Decisão 1004527-05.2015.8.26.0114

Processo: 1004527-05.2015.8.26.0114

Recurso: Apelação

Relator: I - não conhecerá do recurso, se a providência couber ao recorrente;”

Câmara julgadora: Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça

Data do julgamento: 3 de junho de 2025

Ementa Técnica

APELAçãO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Ato de Improbi- dade Administrativa – Pleito de anulação das concor- rências n. (...) e (...) promovidas pela (...) e dos conse- quentes contratos administrativos n. (...) e (...) ante a ocorrência de fraudes em procedimentos licitatórios. Apelação do corréu M. buscando a inversão do julga- do – Ausência de representação processual – Intima- ção do apelante para regularização – Não atendimen- to – Recurso não conhecido. AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Município de (...) – Pre- liminares afastadas – Supremo Tribunal Federal, Tema 1199 de Repercussão Geral – Lei 14.230/2021 486 – Sem retroatividade para efeito da prescrição, que não se verificou – Esquema fraudulento de licitações comprovado – Necessidade de constatação do dolo – Tema n.º 1199 de Repercussão Geral do STF – Dolo Jurisprudência - Direito Público bem caracterizado – Condutas prevista no art. 9 da Lei 8429/92 – Sanções que devem respeitar o princípio da proporcionalidade e razoabilidade – Sanções bem aplicadas, que não comportam alteração, com obser- vação apenas quanto ao pagamento da multa civil a fim de que seja fixado com base no acréscimo patri- monial, conforme o artigo 12, inciso I, com a atual re- dação conferida pela Lei 14.230/2021 e a condenação dos particulares nos termos dos artigos 3º, 9º, I e 12, I, da Lei 8429/92. Recurso não conhecido corréu M. Recurso dos her- deiros de L. provido em parte. Recursos dos demais corréus desprovidos. Recurso do M. P. do E. de S. P. provido em parte.(TJSP; Processo nº 1004527-05.2015.8.26.0114; Recurso: Apelação; Relator: I - não conhecerá do recurso, se a providência couber ao recorrente;”; Data do Julgamento: 3 de junho de 2025)

Voto / Fundamentação

, em 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Não conheceram do recurso de ape- lação interposto pelo corréu M..; deram provimento em parte ao “recurso” dos herdeiros de L.; negaram provimento aos recursos dos demais corréus; e, deram provimento em parte ao recurso do M. P. do E. de S. P. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. (Voto nº 33.421) O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores OSCILD DE LIMA JÚNIOR (Presidente), AFONSO FARO JR. e FRANCISCO SHIN- TATE. São Paulo, 3 de junho de 2025. OSCILD DE LIMA JÚNIOR, Relator


Ementa: AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Ato de Improbi- dade Administrativa – Pleito de anulação das concor- rências n. (...) e (...) promovidas pela (...) e dos conse- quentes contratos administrativos n. (...) e (...) ante a ocorrência de fraudes em procedimentos licitatórios. Apelação do corréu M. buscando a inversão do julga- do – Ausência de representação processual – Intima- ção do apelante para regularização – Não atendimen- to – Recurso não conhecido. AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Município de (...) – Pre- liminares afastadas – Supremo Tribunal Federal, Tema 1199 de Repercussão Geral – Lei 14.230/2021 486 – Sem retroatividade para efeito da prescrição, que não se verificou – Esquema fraudulento de licitações comprovado – Necessidade de constatação do dolo – Tema n.º 1199 de Repercussão Geral do STF – Dolo Jurisprudência - Direito Público bem caracterizado – Condutas prevista no art. 9 da Lei 8429/92 – Sanções que devem respeitar o princípio da proporcionalidade e razoabilidade – Sanções bem aplicadas, que não comportam alteração, com obser- vação apenas quanto ao pagamento da multa civil a fim de que seja fixado com base no acréscimo patri- monial, conforme o artigo 12, inciso I, com a atual re- dação conferida pela Lei 14.230/2021 e a condenação dos particulares nos termos dos artigos 3º, 9º, I e 12, I, da Lei 8429/92. Recurso não conhecido corréu M. Recurso dos her- deiros de L. provido em parte. Recursos dos demais corréus desprovidos. Recurso do M. P. do E. de S. P. provido em parte.





VOTO

Trata-se de ação de responsabilidade por ato de improbidade administra- tiva com pedido de liminar ajuizada pelo M. P. do E. de S. P. contra (...), A., L., M., E., M., (...) Ltda., G. e J., em que pretende: a) decretar a nulidade das con- corrências n. 01/2006 e 02/2007 promovidas pela (...) e dos consequentes con- tratos (...) e (...), suas prorrogações e aditivos; b) que os réus (...), A. e M.., sejam condenados nos termos do art. 9º, inciso I, e art. 12, I, da Lei 8.429/1992, à perda de bens ou valores, equivalente ao valor ilicitamente acrescido ao patrimônio em razão do recebimento de dinheiro noticiado na ação, à perda da função pú- blica que exercer ao tempo da condenação, à suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, ao pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acrés- cimo patrimonial indevido e à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de dez anos, além da condenação solidária quanto ao ressarcimento integral do dano causado, ressarcimento este destinado à (...); c) que os réus E., M., G., J. e a empresa (...) Ltda., sejam condenados nos termos dos arts. 3º, 9º, inciso I, e art. 12, I, da Lei 8.429/1992, à perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao seu patrimônio, ao pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial indevido, à suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, e à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária, pelo prazo de dez anos, além de, solidariamente com os réus mencionados no item “b”, ao ressarcimento integral do dano causado, ressarcimento este destinado à (...); d) subsidiariamente, sejam os corréus mencionados nos itens “b” e “c” acima Jurisprudência - Direito Público condenados, solidariamente, nos termos dos art. 11, “caput”, e inciso I, e art. 3º da Lei 8.429/1992, às cominações previstas no art. 12, III, do mesmo diploma, inclusive quanto ao ressarcimento integral do dano causado, ressarcimento este destinado à (...); e) que o réu L., seja condenado, solidariamente, ao ressarci- mento do dano. A r. sentença de fls. 2.197/2.208, cujo relatório se adiciona a presente, julgou o pedido procedente, para: 1) condenar a requerida (...), com fundamento nos artigos 9º, I, e 12, I, ambos da Lei 8.429/1992, à perda de bens ou valores correspondentes a três por cento do valor dos contratos objeto dos autos, solida- riamente aos demais requeridos, à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de oito anos e ao pagamento de multa civil equivalente a cinquenta vezes o valor da última remuneração auferida no cargo público; 2) condenar o requerido A., com fundamento nos artigos 9º, I e 12, I, ambos da Lei 8.429/1992, à perda de bens ou valores correspondentes a três por cento do valor dos contratos objeto dos autos, solidariamente aos demais requeridos, à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de oito anos e ao pagamento de multa civil equivalente a cinquenta vezes o valor da última remuneração auferida no cargo público; 3) condenar o requerido L., com fundamento nos artigos 9º, I e 12, I, ambos da Lei 8.429/1992, à perda de bens ou valores correspondentes a três por cento do valor dos con- tratos objeto dos autos, solidariamente aos demais requeridos e à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de oito anos; 4) condenar o requerido M., com fun- damento nos artigos 9º, I e 12, I, ambos da Lei 8.429/1992, à perda de bens ou valores correspondentes a três por cento do valor dos contratos objeto dos autos, solidariamente aos demais requeridos, à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de oito anos e ao pagamento de multa civil equivalente a cinquenta vezes o valor da última remuneração auferida no cargo público; 5) condenar o reque- rido M., com fundamento nos artigos 9º, I e 12, I, ambos da Lei 8.4239/1992, à perda de bens ou valores correspondentes a três por cento do valor dos con- tratos objeto destes autos, solidariamente aos demais requeridos, à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de oito anos e ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do acréscimo patrimonial; 6) condenar o requerido E.., com fundamento nos artigos 9º, I e 12, I, ambos da Lei 8.4239/1992, à perda de bens ou valores correspondentes a três por cento do valor dos contratos objeto destes autos, solidariamente aos demais requeridos, à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de oito anos e ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do acréscimo patrimonial; 7) condenar a requerida (...) Ltda ao pagamento de multa civil equivalente a duzentos salários mínimos e à proibição de contratar com o 488 poder público ou dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos; 8) condenar o requerido G. ao paga- mento de multa civil equivalente a cinquenta salários mínimos e à proibição de Jurisprudência - Direito Público contratar com o poder público ou dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurí- dica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos; 9) condenar o reque- rido J. ao pagamento de multa civil equivalente a cinquenta salários mínimos e à proibição de contratar com o poder público ou dele receber benefícios ou incen- tivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos. Os embargos de declaração opostos pelos réus M. (fls. 2.211/2.217), (...) (fls. 2.218/2.221), G. (fls. 2.222/2.228), J. (fls. 2.229/2.234), M. (fls. 2.236/2.244), foram rejeitados pela decisão de fls. 2.293/2.294. Inconformado, o réu A. interpôs recurso de apelação a fls. 2.255/2.265, pugnando, em síntese, pela reforma da r. sentença e consequente improcedência da ação, vez que ação não foi instruída com prova cabal da participação do ape- lante no propalado “esquema (...)” e tampouco nas noticiadas fraudes. O M. P. interpôs recurso de apelação a fls. 2.266/2.287, requerendo a procedência total dos pedidos iniciais, em especial para declarar a nulidade das Concorrências nºs. (...) e (...), promovidas pela (...) e dos Contratos nºs. (...) e (...), com suas prorrogações e os aditivos, com a consequente condenação soli- dária de todos os réus ao ressarcimento integral do dano, bem como para reti- ficar o percentual fixado a título de vantagem indevida (propina), majorando-o para 12% sobre o valor dos contratos, além de ser ajustada as sanções comina- das aos corréus (...), A., M., (...) Ltda., G. e J., devendo todos ser condenados nas penas do artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.429/1992. Por fim, sustenta que houve a atribuição equivocada de sanções aos réus, tendo em vista que para os elencados no item “a” não é possível a fixação da multa civil com base na última remuneração auferida no cargo público, mas sim deve ser imposta a multa com base no valor do acréscimo patrimonial. O réu M. interpôs recurso de apelação a fls. 2.309/2.342, aduzindo, pre- liminarmente, inépcia da inicial, vez que o apelado sequer esclarece a data dos fatos, impossibilitando inclusive o marco inicial para contagem do prazo pres- cricional, cujo início da contagem da prescrição é diferente dos outros réus, bem como diversas deficiências da inicial. Alega, ainda em preliminar, prescrição, sustentando que esta deve ser iniciada com a saída do L. da Presidência da (...), bem como que, consta na exordial, que o Apelante participou de fraudes na licitação com o escopo de auxiliar a empresa (...) a vencer as concorrências nº. (...) e (...), referentes aos contratos (...) e (...) e, compulsando os autos, observa às fls. 24/200 que os contratos descritos na exordial são os (...) e (...), referen- tes as licitações realizadas nos anos de 2005 e 2006, e consequentemente os contratos no ano de 2007, portanto, considerando referidas datas para o fim de contagem da prescrição, a inicial foi distribuída em 19/02/2015, tem-se que os fatos imputados ao requerido foram alcançados pelo manto da prescrição à teor Jurisprudência - Direito Público do entendimento do Supremo Tribunal Federal quando decidiu que a regra é a da prescritibilidade quando a lei não fixa o prazo da prescrição administrativa, devendo ocorrer em cinco anos a contar da data do ato improbo cometido pelo particular. Pugna, ainda, pela aplicabilidade da Lei nº 14.230/2021. No mérito, sustenta, em síntese, ausência de provas efetivas de que os contratos descritos na exordial foram fraudados pelo Apelante, sendo certo de que as provas e de- poimentos extraídos do processo criminal apenas e tão somente aponta para a suposta fraude licitatório no aspecto geral e não especificamente dos referidos contratos. Assim, aduz que não restou provado as alegações contidas na inicial, bem como sequer restou provado o dolo do Apelante, requerendo, assim, a re- forma da r. sentença para o fim de julgá-la totalmente improcedente. Alega que resta demonstrado na presente demanda que tem por objeto a recomposição do suposto dano causado ao erário Público decorrente de fraudes nas licitações dos contratos (...) e (...), sustentado na lei de improbidade administrativa, ocorre que referida recomposição do erário decorrente da fraude nos contratos acima men- cionado já é objeto de ação popular (...), conforme consta no próprio mandado de notificação. Por fim, reitera o pedido de justiça gratuita, isentando o Apelante das custas e despesas processuais conforme declaração juntada a fls. 869, bem como pela não oposição do M. P. a fls. 1562. O réu G. interpôs recurso de apelação a fls. 2.343/2.377, aduzindo, preli- minarmente, inépcia da inicial, prescrição, aplicação da Lei nº 14.230/2021. No mérito, requer a reforma da r. sentença para o fim de julgá-la totalmente impro- cedente. Por fim, reitera o pedido de justiça gratuita, isentando o Apelante das custas e despesas processuais conforme declaração juntada nos autos. O réu J. interpôs recurso de apelação a fls. 2.378/2.414, aduzindo, preli- minarmente, inépcia da inicial, prescrição, aplicação da Lei nº 14.230/2021. No mérito, requer a reforma da r. sentença para o fim de julgá-la totalmente impro- cedente. Por fim, reitera o pedido de justiça gratuita, isentando o Apelante das custas e despesas processuais conforme declaração juntada nos autos. A empresa ré (...) Ltda. interpôs recurso de apelação a fls. 2.415/2.446, aduzindo, preliminarmente, nulidade da citação e intimação da apelante; inépcia da inicial, prescrição, aplicação da Lei nº 14.230/2021 e cerceamento de defesa. Requer a reforma da r. sentença para o fim de julgá-la totalmente improcedente. Por fim, reitera o pedido de justiça gratuita, vez que a empresa (...) teve sua fa- lência decretada, conforme Processo (...). O réu E. interpôs recurso de apelação a fls. 2.447/2.462, aduzindo, pre- liminarmente, prescrição, pois, segundo o autor, o apelante estava agindo em 490 conluio com o corréu L., sendo certo que este, segundo a exordial, deixou o cargo público que ocupava em 17/07/2008. Dessa forma, o prazo prescricio- nal quinquenal se encerrou em 17/07/2013. Como a ação foi distribuída em 19/02/2015, de rigor o reconhecimento da prescrição da presente ação de impro- Jurisprudência - Direito Público bidade administrativa. No mérito, pugna, em síntese, pela reforma da r. sentença e consequente improcedência da ação, vez que o M. P. não aponta qual ato teria o réu praticado visando alterar a legalidade das Concorrências nºs (...) e (...), mas se limita a produzir prova genérica, bem como a ausência de prova do dolo. Reitera o pedido de justiça gratuita. Contrarrazões a fls. 2.463/2.465 apresentada pelos réus J., M., G. e pela empresa ré (...) Ltda. A ré (...) interpôs recurso de apelação a fls. 2.466/2.503, requerendo, pre- liminarmente, o pagamento das custas recursais ao final do feito, acaso a ape- lante não logre a reforma da r. sentença recorrida, e a prioridade na tramitação processual. Sustenta a aplicação retroativa e imediata das alterações de direito material e processual introduzidas pela Lei nº 14.230/21. Alega nulidade da sen- tença por não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo, ilicitude das provas utilizadas pelo apelado, ausência de enriquecimento ilícito e conduta dolosa. O réu M. interpôs recurso de apelação a fls. 2.504/2.551, requerendo, preliminarmente, o diferimento da taxa judiciária decorrente da interposição do recurso de apelação, com a recepção do presente independentemente do adian- tamento de preparo, com fundamento no art. 23-B da Lei n. 8.429/1992, com a redação da Lei n. 14.230/2021. Sustenta a aplicação da Lei nº 14.230/21. Alega, preliminarmente, inépcia da inicial, ilegitimidade passiva ad causam, impug- nação ao valor da causa, nulidade da decisão por ausência de fundamentação devida, prescrição. No mérito, aduz que não restou efetivamente demonstrada a ocorrência de dano ao erário, ausência de indício de dolo. Contrarrazões a fls. 2.555/2.577 apresentada pela ré (...). Contrarrazões a fls. 2.578/2.598 apresentada pelo réu M. Contrarrazões a fls. 2.600/2.623 apresentada pelo M. P. Contrarrazões a fls. 2.631/2.634 apresentada pelo réu L., por meio da Defensoria Pública. A douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se a fls. 2.646/2.648. Esclarece que, consoante informações trazidas nos recursos dos apelantes G. (fls. 2.370) e J. (fls. 2.407), o corréu L. faleceu no curso desta demanda, dias após a prolação da r. sentença. Em que pese tal fato ainda não ter sido noticiado nestes autos, a informação pode ser confirmada nos autos da apelação nº (...), atualmente em grau de recurso, no qual se discute a existência do mesmo esque- ma de fraudes destes autos, tendo sido juntada a certidão de óbito a fls. 3.375 daquele feito. Assim, requereu: - a intimação do curador especial para que se manifeste e eventualmente promova a habilitação dos sucessores, apresentando, se o caso, recurso de ape- lação ou nova peça de contrariedade ao recurso ofertado pelo autor da ação; Jurisprudência - Direito Público - a citação por edital dos herdeiros constantes na certidão de óbito juntada nos autos nº (...) (fls. 3.375); - sem prejuízo, tal como requerido pelo M. P. nos autos nº (...) (fls. 3.449), a tentativa de citação do herdeiro D., cujo endereço foi localizado nos autos nº (...) (fls. 461) em trâmite perante a 5ª Vara Cível de (...), no qual figurou como réu juntamente com o falecido L. - a suspensão deste processo nos termos do artigo 689 do CPC. Ultimadas as medidas acima referidas, postula pela concessão de nova vista para a oferta de parecer no momento oportuno. Houve oposição ao julgamento virtual (fls. 2.643, 2.651, 2.653). O recurso foi distribuído por prevenção para esta C. 11ª Câmara de Direito Público (fls. 2.638), que não conheceu dos recursos (fls. 2.657/2668, 2.728/2.730 e 2.756/2.760). Redistribuídos os autos para a C. 9ª Câmara de Direito Público do Tribu- nal que não conheceu dos recursos e suscitou o conflito negativo de competên- cia (acórdão de fls. 2.805/2.820). Em v. acórdão, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, por maioria de votos, conheceu o conflito de competência e o julgou procedente, para declarar a competência da Colenda 11ª Câmara de Direito Público (suscita- da), para conhecimento da apelação (fls. 2.834/2.839). Foi deferida a suspensão deste processo, nos termos do artigo 689 do CPC, bem como determinado a intimação do corréu M. a fim de que regulari- zasse sua representação processual (fls. 2.846). Aviso de recebimento juntado a fls. 2.853 referente à intimação do cor- réu M. a fim de que regularizasse sua representação processual (renúncia a fls. 2.679/2.680 em 09/02/2023). Certificado que decorreu o prazo legal sem manifestação do corréu M. (fls. 2.857). Determinada a intimação do M. P. do E. de S. P., a fim de que promovesse a habilitação dos herdeiros do corréu L. (fls. 2.859). Pedido de inclusão dos herdeiros do corréu L. a fls. 2.863/2.865, o que foi deferido a fls. 2.868. Os herdeiros do corréu L. apresentaram “defesa” a fls. 2.903/2.906. A douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se a fls. 2.952/2.987, opinando pelo desprovimento dos recursos dos réus, excetuando-se o dos suces- sores de L., ao qual deve ser dado provimento parcial, nos termos desta mani- festação, e provimento parcial do recurso do M. P. 492 Despacho a fls. 2.989 determinando a intimação por oficial de justiça do corréu M. a fim de que regularizasse sua representação processual. Certidão do oficial de justiça a fls. 2.993/2.994. É o relatório. Jurisprudência - Direito Público Ab initio, verifica-se que nesta instância, o advogado do apelante M. co- municou sua renúncia ao mandato (fls. 2.679/2.680 em 09/02/2023). Assim, fa- cultou-se a regularização da sua representação processual (fls. 2.846). Contudo, o apelante deixou transcorrer o prazo sem manifestação (fls. 2.857). E, nova- mente determinada a sua intimação a fim de que regularizasse sua representa- ção processual, desta vez por oficial de justiça, o mandado restou negativo (fls. 2.993/2.994). Portanto, constatada a renúncia do patrono após a interposição do recurso, o apelante foi intimado por carta com aviso de recebimento, para constituir novo advogado, em obediência ao disposto no art. 76, “caput” c.c. § 2º, I, do CPC: “Art. 76. Verificada a incapacidade processual ou a irregularidade da representação da parte, o juiz suspenderá o processo e designará prazo razoável para que seja sanado o vício. (...) § 2º Descumprida a determinação em fase recursal perante tribunal de justiça, tribunal regional federal ou tribunal superior, o relator: I - não conhecerá do recurso, se a providência couber ao recorrente;” Assim, não regularizada a representação processual, embora intimado o recorrente a fazê-lo, inadmissível o conhecimento do recurso, com fundamento no art. 76, §2º, I, do CPC. Nesse sentido: “Processual civil. Agravo regimental no agravo de instrumento. Ausên- cia de procuração nos autos. Renúncia. Não regularização. Ausência de pressuposto processual. Não conhecimento. 1. A ausência de representação processual, ainda que proveniente de renúncia posterior à interposição do recurso, impõe à parte o dever de regularização, sob pena de não conhecimento do recurso por ausência de pressuposto processual. 2. Agravo regimental não conhecido. (Agrg no ag 1399568/SP, rel. Mi- nistro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 17/09/2013, dje 22/10/2013). Desta Corte: “APELAÇÃO CÍVEL. ICMS. Mandado de segurança. ICMS. Pedido de compensação do débito tributário com crédito judicial. Recusa ad- ministrativa. Segurança denegada. Insurgência da impetrante. Caso em que após a interposição do recurso de apelação foi noticiada a re- núncia dos procuradores da apelante. Determinação de intimação da recorrente para constituição de novo advogado, nos endereços indica- dos nos autos, por diversas vezes, sem sucesso. Falta de regularização da representação processual da parte que impede o conhecimento do recurso. Inteligência do artigo 76, §2º, I do CPC. Recurso não conhe- cido.” (TJSP; Apelação Cível 1030326-84.2014.8.26.0114; Relator: Jose Jurisprudência - Direito Público Eduardo Marcondes Machado; Órgão Julgador: 10ª Câmara de Direito Público; Foro de Campinas - 2ª Vara da Fazenda Pública; Data do Julga- mento: 25/03/2023; Data de Registro: 25/03/2023). “APELAÇÃO CÍVEL – ICMS – Embargos à execução fiscal rejeitados com base no art. 739, I do CPC/1973 – Apelação em que a empresa re- quer seja reconhecida a tempestividade dos embargos com a decretação de nulidade da CDA – Renúncia ao mandato pelos advogados constituí- dos pelo autor – Intimação para constituição de novo patrono – Decor- rido o prazo in albis – Aplicação do art. 76, § 2º, I do CPC/2015 – Recur- so não conhecido.” (TJSP; Apelação Cível 0029353-13.2002.8.26.0068; Relator: Eduardo Gouvêa; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Público; Foro de Barueri - SAF - Setor de Anexo Fiscal; Data do Julgamento: 09/08/2022; Data de Registro: 09/08/2022). Ante o exposto, não conheço do recurso de apelação interposto pelo corréu M., nos termos do art. 76, § 2º, I c.c. o art. 1.011, II, todos do Código de Processo Civil. No mais, recebo a manifestação ofertada pelos sucessores de L. (fls. 2903/2906), como apelação. Observa-se que a participação de L. não foi abala- da pela defesa apresentada, assim, o que resta é aferir que as sanções extrapatri- moniais, por seu caráter personalíssimo, que não se transmitem a seus sucesso- res, certo ainda que não foi condenado a multa civil. Desta forma, sujeitam-se os sucessores D., F. e F. apenas ao valor cor- respondente ao perdimento de bens acrescidos ao patrimônio de L., nos limites da força da herança, consoante art. 8º, da Lei 8429/92, o que deve ser apurado quando do cumprimento da sentença. Desta forma, é o caso de provimento em parte do “recurso” dos her- deiros, mantendo-se o perdimento de valores, na forma do referido dispo- sitivo. No que tange aos pleitos preliminares de concessão do benefício da jus- tiça gratuita pelos corréus, reputo que os elementos coligidos aos autos não são suficientes para a sua concessão. Contudo, tratando-se de regra processual, incide aqui a norma do artigo 23-B da Lei nº 8.429/92, incluído pela Lei nº 14.230/2021 (artigo 14 do Código de Processo Civil), que difere o recolhimento das custas processuais, que serão pagas ao final pelo vencido, no caso de proce- dência da ação (§1º). Rejeito a preliminar de prescrição, pois conforme destacou o juiz a quo no despacho saneador a fls. 2.166/2.167: Não ocorre a prescrição alegada pelo requerido M. O artigo 23 da Lei 8.429/1992 não disciplina especificamente a prescri- 494 ção com relação àqueles que não ocupam cargo ou função pública, porém o C. STJ assentou entendimento no sentido de que, “nos termos do artigo 23, I e II, da Lei 8429/92, aos particulares, réus na ação de improbidade administrativa, aplica-se a mesma sistemática atribuída aos agentes públicos para fins de fixa- Jurisprudência - Direito Público ção do termo inicial da prescrição” (STJ, AgRg no REsp 1541598/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 05.11.15). Ocorre que há mais de um agente público integrando o polo passivo. Embora os contratos objeto dos autos sejam datados de 2006 e 2007, a inicial relata a existência de um esquema de corrupção que perdurou ao longo dos anos, chefiado, em tese, pela requerida (...), que ocupou o cargo de Chefe de Gabinete até 05/2011. Logo, considerado o momento em que o último agente público deixou o cargo, não ocorre a prescrição. Portanto, apenas com o desligamento da ré (...) em 2011 se faz possível o início da contagem do prazo para os demais réus. Assim, dada à multiplicidade de réus, é o desligamento do último deles o termo “a quo” do prazo quinquenal. Na hipótese, este termo coincide com o desligamento de (...), em maio de 2011. A ação foi proposta no ano de 2015, portanto, não se cogitando de prescrição aplicável a quaisquer dos recorrentes. No mais, sobre aplicação retroativa da Lei 14.230/2021, cumpre obser- var os delineamentos de Supremo Tribunal Federal, Tema 1199, ARE 843989, Tribunal Pleno, julgado em 18-08-2022, DJe-251 09-12-2022, PUBLIC 12-12- 2022: 4. A Lei 14.230/2021 não excluiu a natureza civil dos atos de impro- bidade administrativa e suas sanções, pois essa “natureza civil” retira seu substrato normativo diretamente do texto constitucional, conforme reconhecido pacificamente por essa SUPREMA CORTE (TEMA 576 de Repercussão Geral, de minha relatoria, RE n° 976.566/PA). 7. O ato de improbidade administrativa é um ato ilícito civil qualificado “ilegalidade qualificada pela prática de corrupção” e exige, para a sua consumação, um desvio de conduta do agente público, devidamente tipificado em lei, e que, no exercício indevido de suas funções, afaste-se dos padrões éticos e morais da sociedade, pretendendo obter vantagens materiais indevidas (artigo 9º da LIA) ou gerar prejuízos ao patrimônio público (artigo 10 da LIA), mesmo que não obtenha sucesso em suas intenções, apesar de ferir os princípios e preceitos básicos da administração pública (artigo 11 da LIA). 8. A Lei 14.230/2021 reiterou, expressamente, a regra geral de ne- cessidade de comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipifica- ção do ato de improbidade administrativa, exigindo em todas as hipóteses a presença do elemento subjetivo do tipo DOLO, conforme se verifica nas novas redações dos artigos 1º, §§ 1º e 2º; 9º, 10, 11; bem como na revo- gação do artigo 5º. 9. Não se admite responsabilidade objetiva no âmbito de aplicação da lei de improbidade administrativa desde a edição da Lei 8.429/92 e, a partir da Lei 14.230/2021, foi revogada a modalidade cul- posa prevista no artigo 10 da LIA. 10. A opção do legislador em alterar a lei de improbidade administrativa coma supressão da modalidade cul- posa do ato de improbidade administrativa foi clara e plenamente válida, Jurisprudência - Direito Público uma vez que é a própria Constituição Federal que delega à legislação ordinária a forma e tipificação dos atos de improbidade administrativa e a gradação das sanções constitucionalmente estabelecidas (CF, art. 37, §4º). 11. O princípio da retroatividade da lei penal, consagrado no inciso XL do artigo 5º da Constituição Federal (“a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”) não tem aplicação automática para a res- ponsabilidade por atos ilícitos civis de improbidade administrativa, por ausência de expressa previsão legal e sob pena de desrespeito à constitu- cionalização das regras rígidas de regência da Administração Pública e responsabilização dos agentes públicos corruptos com flagrante desres- peito e enfraquecimento do Direito Administrativo Sancionador. (...) 14. Os prazos prescricionais previstos em lei garantem a segurança jurídica, a estabilidade e a previsibilidade do ordenamento jurídico; fixando ter- mos exatos para que o Poder Público possa aplicar as sanções derivadas de condenação por ato de improbidade administrativa. 15. A prescrição é o perecimento da pretensão punitiva ou da pretensão executória pela INÉRCIA do próprio Estado. A prescrição prende-se à noção de perda do direito de punir do Estado por sua negligência, ineficiência ou incompe- tência em determinado lapso de tempo. 16. Sem INÉRCIA não há PRES- CRIÇÃO. Sem INÉRCIA não há sancionamento ao titular da pretensão. Sem INÉRCIA não há possibilidade de se afastar a proteção à probidade e ao patrimônio público. 17. Na aplicação do novo regime prescricional novos prazos e prescrição intercorrente, há necessidade de observância dos princípios da segurança jurídica, do acesso à Justiça e da proteção da confiança, com a IRRETROATIVIDADE da Lei 14.230/2021, garan- tindo-se a plena eficácia dos atos praticados validamente antes da alte- ração legislativa. 18. Inaplicabilidade dos prazos prescricionais da nova lei às ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato do- loso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa, que permanecem imprescritíveis, conforme decidido pelo Plenário da CORTE, no TEMA 897, Repercussão Geral no RE 852.475, Red. p/Acórdão: Min. EDSON FACHIN. 19. Recurso Extraordinário PROVIDO. Fixação de tese de re- percussão geral para o Tema 1199: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Cons- tituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, 496 porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar even- tual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos Jurisprudência - Direito Público temporais a partir da publicação da lei.” Assim, sem aplicação retroativa da referida lei, não se verificou a pres- crição. Rejeito a preliminar de nulidade da citação e intimação da apelante em- presa ré (...) Ltda, isso porque, conforme bem destacou o juiz a quo no despacho saneador a fls. 2166/2167: A decretação da falência da requerida (...) (fls. 1490/1495) não havia sido noticiada nos autos anteriormente. Portanto, não há que se falar em nuli- dade de qualquer ato processual anterior. Ademais, a massa falida foi citada e ofereceu contestação (fls. 1655/1670). Considerando a competência das Varas da Fazenda Pública para o pro- cessamento de ações de improbidade administrativa (ao contrário do que ocor- re no julgado copiado a fls. 1666/1670), indevido o deslocamento da competên- cia para o juízo da falência. Rejeito a preliminar de inépcia da inicial, pois se observa com clareza a narração da causa de pedir e dos pedidos, em concatenação lógica, nos exatos limites previstos pelo diploma processual civil. E, consoante entendimento assente do E. Superior Tribunal de Justiça, “não é inepta a petição inicial onde feita descrição suficiente dos fatos que servem de fundamento ao pedido, ensejando ao réu o pleno exercício de sua defesa” (REsp 343.592/PR, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira). Com relação ao alegado cerceamento de defesa, é de se observar que aos réus foram oportunizados em sua plenitude o exercício ao direito à defesa e ao contraditório, lembrando notar que a prova emprestada advinda do processo criminal nº (...) foi amplamente debatida pelos réus. Note-se ainda que a presente demanda, a despeito do pedido de ressarci- mento ao erário, seu fundamento baseia-se no valor do contrato face à sua nuli- dade e não sobre eventual inexecução da avença ou superfaturamento – questões não alegadas na inicial – de modo que se mostra desnecessária e inútil a prova pericial para a aferição de seu valor. Rejeito, ainda, a preliminar de nulidade da sentença por ausência de fun- damentação, pois o fundamento da sentença está de acordo com os pedidos e de acordo com o art. 93, IX da CF. Assim, não há nulidade a declarar, já que fundamentação sucinta não se confunde falta de fundamentação. Por fim, anote-se que a ação popular (...) foi julgada extinta, sem resolu- ção do mérito, diante do ajuizamento pelo M. P. da presente ação civil pública. No mérito, melhor sorte não assiste aos demais apelantes corréus, com exceção dos sucessores de L., ao qual deve ser dado provimento em parte, nos termos do que constou acima. Ademais, é o caso de dar provimento em parte ao recurso do M. P. do E. de S. P. Conforme bem sintetizou a D. Procuradoria Geral de Justiça: A presente demanda envolve fraudes em licitações perante a (...) (socie- Jurisprudência - Direito Público dade de economia mista municipal responsável pela pelo planejamento, execu- ção, e operação dos serviços de (...) de (...)), mais especificamente nas Concor- rências (...) (fls. 58/72 e 140/155), representados pelos contratos nº (...) e (...) (fls. 28/41 e 112/127) e respectivos aditamentos, vencidos pela corré (...) Ltda., representada pelo corréu G. e pelo funcionário J.., ambos com atuação decisiva no esquema de corrupção. O esquema de corrupção era liderado pela corré (...), à época ocupante do cargo de Secretária Chefe de Gabinete, e contava com a participação ativa dos integrantes do corpo diretivo da (...), por seu Diretor Presidente, o corréu L., A., ocupante do cargo de Diretor Técnico e de M., Diretor Administrativo/ Financeiro e de Relações com Investidores da (...). Os corréus E. e M. figuravam como lobistas, em verdade intermediários, das negociações ilícitas e ficando com parte dos pagamentos a título de propi- na, tendo apresentado o réu G. ao então Presidente da (...), L. O esquema se dava da seguinte forma: a partir da verificação da neces- sidade de uma contratação perante algum órgão ou entidade da Administração Direta ou Indireta do Município, neste caso da (...), os réus escolhiam a empresa para quem seria oferecido o contrato, cujas tratativas prévias indicassem sua concordância na participação da fraude, a qual deveria movimentar-se para garantir que outras empresas não se interessassem pelo objeto contratual ou qualquer outro meio para que o esquema fosse exitoso. A partir de então eram ajustados valores para a garantia do direcionamento da licitação e da conti- nuidade do futuro contrato por meio de aditamentos (apurado em 12% do valor do contrato no valor de R$ (...), e tais pagamentos se davam periodicamente na forma de “mensalinho”, sendo divididos entre os integrantes do esquema de corrupção, cuja maior parte ficava em poder da corré (...). As licitações deflagradas não passavam de fachada, posto que viciadas em função do prévio direcionamento acima narrado. A imputação deu-se nos termos dos artigos 9º, inciso I, e 11, “caput”, da LIA. Pois bem. A Constituição Federal disciplina os princípios da Administração Pública e dispõe acerca da imposição de sanções para atos de improbidade administrati- va, conforme se extrai da leitura do texto transcrito: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, 498 publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) § 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade Jurisprudência - Direito Público dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. Por sua vez, a Lei nº 8.429/92, em complemento ao §4º do art. 37 da CF, disciplina os mecanismos de combate à improbidade administrativa. O M. P. imputou aos réus a prática dos atos de improbidade previstos nos artigos 9, inciso I e 11, caput, da Lei 8.429/92. De acordo com o art. 9 da supracitada lei, na redação à época da infra- ção, “Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando enri- quecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente: I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atin- gido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público;(...)”. O artigo 11º, por sua vez, previa que: “Art. 11. Constitui ato de improbi- dade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialida- de, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:” E, no tocante aos prepostos da empresa: “Art. 3º As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra dolosamente para a prática do ato de improbidade. § 1º Os sócios, os cotistas, os diretores e os colaboradores de pessoa jurídica de direito privado não respondem pelo ato de improbidade que venha a ser imputado à pessoa jurídica, salvo se, comprovadamente, houver participação e benefícios diretos, caso em que responderão nos limites da sua participação. § 2º As san- ções desta Lei não se aplicarão à pessoa jurídica, caso o ato de improbidade administrativa seja também sancionado como ato lesivo à administração pú- blica de que trata a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. Com as alterações promovidas pela Lei 14230/2021, passou-se a exigir do agente o dolo para a caracterização do ato de improbidade administrativa em qualquer de uma das três modalidades. E, como dito acima, o E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 843989, Tema n.º 1199 de Repercussão Geral definiu a seguinte tese: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se – nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA – a presença do elemento subjetivo – DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 – revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa –, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade ad- Jurisprudência - Direito Público ministrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRE- TROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei”. No caso dos autos, a farta prova documental demonstra a existência de um esquema fraudulento de licitações, objeto do Procedimento de Investigação Criminal nº (...), que tramitou junto ao GAECO/MPSP - Grupo de Atuação Es- pecial Contra o Crime Organizado - Núcleo de (...)/SP. Os elementos de con- vicção coligidos aos autos demonstram sobremodo a ocorrência de improbidade administrativa, a par de encontrar-se positivado o subjacente dolo dos réus. Enfim, os fatos foram bem delineados na sentença, cujos fundamentos devem ser acrescidos como razões de decidir (fls. 2.197/2.208): No mérito, a petição inicial destes autos é fortemente lastreada no depoimento prestado pelo ora terceiro requerido ao M. P. em 17/01/2011 (fls. 205/235), a partir do qual o M. P. ofereceu denúncia contra as pessoas físicas ora requeridas, além de outras pessoas, como incursas no artigo 288 do Código Penal, artigo 90 da Lei 8.666/1993, artigos 317 e 333 do Código Penal (fls. 236/365). Em linhas gerais, o terceiro requerido delatou a existência de um esquema de corrupção na Administração municipal, em especial na (...), envolvendo diversos con- tratos, dentre os quais os dois objetos destes autos, firmados com a sétima requerida. Pelo relato do terceiro requerido, o vencedor da concorrência era previamente “es- colhido”, em troca de determinada quantia em espécie, cabendo a essa empresa com- binar-se com as demais participantes do certame; essa quantia era dividida entre a primeira requerida (Chefe de Gabinete e esposa do prefeito), que ficava com a maior parte, e os diretores da (...). No caso, a intermediação foi feita pelo quinto e sexto re- querido, que se apresentavam como lobistas e também receberam parte da “propina”. O feito criminal tramitou em paralelo com estes autos, até que sobreveio senten- ça condenatória datada de 01/12/2015 (fls. 1766/1768), parcialmente reformada por v. Acórdão datado de 05/06/2019 (fls. 1769/2009). Com relação aos contratos objeto destes autos, consta do voto proferido pelo Eminente Relator: “Em 01 de janeiro de 2005, a recorrente (...) foi nomeada Secretária Che- fe de Gabinete da Prefeitura Municipal de (...), cargo público por ela ocupado até o final de maio de 2011, passando a deter enorme influência sobre vários setores da Administração Direta e Indireta do Município. No entanto, ao invés de cumprir com suas responsabilidades e deveres funcionais, criou um grande esquema de corrupção e arrecadação clandestina de dinheiro envolvendo agentes públicos e empresários. Para tanto, cooptou toda a Diretoria da (...), para arrecadar valores 500 através dos contratos públicos que já estavam em vigência e também através daqueles que pudessem vir a ser celebrados. Os diretores e demais servidores da (...) arregimentados para o esquema de corrupção formaram um dos núcleos de corrupção que atuou em concerto executório com os demais núcleos existentes em outras áreas. Jurisprudência - Direito Público Dentre tal contexto o corréu L., à época Diretor Presidente da entidade, era responsável e participava diretamente de todas as tratativas para os ajustes e combinações necessários para fraudar o caráter competitivo das licitações em contratos de prestação de serviços mantidos pela (...). Além disso, ele partici- pava ativa e diretamente do recebimento, conferência e redistribuição entre os demais membros da quadrilha do dinheiro oriundo do esquema de corrupção. Após divergências de seus comparsas, L. foi expulso da quadrilha em meados de julho de 2008, quando deixou o cargo público ocupado na (...). Além dele, também foi arregimentado e passou a integrar a quadrilha o corréu A., Diretor Técnico da (...), que participava diretamente de todas as tra- tativas para fraudar o caráter competitivo das licitações inerentes aos contratos de obras mantidos pela referida sociedade, bem como conferia e redistribuía entre os demais membros da quadrilha o dinheiro oriundo do esquema de cor- rupção. M. foi Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com Investidores da (...) até o dia 12 de janeiro de 2009. Durante sua permanência no cargo e na quadrilha, o insurgente participava diretamente das tratativas para os ajustes necessários e combinações para fraudar o caráter competitivo das licitações, além de ser responsável por um esquema de corrupção nos contratos de em- préstimos bancários da entidade e ajudava na divisão e distribuição do dinheiro arrecadado com o esquema fraudulento. (...) Os recorrentes acima mencionados, nos respectivos períodos em que par- ticiparam do esquema, integram ou integraram o centro nervoso do núcleo de corrupção da (...), na medida em que todos atuam ou atuaram diretamente nas tratativas das fraudes licitatórias ou no recebimento do dinheiro oriundo da corrupção” (fls. 1836/1838). Tal situação é comum aos diversos contratos da (...) objeto da ação, tanto é que ensejou a condenação pelo delito do artigo 288 do Código Penal. Especificamente com relação ao contrato firmado com a sétima requerida, diz-se no voto: “DA FRAUDE LICITATÓRIA E DA CORRUPÇÃO BILATERAL INE- RENTE AO CONTRATO DA (...) nº (...) - Execução de obras para mudança das redes de água pelo método não destrutivo. Consta que em meados do ano de 2007,durante os meses que antece- deram a deflagração da Concorrência nº (...) da (...), (...), A., A. e M., além de outros indivíduos não identificados, todos atuando em concerto executório entre eles e com G. e J., representantes da empresa (...) Ltda., bem como com M. e E., lobistas vinculados a mesma empresa, fraudaram, mediante ajustes, combina- ções e outros expedientes, o caráter competitivo do respectivo procedimento li- citatório, com o intuito de obter, para eles e para outrem, vantagens decorrentes da adjudicação do objeto da licitação. Consta, também, que durante toda a execução dos serviços referentes aos Contratos nºs (...) e (...), G., J., M. e E., representantes da empresa (...) Ltda., mensalmente, de forma continuada, ofereciam e prometiam à (...), A., L., M. e (...), além de outros indivíduos não identificados, vantagens financeiras indevi- das consistentes em valores em dinheiro no importe de, pelo menos, 10% (dez por cento) sobre os valores efetivamente executados, tudo para que os agentes públicos garantissem a manutenção do contrato, bem como realizassem adita- Jurisprudência - Direito Público mentos e prorrogações da contratação inicial. Consta, ainda, que durante toda a execução dos serviços referentes aos Contratos nºs (...) e (...), (...), A., L., M. e (...)., além de outros indivíduos ainda não identificados, todos previamente ajustados e agindo em concerto executório no contexto da organização criminosa que integravam, receberam, para eles, de forma direta e continuada, mensalmente, em razão das funções públicas por alguns deles exercidas, vantagens financeiras indevidas consistentes em valores em dinheiro no importe de, pelo menos, 10% (dez por cento) sobre os valores efe- tivamente pagos, mensalmente, pela (...) à (...) pelos serviços executados, tudo para que os agentes públicos garantissem a manutenção do contrato, bem como realizassem aditamentos e prorrogações da contratação inicial. Assim, em razão das vantagens recebidas, os agentes públicos indicados praticaram atos de ofí- cio infringindo deveres funcionais. Consta, por fim, que nas circunstâncias fáticas acima delineadas, (...) concorreu, de qualquer forma, para o recebimento das vantagens indevidas pe- los seus comparsas agentes públicos, na medida em que, atuando com eles de forma coordenada e em concerto executório no contexto da organização crimi- nosa que todos integravam, induziu, instigou e auxiliou materialmente no rece- bimento do numerário oriundo da corrupção, inclusive ficando com a posse e detenção de grande parte do dinheiro. Os serviços em questão foram executados pela empresa (...) Ltda, em razão dos Contratos nºs (...) e (...), decorrentes das Concorrências nº (...) e (...), e abrangeram a substituição e prolongamento de redes de distribuição de água por método não destrutivo, ligações domiciliares e instalação de caixas de pro- teção de hidrômetros, no município de (...), com fornecimento de materiais, mão de obra, máquinas e equipamentos. O Contrato nº (...) foi celebrado em 28 de junho de 2006 e tinha como valor inicial R$ (...). Durante a execução da obra foram realizados vários aditamentos, alguns identificados: i) em 23 de abril de 2007 no valor de R$ 1.003.138,00 (um milhão, três mil e cento e trinta e oito reais); ii) em 28 de junho de 2007 no importe de R$ 5.280.396,62 (cinco milhões, duzentos e oitenta mil e trezentos e noventa e seis reais e sessenta e dois centavos); iii) em 06 de junho de 2008 no valor de R$ 5.507.914,26 (cinco milhões, quinhentos e sete mil e novecentos e quatorze reais e vinte e seis centavos). O Contrato nº (...) foi celebrado em 10 de julho de 2007 e tinha como valor inicial o importe de R$ (...). Durante a execução dos serviços foram realizados dois aditamentos iden- tificados: i) em 15 de abril de 2008 no valor de R$ 2.102.893,40 (dois milhões, cento e dois mil, oitocentos e noventa e três reais e quarenta centavos); ii) em 05 de junho de 2008 no importe de R$ 10.970.045,41 (dez milhões, novecentos e setenta mil, quarenta e cinco reais e quarenta e um centavos). Conforme apurado durante a investigação realizada pelo M. P., os con- tratos em questão foram decorrentes de procedimentos licitatórios cujo caráter competitivo foi fraudado em razão dos ajustes e combinações realizadas entre os Diretores da (...), comandados por (...) e G., J., bem como M. e E., represen- 502 tando os interesses da empresa (...)., a quem a vitória nos certames havia sido oferecida e prometida. Nos meses que antecederam a deflagração da Concorrência nº (...) da (...), em uma reunião realizada no Hotel (...), E. e M., atuando como lobistas da empresa (...)., apresentaram G. e J. respectivamente, proprietário e representan- Jurisprudência - Direito Público te da empresa, ao então Diretor Presidente da (...), L. Na ocasião, os representantes da empresa (...). e seus lobistas ofereceram ao Diretor presidente da (...) a quantia de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais) para que fosse iniciada e direcionada uma licitação a fim de que a mencionada empresa pudesse ser contratada para a prestação de serviços de substituição das redes de água pelo método não destrutivo, especialidade da (...). Dias depois, participaram os envolvidos uma nova reunião no mesmo local, quando, dentro do esquema de fraude e corrupção engendrado e coman- dado por (...), L. A. recebeu de G., J., M. e E. a quantia de R$ 140.000,00 (cento e quarenta mil reais). O recorrente L. permaneceu em poder de apenas uma parte da vantagem a ele oferecida e entregue, sendo o restante repartido entre (...) e A. Os integrantes da organização criminosa e os empresários e lobistas combinaram a vitória da empresa (...) no procedimento licitatório que seria deflagrado e passaram a atuar com vistas a tal objetivo, tudo para posterior estabelecimento do esquema de corrupção bilateral inerente ao repasse de per- centuais dos valores do contrato. O acordo inicial entre os envolvidos consistia no repasse do percentual de, pelo menos, 10% (dez por cento) dos valores efetivamente pagos pela (...). O numerário seria entregue por G. diretamente aos lobistas E. e M. que ficariam com 25% (vinte e cinco por cento) e passariam o restante de 75% (setenta e cinco por cento) a L., para a subsequente divisão com os demais integrantes da organização. No entanto, apesar de combinado, logo no início da relação entre os en- volvidos, ocorreram divergências entre os lobistas e o então Diretor Presidente da (...), momento que iniciaram chantagens e ameaças no intuito de permanece- rem com um percentual maior dos valores repassados. Em razão das referidas chantagens que comprometeriam o esquema da corré (...), restou estabelecida uma nova divisão dos percentuais repassados por G. De acordo com o “novo esquema”, E. e M. ficariam com 1/3 (um terço) cada dos 10% (dez por cento) e o restante seria entregue para L. que dividiria entre os demais integrantes da organização criminosa através da entrega direta a (...) e (...). A mesma sistemática utilizada para fraudar a Concorrência nº (...) foi empregada posteriormente para fraudar a Concorrência nº (...). Através de ajustes e combinações entre os representantes da empresa (...) e os integrantes da organização criminosa de (...), restou acordado que a empre- sa seria também vencedora no mencionado certame, quando, então, passaria a valer o mesmo acordo de repasse de percentuais para a nova contratação que seria celebrada (cf. fls. 40d/57d). Neste ponto, a r. sentença merece ser mantida por seus próprios e jurídi- cos fundamentos, subsistindo a condenação apenas dos recorrentes G., M., E., (...), A. e L. O corréu delator, L., em seu interrogatório confirmou declarações forne- cidas no curso do processo e de sua delação, asseverando que, “A (...) lhe foi apresentada pelos lobistas M. e E. Na primeira reunião que tiveram, o apelante G. se prontificou a entregar a quantia de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais) para que entrassem na concorrência. No próximo encontro, que contava com a Jurisprudência - Direito Público presença de M., E., G. e J. foram entregues a L. a importância de R$ 140.000,00 (cento e quarenta mil reais), em dinheiro, a título de adiantamento para que a concorrência fosse direcionada a (...).” Assim, começaram a “trabalhar para que isso acontecesse”, adicionan- do cláusulas específicas que possibilitaria apenas que a empresa (...) ganhasse. Referida empresa ganhou a licitação e passou a lhe pagar a quantia de 10% (dez por cento) do faturamento. Suscitado qual a forma que utilizavam para fraudar à licitação, além da inserção em contrato de cláusulas específicas, o corréu delator afirmou que “Uma das formas de mostrar que “a licitação tem dono, é adiar a data da lici- tação”. G. entregava a quantia em dinheiro a E. e M., que, por sua vez, entregava a L. em seu escritório. Desse valor, 1/3 (um terço) era destinado a M. 1/3 (um terço) para E. e o outro 1/3 (um terço) ficava “para a administração”. Deste 1/3 (um terço), 2/3 (dois terços) eram entregues a (...), e o restante era dividido igualitariamente entre L., A. e M. (cf. mídia digital de fl. 6.322, 32º volume). Corroborando a versão por ele apresentada, a testemunha D., motoris- ta do corréu delator, tanto na fase investigativa como em juízo, asseverou que “Pouco tempo depois, logo no início dos meus serviços, o A. me disse que preci- saria montar uma equipe de segurança, pois estaria sendo ameaçado. A equipe de segurança era formada pelo tenente J., pelo soldado B., já falecido, pelo Tenente L. e pelo soldado L.”. “Desde que comecei a trabalhar para o A., pelo menos uma ou duas vezes por mês, eu o levava a um escritório localizado na Rua (...). Nesse escritório, o A. se reunia com as pessoas de E. e M., aqueles que foram presos recentemente em operação do GAECO. Algumas vezes a equipe de segurança também acompanhou A. até essas reuniões. Mas a maioria das vezes íamos apenas eu e ele. Essas reuniões eram sempre no período noturno. Ele não me dava detalhes sobre o que tratava nessas reuniões com E. e M. Eu desconfiava que havia alguma coisa de ilícita nessas reuniões, mas o A. nunca me deu detalhes. Eu sempre via o E. e o M. ou chegando ou saindo das reuniões. Eles sempre se faziam acompanhar de seus motoristas e seguranças. Que eu me lembro o nome de algum desses funcionários de E. e M. era o L., o M., conheci- do por “a.”, e outro que eu não me recordo com exatidão. Às vezes eu percebia que o E. e o M. chegavam às reuniões com mochilas de academia. O A. estava sempre em poder de uma pasta de couro. Não sei informar se nessas reuniões havia transações de dinheiro. Eu também levei o A. em encontros com E. e M. realizados em outros locais, por exemplo, no Bar (...), numa Cachaçaria próxi- ma do (...), na Pizzaria (...), no Restaurante (...), no Hotel (...), no Bar (...) em (...) e outros. Nessa mesma época, eu levava o A. à casa da senhora (...), esposa do prefeito (...)., pelo menos uma vez por mês. Ele sempre me dizia que a “doutora”, o estava chamando para alguma conversa ou reunião. A casa da doutora (...) era no Condomínio (...), próximo ao (...). O A. sempre me dizia que tais conversas ou reuniões eram com a doutora (...) e não com o prefeito (...). Enquanto eles conversavam no interior da residência, eu permanecia no interior do veículo. Também não sei informar se nessas reuniões havia transações de dinheiro”. A testemunha M., segurança pessoal do recorrente E., confirmou os fatos 504 descritos na peça inaugural, aduzindo que “Por fim, como acabei de me lem- brar, gostaria de afirmar que, durante determinado período, entre 2006 e 2007, em três oportunidades distintas cheguei a buscar dinheiro na sede da empresa (...). com o próprio proprietário da empresa, o senhor W. Eu levava o dinheiro para o E., da mesma forma como faziam em relação ao dinheiro remetido por C. Jurisprudência - Direito Público Do que eu tomei conhecimento pelo E., havia sido ele e o M. que conseguiram os contratos da (...). com (...). Também sei que em determinado momento, o E. e o M. romperam relações com o W., mas não sei detalhes mais precisos disso.”. Destaca-se, ainda, que apesar de ter negado as imputações que lhe são feitas sob o crivo do contraditório, na fase extrajudicial o recorrente G. que de- talhou o esquema de fraudes licitatórias e corrupção relacionados aos contratos de suas empresas com a (...), de forma pormenorizada, disse que repassava di- nheiro aos corréus E. e M. e aos agentes públicos envolvidos no esquema. Nota-se, portanto, que diferentemente do sustentado pela defesa dos re- correntes está devidamente delimitada suas participações na organização crimi- nosa e nas fraudes à licitações acima apontadas” (fls. 1871/1882). Embora não tenha havido ainda o trânsito em julgado na ação criminal, pendem de julgamento somente recursos aos Tribunais Superiores, nos quais somente serão analisadas questões de direito, nos termos da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça (“A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”). Logo, perfeitamente aplicável o artigo 935 do Código Civil (“A responsabilida- de civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal”), ainda que não haja trânsito em julgado na ação penal – contudo, reitere-se, estabilizado o quadro fático. (...) Recapitulando, o que se reconheceu no processo criminal (e que se conside- ra questão fática superada nestes autos), é que: 1) a primeira requerida organizou um esquema de corrupção na Administração municipal, em especial na (...); 2) para tanto, obteve a anuência do terceiro requerido, segundo requerido e quarto reque- rido, que ocuparam cargos de direção naquela empresa; 3) o esquema consistia na “escolha” da empresa que seria declarada vencedora em licitações e na cobrança de uma “propina”, que era dividida entre os diretores da (...) e a primeira requerida; 4) especificamente nos contratos objeto dos autos, firmados com a sétima requerida, observou-se o mesmo esquema, que contou ainda com a participação de dois interme- diários, o sexto requerido e o quinto requerido, a quem também foi destinada parte da arrecadação da propina; 5) da parte da contratada, o oitavo requerido e o nono requerido participaram das negociações. Temos, portanto, que os requeridos devem ser responsabilizados por tais fatos, no âmbito da Lei 8.429/1992, restando definir as penalidades a serem aplicadas. (...) Portanto, as questões suscitadas pelos réus, quais sejam, negativa de par- ticipação no contexto narrado na inicial, invalidade do conteúdo da delação pre- miada do réu falecido L., ausência de provas materiais das fraudes noticiadas e do recebimento de propina, não comportam maiores debates, tendo em vista não apenas o quanto carreado aos autos, como também a condenação criminal havi- da nos autos nº (...), confirmada em sede de apelação, pelos mesmos fatos aqui discutidos, por formação de quadrilha, crimes contra a administração pública e crimes previstos na Lei de Licitações, o que impede a rediscussão dos fatos e sua autoria nos termos do art. 935, do Código Civil. Jurisprudência - Direito Público E, conforme bem destacou a D. Procuradoria Geral de Justiça: E ao reverso do sustentado pelos recorrentes no tocante à ausência de provas de suas participações no contexto dos fatos, salvo a versão apresentada na delação premiada, reputada ilícita por eles, houve a apresentação de provas documentais e testemunhais colhidas pelo GAECO e que conferiram lastro à narrativa trazida por L. (...) Também no processo criminal ficou bem destacado que as condenações não se deram com base unicamente na delação premiada conforme trecho daquela sentença: “No presente caso, houve diversas provas que corroboraram o depoimento do colaborador, conferindo à ele ainda mais credibilidade, verossimilhança e segurança. Deste modo, ele não é a única prova que confirma a prática dos crimes descritos na exordial. Há prova testemunhal, confissão de corréu, interceptação telefônica, captação ambiental, apreensão de dinheiro na casa de réus, CPI da Câmara Municipal reconhe- cendo as fraudes licitatórias e corrupções e rejeição pelo Tribunal de Contas do Estado de vários contratos da (...) realizados no período. Veja-se que a despeito de não ter sido possível apurar a participação de agentes públicos em eventual confecção dos editais com cláusulas restritivas voltadas ao dire- cionamento da empresa vencedora, ou ainda da colaboração de outras empresas que participaram dos certames, é certo que o contexto narrado e comprovado nos autos não deixa dúvidas sobre a existência de fraudes nos certames discutidos, porque ins- talado um permanente e retroalimentado esquema de corrupção, dentre outros delitos, suficiente para a manutenção da condenação dos réus, com o total afastamento das alegações recursais no sentido de ausência de provas. (...) O dolo dos réus é patente e exsurge da própria conduta, tanto dos destina- tários da propina, incluindo os lobistas porque figuravam como intermediários do plano, como dos particulares, que assim agiram visando benefícios em con- tratações com a (...), porque não se submetiam ao regular processo licitatório com ampla concorrência dada o vício que contaminavam os certames e ampla- mente narrados nesta demanda. Observa-se que, quanto à aplicação das sanções, os particulares benefi- ciários do contrato foram condenados com base no artigo 11 da LIA, porque compreendeu o julgador que não houve enriquecimento ilícito de sua parte. Contudo, como discorreu a D. Procuradoria Geral de Justiça, “Ocorre que o projeto improbo somente foi exitoso a partir da participação dos particulares em questão, daí a conclusão que somente com as suas colaborações mediante o pagamento da propina, foi possível o enriquecimento ilícito dos demais réus ao lado da frustração ao certame licitatório.”. Dessa forma, bem caracterizados o ato de todos os réus como de improbi- dade administrativa, nos termos dos artigos 9, inciso I, da Lei 8429/92: Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriqueci- mento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem pa- 506 trimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gra- Jurisprudência - Direito Público tificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público; (...). Quanto às penalidades, dispõe o art. 12, parágrafo único, da Lei nº 8429/92 que “na fixação das penas previstas na lei, o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente”. Tomando como base o referido comando legal, tem-se que a imposição das sanções elencadas para os atos de improbidade administrativa deve ser ra- zoável, isto é, adequada, sensata, coerente em relação ao ato ímprobo cometido pelo agente público e suas circunstâncias, e proporcional, ou seja, compatível, apropriada, pertinente com a gravidade e a extensão do dano causado por ele. Alexandre de Moraes, dentre outros, adota essa acepção: “Entendemos que o rol de sanções previstas no artigo 12 da lei não deverá ser, obrigatoriamente, aplicado de forma cumulativa, ou seja, o Poder judiciário não estará vinculado, abstratamente, à aplicação de todas as sanções em todas as hipóteses de ato de improbidade administrativa, pois em virtude do princípio da individualização da pena consagrado constitucionalmente no inciso XLVI, do artigo 5º, exige-se uma estreita correspondência entre a responsabilização da conduta do agente e a sanção a ser aplicada, de maneira que a pena atinja suas finalidades de prevenção e repressão. Dessa forma, a imposição da pena depende do juízo individualizado da culpa- bilidade do agente (censurabilidade de sua conduta), permitindo ao magistrado que no caso concreto opte pela aplicação de todas as sanções previstas no artigo 12, ou somente por alguma delas, em respeito ao princípio da razoabilidade anteriormente analisado. Portanto, a aplicação cumulativa, parcial ou isolada das sanções arroladas no art. 12 da LIA subordina-se aos princípios constitucionais da razoabilidade e propor- cionalidade. Assim sendo, exigem que o Magistrado, no momento da aplicação das sanções previstas na LIA, à luz do caso concreto, limite-se àquelas estritamente neces- sárias (razoáveis e proporcionais) para alcançar, com justiça, os fins almejados pela LIA, sendo defeso a ele, pois, a mera aplicação objetiva e automática de sanções em bloco”1. Desta forma, tendo em vista o caso concreto e suas circunstâncias, a cul- pabilidade do agente, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e os fins almejados pela LIA, entendo que a r. sentença aplicou corretamente as sanções, em coerência com a gravidade do ato ímprobo cometido, sendo neces- sárias à inibição da reiteração da conduta. Contudo, deve-se observar que o artigo 12, inciso I, com a atual redação conferida pela Lei 14.230/21 prevê que o pagamento da multa civil seja fixado com base no acréscimo patrimonial, de modo que sob este aspecto, merece pe- queno reparo a r. sentença, assim como, no tocante aos particulares condená-los, 1 Lei de Improbidade Administrativa Comentada, 3ª ed., 2007, São Paulo, Atlas, p. 156. nos termos do artigo 3º, da LIA, como incursos no artigo 9º, inciso I, da LIA, aplicando as seguintes penas do artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.429/1992: - condenar a requerida (...) ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do acréscimo patrimonial e à proibição de contratar com o poder público Jurisprudência - Direito Público ou dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indire- tamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majori- tário, pelo prazo de três anos; - condenar o requerido G. ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do acréscimo patrimonial e à proibição de contratar com o poder público ou dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indire- tamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majori- tário, pelo prazo de três anos; - condenar o requerido J. ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do acréscimo patrimonial e à proibição de contratar com o poder público ou dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indire- tamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majori- tário, pelo prazo de três anos. No mais, anote-se que, conforme destacou o juiz a quo: Embora, logicamente, se houve fraude à licitação, a declaração de nulidade do contrato seja consequência necessária, não há no caso qualquer utilidade prática em declará-la. O contrato foi executado regularmente, não havia sobrepreço e o pagamento foi efetuado normalmente pela (...) (ao menos nada em sentido contrário é alegado na inicial). O terceiro requerido, ao delatar o esquema de corrupção ao M. P., afirmou que “Não havia superfaturamento dessas obras. Para as empresas, era vantagem ganhar a licitação, executar os contratos e repassar os percentuais previamente acordados, pois tinham a certeza da vitória nas concorrências. O repasse de 5% (cinco por cento) a 7% (sete por cento) para a Administração certamente já estava embutido nos custos da obra” (fls. 214). Deixa-se, portanto, de declarar a nulidade dos contratos. Consequentemente, não é devida, pela contratada, a devolução do valor recebido, mesmo porque o serviço foi corretamente prestado e o valor era devido. Embora se reconheça ter havido recebimentos indevidos pelos requeridos agen- tes públicos, os valores não são precisos. Considera-se, desta forma, um patamar mí- nimo equivalente a três por cento do valor dos contratos, devido solidariamente pela primeira requerida, segundo requerido, terceiro requerido, quarto requerido, quinto requerido e sexto requerido (a petição inicial menciona um percentual de dez por cento, a ser dividido entre os envolvidos, porém em percentuais que variaram ao longo do tempo, tendo sido alterada em data incerta a divisão, de modo que o patamar de três por cento se mostra, dentro de um critério de razoabilidade, plausível com o benefício mínimo recebido por cada um). As demais penalidades são em princípio devidas, cumulativamente, ante a gra- vidade da conduta. Somente não se cogita de perda de cargo ou função pública, que não consta nenhum dos requeridos exerça atualmente. A conduta atribuída aos agentes públicos que receberam valores indevidamente, bem como dos intermediários, é a do artigo 9º, I, da Lei 8.429/1992; (...). Pondera-se, porém, as penas do terceiro requerido, cuja delação foi essencial para que se pudesse desarticular a organização criminosa. Embora a delação tenha se dado nos autos do processo criminal (o acordo de Jurisprudência - Direito Público não persecução cível somente foi incluído no ordenamento jurídico anos mais tarde, pela Lei 13.964/2019), deve tal acordo surtir efeitos neste processo. Desonero o terceiro requerido, pois, da multa civil, mantendo as demais penali- dades em seu patamar mínimo. Ante o exposto, pelo meu voto, não conheço do recurso de apelação in- terposto pelo corréu M.; dou provimento em parte ao “recurso” dos herdeiros de L.; nego provimento aos recursos dos demais corréus; e, dou provimento em parte ao recurso do M. P. do E. de S. P. para o fim de se observar que o artigo 12, inciso I, com a atual redação conferida pela Lei 14.230/21 prevê que o paga- mento da multa civil seja fixado com base no acréscimo patrimonial, de modo que sob este aspecto, merece pequeno reparo a r. sentença; bem como condenar os particulares, nos termos dos artigos 3º, 9º, I e 12, I, da LIA, nos termos acima