Decisão 0011974-63.2025.8.26.0000

Processo: 0011974-63.2025.8.26.0000

Recurso: Conflito

Relator: CAMARGO ARANHA FILHO

Câmara julgadora:

Data do julgamento: 2 de junho de 2025

Ementa Técnica

CONFLITO – DIREITO PROCESSUAL PENAL. CON- FLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. CRIME CONTRA VÍTIMA CRIANÇA OU ADOLESCEN- TE DO SEXO MASCULINO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. I. CASO EM EXAME 1. Conflito negativo de jurisdição entre a 2ª Vara Cri- minal e da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e a 1ª Vara Criminal da Comarca de Assis, nos autos de ação penal para apuração de suposta prática do crime tipificado no art. 217-A do CP, con- tra vítima criança ou adolescente do sexo masculino. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em determinar se a competência é da Vara Criminal ou da Vara de Vio- lência Doméstica e Familiar contra a Mulher. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Art. 23 da Lei nº 13.431/2017 não ampliou a com- petência das Varas de Violência Doméstica e Familiar. 4. Organização da Justiça que compete aos Estados, por meio de lei de iniciativa do respectivo Tribunal de Justiça, conforme dispõe o artigo 125, caput, e § 1º, da Constituição Federal. 5. A presença de vítima do gênero masculino exclui a incidência da Lei Maria da Penha. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo suscitado. Tese de julgamento: “Nas Comarcas em que não há Vara Especializado em Crimes contra Crianças e Adolescentes, a competência para julgar processos de crimes cometidos contra vítima do sexo masculino é das Varas Criminais Comuns.” Dispositivos relevantes citados: CF, art. 125, caput e 868 §1º; CPP, art. 114, I; L. nº 13.431/2017, art. 23. Jurisprudência relevante citada: STJ, HC nº 728.173/ Jurisprudência - Câmara Especial RJ, Rel. Min. Olindo Menezes, j. 26/10/2022; TJSP, Conflito de Jurisdição nº 0008470-83.2024.8.26.0000, Rel. Des. Sulaiman Miguel Neto, Câmara Especial, j. 21/06/2024; TJSP, Conflito de Jurisdição nº 0011218-88.2024.8.26.0000, Rel. Des. Torres de Carvalho – Pres. Seção de Direito Público, Câmara Especial, j. 22/05/2024.(TJSP; Processo nº 0011974-63.2025.8.26.0000; Recurso: Conflito; Relator: CAMARGO ARANHA FILHO; Data do Julgamento: 2 de junho de 2025)

Voto / Fundamentação

, em sessão permanente e virtual da Câmara Especial do Tri- bunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “CONHECERAM do conflito negativo de jurisdição e DECLARARAM a competência do JUÍZO SUSCITADO (MM. Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Assis). V.U.”, de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. (Voto nº 44.582) 867 O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores BERET- TA DA SILVEIRA (VICE-PRESIDENTE) (Presidente) e XAVIER DE AQUI- NO (DECANO). Jurisprudência - Câmara Especial São Paulo, 2 de junho de 2025. CAMARGO ARANHA FILHO, Relator e Presidente da Seção de Direito Criminal


Ementa: DIREITO PROCESSUAL PENAL. CON- FLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. CRIME CONTRA VÍTIMA CRIANÇA OU ADOLESCEN- TE DO SEXO MASCULINO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. I. CASO EM EXAME 1. Conflito negativo de jurisdição entre a 2ª Vara Cri- minal e da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e a 1ª Vara Criminal da Comarca de Assis, nos autos de ação penal para apuração de suposta prática do crime tipificado no art. 217-A do CP, con- tra vítima criança ou adolescente do sexo masculino. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em determinar se a competência é da Vara Criminal ou da Vara de Vio- lência Doméstica e Familiar contra a Mulher. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Art. 23 da Lei nº 13.431/2017 não ampliou a com- petência das Varas de Violência Doméstica e Familiar. 4. Organização da Justiça que compete aos Estados, por meio de lei de iniciativa do respectivo Tribunal de Justiça, conforme dispõe o artigo 125, caput, e § 1º, da Constituição Federal. 5. A presença de vítima do gênero masculino exclui a incidência da Lei Maria da Penha. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo suscitado. Tese de julgamento: “Nas Comarcas em que não há Vara Especializado em Crimes contra Crianças e Adolescentes, a competência para julgar processos de crimes cometidos contra vítima do sexo masculino é das Varas Criminais Comuns.” Dispositivos relevantes citados: CF, art. 125, caput e 868 §1º; CPP, art. 114, I; L. nº 13.431/2017, art. 23. Jurisprudência relevante citada: STJ, HC nº 728.173/ Jurisprudência - Câmara Especial RJ, Rel. Min. Olindo Menezes, j. 26/10/2022; TJSP, Conflito de Jurisdição nº 0008470-83.2024.8.26.0000, Rel. Des. Sulaiman Miguel Neto, Câmara Especial, j. 21/06/2024; TJSP, Conflito de Jurisdição nº 0011218-88.2024.8.26.0000, Rel. Des. Torres de Carvalho – Pres. Seção de Direito Público, Câmara Especial, j. 22/05/2024.





VOTO

Trata-se de conflito negativo de jurisdição suscitado pelo MM. Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal e da Violência Doméstica e Familiar contra a Mu- lher em face do MM. Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal, ambos da Comarca de Assis, nos autos da ação penal em que se apura a prática do delito previsto no artigo 217-A do Código Penal, por S.C.F. (processo nº (...)). O feito foi distribuído ao Juízo suscitado, que determinou a remessa dos autos ao Juízo suscitante, por entender ser dele a competência absoluta para pro- cessar e julgar o feito, em observância ao disposto no artigo 23, parágrafo único, da Lei nº 13.431/2017 (fls. 42/43 dos autos de origem). O Juízo suscitante discorda do ato declinatório, ao argumento de que o artigo 23 da Lei nº 13.431/2017 não ampliou a competência das Varas de Vio- lência Doméstica e Familiar contra a Mulher (fls. 121/125 dos autos de origem). Foi designado o Juízo suscitado (MM. Juízo de Direito da 1ª Vara Crimi- nal da Comarca de Assis) para apreciar e decidir questões urgentes (fl. 06). A Douta Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela declaração da compe- tência do Juízo suscitado (fls. 14/19). É o relatório. Presente a hipótese do artigo 114, I, do Código de Processo Penal, co- nheço do presente conflito de jurisdição na medida em que ambos os Juízos se recusam a processar e julgar a demanda. E, na hipótese, assiste razão ao Juízo suscitante. Trata-se de feito em que se apura a prática de crime contra criança ou adolescente do sexo masculino, que tramita em Comarca em que não instalada Vara Especializada de Crimes contra Crianças e Adolescentes. O artigo 23 da Lei nº 13.431/20171, que estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, não ampliou a competência das Varas de Violência Doméstica e Familiar Contra a 1 Art. 23. Os órgãos responsáveis pela organização judiciária poderão criar juizados ou varas es- pecializadas em crimes contra a criança e o adolescente. Parágrafo único. Até a implementação do disposto no caput deste artigo, o julgamento e a execução das causas decorrentes das práticas de violência ficarão, preferencialmente, a cargo dos juizados ou varas especializadas em violência doméstica e temas afins. 869 Mulher, tendo apenas facultado aos órgãos estaduais, responsáveis pela organi- zação judiciária, a criação de varas especializadas em crimes praticados contra crianças e adolescentes, destacando que, até sua instalação, seria preferível que Jurisprudência - Câmara Especial tais crimes fossem processados nas Varas de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, mas não impondo essa competência. E não poderia ser de outro modo, pois qualquer imposição nesse sentido violaria o disposto no artigo 125, caput, e § 1º, da Constituição Federal, os quais preveem que compete aos Estados a organização da sua Justiça, por meio de lei de iniciativa do respectivo Tribunal de Justiça. Assim, sendo a vítima do gênero masculino, excluída a incidência da Lei Maria da Penha, e não tendo sido instalada vara especializada, deve o feito tra- mitar na Vara Criminal Comum. Nesse sentido, a jurisprudência desta Colenda Câmara Especial: CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. MEDIDAS PROTETIVAS. CRIMES DE MAUS TRATOS E TORTURA SUPOSTAMENTE PRATICADOS PELO PAI CONTRA OS FILHOS. Vítimas do sexo masculino. Relativamente à vítima do sexo feminino, não se estaria diante de violência de gênero. Competência da Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher não configurada. Não incidência da Lei nº. 11.340/06. Art. 26, da referida norma que não modificou ou ampliou a competência material dos juizados ou varas especializadas. Fa- culdade, pelos órgãos estaduais, de criação de varas especializadas em crimes praticados contra crianças e adolescentes. Inexistência na Comarca. Feito que deve tramitar pela Vara Comum. Aplicação da Súmula nº. 114 do TJSP. Prece- dentes. CONFLITO PROCEDENTE. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITAN- TE. (TJSP, Conflito de Jurisdição nº 0008470-83.2024.8.26.0000, Rel. Des. Su- laiman Miguel Neto, Câmara Especial, j. 21/06/2024) CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO – Ação penal – Estupro de vulne- rável (caput do art. 217-A do C.P) – Vítima menor do gênero masculino – Re- distribuição ao Juízo da Vara do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Guarulhos – Impossibilidade – Gênero da vítima que afasta a incidência da Lei nº 11.340/2006 à hipótese, a qual depende da verificação da existência efetiva de qualquer tipo de violência de gênero, no âmbito da unidade doméstica ou familiar, ou ainda, em qualquer relação íntima de afeto, consoante previsão de seu art. 5º e da Súmula 114 deste E. Tribunal de Justiça – Lei nº 13.431/2017 que não modificou ou ampliou a competência material dos Juizados ou Varas especializadas em Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher prevista na Lei n. 11.340/2006, mas facultou aos órgãos estaduais a criação de Varas especializadas em crimes contra a criança e adolescente – Ausência de obrigatoriedade – Organização da Justiça que cabe aos Estados – Inteligência do art. 125, caput e § 1º, da Constituição Federal – Comarca de Guarulhos que não possui vara especializada em crimes contra a criança e adolescente – Pre- cedentes – Procedente o conflito – Competente o Juízo Suscitado. (TJSP, Con- flito de Jurisdição nº 0011218-88.2024.8.26.0000, Rel. Des. Torres de Carvalho – Pres. Seção de Direito Público, Câmara Especial, j. 22/05/2024) 869 Por fim, conquanto não se desconheça o entendimento fixado pela Colen- da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do HC nº 728.173/ Jurisprudência - Câmara Especial RJ, é certo que o posicionamento não foi firmado sob o rito dos recursos repeti- tivos, o que afasta seu caráter vinculante. Ante o exposto, CONHEÇO do conflito negativo de jurisdição e declaro a competência do JUÍZO SUSCITADO (MM. Juízo de Direito da 1ª Vara Cri- minal da Comarca de Assis).