Decisão 1011296-72.2024.8.26.0127

Processo: 1011296-72.2024.8.26.0127

Recurso: Apelação

Relator: ÁLVARO TORRES JÚNIOR

Câmara julgadora:

Data do julgamento: 12 de junho de 2025

Ementa Técnica

APELAçãO – RESPONSABILIDADE CIVIL - Indeni- zação - Operações bancárias realizadas na conta corrente do autor por fraudadores - Golpe da falsa central de atendimento - Documentos exibidos com a própria petição inicial não condizem com a afirmação genérica de o autor ter sido vítima de fraude - Banco réu enviou alertas de suposta ocorrência de fraude ao autor antes de concluídas as transferências bancárias - Falta de cautela do autor que foi definitiva para a conclusão da fraude cometida por terceiro - Ação im- 313 procedente - Sentença reformada - Inversão dos en- cargos de sucumbência - Recurso provido. Jurisprudência - Direito Privado(TJSP; Processo nº 1011296-72.2024.8.26.0127; Recurso: Apelação; Relator: ÁLVARO TORRES JÚNIOR; Data do Julgamento: 12 de junho de 2025)

Voto / Fundamentação

, em sessão permanente e virtual da 20ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “De- ram provimento ao recurso. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. (Voto nº 57.979) O julgamento teve a participação dos Desembargadores ROBERTO MAIA (Presidente) e REBELLO PINHO. São Paulo, 12 de junho de 2025. ÁLVARO TORRES JÚNIOR, Relator


Ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL - Indeni- zação - Operações bancárias realizadas na conta corrente do autor por fraudadores - Golpe da falsa central de atendimento - Documentos exibidos com a própria petição inicial não condizem com a afirmação genérica de o autor ter sido vítima de fraude - Banco réu enviou alertas de suposta ocorrência de fraude ao autor antes de concluídas as transferências bancárias - Falta de cautela do autor que foi definitiva para a conclusão da fraude cometida por terceiro - Ação im- 313 procedente - Sentença reformada - Inversão dos en- cargos de sucumbência - Recurso provido. Jurisprudência - Direito Privado





VOTO

1. Recurso de apelação contra a sentença que julgou procedente em parte esta ação declaratória c. c. indenização nos termos seguintes (cf. fls. 119-123): “Enfim, isto posto, com fundamento no artigo 487, I, do nCPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na peça vestibular, DECLARANDO a inexistência e inexigibilidade do(s) débito(s) descritos na peça vestibular, e demonstrados na documentação trazida aos autos, e conde- nar o réu a restituir ao autor, de forma simples, os valores indevidamente debi- tados, a serem apurados em liquidação de sentença, com correção monetária a partir de cada desembolso e juros de mora a contar da citação; além de também condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com correção monetária a partir desta data (arbitra- mento) e juros de mora a contar da citação. Salvo previsão contratual em sentido contrário e a ser observada, a atua- lização do valor deverá obedecer às seguintes variáveis: a) até 27/08/2024 (inclusive), a correção monetária deve se dar pela Ta- bela Prática do TJSP e os juros de mora são de 1% a.m.; b) a partir de 28/08/2024 (início da vigência da Lei n. 14.905/2024, art. 5º, II), os encargos são devidos com correção monetária pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, do Código Civil) e com juros de mora pela diferença entre a SELIC e o IPCA (art. 406 do Código Civil), considerando 0 (zero), para efeito de cálculo dos juros no período de referência, caso a taxa legal (SELIC subtraí- da pelo IPCA) apresente resultado negativo. Em razão da sucumbência recíproca, cada parte arcará com 50% (cin- quenta por cento) das custas e despesas processuais totais; recaindo sobre cada uma das partes o ônus sucumbencial destinado ao patrono da parte adversa em montante que fixo, por equidade, nos termos do artigo 85, §§ 2º e 8º, do nCPC, no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais).”. Alega o Banco recorrente que a fraude ocorreu por culpa exclusiva do autor que seguiu orientação dos estelionatários e usou o “token”, com senha pessoal, para finalizar as operações financeiras; diz que toma todas as providên- cias para evitar todo tipo de fraude, todavia não foi possível detectar o ocorrido, tratando-se de fortuito externo com culpa concorrente do autor. Recurso tempestivo, bem processado e não contrariado. 1.1. Como se observa do boletim de ocorrência policial juntado aos autos a fls. 16-17, o autor foi vítima de estelionatários que o ludibriaram, pois se pas- saram por prepostos do Banco réu, levando-o a realizar operações que culmina- ram na transferência indevida de valores a contas de terceiros e contratação de 314 mútuo (empréstimo pessoal). O Banco réu contestou e afirmou ter sido diligente, pois há ampla divul- gação em seu site sobre meios de prevenção a tais golpes; afirmou haver culpa exclusiva da vítima e de terceiros, o que afasta a sua responsabilidade pela frau- Jurisprudência - Direito Privado de ocorrida. A sentença concluiu que as provas eram favoráveis à tese do autor, mas as alegações da petição inicial mostram-se confusas e os documentos que ele trouxe aos autos revelam ter agido de modo temerário. Os “prints” das mensagens que o autor recebeu no aplicativo “whatsapp” denotam que antes de finalizadas as transações foram emitidos alertas de se- gurança (cf. fls. 19-26): “Olá, JUAREZ. Vi aqui um PIX pelo Bradesco Celular na sua conta final 319. Ele ain- da está em análise. Dados da transação R$ 18.000,00 para PAULO CESAR PECIN DOS SANTOS, às 19:39 de 05/03/2024. Você reconhece?.” (cf. fl. 24). E o autor confirmou: “Sim, reconheço.” (cf. fl. 23). Ele repetiu esse procedimento no dia seguinte, com um PIX de R$ 12.500,00 para esse mesmo terceiro (cf. fl. 25). Ora, diante dos elementos informativos apresentados pelo Banco réu, exi- gia-se algo mais do autor, além da simples alegação de que foi vítima de fraude e de que há responsabilidade objetiva do Banco por não ter bloqueado as transa- ções supostamente fora de seu perfil de consumo. Conquanto a relação havida entre as partes esteja subordinada ao CDC, não há nexo de causalidade entre o prejuízo financeiro sofrido pelo autor e o serviço prestado pelo Banco réu, que não pode ser condenado ao pagamento de indenização. O réu não falhou no seu serviço porque o golpe foi praticado por terceiro e concluído por falta de cautela do próprio autor - este forneceu, espontanea- mente, seus dados bancários e informações aos fraudadores que finalizaram as transações bancárias (transferências de valores via PIX). Segundo a petição inicial, o golpe decorreu de ligação, por golpista que se passava por funcionário do Banco réu, oportunidade em que o autor foi in- formado que precisaria fazer alguns procedimentos em sua conta bancária como medida de segurança. Houve, contudo, mera narrativa, sem qualquer prova de vazamento de dados pessoais do autor ou indícios que os valores transferidos destoavam do histórico de transações bancárias do autor. A própria contratação do empréstimo pessoal e os supostos gastos no car- 314 tão de crédito foram impugnados de forma genérica. O autor não trouxe extratos bancários de outros meses, mas apenas apresentou um extrato parcial de apenas dois dias do mês de março de 2024 (cf. fls. 29-30). Jurisprudência - Direito Privado A propósito: “Não existe responsabilidade, dever de indenizar, se não houver dano, culpa e nexo causal. O dano estará justificado e, em princípio não surgirá obrigação de indenizar quando ocorrer inimputabilidade do agente ativo, inculpabilidade por vontade viciada em decorrência de erro ou violência, interrupção do nexo causal por caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima (...)” (cf. Antônio Jeová Santos, Dano Moral Indenizável, ed. Lejus, 2.ª ed., p. 79). Embora objetiva a responsabilidade do prestador de serviço (cf. 14, “caput”, do CDC), a sua condenação pode ser afastada mediante prova de que “o defeito inexiste” (cf. § 3º, I daquele dispositivo legal), ou que o serviço foi prestado apropriadamente, ou ainda que teria ocorrido culpa exclusiva do con- sumidor ou de terceiros. Foi o que ocorreu aqui, pois não há dúvida da culpa exclusiva do autor e do terceiro fraudador, o que consubstancia causa excludente de responsabilida- de do prestador de serviço, no caso, do Banco réu. E não é possível, diante destas circunstâncias do caso concreto, a inversão do ônus probatório na forma do art. 6º, VIII, do CDC e automática transferência do risco da operação envolvida ao Banco réu apenas com base nas alegações do apelado. Assim, não é possível o reconhecimento de responsabilidade do Banco réu pelos prejuízos do autor. Neste cenário, e sobretudo por haver prova dos alertas de segurança que foram enviados pelo Banco ao autor antes da finalização das transfe- rências bancárias (que foram realizadas mediante o uso de senha pessoal), a ação é improcedente. 1.2. Reforma-se a sentença, julga-se improcedente esta ação e condena-se o autor a pagar as custas processuais e os honorários do advogado do Banco réu, arbitrados em 10% sobre o valor da causa. 3. Posto isso, o meu voto dá provimento ao recurso.