RECURSO – – Notificação para explicações – Medida pre- paratória, de natureza cautelar, de eventual e futura ação penal de delito contra a honra – Art. 144 do Có- digo Penal – Interpelação vinculada à necessidade de esclarecer situações, frases ou expressões, escritas ou verbais, caracterizadas por sua dubiedade, equivoci- dade ou ambiguidade. – Pedido de explicações relativo a conteúdo de decisão judicial, proferida no regular exercício da jurisdição 817 – Excludente de ilicitude, na forma do art. 142 do Có- digo Penal – Ausência de ilicitude a ser apurada pos- teriormente – Inviabilidade da propositura de ação Jurisprudência - Órgão Especial penal, resultando na desnecessidade do pedido de explicações e, consequentemente, na sua inadmissibi- lidade – Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Pau- lo – Pedido de explicações ao qual se nega seguimento.(TJSP; Processo nº 0003204-81.2025.8.26.0000; Recurso: recurso; Relator: SILVIA ROCHA; Data do Julgamento: 28 de maio de 2025)
, em Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo,
proferir a seguinte decisão: “NEGARAM SEGUIMENTO AO PEDIDO DE
EXPLICAÇÕES. V.U.”, de conformidade com o voto da Relatora, que integra
este acórdão. (Voto nº 37606)
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FER-
NANDO TORRES GARCIA (Presidente sem voto), NUEVO CAMPOS, CAR-
LOS MONNERAT, RENATO RANGEL DESINANO, AFONSO FARO JR.,
JOSÉ CARLOS FERREIRA ALVES, MÁRIO DEVIENNE FERRAZ, LUIZ
ANTONIO CARDOSO, BERETTA DA SILVEIRA, XAVIER DE AQUI-
NO, DAMIÃO COGAN, VICO MAÑAS, ADEMIR BENEDITO, CAMPOS
MELLO, FÁBIO GOUVÊA, MATHEUS FONTES, RICARDO DIP, FIGUEI-
REDO GONÇALVES, GOMES VARJÃO, ÁLVARO TORRES JÚNIOR, LU-
CIANA BRESCIANI, LUIS FERNANDO NISHI e MÁRCIA DALLA DÉA
BARONE.
São Paulo, 28 de maio de 2025.
SILVIA ROCHA, Relatora
Ementa: – Notificação para explicações – Medida pre-
paratória, de natureza cautelar, de eventual e futura
ação penal de delito contra a honra – Art. 144 do Có-
digo Penal – Interpelação vinculada à necessidade de
esclarecer situações, frases ou expressões, escritas ou
verbais, caracterizadas por sua dubiedade, equivoci-
dade ou ambiguidade.
– Pedido de explicações relativo a conteúdo de decisão
judicial, proferida no regular exercício da jurisdição
817
– Excludente de ilicitude, na forma do art. 142 do Có-
digo Penal – Ausência de ilicitude a ser apurada pos-
teriormente – Inviabilidade da propositura de ação
Jurisprudência - Órgão Especial
penal, resultando na desnecessidade do pedido de
explicações e, consequentemente, na sua inadmissibi-
lidade – Precedentes do Supremo Tribunal Federal e
do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Pau-
lo – Pedido de explicações ao qual se nega seguimento.
VOTO
Trata-se de pedido de “explicações em juízo”, formulado pelos advoga-
dos (...), (...) e (...), com fundamento no artigo 144 do Código Penal, em face do
Dr. (...), Juiz de Direito Titular da (...) Vara Cível do Foro Central da Comarca
de São Paulo.
Segundo os requerentes, em 8.12.2024, o magistrado prolatou decisão no
processo nº (...) (fls. 6/10), na qual, por duas vezes, teria sugerido que eles, que
atuam em conjunto e na condição de sócios de escritório de advocacia, estariam
atuando de maneira a causar prejuízo ao erário, violando princípios éticos e
exercendo a advocacia de maneira predatória.
Além disso, o magistrado teria aproximado “a ilibada atuação destes advo-
gados com a conduta narrada em reportagem que aborda a nefasta prática de advocacia
predatória, trazendo referência de tal reportagem e do provimento CG 02/2017 do E.
TJSP.”, chegando “ao absurdo de criar obrigação não prescrita em lei ao impor, sob
pena de extinção do feito, a apresentação de procuração com firma reconhecida, descre-
dibilizando publicamente a atuação destes advogados, bem assim a idoneidade profis-
sional destes e ainda afrontando o Art. 1º da Lei 11.925/2009 e o Art. 425, IV do CPC,
verdadeiramente impugnando previamente documento sem qualquer justificativa.” (sic,
fl. 2).
O Procurador de Justiça Sérgio Turra Sobrane, atuando por delegação do
Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, nos termos do art. 116,
inc. XIV, da Lei Orgânica do Ministério Público, apresentou parecer pelo inde-
ferimento, de plano, do pedido de explicações, com consequente arquivamento
dos autos, por falta de amparo legal e de interesse de agir, nas modalidades de
necessidade e adequação, porque “no caso concreto não há qualquer dubiedade nas
afirmações inseridas no despacho judicial que permitam a tramitação do pedido de ex-
plicações. Tanto que, de plano, a Promotora de Justiça em primeiro grau de jurisdição
notou ‘Aliás, nem se houvesse existido uma constatação categórica do ocorrido houve
calúnia uma vez que o juiz tem o dever de reconhecer a litigância predatória em caso
de sua existência, inclusive para denegar a justiça gratuita ou para tomar as medidas
cabíveis em âmbito cível, administrativo, disciplinar e penal. Percebe-se, portanto, que
AUSENTE QUALQUER ÂNIMO DIFAMATÓRIO OU CALUNIANTE. E, se ausente
estaria na própria constatação da conduta, quanto mais está na mera desconfiança, que
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é apontada apenas para que se possa obter certeza quanto a necessidade da garantia tão
importante da gratuidade de justiça. No mais, reforço que se trata de mais uma situação
na qual se procura o envolvimento em esfera penal para proteção da parte autora ou
ainda para a obtenção de vantagens em esfera cível que em nada se relacionam com o
Jurisprudência - Órgão Especial
feito’ (fls. 17). (...) Assim sendo, ao formular pedido de explicações em juízo cabe ao
pretenso ofendido demonstrar de forma razoável a dubiedade presente nas expressões,
frases, gestos, etc, que, a depender dos esclarecimentos, podem ou não configurar mácu-
la à sua honra subjetiva ou objetiva, para subsidiar propositura de queixa crime. No caso
presente, porém, os requerentes não se desincumbiram de tal exigência e se limitaram
a deduzir questionamentos sobre a própria decisão judicial com a qual não concordam.
Ocorre que decisão judicial se enfrenta por meio de recursos previstos na legislação pro-
cessual. Aos requerentes cabe então deduzir suas pretensões e inconformismos na esfera
adequada, vale dizer, nos autos do processo cível onde se discute sobre a gratuidade
processual, onde há caminhos específicos para enfrentar as opções de convencimento
e os fundamentos que Juiz de Direito utilizou no caso concreto, sem abertura da esfera
penal para esta finalidade.” (fls. 31/38).
É o relatório.
De acordo com o artigo 144 do Código Penal, “Se, de referências, alusões
ou frases, se infere calúnia, difamação ou injúria, quem se julga ofendido pode pedir
explicações em juízo. Aquele que se recusa a dá-las ou, a critério do juiz, não as dá
satisfatórias, responde pela ofensa.”.
Há necessidade de prévio pedido de esclarecimentos quando, em virtude
dos termos empregados ou do verdadeiro sentido das frases, não for evidente a
intenção de praticar crime contra a honra, mas houver dúvida quanto ao sentido
da manifestação do autor ou quanto ao seu destinatário. Quando são empregadas
palavras de duplo sentido, frases vagas ou reticentes, alusões imprecisas, cabe o
pedido de explicações.
Ao contrário, não cabe pedido de explicações quando não há equivoci-
dade, verificando-se pela simples leitura que não há forma dúbia, se nada há
de ofensa à honra alheia ou não há nenhuma dúvida a respeito da existência
objetiva de ofensa.
O pedido de explicações, então, só pode ser admitido se houver, no mí-
nimo, algum indício da prática de calúnia, difamação ou injúria e se o procedi-
mento for útil ao interpelante, permitindo futura e eventual propositura de ação
penal.
Não se desconhece decisão recente deste C. Órgão Especial, a propósito
de pedidos de notificação para explicações, de não ser “adequado, nesta sede,
qualquer juízo de valor sobre o teor do requerimento, cingindo-se o procedimento a
conceber forma judicial à interpelação do requerido e disponibilizando-se os autos ao
requerente para as providências que entender necessárias.” (Notificação para Expli-
cações nº 2352952-09.2024.8.26.0000, rel. Des. Afonso Faro Jr., j. 26.02.2025).
No mesmo sentido: Notificação para Explicações nº 2299427-15.2024.8.26.0000, rel. Des. Afonso Faro Jr., j. 18.12.2024; Notificação para
819
Explicações nº 2268227-24.2023.8.26.0000, rel. Des. Luis Fernando Nishi, j.
28.02.2024; Notificação para Explicações nº 0007176-30.2023.8.26.0000, rel.
Des. Elcio Trujillo, j. 28.06.2023; Notificação para Explicações nº 2250351-
Jurisprudência - Órgão Especial
90.2022.8.26.0000, rel. Desª Luciana Bresciani, j. 12.04.2023; Notificação para
Explicações nº 2193500-31.2022.8.26.0000, rel. Des. James Siano, j. 19.10.2022;
Notificação para Explicações nº 2253596-46.2021.8.26.0000, rel. Des. Fran-
cisco Casconi, j. 16.02.2022; Interpelação nº 0038630-96.2021.8.26.0000, rel.
Desª Luciana Bresciani, j. 15.12.2021.
Este caso concreto, porém, tem contornos diferentes das hipóteses retra-
tadas nos precedentes acima mencionados.
Na hipótese agora em exame, o MM. Juiz de Direito proferiu a seguin-
te decisão (fls. 6/10 deste processo; 161/165 do processo digital nº 1187820-05.2024.8.26.0100, grifos e destaques no original):
“Vistos.
1. Em relação ao pedido de justiça gratuita, é importante lembrar que o
que existe é a ‘justiça subsidiada’, ou seja, os custos do processo são suportados
por toda a população. Sendo assim, quando se defere o benefício a uma pessoa
específica, se impõe aos demais cidadãos o pagamento daqueles custos. Por con-
ta disso, é preciso que este instituto seja utilizado com parcimônia para que os
mais necessitados não tenham que arcar com despesas daqueles que tem situa-
ção privilegiada em relação a eles (TJSP, Agravo de Instrumento nº 2114181-48.2021.8.26.0000, j. 16/06/2021).
O benefício se traduz como isenção ao pagamento do tributo, razão pela
qual realmente deve haver prova da situação de miserabilidade. Nesse sentido, o
art. 5º, inciso LXXIV, da CF/1988, estabelece que ‘o Estado prestará assistência
jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos’.
Assim, para apreciação do pedido de gratuidade, objetivando resguardar
o interesse público (uma vez que o prejuízo aos cofres públicos e, consequente-
mente, aos contribuintes paulistas apenas em razão de litigância predatória, foi
recentemente estimado em R$ 2,7 bilhões de reais1), a parte autora deverá apre-
sentar, no prazo de 15 dias, em atendimento ao disposto no art. 99, § 2º, parte fi-
nal, do CPC, todos os documentos abaixo elencados, sob pena de indeferimento:
a) cópia das últimas folhas da carteira do trabalho, ou comprovante de
renda mensal, seu e do cônjuge;
b) cópia dos extratos bancários de todas as contas de sua titularidade, e do
cônjuge, dos últimos três meses;
c) cópia dos extratos de cartão de crédito, seu e do cônjuge, dos últimos
três meses;
d) cópia das duas últimas declarações do imposto de renda apresentadas à
Secretaria da Receita Federal, seu e do cônjuge;
e) cópia do relatório completo e atualizado de contas emitido pelo sistema
REGISTRATO
.
Anoto que em rápida consulta realizada no SNIPER na presente data, foi
possível verificar que o autor é sócio-administrador da empresa SELETRON
820
COMÉRCIO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ELETRÔNICOS LTDA, e que
possui conta ativa nas seguintes instituições financeiras:
– BCO C6 S.A.
– BCO BRADESCO S.A.
Jurisprudência - Órgão Especial
– BCO SANTANDER (BRASIL) S.A.
– BCO VOTORANTIM S.A.
– MERCADO PAGO IP LTDA.
– ITAÚ UNIBANCO S.A.
– NU PAGAMENTOS - IP
– EFÍ S.A. - IP
– AME DIGITAL BRASIL IP LTDA.
Logo, sem prejuízo da juntada dos demais documentos mencionados no
parágrafo anterior, deverá a parte autora juntar o extrato dos últimos 3 meses das
contas que possui em todas essas instituições financeiras, indicando a totalidade
de suas movimentações financeiras, ou comprovante idôneo emitido pela respec-
tiva instituição financeira atestando que a conta foi encerrada, com a indicação
da data de encerramento.
Conveniente salientar que como a concessão da gratuidade atinge, além
dos interesses da parte contrária, o próprio erário, por implicar renúncia de recei-
ta, o juiz está autorizado a examinar a veracidade da declaração, podendo deferir
ou indeferir a benesse pleiteada.
Por isso, o E. TJSP prestigia a consulta realizada pelo magistrado, de ofí-
cio, a sistemas conveniados ou a sites para dirimir dúvidas a respeito da alegada
hipossuficiência financeira da parte que pleiteia a gratuidade. (...).
O principal critério que será utilizado para a concessão do benefício con-
siste na demonstração de renda familiar mensal inferior a 3 (três) salários-míni-
mos (...).[
Esse critério, além de razoável, mantém a igualdade no tratamento em re-
lação às partes que procuram a Defensoria Pública do Estado de São Paulo (cujo
atendimento, para essa finalidade, se restringe às pessoas com renda familiar de
até 3 salários-mínimos por mês2).
Com base nesse entendimento, este Juízo, além de conceder igual trata-
mento para partes que se encontram na mesma situação, também busca assegurar
a harmonia do sistema, evitando casuísmos e privilégios.
Alternativamente, no mesmo prazo de 15 dias, poderá a parte autora optar
por recolher as custas (taxa judiciária de 1,5% sobre o valor da causa) e despesas
processuais (neste momento, para a expedição de carta de citação), nos termos
atualizados pela Lei Estadual nº 17.785, de 03/10/2023.
O não atendimento da determinação (juntada de todos os documentos
acima discriminados ou o recolhimento da taxa judiciária e despesas de citação
nos valores corretos) ensejará a extinção da demanda, sem nova intimação, nos
termos do art. 290, c.c. o art. 485, inciso IV, ambos do Código de Processo Civil.
(...)
3. No mesmo prazo, a parte autora deverá regularizar a sua representação
processual, apresentando procuração com firma reconhecida (ou com assinatura
821
eletrônica certificada por certificadora credenciada pelo ICP-Brasil) e também
com poderes específicos para o presente feito, nos termos do que preceitua o
art. 139, incisos III e IX, do Código de Processo Civil e do Comunicado CG N.º
02/17, sob pena de extinção sem julgamento de mérito (CPC, arts. 76, § 1º, inciso
Jurisprudência - Órgão Especial
I, 104 e 485, inciso IV).
(...)”.
Os requerentes afirmam que a alusão à litigância predatória, na decisão,
com referências a reportagens e provimentos do Tribunal de Justiça, assim como
a determinação de regularização da representação processual, os faz inferir “que
o requerido está sugerindo, por meio de referências e alusões, que a prática profissional
destes advogados se trata de: a) má prática da advocacia; b) advocacia predatória; c)
ato atentatório à dignidade da justiça; e d) existência de conflito de interesse entre os
advogados e o cliente (cerne da prática de advocacia predatória).” (sic, fl. 3), o que
dá ensejo ao pedido de explicações.
Ocorre que é dever legal de todo juiz tomar medidas para coibir eventual
litigância abusiva e, para verificar a sua existência, pode se valer do seu poder
geral de cautela, o que é recomendado não só pelo Código de Processo Civil,
como também pelo Conselho Nacional de Justiça e por este Tribunal.
Ao exercer suas funções, dentro dos limites legais, o juiz de direito, em
tese, não responde por nenhuma infração penal. De fato, atuando pautado pela
impessoalidade e legalidade, o magistrado atrai para si a imunidade preconizada
no artigo 142, III, do Código Penal, o que afasta a ilicitude de eventual conceito
desfavorável que possa ter emitido em sua decisão.
E, conforme lição de Damásio E. de Jesus, o pedido de explicações pre-
visto no artigo 144 do Código Penal “É incabível quando o fato imputado se encon-
tra acobertado por causa excludente da ilicitude (CP, art. 142) ou extintiva da punibilida-
de (decadência etc.).” (in Direito Penal, São Paulo: Saraiva, 1995, p. 209).
Depois, não há nenhuma dúvida quanto ao conteúdo da decisão nem indí-
cio de ofensa à conduta profissional dos requerentes, mas, apenas e tão somente,
determinação de juntada de documentos para análise do pedido de justiça gra-
tuita formulado pelo autor, a fim de se resguardar o interesse público, porque,
como tem sido amplamente divulgado e não se restringe a nenhuma parte nem
a nenhum escritório de advocacia, especificamente, a concessão indevida do
benefício da justiça gratuita tem causado enorme prejuízo à prestação jurisdicio-
nal, porque enseja, como é notório, a litigância predatória.
A menção à litigância predatória na decisão foi formulada como funda-
mento para as determinações nela contidas, que se destinam tão somente à prova
da necessidade do benefício da justiça gratuita e à regularização da representa-
ção processual, sem nenhuma imputação aos requerentes, basta ler a decisão.
Pedir explicações sobre a decisão em questão, que é absolutamente clara
e direta, implica tentativa de impedir a apuração e a regularização a que ela se
destina.
822
De se observar que, no caso concreto, o autor pretende, com a ação, a
revisão de cláusulas de contrato bancário, hipótese conhecida de ajuizamento
de causas em massa, notadamente porque nelas são costumeiramente invocadas
diversas e repetidas teses jurídicas, que se aplicam a qualquer contrato, e com
Jurisprudência - Órgão Especial
pedidos genéricos, que sugerem, em princípio, a repetição de causas similares.
Tudo isso atrai a cautela imposta aos juízes pelo artigo 139 do Código
de Processo Civil e pela Recomendação nº 159, de 23 de outubro de 2024, do
Conselho Nacional de Justiça, que, no Anexo A, elenca, exemplificativamente,
condutas processuais potencialmente abusivas, dentre elas “1) requerimentos de
justiça gratuita apresentados sem justificativa, comprovação ou evidências mínimas de
necessidade econômica;” e “7) distribuição de ações judiciais semelhantes, com peti-
ções iniciais que apresentam informações genéricas e causas de pedir idênticas, frequen-
temente diferenciadas apenas pelos dados pessoais das partes envolvidas, sem a devida
particularização dos fatos do caso concreto;”.
Além disso, breve análise daquele processo revela que a inicial não foi
instruída com procuração, causa da determinação de regularização da represen-
tação processual do autor, sem nenhuma conjectura a respeito da atuação do
escritório de advocacia ou da dos seus sócios.
Assim sendo, o que se tem é que a decisão judicial foi proferida no exer-
cício regular da jurisdição o que não pode ser cerceado - de forma a não haver
ilicitude a ser apurada posteriormente nem, portanto, viabilidade de propositura
de ação penal, resultando na inutilidade do pedido de explicações e, consequen-
temente, na sua inadmissibilidade.
De resto, não se pode esquecer que a matéria objeto da decisão proferida
pelo magistrado é de caráter estritamente jurisdicional, sujeitando-se, portanto,
à interposição de recurso.
Permitir que cada decisão judicial seja alvo de pedido de explicações,
quando não se vislumbra nenhuma razão para tanto, como se ele fosse sucedâ-
neo do recurso legalmente previsto, afrontaria o regular exercício da jurisdição,
impediria o controle da litigância predatória e subverteria o princípio do livre
convencimento do magistrado, que lhe assegura proferir decisões, devidamente
motivadas, com “independência, serenidade e exatidão” (LOMAN, art. 35, I),
sem se submeter a nenhum tipo de intimidação, sem o quê o juiz não poderia
executar as relevantes funções que lhe são atribuídas, dentre elas, como é cediço,
a de analisar cuidadosamente os pedidos deduzidos pelas partes nos processos e
proferir as decisões a tanto atinentes, respeitada a legislação vigente, não sendo
demais acrescentar que, “Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem
o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo
teor das decisões que proferir.” (idem, art. 41).
Assim, eventuais decisões contrárias aos interesses do cliente dos advo-
gados requerentes deverão ser apontadas no processo e discutidas, se for o caso,
em regulares recursos.
823
Em suma, nada ampara o pedido de explicações, que, tendo em vista o
caso concreto, é inadmissível.
Na jurisprudência do C. Órgão Especial há precedentes no mesmo sen-
Jurisprudência - Órgão Especial
tido:
“Notificação. Pedido de Explicação. Interpelação. Matéria, em sede de agravo
de instrumento, de cunho pseudo-ofensivo. Inviabilidade. Inexistência de ambi-
guidade, dubiedade ou equivocidade na manifestação judicial. Indeferimento.”
(Notificação para Explicações nº 2069179-31.2016.8.26.0000, rel. Des. Sérgio
Rui, j. 27.04.2016);
“Notificação para Explicações – Equivocidade, ambigüidade e dubiedade de
expressões em manifestação de Promotor de Justiça – Mera contraposição às
conclusões e raciocínio inferidos pelo promotor de justiça em sua manifestação
– Requisitos essenciais à propositura da medida não observados – Indeferimento
liminar.” (Notificação para Explicações nº 0229797-23.2012.8.26.0000, rel. Des.
Castilho Barbosa, j. 27.02.2013);
“Pedido de explicações – Ausência de dúvida sobre o sentido das afirmações
do requerido – Medida que não se presta para investigação de autoria de su-
posto delito – Inicial indeferida.” (Notificação para Explicações nº 0101601-06.2010.8.26.0000, rel. Des. Mauricio Vidigal, j. 19.05.2010).
Esse é, também, o entendimento do Supremo Tribunal Federal:
“EMENTA: INTERPELAÇÃO JUDICIAL. PROCEDIMENTO DE NA-
TUREZA CAUTELAR. MEDIDA PREPARATÓRIA DE AÇÃO PENAL RE-
FERENTE A DELITOS CONTRA A HONRA (CP, ART. 144). PEDIDO DE
EXPLICAÇÕES AJUIZADO CONTRA DEPUTADO FEDERAL. COM-
PETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, POR
DISPOR, O PARLAMENTAR FEDERAL, DE PRERROGATIVA DE FORO,
‘RATIONE MUNERIS’, PERANTE ESTA SUPREMA CORTE, NAS INFRA-
ÇÕES PENAIS COMUNS. IMPUTAÇÕES ALEGADAMENTE OFENSIVAS
AO PATRIMÔNIO MORAL DO INTERPELANTE. RECONHECIMEN-
TO, POR ELE PRÓPRIO, DE QUE AS AFIRMAÇÕES QUESTIONADAS
OFENDERAM-LHE A IMAGEM E A REPUTAÇÃO. AUSÊNCIA, EM TAL
CONTEXTO, DE DUBIEDADE, EQUIVOCIDADE OU AMBIGUIDADE.
CONSEQUENTE INEXISTÊNCIA DE DÚVIDA QUANTO AO CONTEÚDO
DE TAIS AFIRMAÇÕES. INVIABILIDADE JURÍDICA DO AJUIZAMEN-
TO DA INTERPELAÇÃO JUDICIAL, POR FALTA DE INTERESSE PROCES-
SUAL. PEDIDO DE EXPLICAÇÕES A QUE SE NEGA SEGUIMENTO.
– O Supremo Tribunal Federal possui competência originária para processar
pedido de explicações formulado com apoio no art. 144 do Código Penal,
quando deduzido contra parlamentar federal, que dispõe de prerrogativa de
foro, ‘ratione muneris’, perante esta Corte Suprema, nas infrações penais co-
muns (CF, art. 53, § 1º, ‘caput’, c/c o art. 102, I, ‘b’).
– O pedido de explicações, admissível em qualquer das modalidades de crimes
contra a honra, constitui típica providência de ordem cautelar, sempre facultati-
va (RT 602/368 – RT 627/365 – RT 752/611 – RTJ 142/816), destinada a apa-
relhar ação penal principal tendente a sentença condenatória. O interessado,
823
ao formulá-lo, invoca, em juízo, tutela cautelar penal, visando a que se esclare-
çam situações revestidas de equivocidade, ambiguidade ou dubiedade, a fim de
que se viabilize o exercício eventual de ação penal condenatória.
– O pedido de explicações em juízo submete-se à mesma ordem ritual que é
Jurisprudência - Órgão Especial
peculiar ao procedimento das notificações avulsas (CPC, art. 867 c/c o art. 3º do
CPP). Isso significa, portanto, que não caberá, ao Supremo Tribunal Federal,
em sede de interpelação penal, avaliar o conteúdo das explicações dadas pela
parte requerida nem examinar a legitimidade jurídica de sua eventual recusa
em prestá-las, pois tal matéria compreende-se na esfera do processo penal de
conhecimento a ser eventualmente instaurado. Doutrina. Precedentes.
– A interpelação judicial, fundada no art. 144 do Código Penal, acha-se ins-
trumentalmente vinculada à necessidade de esclarecer situações, frases ou ex-
pressões, escritas ou verbais, caracterizadas por sua dubiedade, equivocidade
ou ambiguidade. Ausentes esses requisitos condicionadores de sua formula-
ção, a interpelação judicial, porque desnecessária, revela-se processualmente
inadmissível. Doutrina. Precedentes. (Petição nº 5.187/SP, rel. Min. Celso de
Mello, decisão de 08.09.2014) (destaques no original; sublinhei).
Sendo assim, diante da desnecessidade da interpelação judicial, o que
traduz falta de interesse de agir, nego seguimento ao presente pedido de expli-
cações.