06.2020.
Impugnaram o dito pagamento da fração adquirida.
Ao fim, pediram a improcedência dos pedidos iniciais.
Decisão liminar, em grau recursal, determinou a impossibilidade de venda do bem pelo embargante agravado (Evento 29).
Decisão do Evento 32 considerou a revelia dos embargados, por não terem apresentado contestação no prazo legal; recebeu a inicial como oposição, e não embargos de terceiro; e determinou o processamento conjunto.
Decisão definitiva, em grau recursal, determinou a impossibilidade de venda do bem pelo embargante agravado (Evento 88).
Determinada a retificação do polo passivo da oposição, para inclusão da pessoa de A. N. Q. (Evento 90).
Citado, o oposto A. N. Q. apresentou a contestação do Evento 183.
Alegou sua ilegitimidade passiva, por não ter dado causa à constrição do bem.
Discorreu sobre causalidade e irresponsabilidade quanto a ônus sucumbenciais.
Ao fim, pediu isenção das verbas sucumbenciais.
Decisão saneadora do Evento 189 rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva do oposto A. N. Q.; reconheceu a revelia dos opostos R. B. e I. C. F. B., improducente de efeitos; e oportunizou às partes a indicação de provas que teriam interesse em produzir.
Pediu o oposto A. N. Q. o depoimento pessoal do opoente e oitiva de testemunhas (Evento 195).
Os opostos R. B. e I. C. F. B. pediram depoimento pessoal do opoente, oitiva de testemuhas, e prova emprestada produzida nos autos apensos 5074298-62.2020.8.24.0023 e n. 5067788-33.2020.8.24.0023 (Evento 199).
Por sua vez, o opoente pediu o depoimento pessoal dos opostos (Evento 200).
Decisão do Evento 202 determinou que os opostos R. B. e I. C. F. B. especificassem as provas que queriam emprestar dos autos n. 5074298-62.2020.8.24.0023 e n. 5067788-33.2020.8.24.0023; e deferiu a produção de prova oral.
Rol de testemunhas do oposto A. N. Q. no Evento 221.
Pediram os opostos R. B. e I. C. F. B. a produção de prova emprestada testemunhal dos autos n. 5074298-62.2020.8.24.0023 e n. 5067788-33.2020.8.24.0023, e dos autos n. 5052208-60.2020.8.24.0023 (Evento 233).
Audiência de instrução no Evento 288, em que colhido depoimento pessoal de ambas as partes; encerrada a instrução; e oportunizado às partes a apresentação de alegações finais.
Alegações finais do oposto A. N. Q. no Evento 295; dos opostos R. B. e I. C. F. B. (Evento 297); e do opoente no Evento 298.
Vieram os autos conclusos para julgamento conjunto.
É o relatório.
Na parte dispositiva da sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito Celso Henrique de Castro Baptista Vallim, constou:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a oposição de autos n. 5058962-18.2020.8.24.0023, do opoente ANDERSON SOUZA DIAS contra os opostos R. B., I. C. F. B. e A. N. Q. deixando de confirmar a tutela de natureza provisória deferida nos autos.
Como consequência, condeno o opoente ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios dos opostos, que fixo, pro rata, em 10% sobre o valor da causa.
Ainda, confirmo a tutela provisória deferida em grau recursal e JULGO IMPROCEDENTE a oposição de autos n. 5059286-08.2020.8.24.0023, do opoente NORTON COUTO COELHO contra os opostos R. B., I. C. F. B. e A. N. Q..
Como consequência, condeno o opoente ao pagamento dos honorários advocatícios dos opostos, que fixo, pro rata, em 10% sobre o valor da causa.
No mais, confirmo a tutela provisória parcialmente deferida no Evento 7, e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais da ação originária de autos n. 5052208-60.2020.8.24.0023, ajuizada por R. B. e I. C. F. B. contra A. N. Q., tão somente para:
a) RESOLVER o negócio entre as partes;
b) DETERMINAR A REINTEGRAÇÃO de posse dos autores, salvo nos 288,00m² que anuíram a venda a Vilson Meireles dos Santos, no prazo de 15 dias úteis, a contar do depósito, em juízo, de todos os valores que os autores receberam do réu, descritos na inicial, a serem corrigidos, na forma legal, desde cada pagamento, para fiel recomposição da moeda.
c) DETERMINAR a paralisação de obras no terreno, de autoria da parte ré; e proibir o réu de anunciar qualquer venda daquele solo.
Quando da devolução dos valores recebidos pelos autores ao réu, e reintegração, oficie-se à serventia extrajudicial para proceder à baixa da averbação da presente demanda.
Como consequência da sucumbência mínima dos autores (parágrafo único do art. 86 do CPC), condeno o réu ao pagamento das despesas processuais e aos honorários advocatícios da parte adversa, que fixo em 10% sobre o proveito econômico dos autores - tal fração da diferença do total do valor da causa subtraído do valor do pedido a título de multa, julgado improcedente.
Publique-se, registre-se, intimem-se.
Transitada em julgado, arquivem-se.
Acrescenta-se ao relatório que, conforme decisão proferida no evento 374 dos autos n. 5052208-60.2020.8.24.0023, foi determinado o julgamento conjunto das ações de oposição n. 5058962-18.2020.8.24.0023 e n. 5059286-08.2020.8.24.0023. Assim, passa-se à exposição individual de cada processo após a prolação da sentença.
Ação de rescisão contratual c/c pedido de reintegração de posse, perdas e danos e tutela de urgência n. 5052208-60.2020.8.24.0023
Irresignadas, ambas as partes opuseram embargos de declaração (eventos 400 e 406, da origem) que restaram rejeitados (evento 415, da origem).
Ainda insatisfeito, o réu interpôs o presente apelo (evento 424, da origem).
Nas suas razões recursais, sustenta, em preliminar, a ausência de notificação válida/constituição em mora, porquanto a cláusula sétima do ajuste exigiria prévia interpelação judicial ou notificação cartorial, não havendo cláusula resolutiva expressa; afirma que a comunicação invocada teria sido subscrita por advogado sem procuração, encaminhada a endereço equivocado e recebida com assinatura cuja autenticidade foi impugnada, razão pela qual, à luz do art. 474 do Código Civil, não se teria aperfeiçoado a mora apta a autorizar a resolução.
Alega, ainda, cerceamento de defesa, em virtude do indeferimento da perícia grafotécnica destinada justamente a elucidar a autenticidade da assinatura aposta no aviso de recebimento, prova que reputa indispensável e cujo afastamento lhe teria causado efetivo prejuízo (art. 464 do CPC). Argui, também, nulidade de citação, apontando vício não convalidado no curso do processo.
No mérito, assevera que inexiste inadimplemento útil à resolução, pois a execução do objeto contratual dependia de prévia indicação, pelos recorridos, do terreno onde seriam realizadas as obras, circunstância que não se teria verificado; ausente a indicação e não comprovada a mora, não se configuraria descumprimento imputável ao apelante.
Em caráter subsidiário, diante da ocupação consolidada por diversas famílias e da irreversibilidade fática, requer a conversão da obrigação em perdas e danos (art. 499 do CPC), com fixação de parâmetros objetivos para futura liquidação — área efetivamente afetada, benfeitorias e edificações —, bem como a reserva do imóvel do recorrente cuja construção teria ocorrido com anuência dos recorridos.
Postula, por fim, a concessão de efeito suspensivo ao apelo, nos termos do art. 1.012, § 4º, do CPC, invocando a probabilidade do direito — evidenciada pelas preliminares e pela tese de inexistência de inadimplemento — e o perigo de dano — consubstanciado no risco de desalojamento de terceiros e na irreversibilidade prática dos efeitos da decisão. Formula pedidos de anulação da sentença por vícios processuais ou, subsidiariamente, de reforma do julgado para conversão em perdas e danos, além de prequestionar, para fins recursais, os arts. 18, 242, 464 e 1.012, § 4º, do CPC e o art. 474 do Código Civil.
Com as contrarrazões (evento 435, da origem), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.
Oposição n. 5058962-18.2020.8.24.0023
Irresignada, a parte autora opôs embargos de declaração (evento 343, da origem) que restaram rejeitados (evento 354, da origem).
Ainda insatisfeita, interpôs o presente apelo (evento 385, da origem).
Em suas razões recursais, sustenta que adquiriu a fração de boa-fé, antes da averbação da ação na matrícula, e que exerce posse mansa e pacífica, com destinação à moradia familiar. Requer o reconhecimento da posse legítima ou, alternativamente, a conversão da reintegração em perdas e danos.
Com as contrarrazões (eventos 373 e 375, da origem), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.
Oposição n. 5059286-08.2020.8.24.0023
Irresignada, a parte autora opôs embargos de declaração (evento 324, da origem) que restaram rejeitados (evento 337, da origem).
Ainda insatisfeita, interpôs o presente apelo (evento 350, da origem).
Em suas razões recursais, sustenta, em síntese, que adquiriu a fração de boa-fé, antes da averbação da ação na matrícula, e que exerce posse mansa e pacífica, com destinação à moradia familiar. Requer o reconhecimento da posse legítima ou, alternativamente, a conversão da reintegração em perdas e danos.
Com as contrarrazões (eventos 359 e 360, da origem), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.
Este é o relatório.
VOTO
Trata-se de julgamento conjunto das ações de rescisão contratual n. 5052208-60.2020.8.24.0023; de oposição n. 5058962-18.2020.8.24.0023 e n. 5059286-08.2020.8.24.0023. Considerando a individualidade das matérias discutidas em cada feito, passa-se à análise separada de cada processo, respeitando suas peculiaridades fáticas e jurídicas.
Ação de rescisão contratual c/c pedido de reintegração de posse, perdas e danos e tutela de urgência n. 5052208-60.2020.8.24.0023
O cerne da controvérsia cinge-se em apurar a possibilidade de ruptura do "Contrato Particular de Compra e Venda" formado entre as partes e tem como objeto um terreno localizado na Rua Severiano Firmino Martins, nº 608, Ribeirão da Ilha – Florianópolis – SC, com área total de 97.201,83 m², conforme matrícula nº 70.747.
A sentença reconheceu o inadimplemento contratual do réu, decretando a resolução do contrato, com fundamento no artigo 475 do Código Civil. Determinou-se a reintegração de posse aos autores, excetuando-se a fração de 288m² cuja venda foi previamente anuída, condicionada ao depósito, em juízo, dos valores pagos pelo réu, corrigidos monetariamente desde cada pagamento. Foram também deferidos os pedidos de paralisação das obras no terreno e proibição de novos anúncios de venda por parte do réu. Por outro lado, foram indeferidos os pedidos de multa contratual e indenização por perdas e danos, em razão da ausência de constituição formal da mora e da falta de comprovação de prejuízos específicos.
Preliminarmente, o réu alegou a ausência de constituição em mora (cláusula sétima; art. 474 CC). Disse que o contrato não prevê cláusula resolutiva expressa, razão pela qual incide o art. 474 do CC: a cláusula tácita depende de interpelação. Por outro lado, afirma que na cláusula sétima consta que a resolução por inadimplemento exige interpelação judicial ou notificação cartorial e, na hipótese a comunicação invocada foi subscrita por advogado sem procuração, remetida a endereço equivocado e com assinatura no AR contestada, cuja verificação grafotécnica foi indeferida.
Entende que, diante disso, ausente a mora do compromissário, circunstância que compromete a procedibilidade da rescisão, impondo-se a cassação da sentença por error in procedendo (art. 485, IV, CPC).
Rejeita-se a preliminar. A matéria foi objeto de análise em decisão saneadora, regularmente proferida e não impugnada em tempo e modo, na qual se consignou — e aqui se reafirma — que a validade da notificação não configura pressuposto processual, mas sim questão de mérito a ser apreciada no julgamento da causa.
Além disso, questiona a autenticidade da assinatura lançada no AR e sustenta ser questão essencial para comprovar a constituição em mora. Acrescenta que o juízo concluiu pela regularidade da notificação sem a perícia (art. 464 CPC), tolhendo a parte do único meio apto a elucidar a falsidade alegada e definindo o próprio nascimento da mora. O indeferimento gerou prejuízo concreto - cerceamento de defesa, contaminando o julgamento.
Não se verifica, neste ponto, qualquer vício processual relevante que possa justificar a anulação da sentença proferida.
O contrato firmado entre as partes prevê expressamente, em sua cláusula sétima (evento 1, OUT5, da origem):
Referida cláusula estabelece o regime jurídico aplicável à inadimplência e à resolução contratual, prevendo expressamente que o não pagamento de qualquer das parcelas do preço do imóvel constitui inadimplemento contratual, com repercussões que vão além da mera mora, alcançando inclusive cláusulas penais e perdas e danos.
O item 7.1, dispõe que a inadimplência, por si só, acarreta consequências contratuais, “em prejuízo das cláusulas penais e perdas e danos”, o que deve ser interpretado como uma autorização para a resolução do contrato independentemente da aplicação de penalidades adicionais, como multa ou indenização, que permanecem como medidas autônomas e cumulativas, desde que observadas suas condições específicas.
Já o item 7.2 condiciona a aplicação da multa contratual de 10% ao mês e a rescisão automática do contrato à prévia constituição formal da mora, mediante interpelação judicial ou notificação cartorial. Trata-se de cláusula resolutiva expressa, que exige formalidade para produzir efeitos, conforme entendimento consolidado na jurisprudência.
Adicionalmente, a cláusula prevê a possibilidade de purgação da mora pelo comprador, mediante o pagamento da parcela inadimplida, juros moratórios, despesas com a notificação e honorários advocatícios arbitrados em 20% sobre o valor do atraso. Persistindo a mora, o contrato poderá ser rescindido, com perda integral do sinal de arras e aplicação de reajuste de 100% sobre o valor devido, além de outras sanções previstas.
Portanto, a cláusula sétima estabelece um regime escalonado de inadimplemento, em que: i) a rescisão contratual pode ocorrer com base no inadimplemento simples, conforme item 7.1; ii) a multa e penalidades adicionais dependem de mora formalmente constituída, conforme item 7.2; e, iii) o comprador tem direito à purgação da mora, mas, se não o fizer, sofrerá sanções severas.
Tal estrutura contratual é válida e eficaz, desde que respeitados os princípios da boa-fé, da função social do contrato e da proporcionalidade das penalidades, sendo plenamente compatível com o ordenamento jurídico brasileiro.
Na hipótese, ao contrário do que afirma o apelante, a sentença não resolveu o contrato com base na notificação, mas, sim, pelo inadimplemento inequívoco e substancial pelo apelante. Isso porque, restou incontroverso que o réu não adimpliu com as obrigações contratuais assumidas, seja no tocante ao pagamento das parcelas ajustadas, seja quanto à contraprestação em unidades imobiliárias.
A tentativa de justificar o inadimplemento com base na pandemia ou na ausência de indicação de local para construção não encontra respaldo jurídico, tampouco documental, conforme bem fundamentado na sentença de origem.
Nesse caso, a resolução contratual por inadimplemento não exige, necessariamente, a constituição formal da mora. Nos termos do art. 475 do Código Civil, é suficiente que a parte lesada demonstre o não cumprimento das obrigações essenciais do contrato para que se autorize a sua resolução:
Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos.
Embora o contrato preveja, para fins de aplicação de multa, a necessidade de interpelação judicial ou notificação cartorial, tal formalidade não é exigida para a resolução contratual por inadimplemento, quando este se mostra evidente e suficiente para frustrar a finalidade do negócio jurídico.
Nessas condições, a mora é automática, por força do disposto no artigo 397 do Código Civil, segundo o qual o inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor.
Assim, por se tratar de mora ex re, prescinde-se de qualquer notificação para sua constituição, sendo legítima a decisão que determina o retorno das partes ao status quo ante, com reintegração de posse e devolução dos valores pagos, devidamente corrigidos.
No que diz respeito à alegação de ausência de indicação do terreno pelos promitentes cedentes, embora prevista contratualmente como condição para a entrega dos apartamentos, não possui força suficiente para afastar o inadimplemento contratual reconhecido nos autos. O apelante não apenas deixou de cumprir a obrigação de construir os imóveis, como também não adimpliu substancial parcela pecuniária do contrato.
O magistrado de origem foi claro ao afirmar que, "ainda que não houvesse indicação, não se comprovou o cumprimento da parcela pecuniária do negócio", o que revela que o inadimplemento não se restringe à contraprestação em imóveis, mas alcança também o aspecto financeiro do contrato. Assim, mesmo que se admitisse a ausência de indicação como fato impeditivo da construção, o descumprimento das obrigações de pagamento por si só autoriza a resolução contratual, nos termos do artigo 475 do Código Civil.
Portanto, a não indicação do terreno, na hipótese dos autos, não tem o condão de modificar o julgamento, pois não afasta o inadimplemento substancial do réu, tampouco justifica a manutenção de um contrato cuja finalidade foi frustrada por descumprimento inequívoco das obrigações principais.
Argumenta, ainda, que diante da ocupação consolidada por diversas famílias, com infraestrutura instalada, a reintegração se revela inviável e socialmente gravosa. Em razão disso, pretende, subsidiariamente, a conversão em perdas e danos (art. 499 CPC), fixando-se parâmetros de avaliação na liquidação (área efetivamente afetada, benfeitorias, pavimentação e edificações), assegurada a reserva do seu imóvel cuja construção se deu com anuência dos apelados.
Como já explanado, no caso em exame, o inadimplemento contratual do apelante se configurou de forma inequívoca antes mesmo da alienação de frações do imóvel a terceiros, sendo este fato posterior à frustração das obrigações assumidas no contrato celebrado com os apelados. Conforme reconhecido na sentença, o réu não comprovou o cumprimento das obrigações essenciais, seja no tocante ao pagamento das parcelas pecuniárias, seja quanto à contraprestação em unidades imobiliárias. Ademais, os autores afirmaram que o inadimplemento iniciou a partir da prestação prevista para 13-10-2019, fato este não impugnado pelo réu, seja com argumentos ou documentos, ônus que lhe incumbia (art. 373, II, do CPC).
Com isso, a alienação de frações do imóvel a terceiros, ainda que de boa-fé, não tem o condão de impedir a reintegração de posse, pois decorre de negócio jurídico celebrado por quem não detinha legitimidade para dispor da propriedade, configurando hipótese de venda a non domino.
Portanto, para fins de definição da reintegração de posse, considera-se como marco do inadimplemento o momento em que o réu deixou de cumprir as obrigações contratuais pactuadas, o que ocorreu antes das vendas a terceiros - com exceção do contrato anuído prelos autores -, legitimando a retomada da posse pelos autores e a resolução do negócio jurídico originário.
Em arremate, a sentença ora analisada e mantida por este e. Órgão fracionário, foi prolatada sob a égide do novo ordenamento processual civil, impondo o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, obedecendo aos requisitos pelo Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5052208-60.2020.8.24.0023/SC
RELATORA: Desembargadora HAIDÉE DENISE GRIN
EMENTA
EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA UNA. JULGAMENTO CONJUNTO. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL COM PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE PROMOVIDA PELOS PROPRIETÁRIOS DO IMÓVEL. TERRENO DE PROPRIEDADE DOS AUTORES. OPOSIÇÕES (EMBARGOS DE TERCEIRO). INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. VENDA A NON DOMINO. POSSE INJUSTA. MULTIPLICIDADE DE LIDES COMUM. RECURSOS DESPROVIDOS.
I. CASO EM EXAME: A sentença de primeiro grau apreciou, em decisão una, o mérito de três demandas apensadas:
(i) a ação principal de rescisão contratual cumulada com reintegração de posse, perdas e danos e tutela de urgência, ajuizada por promitentes vendedores em face do promitente comprador de imóvel, fundado no inadimplemento contratual;
(ii) a oposição n. 5058962-18.2020.8.24.0023, ajuizada por adquirente de fração do terreno objeto do contrato inadimplido, que pretendia ver reconhecida sua posse;
(iii) a oposição n. 5059286-08.2020.8.24.0023, também ajuizada por terceiro adquirente de fração do mesmo imóvel, com pedido de manutenção de posse e afastamento da reintegração.
A sentença: a) julgou parcialmente procedentes os pedidos da ação principal, decretando a rescisão contratual e a reintegração de posse em favor dos autores, ressalvando apenas a fração de 288 m² cuja venda fora previamente anuída, condicionada à devolução dos valores recebidos pelo réu, corrigidos;
b) determinou a paralisação de obras e a proibição de novas alienações do imóvel pelo réu;
c) julgou improcedentes ambas as oposições, reconhecendo a invalidade das aquisições feitas pelos terceiros, em razão da nulidade dos negócios jurídicos praticados por quem não detinha titularidade ou posse legítima.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: Há três questões em discussão:
(i) saber se a ausência de notificação formal válida impediria a resolução contratual, diante da cláusula contratual e do art. 474 do Código Civil;
(ii) saber se a ausência de perícia grafotécnica teria causado cerceamento de defesa ao réu;
(iii) saber se é legítima a posse exercida por terceiros adquirentes de frações do imóvel, cuja origem é negócio celebrado por promitente comprador inadimplente, desprovido de titularidade dominial.
III. RAZÕES DE DECIDIR: 3.1. A resolução do contrato foi fundada em inadimplemento substancial, o que dispensa a constituição formal de mora (art. 475 do CC), sendo suficiente a demonstração de descumprimento de obrigações essenciais; 3.2. A cláusula contratual exigia notificação formal apenas para fins de aplicação de penalidades contratuais específicas, mas não como condição para resolução do contrato, que prescinde de interpelação nos casos de inadimplemento evidente; 3.3. O indeferimento da prova grafotécnica não ensejou cerceamento de defesa, pois não comprometeu a formação do convencimento judicial, à vista do conjunto probatório constante nos autos. 3.4. A posse dos terceiros foi tida como injusta, pois decorreu de negócios celebrados com parte desprovida de legitimidade para alienar frações do imóvel, configurando venda a non domino. A boa-fé dos terceiros não foi reconhecida, diante da ausência de cautela mínima e do inadimplemento anterior do promitente vendedor; 3.5. A conversão da reintegração em perdas e danos foi corretamente afastada, por não ser admissível indenização baseada em posse precária ou derivada de negócio nulo; 3.6. A sentença foi mantida integralmente, com majoração dos honorários advocatícios recursais, nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
IV. DISPOSITIVO E TESE: Recursos conhecidos e desprovidos. Tese de julgamento:
"1. A resolução contratual por inadimplemento substancial prescinde de constituição formal da mora, sendo suficiente a demonstração do descumprimento de obrigações essenciais."
"2. A venda realizada por parte desprovida de titularidade dominial configura negócio jurídico nulo, não gerando posse legítima ao adquirente."
"3. A ausência de prova pericial não acarreta nulidade do julgado, quando existente acervo probatório suficiente à formação do convencimento judicial."
"4. A pretensão de conversão da reintegração de posse em perdas e danos é incabível quando fundada em posse injusta, derivada de negócio jurídico inválido."
Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 397, 474, 475; CPC, arts. 85, §§ 2º e 11; 373, II; 464.
Jurisprudência relevante citada: não consta
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 7ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, conhecer dos recursos e, nos termos da fundamentação, negar-lhes provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por HAIDÉE DENISE GRIN, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6865729v4 e do código CRC 6b71aa80.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): HAIDÉE DENISE GRIN
Data e Hora: 14/11/2025, às 16:03:00
5052208-60.2020.8.24.0023 6865729 .V4
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 09:10:29.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 13/11/2025
Apelação Nº 5052208-60.2020.8.24.0023/SC
RELATORA: Desembargadora HAIDÉE DENISE GRIN
PRESIDENTE: Desembargador OSMAR NUNES JÚNIOR
PROCURADOR(A): ALEX SANDRO TEIXEIRA DA CRUZ
SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: WILLIAN MEDEIROS DE QUADROS por R. B.
SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: WILLIAN MEDEIROS DE QUADROS por I. C. F. B.
SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: ISAAC PIRES MARTINS FARIAS JUNIOR por A. N. Q.
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 13/11/2025, na sequência 27, disponibilizada no DJe de 27/10/2025.
Certifico que a 7ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 7ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DOS RECURSOS E, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO, NEGAR-LHES PROVIMENTO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora HAIDÉE DENISE GRIN
Votante: Desembargadora HAIDÉE DENISE GRIN
Votante: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA
Votante: Desembargador OSMAR NUNES JÚNIOR
TAIARA MONIQUE BARBOSA SANTOS
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 09:10:29.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas