APELAçãO – Apelação - Ação declaratória de inexistência de relação jurídica c/c repetição do indébito e inde- nização por danos morais - Sentença de parcial pro- cedência, apenas para determinar o cancelamento do contrato de cartão de crédito consignado - Recurso do autor. Pleito de declaração de inexistência do contrato de cartão de crédito com reserva de margem consigná- vel (RMC) - Alegação de vício de consentimento - Não acolhimento - Ausência de ilegalidade na contratação - Banco réu que comprovou a regularidade da con- tratação, inclusive demonstrando a transferência do valor à conta corrente do autor, desincumbindo-se do seu ônus probatório, conforme art. 373, II do CPC Inexistência de defeito na prestação do serviço ou de falha no dever informação Ausência de dever de inde- nizar, dada a ausência de ilícito. 277 Recurso improvido.(TJSP; Apelação 1002542-34.2022.8.26.0541; Data do Julgamento: 6 de agosto de 2025)
, em sessão permanente e virtual da 37ª Câmara de Direito
Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Nega-
ram provimento ao recurso. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que
integra este acórdão. (Voto nº 32.159).
O julgamento teve a participação dos Desembargadores AFONSO CEL-
SO DA SILVA (Presidente), SERGIO DA COSTA LEITE e PEDRO KODAMA.
São Paulo, 6 de agosto de 2025.
AFONSO CELSO DA SILVA
Ementa: Apelação - Ação declaratória de inexistência
de relação jurídica c/c repetição do indébito e inde-
nização por danos morais - Sentença de parcial pro-
cedência, apenas para determinar o cancelamento do
contrato de cartão de crédito consignado - Recurso
do autor.
Pleito de declaração de inexistência do contrato de
cartão de crédito com reserva de margem consigná-
vel (RMC) - Alegação de vício de consentimento - Não
acolhimento - Ausência de ilegalidade na contratação
- Banco réu que comprovou a regularidade da con-
tratação, inclusive demonstrando a transferência do
valor à conta corrente do autor, desincumbindo-se do
seu ônus probatório, conforme art. 373, II do CPC
Inexistência de defeito na prestação do serviço ou de
falha no dever informação Ausência de dever de inde-
nizar, dada a ausência de ilícito.
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Recurso improvido.
VOTO
Jurisprudência - Direito Privado
Vistos.
Trata-se de apelação interposta contra a r. sentença, cujo relatório se ado-
ta, que julgou parcialmente procedente a ação declaratória de inexistência de
relação jurídica c/c repetição de indébito e indenização por danos morais. Cons-
tou do dispositivo:
Ante o exposto e tudo o mais que dos autos consta, julgo PARCIALMEN-
TE PROCEDENTE a pretensão deduzida por LUCIANO MACHADO em face de
BANCO PAN S.A., o que faço para determinar que o banco requerido proceda
ao cancelamento do cartão benefício consignado RCC de titularidade da parte
autora (contrato n.º 762395241-8), devendo conceder à parte autora, no prazo
de 5 (cinco) dias, a opção pelo pagamento do saldo devedor por liquidação ime-
diata do valor total, conforme disposto no art. 10, da Instrução Normativa INSS
Nº 138 de 10/11/2022, bem como excluir a RCC do benefício previdenciário da
parte autora, quando não houver mais saldo a pagar (§ 1º do artigo 10 da Ins-
trução Normativa INSS Nº 138 de 10/11/2022).
Altero a tutela de urgência, para que o banco requerido proceda ao can-
celamento do cartão de crédito da parte autora na forma ora determinada, no
prazo de 5 (cinco) dias, bem como envie o boleto com o valor do saldo devedor
para a opção da liquidação antecipada, sob pena de serem tomadas medidas
coercitivas que tornem eficaz a decisão judicial. Quanto ao débito RCC no bene-
fício previdenciário da parte autora, fica autorizado até que não haja mais saldo
devedor vinculado ao contrato de cartão de crédito em tela. Oficie-se ao INSS.
Outrossim, julgo improcedentes os pedidos de repetição de indébito e
indenização por danos morais, por ausência de ato ilícito por parte do banco
requerido e existência de situação debitória por parte do autor.
Improcedente também o pedido de conversão do contrato de cartão de
crédito consignado em contrato de mútuo consignado com juros simples.
É caso de sucumbência recíproca. Todavia, a parte autora decaiu de
parte maior de seu pedido. Pelo princípio da causalidade e nos termos do artigo
86, § único do Código de Processo Civil, a parte autora responde pela sucum-
bência, que fixo em R$ 1.000,00 (hum mil reais) nos termos do art. 85, §§ 2º e
8º, do Código de Processo Civil. Anote-se que a parte autora é beneficiária da
Justiça Gratuita e aplica-se a seu favor o disposto no § 3º do artigo 90 do Códi-
go de Processo Civil.
Apela o autor alegando, em síntese, que: houve vício de consentimen-
to; a contratação do cartão foi irregular; deve haver a repetição do indébito de
forma dobrada; não teve intenção de contratar cartão de crédito com margem
consignável; há danos morais indenizáveis, ante a irregularidade da contratação.
Pugna, ao final, pela reforma da r. sentença.
Recurso tempestivo e isento de preparo; não foram apresentadas contrar-
razões.
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É o relatório.
Cuida-se de ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédi-
to consignado c/c repetição do indébito e reparação por danos morais; o autor
alega, em síntese, que foi surpreendido ao consultar o extrato do INSS com a
Jurisprudência - Direito Privado
existência de um contrato de cartão de crédito com reserva em margem consig-
nável, que afirma desconhecer; acrescenta que nunca solicitou o cartão de crédi-
to tampouco realizou empréstimo nessa modalidade; aduz que os descontos são
realizados em sua folha de pagamento.
Requereu a procedência do pedido, declarando-se a nulidade do contrato
com a condenação da requerida ao pagamento de danos morais e à repetição
dobrada do indébito.
Conforme já relatado, sobreveio a r. sentença de parcial procedência, con-
tra a qual se insurge o autor.
E em que pesem suas alegações, o recurso não merece acolhida.
Há inequívoca relação de consumo, aplicando-se, portanto, as disposi-
ções do Código de Defesa do Consumidor, notadamente os artigos, 2º, 3º e 17º,
eis que a questão se refere ao fornecimento de serviços no mercado de consumo,
na qual o autor alega ter sido vítima de falha na prestação dos serviços pelo
requerido.
Dito isso, e em razão da inversão do ônus da prova, cabia ao réu demons-
trar e provar a contratação dos serviços, bem como a regularidade das cobran-
ças, consoante o art. 6º, inciso VIII do CDC e art. 373, inciso II do CPC/2015.
Conforme Súmula nº. 297 do C. STJ., a legislação consumerista também
se aplica às instituições financeiras: O Código de Defesa do Consumidor é apli-
cável às instituições financeiras.
E de fato, o banco trouxe aos autos cópia do contrato de cartão de crédito
pactuado entre as partes, através do termo de adesão às fls. 145/165, assinado
digitalmente utilizando-se de fotografia selfie do autor (fls. 163), além de ter
comprovado o efetivo depósito dos valores em conta bancária de titularidade do
consumidor (fls. 143).
Ademais, a assinatura digital contém geolocalização (fls. 163/165) indi-
cando o mesmo endereço apontado na qualificação inicial pelo autor, razão pela
qual não se mostra relevante a realização de perícia técnica.
Não prosperam, assim, as alegações do autor, especialmente a alegação
de que o banco não teria juntado provas da negociação para a contratação do
cartão de crédito consignado, eis que a regularidade da contratação restou sufi-
cientemente demonstrada. Nesse sentido:
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA C.C
RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS C.C INDENIZAÇÃO POR DA-
NOS MORAIS E TUTELA DE URGÊNCIA - Alegada ausência de contra-
tação de cartão de crédito consignado (RMC) - Sentença de procedência
- Contratação de empréstimo através de cartão de crédito na forma da
Lei nº 13.172/15, que alterou a Lei nº 10.820/03, diploma de regência
dos empréstimos consignados - Alegação de abusividade - Ausência de
Jurisprudência - Direito Privado
comprovação do vício de consentimento, a teor do art. 373, I, do CPC -
Contratação de cartão de crédito com Reserva de Margem Consignável
devidamente aceito pela autora - Contrato firmado por meio digital,
com assinatura eletrônica por biometria facial, inclusive identificada
por geolocalização e endereço de IP, com acréscimo de documento de
identificação (RG) fornecido pela parte - Regularidade da contratação
- Inexistência de ilícito - Danos morais não configurados - Precedentes
desta 15ª Câmara de Direito Privado - Apelo Provido. (Apelação Cí-
vel nº. 1002542-34.2022.8.26.0541, 15ª Câmara de Direito Privado, Rel.
Des. Ramon Mateo Júnior, j. em 17.11.2022).
Não se verifica, outrossim, prática abusiva, tampouco restou comprovado
vício de consentimento ou a falha no dever de informação.
Ressalte-se que a oferta de cartão de crédito com reserva de margem con-
signável é admitida pelo ordenamento jurídico e se encontra devidamente regu-
lamentada, inexistindo ilegalidade intrínseca a tal modalidade de crédito.
Destarte, a r. sentença não comporta reforma, não havendo que se falar
em repetição do indébito, condenação do banco na indenização por danos mo-
rais, dada a ausência de ilícito ou conversão do contrato.
Em razão da sucumbência recursal, ficam majorados os honorários ad-
vocatícios devidos pelo autor em 15% sobre o valor fixado em primeiro grau,
devendo ser observada a gratuidade de justiça concedida.
Anote-se, por fim, que para acesso às instâncias extraordinárias não é pre-
ciso mencionar expressamente todos os preceitos legais deduzidos pelas partes,
sendo pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de
que tratando-se de prequestionamento, é desnecessária a citação numérica dos
dispositivos legais, bastando que a questão posta tenha sido decidida (ED em
RMS nº 18205-SP, rel. Min. Felix Fischer, j. 18/04/2006).
Ante o exposto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.