APELAçãO – AÇÃO INDENIZATÓRIA. Sentença de improcedência. Recurso dos autores. Acolhimento. Autores vítimas de fraude bancária, mediante trans- ferência de valores para terceiro desconhecido. Réu que não se desincumbiu do ônus de comprovar que a 124 operação questionada estava de acordo com o perfil de consumo dos correntistas, notadamente tratando- se de transferência de considerável valor que atingiu o limite da conta bancária de consumidores idosos. Jurisprudência - Direito Privado Fortuito interno, inerente à atividade explorada pe- los bancos. Responsabilidade civil objetiva. Inteligên- cia do art. 14 do CDC e da Súmula 479, do C. STJ. DANOS MATERIAIS. Determinação de restituição do montante transferido. DANOS MORAIS. Ocor- rência in re ipsa. Quantum indenizatório fixado R$ 10.000,00, consoante requerido na inicial. Precedente desta C. Câmara. Inovação recursal quanto ao pedido de condenação dos réus à indenização de R$ 20.000,00 (R$ 10.000,00 para cada). Não conhecimento desta parte do recurso. SENTENÇA REFORMADA. APE- LAÇÃO PROVIDA, na parte conhecida.(TJSP; Apelação 1004332-44.2023.8.26.0565; Relator: FÁBIO PODESTÁ; Data do Julgamento: 3 de julho de 2025)
, em sessão permanente e virtual da 21ª Câmara de Direito
Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “DE-
RAM PROVIMENTO ao recurso, na parte conhecida V.U.”, de conformidade
com o voto do Relator, que integra este acórdão. (Voto nº 40.965)
O julgamento teve a participação dos Desembargadores ADEMIR BE-
NEDITO (Presidente sem voto), MIGUEL PETRONI NETO e DÉCIO RO-
DRIGUES.
São Paulo, 3 de julho de 2025.
FÁBIO PODESTÁ, Relator
Ementa: AÇÃO INDENIZATÓRIA. Sentença de
improcedência. Recurso dos autores. Acolhimento.
Autores vítimas de fraude bancária, mediante trans-
ferência de valores para terceiro desconhecido. Réu
que não se desincumbiu do ônus de comprovar que a
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operação questionada estava de acordo com o perfil
de consumo dos correntistas, notadamente tratando-
se de transferência de considerável valor que atingiu
o limite da conta bancária de consumidores idosos.
Jurisprudência - Direito Privado
Fortuito interno, inerente à atividade explorada pe-
los bancos. Responsabilidade civil objetiva. Inteligên-
cia do art. 14 do CDC e da Súmula 479, do C. STJ.
DANOS MATERIAIS. Determinação de restituição
do montante transferido. DANOS MORAIS. Ocor-
rência in re ipsa. Quantum indenizatório fixado R$
10.000,00, consoante requerido na inicial. Precedente
desta C. Câmara. Inovação recursal quanto ao pedido
de condenação dos réus à indenização de R$ 20.000,00
(R$ 10.000,00 para cada). Não conhecimento desta
parte do recurso. SENTENÇA REFORMADA. APE-
LAÇÃO PROVIDA, na parte conhecida.
VOTO
Cuida-se de apelação interposta por JAIRO PINHEIRO FERRAZ e
MARIA ANTONIA ANTONIALI FERRAZ contra r. sentença proferida às
fls. 147/152, cujo relatório é adotado, que julgou improcedentes os pedidos
formulados em “ação de indenização por danos materiais e morais c/ tutela
antecipada” ajuizada em face de BANCO MERCANTIL DO BRASIL S/A e
BANCO SANTANDER S.A., condenando a parte autora a arcar com as despe-
sas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atuali-
zado da causa, metade para cada requerido.
Sustentam, em síntese, que: (a) a liberação quase imediata de um valor
tão expressivo sem qualquer confirmação com os clientes, que possuíam um his-
tórico de movimentação diverso, demonstra uma falha grave nos procedimentos
de segurança do banco Apelado (fl. 158); (b) fortuito interno, inerente à ativida-
de bancária, pelo qual as instituições financeiras respondem objetivamente (fl.
159); (c) demora excessiva do Banco Mercantil do Brasil S.A. em comunicar o
Banco Santander S.A. (fl. 160); (d) inobservância das regras estabelecidas pelo
Banco Central, no que concerne ao bloqueio suspeito de fraude (fl. 163); (e)
possuem o direito de serem indenizados pelos danos sofridos (fl. 165); (f) res-
ponsabilidade solidária do BANCO SANTANDER S.A. (fl. 166); (g) requerem
a condenação solidária dos apelados ao pagamento de indenização por danos
materiais no valor de R$ 8.900,50, indenização por danos morais no valor de R$
10.000,00, para cada um dos Apelantes, totalizando R$ 20.000,00, invertendo-
se o ônus da sucumbência (fl. 169).
Recurso tempestivo (fl. 154), preparado (fls. 170/171) e contrarrazoado
(fls. 175/183 e 184/194).
É o relatório.
Trata-se de ação de indenizatória, na qual os autores afirmam que, em
Jurisprudência - Direito Privado
17/11/2023, receberam uma alerta informando que entraram no limite da conta
conjunta mantida junto ao BANCO MERCANTIL DO BRASIL S/A (recurso
que nunca utilizaram, em décadas), sendo transferido o valor de R$8.900,50 (fl.
29), transação que não reconhecem.
Afirmam que realizaram Boletim de Ocorrência (fls. 25/26) e, tomaram
todas as providências para evitar a concretização da transferência por meio do
bloqueio cautelar, sem sucesso.
Expostos tais fatos, inequívoco que o caso em análise se submete às nor-
mas do Código de Defesa do Consumidor, porquanto as partes se adequam aos
conceitos de destinatário final (CDC, art. 2º) e fornecedor (CDC, art. 3º, § 2° e
Súmula 297 do C. STJ1).
Nesse contexto, à luz do que estabelece o artigo 14, caput, do CDC e Sú-
mula 479 do C. STJ2, as instituições financeiras, como prestadoras de serviço,
respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno, relativo a
fraudes e delitos, praticados por terceiros, no âmbito de operações bancárias.
Assim, é de se observar que o primeiro requerido (“Banco Mercantil”)
não se desincumbiu do ônus probatório de comprovar que a operação questio-
nada estava de acordo com o perfil de consumo dos correntistas, notadamente
tratando-se de transferência de considerável valor que atingiu o limite da conta
bancária de consumidores idosos (fl. 27), os quais, por sua vez, alegam que nun-
ca utilizaram referido recurso.
Ademais, observa-se a existência de alegações inconsistentes nas defesas
apresentadas pelos réus, tendo o “Banco Mercantil” afirmado que a operação foi
realizada no autoatendimento (presencialmente), por meio do uso de senha pes-
soal (fl. 51) e, posteriormente, alegado que a transação foi feita diretamente pelo
aparelho do autor, bem como que realizou imediatamente o bloqueio de referido
dispositivo (fl. 52). De igual maneira, o requerido “Banco Santander” mencio-
na que a conta destinatária da transferência estava bloqueada para retirada de
valores desde 14/11/2023 (fl. 108), o que, no entanto, não impediu que o valor
recebido em 17/11/2023 fosse retirado pelo suposto terceiro de má-fé (fl. 109).
Ainda, embora os autores tenham procurado a instituição financeira na
data do ocorrido, o banco receptor foi informado apenas no dia 01/12/2023 (fl.
33).
Deste modo, evidente a falha na prestação de serviços pelos réus ao dei-
xarem de identificar as movimentações suspeitas e posteriormente contestadas,
violando o dever de segurança e de cuidado, o que impõe o reconhecimento da
1 “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.
2 “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno
relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”.
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responsabilidade objetiva pelos danos experimentados pelos autores, que devem
ter o seu prejuízo material devidamente ressarcido.
Nesse sentido, a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça:
“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO
Jurisprudência - Direito Privado
DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO CUMULADA
COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. COMPRAS
REALIZADAS POR TERCEIRO. USO DO CARTÃO DE CRÉDITO E
DE DÉBITO. FALHA NO DEVER DE SEGURANÇA DA INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Nos termos da
jurisprudência desta Corte, a responsabilidade da instituição financeira
deve ser afastada quando o evento danoso decorre de transações que,
embora contestadas, são realizadas com a apresentação física do cartão
original e mediante uso de senha pessoal do correntista, situação, con-
tudo, que não ocorreu no caso concreto. 2. “A vulnerabilidade do siste-
ma bancário, que admite operações totalmente atípicas em relação ao
padrão de consumo dos consumidores, viola o dever de segurança que
cabe às instituições financeiras e, por conseguinte, incorre em falha da
prestação de serviço.” (REsp n. 1.995.458/SP, relatora Ministra NANCY
ANDRIGHI, Terceira Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 18/8/2022).
3. Na hipótese, não é possível afastar a responsabilidade da instituição
financeira, notadamente quando descumpriu o respectivo dever de se-
gurança ao não obstar a realização de compras por cartão de crédito
em estabelecimento comercial objeto de suspeita em transações ante-
riores, na mesma data, pois latente que o perfil de compra da agravada
discrepava do volume das transações fraudulentas efetivamente engen-
dradas. 4. Agravo interno a que se nega provimento” (AgInt no AREsp n.
1.728.279/SP, Relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em
8/5/2023, DJe de 17/5/2023 - g.n.).ta
Relativamente aos danos morais, o abalo extrapatrimonial exsurge in re
ipsa, já que os fatos extrapolaram consideravelmente a esfera do mero aborreci-
mento, porquanto os requerentes sofreram reduções indevidas no limite de sua
conta conjunta, privando-lhes, de imediato, de considerável valor.
Nesse sentido, este E. Tribunal de Justiça assim já entendeu:
“APELAÇÃO - Ação de indenização por danos morais e materiais.
Fraude em conta. Operações via Pix não reconhecidas e contestadas
perante a instituição financeira. Culpa, existência de nexo causal. Au-
sência de comprovação da culpa exclusiva do consumidor. Má-prestação
do serviço diante dos valores das transações fora do perfil e zerando o
saldo do cliente. Dever de restituição. Decisão de parcial procedência.
Obrigação de indenizar pelos danos morais, devido a movimentação
na conta da parte autora sem sua anuência, que consagra o dever de
restituição, havendo privação econômica indevida. Valor fixado em R$
10.000,00 razoável e proporcional, sendo excessivo o valor pleiteado (R$
22.000,00). Recurso parcialmente provido” (Apelação Cível 1067371-
Jurisprudência - Direito Privado
26.2021.8.26.0002; Relator Des. Flávio Cunha da Silva; 38ª Câmara de
Direito Privado; Data do Julgamento: 15/09/2022 - g.n.).
Relativamente ao quantum devido, a indenização deve ser fixada de acor-
do com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, observadas a
finalidade compensatória e a extensão do dano experimentado.
Vislumbrando as peculiaridades do caso em análise e, considerando os
critérios de fixação da indenização, tais como a condição socioeconômica das
partes, grau de culpa e a repercussão da lesão, fixo o quantum indenizatório em
R$ 10.000,00 (dez mil reais), consoante requerido na inicial - fl. 19, item “iii”,
valor adequado e proporcional, que não representa enriquecimento sem causa
aos requerentes e está em consonância com a jurisprudência desta C. Câmara:
“RESTITUIÇÃO C.C. INDENIZAÇÃO. Improcedência. Inconformismo.
Parcial acolhimento. Autoras vítimas de roubo de telefone celular. Reali-
zação de resgastes e transferências via PIX a terceiro mediante fraude.
Falha na segurança da instituição financeira. Transações destoaram do
perfil de consumo das correntistas. Serviço prestado defeituoso. Carac-
terizada a responsabilidade do banco pelos prejuízos suportados pelas
requerentes. Danos materiais. Devolução dos valores transferidos. Dano
moral configurado. Indenização devida. Verba fixada em R$10.000,00
atende à finalidade reparatória/punitiva. Sentença reformada. Ônus su-
cumbencial atribuído ao réu. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSP; Apelação Cível 1004332-44.2023.8.26.0565; Relator Des. Paulo
Alcides; Órgão Julgador: 21ª Câmara de Direito Privado; Foro de São
Caetano do Sul - 6ª Vara Cível; Data do Julgamento: 27/05/2024; Data de
Registro: 27/05/2024 - g.n.)
No mais, deixa-se de conhecer do pedido de condenação dos réus à inde-
nização de R$ 20.000,00 (R$ 10.000,00 para cada autor), por constituir, a rigor,
indevida inovação recursal.
Estabeleça-se que, por se tratar de responsabilidade contratual, mencio-
nado valor deverá ser atualizado pela Taxa Selic deduzida a correção monetária,
nos termos do artigo 406 parágrafo 1º do Código Civil, a partir da citação (art.
405 do CC), devendo, a partir da data do arbitramento (Súmula nº 362 do C.
STJ), incidir a integral atualização pela Taxa Selic.
Ressalte-se que o apelado “Banco Santander” deve responder solidaria-
mente pelos danos materiais e morais, assim como pelas custas processuais e
honorários de sucumbência, haja vista que a conta utilizada para recebimento
de valores indevidos e para a prática de atos ilícitos era mantida junto à referida
instituição financeira, de modo que a corré integra a cadeia de fornecimento do
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serviço, possuindo, reafirme-se, responsabilidade solidária e objetiva pelos da-
nos causados ao consumidor (art. 7º, parágrafo único, e art. 14, ambos do CDC).
Observa-se, ainda, que o apelado permitiu a abertura e a manutenção de
conta fraudulenta, deixando de apresentar qualquer documento apto a demons-
Jurisprudência - Direito Privado
trar a regularidade da referida conta, bem como, a adoção das cautelas necessá-
rias, tendo informado, inclusive, que referida conta foi encerrada em 02/01/2024
(fl. 108).
Comporta, pois, reforma a r. sentença, para julgar procedente a presente
ação, condenando os requeridos, solidariamente, à indenização por danos mo-
rais de R$ 10.000,00, além de indenização por danos materiais correspondente
ao valor transferido (R$ 8.900,50), atualizados pela Taxa Selic, nos termos do
artigo 406 parágrafo 1º do Código Civil, alterado pela Lei nº 14.905/2024, a
partir da citação por tratar-se de responsabilidade contratual.
Invertido o resultado do julgamento, condeno os apelados, ainda, ao pa-
gamento das custas e despesas processuais, bem como, honorários advocatícios,
os quais arbitro em 15% sobre o valor total da condenação atualizado.
Ante o exposto, pelo meu voto, DOU PROVIMENTO ao recurso, na
parte conhecida.
Observa-se, por fim, que a oposição de embargos de declaração manifes-
tamente protelatórios ensejará a condenação ao pagamento da multa prevista no
parágrafo 2º do artigo 1.026 do Código de Processo Civil