Decisão 0006850-02.2025.8.26.0000

Processo: 0006850-02.2025.8.26.0000

Recurso: agravo

Relator: Beretta da Silveira; Órgão

Câmara julgadora:

Data do julgamento: 31 de maio de 2025

Ementa Técnica

AGRAVO – DIREITO PROCESSUAL PENAL. EXCE- ÇÃO DE SUSPEIÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. I. Caso em Exame 1. Exceção de suspeição interposta por E.S. contra o juiz da 3ª Vara Criminal de Piracicaba, Dr. Ro- drigo Pares Andreucci, na ação penal nº 1508088-21.2024.8.26.0451, onde o réu é acusado de roubo majorado. Alega-se suspeição do magistrado por ter condenado o excipiente em ação penal anterior por fatos semelhantes, comprometendo a imparcialidade no julgamento atual. 871 II. Questão em Discussão 2. A questão em discussão consiste em determinar se a atuação anterior do juiz em ação anterior comprome- Jurisprudência - Câmara Especial te sua imparcialidade no julgamento atual. III. Razões de Decidir 3. A imparcialidade do juiz é essencial para a validade do processo, sendo a suspeição ou impedimento regu- lados por lei para garantir essa imparcialidade. 4. A mera prolação de decisão contrária ao interesse da parte não caracteriza suspeição. Não foram apre- sentados elementos que comprovem a quebra da im- parcialidade do magistrado. IV. Dispositivo e Tese 5. Exceção de suspeição rejeitada. Tese de julgamento: 1. A atuação anterior do juiz em processos semelhantes não implica, por si só, em sus- peição. 2. A imparcialidade deve ser comprovada com base em fatos concretos e não em conjecturas. Legislação Citada: CPC, arts. 144, 145 e 147; CPP, art. 254. Jurisprudência Citada: STJ, AgRg no RHC nº 165.304-MT, Rel. Reynaldo Soa- res da Fonseca, 5ª Turma, j. 07.06.2022; STJ, AgInt na ExSusp nº 195-DF, Rel. Ricardo Villas Bôas Cuevas, 2ª Seção, j. 26.06.2019; TJSP, Exceção de Suspeição nº 0043197-05.2023.8.26.0000, Rel. Heraldo de Oliveira, Câmara Especial, j. 18.03.2024; TJSP, Exceção de Suspeição nº 0028039-41.2022.8.26.0000, Rel. Beretta da Silveira, Câmara Especial, j. 03.11.2022.(TJSP; Processo nº 0006850-02.2025.8.26.0000; Recurso: agravo; Relator: Beretta da Silveira; Órgão; Data do Julgamento: 31 de maio de 2025)

Voto / Fundamentação

, em sessão permanente e virtual da Câmara Especial do Tri- bunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Rejeitaram a exce- ção de suspeição. V.U.”, de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. (Voto nº IS-0046/25-CE) O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores BERET- TA DA SILVEIRA (VICE-PRESIDENTE) (Presidente sem voto), HERALDO DE OLIVEIRA (PRESIDENTE DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) e CA- MARGO ARANHA FILHO (PRESIDENTE DA SEÇÃO DE DIREITO CRI- MINAL). São Paulo, 31 de maio de 2025. TORRES DE CARVALHO, Relator e Presidente da Seção de Direito Pú- blico


Ementa: DIREITO PROCESSUAL PENAL. EXCE- ÇÃO DE SUSPEIÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. I. Caso em Exame 1. Exceção de suspeição interposta por E.S. contra o juiz da 3ª Vara Criminal de Piracicaba, Dr. Ro- drigo Pares Andreucci, na ação penal nº 1508088-21.2024.8.26.0451, onde o réu é acusado de roubo majorado. Alega-se suspeição do magistrado por ter condenado o excipiente em ação penal anterior por fatos semelhantes, comprometendo a imparcialidade no julgamento atual. 871 II. Questão em Discussão 2. A questão em discussão consiste em determinar se a atuação anterior do juiz em ação anterior comprome- Jurisprudência - Câmara Especial te sua imparcialidade no julgamento atual. III. Razões de Decidir 3. A imparcialidade do juiz é essencial para a validade do processo, sendo a suspeição ou impedimento regu- lados por lei para garantir essa imparcialidade. 4. A mera prolação de decisão contrária ao interesse da parte não caracteriza suspeição. Não foram apre- sentados elementos que comprovem a quebra da im- parcialidade do magistrado. IV. Dispositivo e Tese 5. Exceção de suspeição rejeitada. Tese de julgamento: 1. A atuação anterior do juiz em processos semelhantes não implica, por si só, em sus- peição. 2. A imparcialidade deve ser comprovada com base em fatos concretos e não em conjecturas. Legislação Citada: CPC, arts. 144, 145 e 147; CPP, art. 254. Jurisprudência Citada: STJ, AgRg no RHC nº 165.304-MT, Rel. Reynaldo Soa- res da Fonseca, 5ª Turma, j. 07.06.2022; STJ, AgInt na ExSusp nº 195-DF, Rel. Ricardo Villas Bôas Cuevas, 2ª Seção, j. 26.06.2019; TJSP, Exceção de Suspeição nº 0043197-05.2023.8.26.0000, Rel. Heraldo de Oliveira, Câmara Especial, j. 18.03.2024; TJSP, Exceção de Suspeição nº 0028039-41.2022.8.26.0000, Rel. Beretta da Silveira, Câmara Especial, j. 03.11.2022.





VOTO

1. Trata-se de exceção de suspeição interposta por E.S. em face do MM. JUIZ DE DIREITO DA 3ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE PIRACICA- BA, Dr. Rodrigo Pares Andreucci, na ação penal nº 1508088-21.2024.8.26.0451, na qual o réu é acusado de roubo majorado (artigo 157, § 2º-A, inciso I, do CP). Afirma suspeição do magistrado, eis que teria ele condenado o excipiente em ação penal anterior, por fatos semelhantes aos ora impugnados, o que o impos- sibilitaria de proferir um julgamento imparcial no processo atual. Pede que o excepto seja declarado suspeito (fls. 1/5 da origem). Recusados os motivos pelo magistrado excepto (fls. 6/7 dos autos de nº 0001182-55.2025.8.26.0451). Concedido prazo de 5 dias para regularização da 872 representação processual, o excipiente juntou a procuração (fls. 3, 7). Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça a fls. 15/19, opinado pela improcedência da Jurisprudência - Câmara Especial exceção. É o relatório. 2. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 22-11-1969 (Pac- to de San José da Costa Rica), em vigor no Brasil desde 25-9-1992, prevê no item 1 do art. 8º que “toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza”. No mesmo sentido são os art. 10 da Declaração Universal dos Direi- tos Humanos, proclamada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas em 10-12- 1948, e art. 14 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, adotado pela XXI Seção da Assembleia-Geral das Nações Unidas em 16-12-1966. A imparcialidade do juiz é um pressuposto subjetivo de validade do pro- cesso e assegura aos litigantes a lisura da prestação jurisdicional. O incidente de arguição de suspeição ou impedimento, por sua vez, é “o modelo estabelecido em lei com o escopo de afastar o magistrado do feito, por lhe faltar a principal característica do julgador, a imparcialidade (Celio Alves de Souza v. Ministério Público do Mato Grosso, AgRg no RHC nº 165.304-MT, STJ, 5ª Turma, 7-6- 2022, Rel. Reynaldo Soares da Fonseca). As hipóteses de impedimento e suspei- ção estão previstas nos arts. 144, 145 e 147 do CPC; e o reconhecimento da uma dessas situações exige a comprovação da quebra da imparcialidade do julgador para apreciar o litígio, sendo insuficientes meras conjecturas (J.D.M. v. Ministra Nancy Andrighi, AgInt na ExSusp nº 195-DF, STJ, 2ª Seção, 26-6-2019, Rel. Ricardo Villas Bôas Cuevas). 3. O excipiente é réu na ação penal nº 1508088-21.2024.8.26.0451, pela suposta prática do crime previsto no artigo 157, § 2º-A, inciso I, do Código Pe- nal. Segundo a denúncia, em 3-4-2022 o acusado abordou a vítima C.S.S. e, se identificando como policial, mediante ameaça exercida com arma de fogo, lhe subtraiu um celular e a carteira. A denúncia foi recebida em 24-1-2025, ocasião em que o juiz impôs medidas cautelares ao acusado, quais sejam a proibição de se aproximar da vítima, suspensão do porte funcional de arma de fogo e aloca- ção em atividades administrativas da Corporação enquanto perdurar o processo, considerando que o acusado é Guarda Municipal em atividade (fls. 107/108 e 110/111 do processo nº 1508088-21.2024.8.26.0451). O excipiente afirma que em data anterior, mais precisamente no ano de 2022, foi oferecida denúncia contra si como incurso nos mesmos artigos e em circunstâncias idênticas, nos autos do processo nº 1500658-30.2022.8.26.0451, tramitado também perante a 3ª Vara Criminal da Comarca de Piracicaba/SP; 873 aduz que em tal ação penal, durante audiência de instrução e julgamento, o juiz excepto demonstrou interesse em desfavorecer o acusado por meio de atos par- ciais (fls. 10/11). Jurisprudência - Câmara Especial 4. A insurgência do excipiente se direciona ao fato de o juiz excepto ter oficiado em outra ação penal em que figurou como réu e, de maneira vaga, afirma que foram praticados atos parciais, sem, contudo, indicar quais atos fo- ram esses. O exame do processo de nº 1500658-30.2022.8.26.0451 não indica qualquer atitude que caracterize a parcialidade alegada; os fatos são distintos, havidos em outra data e envolvem outras vítimas; o réu foi condenado e, poste- riormente, absolvido pela 11ª Câmara de Direito Criminal. Tais circunstâncias, por si só, não são fundamentos para a oposição de exceção de suspeição, por não caracterizarem quebra da imparcialidade. A mera prolação de decisão contrária ao interesse da parte não caracteriza a suspeição apta a justificar o acolhimento da exceção em análise. Nesse sen- tido é o entendimento consolidado na Súmula nº 88, deste Egrégio Tribunal de Justiça: “Reiteradas decisões contrárias aos interesses da excipiente, no estrito exercício da atividade jurisdicional, não tornam o juiz excepto suspeito para o julgamento da causa”. O artigo 254 do Código de Processo Penal arrola as hipóteses de suspeição do magistrado, e no caso concreto não se contempla pre- sente quaisquer delas, destacando-se que o excepto não é inimigo do excipiente, a quem incumbiria a comprovação de suas alegações sob o enfoque atinente ao liame subjetivo apto à caracterização da suspeição buscada, o que não se verificou. Somente o receio legítimo, motivado por circunstâncias ou interesses comprovados e com base na realidade, autoriza a conclusão de que o juiz pode- rá agir com parcialidade na solução da causa, o que não se verificou no presente incidente, como enfatizado. Assim, na ausência de fundamento apto a sinalizar o comprometimento da imparcialidade, inadmissível a destituição do juiz natural do processo. Em casos equivalentes, assim já decidiu esta C. Câmara Especial: EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. Pretensão de afastamento do MM. Juiz proces- sante da ação penal. Alegações genéricas. Não configuração das hipóteses pre- vistas no artigo 254 do Código de Processo Penal. Prolação de decisões judiciais fundamentadas e legais, que podem desagradar aos interesses particulares do excipiente, sem tornar o magistrado suspeito. Incidência da Súmula nº 88 des- te E. Tribunal de Justiça. Incidente de suspeição rejeitado.” (TJSP; Exceção de Suspeição nº 0028039-41.2022.8.26.0000; Relator: Beretta da Silveira; Órgão julgador: Câmara Especial; Data de julgamento: 03/11/2022; Data de publicação: 03/11/2022; Excipiente: Giselle Aparecida Grandizioli da Silva; Excepto: Luiz Filipe Souza Fonseca) O voto é pela rejeição da exceção de suspeição. 874 Habeas Corpus Jurisprudência - Câmara Especial ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus Cível nº 2344795-47.2024.8.26.0000, da Comarca de Votorantim, em que é impetrante M.R.C., pacientes W.S.O.I. (MENOR), J.W.O.I. (MENOR), V.H.C.S.L. (ME- NOR), R.C. (MENOR), A.G.O.D. (MENOR) e A.H.O.D. (MENOR). ACORDAM, em sessão permanente e virtual da Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Concederam a ordem para devolução da guarda das crianças J.W. e W.S. aos genitores, pros- seguindo-se com as estratégias traçadas para reestruturação familiar. V.U.”, de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. (Voto nº HC -0240/24-CE) O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores BERET- TA DA SILVEIRA (VICE-PRESIDENTE) (Presidente sem voto), HERALDO DE OLIVEIRA (PRESIDENTE DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) e CA- MARGO ARANHA FILHO (PRESIDENTE DA SEÇÃO DE DIREITO CRI- MINAL). São Paulo, 30 de abril de 2025. TORRES DE CARVALHO, Relator e Presidente da Seção de Direito Pú- blico Ementa: Direito da Criança e do Adolescente. Habeas Corpus. Guarda de Menores. Ordem concedida. I. Caso em Exame 1. Habeas corpus impetrado contra decisão que de- terminou o desacolhimento de crianças e sua entrega em guarda à tia paterna por 180 dias. A defesa alega abusividade da decisão, destacando evolução dos re- latórios técnicos, ausência de provas de maus tratos e mudança dos genitores para uma casa maior. II. Questão em Discussão 2. A questão em discussão consiste em determinar se a guarda das crianças deve ser mantida com a tia pater- na ou devolvida aos genitores, considerando o direito das crianças de serem criadas em sua família natural. III. Razões de Decidir 3. Os genitores demonstraram esforços para reestru- 875 turação familiar, seguindo orientações técnicas e as- sistenciais, sem comprovação de impedimentos graves para retomar a guarda. Jurisprudência - Câmara Especial 4. A prioridade legal é a manutenção das crianças junto aos pais, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo a colocação em família substituta medida excepcional. IV. Dispositivo e Tese 5. Ordem concedida para devolução da guarda das crianças aos genitores, prosseguindo-se as estratégias traçadas para reestruturação familiar. Tese de julgamento: 1. A reintegração familiar deve ser priorizada em relação à colocação em família substituta. 2. A reestruturação familiar dos genitores foi demonstrada, e estão aptos a retomar a guarda das crianças. Legislação Citada: ECA, art. 19. VOTO 1. Trata-se de habeas corpus impetrado pela DRA. M.R.C. em favor de W.S.O.I. (DN (...) e J.W.O.I. (DN (...)) contra decisão que determinou o de- sacolhimento das crianças e sua entrega em guarda à tia paterna S.S.I.S., pelo prazo de 180 dias (fls. 743/744 dos autos do proc. nº (...)). 2. Sustenta, em síntese, abusividade da decisão considerando a evolução dos relatórios técnicos das visitas dos genitores; os cancelamentos reiterados das visitas pela equipe da casa de acolhimento; inexistência de provas no tocan- te a maus tratos; a mudança dos genitores para uma casa maior, providenciando tudo que foi sugerido pela equipe técnica para receber as crianças; laudo do IML mencionando a ausência de lesões corporais; o fato de a vizinha nunca ter sido ouvida, pois era quem cuidava das crianças no dia em que foram acolhidas; a tia paterna que está com a guarda das crianças reside em (...), a 100 km da casa dos genitores. Pretendem, em liminar, a revogação da decisão que determinou o desacolhimento das crianças (W. e J.W.) em favor da tia materna, para que as crianças voltem à família natural; preventivamente, diante da iminência de que os outros filhos (A.H., A., V.H. e R.) sejam acolhidos, a permanência na família natural (fls. 01/32). 3. Depreende-se dos autos que em 2022 o Ministério Público ingressou com ação de afastamento do convívio familiar, com pedido liminar de acolhi- mento institucional para defesa do adolescente W.O.D. (...) e das crianças V.H. C.S.L. (DN (...)) e W.S.O.I. (DN (...)). 876 Em março de 2023, estabilizadas as condições familiares, foram desaco- lhidos e entregues à genitora e seu companheiro, pai da menina W.S.O.I., com Jurisprudência - Câmara Especial determinação para que o CREAS e a Secretaria de Saúde dessem continuidade aos acompanhamentos da família, bem como a Casa Belém encaminhasse re- latórios mensais (fls. 82/84 e 367 e 381 todas dos autos do proc. nº (...)). Em virtude da estabilização da situação do núcleo familiar, o Ministério Público pe- diu a extinção do feito, o que não foi apreciado naquele momento (fls. 428/433, 435/436, 438/439, 441/442, 443 dos autos do proc. nº (...)). Contudo, em março do presente ano, o Ministério Público informou o acolhimento institucional dos filhos mais novos do casal P. e W. (W.S.O.I e J.W.O.I.) (fls. 456/488 dos autos do proc. nº (...)), após o recebimento de denún- cia anônima de abandono e maus tratos. Ao que se infere da documentação, os menores V.H., W., J.W., R., A. e A.H. estavam sozinhos na residência quando encontrados. Os pais alegaram que haviam ido entregar um trabalho de serralhe- ria, ofício do genitor, e os deixaram aos cuidados de uma vizinha, que nunca foi ouvida pelo MM. Juízo ou pelo Conselho Tutelar. Diante da necessidade de resguardar os interesses das crianças, o Conse- lho Tutelar, aos 25/04/2024, realizou o acolhimento institucional apenas de W. e J.W. (fls. 529/553 dos autos do proc. nº (...)). O Ministério Público requereu a manutenção do acolhimento (fls. 457/488 dos autos do proc. nº (...)), o que foi ratificado pelo juízo (fl. 489 dos autos do proc. nº (...)). O Plano Individual de Atendimento das crianças acolhidas foi elaborado (fls. 497/540 dos autos do proc. nº (...)). A criança W.S.O.I. passou por consulta médica e apresentava leve problema de pele. Nos autos, os pais esclareceram que na data dos fatos, as crianças estavam aos cuidados da vizinha e que ela tinha ido até a sua casa para desligar o fogo; os policiais da guarda municipal foram acionados e, ao chegarem ao local, a vi- zinha já estava retornando; as informações do plano individual de atendimento não mencionam quaisquer maus tratos; as crianças acolhidas estão matriculadas e há o monitoramento pelos órgãos competentes; quanto aos outros filhos da genitora P., V. e R. estão aos cuidados do Sr. E.; A. e A.R., atualmente estão com o genitor e W. sob cuidados maternos; requereram a realização de visitas e a convivência aos finais de semana (fls. 514/529 dos autos do proc. nº (...)). Foi juntado laudo toxicológico da genitora para corroborar as alegações de que ela está abstinente do uso de entorpecentes (fls. 532/533 dos autos do proc. nº (...)). A magistrada, conforme manifestação do Ministério Público e visando à manutenção dos vínculos entre as crianças e os genitores, autorizou a visitação dos genitores (nos dias e horas estabelecidos pela entidade) e determinou a vin- da de relatórios quinzenais (fls. 551 dos autos do proc. nº (...)). A equipe do acolhimento encaminhou relatório aos 10/07/2024, descre- vendo a preocupação da tia paterna (Sra. S.) com as crianças e o deslocamento 877 semanal para visitá-las no abrigo (fls. 557/559 dos autos do proc. nº (...)). No relatório da equipe do acolhimento, datado de 22/07/2024, constou que os filhos se mostraram indiferentes à genitora, as crianças possuem uma Jurisprudência - Câmara Especial boa interação com o genitor e que, após algumas visitas, as crianças ficaram chorosas e até agressivas com as outras crianças (fls. 594/596 dos autos do proc. nº (...)). Novo relatório encaminhado aos 05/08/2024, a equipe do acolhimento pontuou a boa interação entre os genitores e as crianças (brincam, conversam e pedem colo); informam que o genitor é proprietário de uma serralheria e, para complementar a renda, trabalha como segurança em um supermercado; a geni- tora está trabalhando numa lavanderia; há notícia de que a genitora deixou há bastante tempo a drogadição, inclusive, tendo apresentado três exames toxico- lógicos negativos; quanto ao ocorrido no dia acolhimento, a genitora esclareceu que estavam indo até a serralheira para entrega de um serviço e que deixaram as crianças aos cuidados da vizinha; que nunca deixou seus filhos sozinhos, pois possui flexibilidade de horário e, por isso, pode ficar com eles quando necessá- rio, e o sentimento de “perseguição” em virtude do primeiro acolhimento com falsas acusações de uso de entorpecentes – fato que levou a genitora a realizar três exames toxicológicos; a interação mais confortável entre os genitores e a equipe; a preocupação da genitora em provar que não faz mais uso de substân- cias entorpecentes (fls. 600/603 dos autos do proc. nº (...)). Sobreveio o estudo psicossocial, realizado pela equipe técnica do juízo, havendo informação que o genitor W. trabalha na serralheria própria e como segurança em um supermercado, tendo renda mensal por volta de seis mil reais; nunca deixou faltar nada para os filhos; não faz uso de substâncias psicoativas; devido a denúncias contra a companheira e de que não levavam os filhos para creche, mudaram para outra residência; a companheira foi liberada dos atendi- mentos realizados pelo CAPS-AD; a vizinha era paga para auxiliar nos cuidados com as crianças; na data dos fatos, as crianças foram deixadas com a vizinha; quanto às marcas apresentadas pela filha (W.), relata que sempre teve problema de pele; negou qualquer tipo de agressão; a companheira sempre cuidou bem dos filhos; as crianças iam para escola e estavam com todas as vacinas em dia, manifestado o desejo de ter os filhos de volta. A genitora ressaltou a inexistência de motivos para o acolhimento dos filhos; o fato de estar há três anos sem usar drogas; a grande responsabilidade decorrente de cuidar de sua prole numerosa sem auxílio; reiterou que na data do acolhimento tinha deixado os filhos aos cuidados da vizinha e que a vizinha só se dirigiu até a própria casa para preparar a comida (fls. 606/615 dos autos do proc. nº (...)). O relatório informativo encaminhado pela equipe do acolhimento aos 19/08/2024 mencionou a interação afetiva entre os genitores e as crianças (troca de carinhos, beijos, brincadeiras), apontando que as brincadeiras da genitora 878 estimulam o aprendizado dos filhos; a mudança da família para uma casa maior, com 05 cômodos, para receber todas as crianças; os brinquedos que são feitos Jurisprudência - Câmara Especial pelo genitor na serralheria; apontou que os pais estão se empenhando para rea- ver a guarda dos outros filhos (V. e R.) e empenharam esforços para fazer a festa da filha W. no acolhimento. Consta do relatório que: (...) “O casal mostra-se solicito em atender as orientações, aceitando os encaminhamentos para se fortalecerem na função protetiva de pais, em visita domiciliar encontramos uma casa limpa e organi- zada. É uma família em processo de reestruturação.” (fls. 620/627 dos autos do proc. nº (...)). Neste interim, a advogada requereu permissão para retirada das crianças para participar da festa de aniversário da filha W. ou, caso negativo, permissão para que os irmãos participassem da festa dentro da casa de acolhimento (fls. 628/629 dos autos do proc. nº (...)). O Ministério Público, a despeio de as visitas dos genitores estarem sendo positivas e de estarem esforçando para modificar a dinâmica e situação familiar, opinou pelo indeferimento da retirada das crianças para o aniversário da filha (W.) com autorização para que os genitores e os demais irmãos participassem da festa de aniversário a ser realizada no abrigo (fls. 633/634 dos autos do proc. nº (...)). O magistrado, considerando que a família está em processo de reestrutu- ração, indeferiu a retirada das crianças e autorizou a participação dos irmãos na festa de aniversário (fl. 636 dos autos do proc. nº (...)). A equipe de acolhimento encaminhou relatório aos 23/09/2024 destacan- do a interação afetiva entre os genitores e os filhos durante todo o tempo de vi- sita, o tempo restrito de cinco meses para efetivação da superação das questões que levaram ao acolhimento das crianças com a necessidade de um período maior para que fosse analisado se os genitores possuem condições de receber os filhos; a preocupação do retorno das crianças ao convívio com os genitores e irmãos; o fato de ser o segundo acolhimento da criança W.; a excepcionalidade e brevidade do acolhimento e o fato da existência de membro da família extensa interessada na guarda provisória das crianças (fls. 640/642 dos autos do proc. nº (...)). O Ministério Público, aos 26/09/2024, reputou ser prematura a entrega dos irmãos à tia paterna, sobretudo considerando o estudo psicossocial e a pen- dência da realização de estudo psicossocial na residência da tia paterna – Sra. S (fl. 645 dos autos do proc. nº (...)). O magistrado manteve o acolhimento até a conclusão das diligências so- licitadas nos autos apensos nº (...) (fl. 647 dos autos do proc. nº (...) – guarda promovida pela tia paterna S.). A defesa peticionou requerendo o desacolhimento e mencionou os cance- lamentos das visitas dos genitores nos dias 05/07, 30/08, 04/10 e ressaltou que 879 as visitas da tia paterna S. (que disputa a guarda das crianças) puderam ser rea- lizadas (nestes mesmos dias); a Casa Belém não recepcionou bem os genitores e os irmãos na data da festa da criança (W.); a alta da genitora do CAPS foi en- Jurisprudência - Câmara Especial caminhada à Casa Belém em agosto, porém não foi mencionada nos relatórios; os laudos dos exames toxicológicos não foram anexados ou mencionados nos relatórios anteriores e, assim, as informações do acolhimento não dão ciência de que os genitores estão reestruturados física e emocionalmente. Ressaltou a ausência de provas de maus tratos e de abandono, dizendo que todos os outros filhos estão com a genitora (fls. 652/671 e docs. dos autos do proc. nº (...)). Sobreveio relatório informativo da equipe do acolhimento aos 14/10/2024, pontuando que durante toda visita os genitores interagiram com os filhos; a an- siedade das crianças; e, diversamente do que ocorreu até então, mencionaram os técnicos a resistência dos genitores a qualquer intervenção e orientação; o comparecimento da genitora ao abrigo para saber o motivo de as visitas da tia paterna não terem sido suspensas e a desconfiança dos genitores em relação à conduta da equipe; a motivação da suspensão da visita foi devido ao fato de que a presença dos pais no período de atividade prejudicaria a atividade (fls. 734/737 dos autos do proc. nº (...)). O Ministério Público se manifestou favoravelmente ao desacolhimento e a concessão de guarda indeterminada para a Sra. S. (fls. 738/739 dos autos do proc. nº (...)). O magistrado acolheu o parecer do Ministério Público e de- terminou o desacolhimento das crianças à Sra. S., pelo prazo de 180 dias. Daí o agravo. Para melhor elucidação dos fatos e apreciação da liminar, foram determi- nadas providências urgentes, quais sejam: 1) a realização de estudo pela equipe técnica do juízo de (...) junto aos genitores; 2) a realização de estudo com visita domiciliar na comarca de (...) junto à tia paterna S. e às crianças W. e J.W., pela equipe técnica do respectivo Juízo; 3) a realização de audiência concentrada do caso pelo Juízo da Infância de (...); o resultado de todas as determinações acima deveria ser enviado a estes autos tão logo concluídas. O MM. Juízo determinou a realização de avaliação psicossocial com vi- sita domiciliar à tia paterna e às crianças W. e J.W., e autorizou a realização de visitas dos genitores aos filhos, semanalmente, aos sábados ou domingos, sem pernoites e sob a supervisão da guardiã (fls. 514, da origem). Documentos referentes às diligências determinadas foram trazidos a estes autos. Laudo psicossocial produzido na comarca de (...) (processo nº (...)) relata visita ao domicílio da tia paterna S., que detém a guarda das crianças W. e J.W. Trata-se de viúva, pensionista, que coabita com um de seus três filhos, que é funcionário público municipal, solteiro, sem filhos. Habitam imóvel próprio, dispõem de condições materiais para garantia das necessidades das crianças, além de contarem com rede de apoio. É guardiã das crianças desde 23.10.2024, 880 e relatou, em entrevista, que o genitor dos infantes, W., na iminência de acolhi- mento dos filhos, solicitou a ela que requeresse a guarda a fim de evitar a institu- Jurisprudência - Câmara Especial cionalização. Concluiu-se o estudo de forma favorável à manutenção da guarda, com verificação de afeto, cuidado e preocupação da tia e do primo em relação às crianças, que se encontram em excelente estado geral, com suas demandas afetivas, materiais, educacionais e de saúde atendidas (fls. 269/277). Estudo consistente em entrevistas conjuntas da psicóloga e da assistente social, individualizadas com cada um dos componentes do núcleo familiar no ambiente do fórum, além de visita domiciliar, indica que a família tem empe- nhado esforços para sua reestruturação, com maior atenção aos cuidados com os filhos e utilização da rede de apoio do Município (CREAS, CAPSIJ e UBS) para atendimento de demandas clínicas, psiquiátricas e psicológicas. Também se evi- denciou maior atuação quanto à disciplina dos filhos, tendo a genitora deixado de trabalhar fora para se dedicar integralmente aos seus cuidados, permanecen- do como principal responsável pelas tarefas cotidianas com o auxílio das suas filhas adolescentes, ante a extensa jornada de trabalho do genitor; o filho W. não vive no lar familiar, porém tem contato com a família. Em razão da situação de W., as profissionais consideravam que não seria ainda adequado o retorno das crianças ao lar (fls. 278/287). Superado o descumprimento do § 1º do art. 19 do ECA, que impõe a reavaliação trimestral das decisões tomadas, e do Provimento nº 118/2021 do CNJ, que estabelece que a realização de audiências concentradas visa não so- mente avaliar o desacolhimento, mas também se caracteriza como instrumento de acompanhamento e reanálise periódica da medida de proteção aplicada, a au- diência concentrada foi realizada em 10.1.2025 (termo às fls. 288/290). Na oca- sião, a equipe técnica do fórum de (...) denotou preocupação com a adolescente A.H., que havia iniciado acompanhamento psicológico em razão de episódios de depressão e automutilação; quanto ao adolescente W., reside em companhia desconhecida de sua genitora e há notícia de que estaria fazendo uso de entor- pecentes e sem frequência à escola. Aguardavam avaliações mais atuais, uma vez que o último atendimento com os genitores havia sido feito em novembro de 2024, a fim de verificar a evolução. O CREAS informou que a família segue em acompanhamento, com assiduidade desde o novo acolhimento dos filhos, e bom relacionamento com os funcionários do órgão. A equipe de saúde informou que a genitora realizou acompanhamento multidisciplinar por conta de sua dro- gadição, de forma inconstante, durante um ano e oito meses, tendo recebido alta. Testes recentes realizados constataram a ausência de substâncias químicas no seu organismo. Por fim, a equipe do SAICA relatou que, durante o acolhimento das Crianças W.J. e W.S., os genitores e a tia os visitaram com frequência; a despedida com os genitores causava irritabilidade e choro nas crianças, ao passo que com a tia as despedidas eram mais tranquilas. Ademais, questionamento do 881 Ministério Público quanto ao impacto da situação do adolescente W. no retorno das crianças ao lar familiar foi respondido pela equipe técnica, que informou não haver clareza quanto à proteção fornecida pelos genitores quanto aos tumul- Jurisprudência - Câmara Especial tos que o adolescente por vezes causa em visitas à família. Segundo informado pela genitora na audiência, o guardião legal do adolescente é o seu genitor, que reside em outro Município, e ela afirma que buscou ajuda do Ministério Público, do Conselho Tutelar e do genitor quando ciente de que o filho estava em uso de entorpecentes, não tendo sido negligente. Houve ainda informação sobre a frequência e dinâmica das visitas às crianças na cidade de (...), que ocorrem todos os sábados em uma praça da ci- dade, onde se demonstrou ser o ambiente mais proveitoso do quando realizadas na casa da tia. Ao fim, a magistrada determinou a apresentação, pelo CREAS, de rela- tório único sobre a evolução da família, entre os acolhimentos e após o último desacolhimento (período de abril de 2024 até atualmente), quanto à periodicida- de e frequência aos atendimentos, sobre o que se espera da família e se é neces- sário aguardar nova avaliação para que se possa apreciar o pedido de guarda da genitora, no prazo de 30 dias. Determinou, também, que a família apresente um plano objetivo com a descrição das atividades da família, como se as crianças menores estivessem sob sua guarda, no prazo de cinco dias, mantida a guarda das crianças S.W. e J.W com a tia paterna até cumprimento das determinações (fls. 288/290), o que foi atendido (fls. 351/396). Ainda em cumprimento ao determinado neste writ, nos autos de origem foi confeccionado relatório pelo setor técnico do juízo, com o objetivo de arti- cular as diversas políticas de atendimento à família. Informa que em 7.2.2025 houve reunião para discussão do caso, que resultou em encaminhamentos di- versos referidos nos autos de origem. Por fim, a equipe técnica considerou não dispor de elementos para se posicionar quanto à reintegração, ao seio familiar, das crianças sob guardiania da tia paterna, uma vez que a retomada dos atendi- mentos e a elaboração do plano é recente (fls. 933/937 da origem). O CREAS presta informação no sentido de que, após o segundo acolhi- mento dos filhos, ocorrido em março de 2024, a genitora buscou a instituição para retomada dos atendimentos. Naquele momento, mostraram-se abalados quanto ao acolhimento, negaram as acusações feitas contra eles, ao que foram orientados sobre suas responsabilidades e sobre a importância da participação do genitor na rotina dos filhos. Após reunião com a rede de apoio municipal e o setor técnico judicial, foram trabalhadas, com o casal, questões referentes a saúde, educação, projeto psicossocial e dinâmica familiar. A equipe considera que houve evolução e fortalecimento do casal ao longo do processo, além de melhora no relacionamento familiar, tendo o núcleo se comprometido com o processo. A genitora buscou emprego compatível com os horários e rotinas dos 882 filhos, e informa contar com o apoio de sua chefe para eventualidades que sur- jam. A família tem se organizado para o retorno dos filhos, com planejamento de Jurisprudência - Câmara Especial rotinas, lazer, organização escolar, entre outros aspectos. Da referida reunião, foi elaborado o seguinte planejamento a ser seguido junto à família: 1. Atendimentos psicossociais ao núcleo familiar, de forma quinzenal, com os genitores neste CREAS por tempo mínimo de 6 (seis) meses; 2. Os genitores deverão estar atentos às consultas médicas, dialogando com este CREAS sobre as datas agendadas, comparecimento e desdobramentos (a família já vem realizando esse acompanhamento); 3. Quanto à questão escolar deverão realizar o devido acompanhamento e com- parecimento nas reuniões escolares quando convocados (a família já vem reali- zando esse acompanhamento); 4. Procurar atendimento psicológico e/ou psicoterapia para A.H. (já está passan- do com psicólogo na rede particular de saúde); 5. Planejamentos de momentos de lazer e também que W. esteja mais presente na dinâmica familiar, não se restringindo às questões financeiras (W. mostrou-se disponível); 6. Acompanhamento do R. e da A.H. perante o CAPS-IJ, não faltar às consultas (próxima consulta agendada para 12.3.2025); 7. Avaliação para A. no CAPS-IJ; 8. Dialogarem com CAPS-IJ sobre as questões de W. devido ao uso d SPA (subs- tâncias psicoativas) (ocorrerá no mesmo dia 12.3.2025). Fls. 401/403: A Procuradoria Geral da Justiça opina pela denegação da segurança. É o relatório. Ainda que excepcional a cognição da matéria fática debatida nesta estrei- ta via de habeas corpus, é caso de concessão da ordem. Não se desconhece o interesse da tia paterna S. em obter a guarda dos sobrinhos antes mesmo de seu acolhimento institucional. Do mesmo modo, é sabido que o acolhimento é medida excepcional e deve ser breve. De acordo com o ECA, é direito da criança ser criada em sua família na- tural, sendo excepcional a colocação em família substituta (art. 19), dispondo o parágrafo terceiro que a manutenção ou a reintegração de criança ou adolescente à sua família terá preferência em relação a qualquer outra providência, caso em que será incluída em serviços e programas de proteção, apoio e promoção. O poder familiar é um múnus exercido em favor da criança e do adoles- cente, de forma a se concretizar seu superior interesse. É o que se extrai da lição de Rolf Madaleno1: o conteúdo do poder familiar encontra sua gênese no artigo 229 da Constituição Federal, ao prescrever como deveres inerentes aos pais os de assistirem, criarem e educarem os filhos menores, nisso sendo secundado pelo artigo 22 do Estatu- to da Criança e do Adolescente, quando estabelece ser incumbência dos pais o 883 dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores. (Curso de Direito de Família, Ed. Forense, 2015, p. 722) Nessa linha, os ensinamentos de Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Jurisprudência - Câmara Especial Maciel, ao analisar esses aspectos do instituto, destaca: ambos os pais (consanguíneos ou adotivos) têm o dever moral e a obrigação jurí- dica de, conjuntamente, sobre os filhos “dirigir-lhes a criação e a educação” (art. 1.634, I), na esteira dos arts. 227 e 229 da CF. (In Curso de direito da criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. 9ª. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 153) O legislador, nos arts. 1.630 e 1.634 do CC, e nos arts. 21 e 22 do ECA, atribui aos pais o poder familiar sobre os filhos menores, arrola os direitos e deveres que dele decorrem e prevê os casos em que, por abuso ou omissão no desempenho do múnus, podem eles perder a prerrogativa, conforme disposição dos arts. 1.638 do CC e 24 do ECA. É direito da criança e do adolescente a criação e educação no seio de sua família natural e, de forma excepcional, em família substituta, consoante o já referido art. 19 do ECA. Neste panorama, ainda que a tia paterna S. integre a família extensa das crianças, e que reúna condições para assumir a guarda dos sobrinhos, a prioridade é que sejam mantidas junto aos pais; de todas as longas informações que foram referidas, ficou evidenciado que os genitores empreen- deram todos os esforços possíveis para receber seus filhos W.S. e J.W. nova- mente, e que em todo o período de acompanhamento pelas equipes técnicas do acolhimento e do juízo nada de grave ou impeditivo se comprovou que os impossibilitasse de retomar a guarda de seus filhos pequenos. Depreende-se do relatório encaminhado no dia 19.8.2024 que a família estava em reestruturação; a existência de laços familiares entre os genitores e as crianças; a possibilidade de a genitora ter se sentido sobrecarregada, com todos os sete filhos sob a sua responsabilidade considerando a ausência do genitor das crianças pequenas na maior parte do tempo em razão do trabalho; indicou-se que o casal é solícito em atender as orientações, aceitando os encaminhamentos para se fortalecer na função parental, tal como mencionado em outros relatórios anteriores. Por esta razão, diante do quadro promissor e da possibilidade concre- ta de reintegração familiar, em manifestação datada de 26.9.2024, o Ministério Público opinou ser prematura a entrega das crianças à tia paterna. Contudo, em menos de um mês, no relatório da equipe de acolhimento acostado aos autos em 18.10.2024, foi destacada a excepcionalidade e brevidade do acolhimento, a resistência dos genitores a qualquer intervenção e orientação e a desconfiança dos genitores em relação à conduta da equipe em suposto favo- recimento à tia paterna, que estava disposta a cuidar dos sobrinhos. A propósito, quanto a este ponto, há que se considerar que os pais não possuem conhecimento legal a respeito dos trâmites e regras relativas ao aco- lhimento, o que torna compreensível que os pais estranhem o fato de a equipe 883 ter cancelado suas visitas por diversas vezes enquanto tomaram conhecimento de que a tia paterna, nos mesmos dias, conseguiu visitar as crianças. Inclusive, Jurisprudência - Câmara Especial competiria à equipe do acolhimento reformular o horário da visita para que o direito dos pais fosse garantido, o que não aconteceu. Constata-se da farta documentação juntada que as orientações feitas pela equipe técnica e assistencial estão sendo seguidas e é evidente o esforço dos ge- nitores para modificar a dinâmica e a situação familiar. Além disso, consideran- do as informações contidas nos relatórios e as estratégias recentemente traçadas junto à família, vislumbra-se efetiva ação dos genitores no sentido de modificar o contexto que justificou, primeiramente, o acolhimento e, após, a concessão de guarda das crianças à tia paterna. O casal aparenta estar em reestruturação quan- to aos deveres familiares, com busca de soluções que possam a todos beneficiar e principalmente com a finalidade de garantir proteção e cuidado aos filhos. Quanto à situação do adolescente W., em que pese seja de relevante na dinâmica familiar, é de se considerar que não é objeto da presente ação e, se o caso, deve ser tratada em autos próprios, notadamente porque o guardião legal do adolescente é o genitor. Em princípio, tal situação não retira da genitora os seus deveres parentais – e há notícia nos autos de que ela tomou as medidas ao seu alcance – porém, não pode ser utilizado como empecilho para a regulariza- ção da situação das crianças J.W. e W.S., que se encontram há longo tempo em convívio com a família extensa sem que remanesçam as supostas violações que os afastou do poder familiar. Desta forma, o conjunto das circunstâncias fáticas, aliadas ao primordial objetivo da presente ação, qual seja, a proteção dos direitos das crianças, impos- sibilitam que se mantenha a situação atual, em que as crianças estão, na maior parte do tempo, privadas do convívio com sua família de origem sem justifica- tiva suficiente para tanto. Por fim, observo que o objeto desta ação é a mesma decisão atacada no agravo de instrumento nº (...) (decisão proferida na ação de acolhimento institu- cional nº (...) que determinou o desacolhimento das crianças W.S. e J.W. e sua entrega em guarda à tia paterna). Portanto, todas as questões levantadas naquele recurso foram aqui decididas. O voto é pela concessão da ordem para devolução da guarda das crian- ças J.W. e W.S. aos genitores, prosseguindo-se com as estratégias traçadas para reestruturação familiar. Tão logo concluído o presente julgamento, dê-se ciência aos MM. Juízos da Infância de (...) e de (...), para o cumprimento da ordem. Traslade-se cópia do decidido para os autos do agravo supracitado, dando ciência ao Juízo singular.