Decisão 1022079-50.2022.8.26.0562

Processo: 1022079-50.2022.8.26.0562

Recurso: Apelação

Relator: Antonio Celso Faria, Comarca: São Paulo, Órgão julgador: 8ª Câmara de

Câmara julgadora: Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça

Data do julgamento: 29 de abril de 2025

Ementa Técnica

APELAçãO – APELAÇÕES – Embargos à execução fiscal – ICMS – Preliminar de cerceamento de defesa afas- tada – Contrato de Afretamento por tempo – Moda- lidade contratual que implica em locação de embar- cação tripulada, ficando a fretadora responsável pela gestão náutica e a afretadora pela gestão comercial – Contrato que pode englobar negócios acessórios que não podem ser cindidos para fins de tributação – Au- sência de simulação por parte das contratantes – Pre- visões contratuais que alteram algumas obrigações inerentes às posições de fretadora e afretadora que não são suficientes para descaracterizar o afretamen- to – Ausência de elementos que caracterizem o con- trato de transporte – Tributação sobre o fornecimen- to do combustível pela contratante, PETROBRAS, à empresa fretadora – Não configurado o autoconsumo de combustível aquaviário, pois os navios pertencem a empresa distinta – ICMS devido – Convenção parti- cular que não é oponível à Fazenda Pública para fins de afastar a incidência do imposto – Honorários advo- catícios – Sucumbência recíproca reconhecida corre- tamente – Não comprovação da desproporcionalidade do quantum fixado – Escalonamento que tem previsão 389 legal e não precisa constar expressamente – Sentença mantida – Recursos não providos.(TJSP; Processo nº 1022079-50.2022.8.26.0562; Recurso: Apelação; Relator: Antonio Celso Faria, Comarca: São Paulo, Órgão julgador: 8ª Câmara de; Data do Julgamento: 29 de abril de 2025)

Voto / Fundamentação

, em 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Nega-se provimento ao recurso”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. (Voto nº 53.998) O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores KLE- BER LEYSER DE AQUINO (Presidente sem voto), CAMARGO PEREIRA e ENCINAS MANFRÉ. São Paulo, 29 de abril de 2025. JOSÉ LUIZ GAVIÃO DE ALMEIDA, Relator


Ementa: APELAÇÕES – Embargos à execução fiscal – ICMS – Preliminar de cerceamento de defesa afas- tada – Contrato de Afretamento por tempo – Moda- lidade contratual que implica em locação de embar- cação tripulada, ficando a fretadora responsável pela gestão náutica e a afretadora pela gestão comercial – Contrato que pode englobar negócios acessórios que não podem ser cindidos para fins de tributação – Au- sência de simulação por parte das contratantes – Pre- visões contratuais que alteram algumas obrigações inerentes às posições de fretadora e afretadora que não são suficientes para descaracterizar o afretamen- to – Ausência de elementos que caracterizem o con- trato de transporte – Tributação sobre o fornecimen- to do combustível pela contratante, PETROBRAS, à empresa fretadora – Não configurado o autoconsumo de combustível aquaviário, pois os navios pertencem a empresa distinta – ICMS devido – Convenção parti- cular que não é oponível à Fazenda Pública para fins de afastar a incidência do imposto – Honorários advo- catícios – Sucumbência recíproca reconhecida corre- tamente – Não comprovação da desproporcionalidade do quantum fixado – Escalonamento que tem previsão 389 legal e não precisa constar expressamente – Sentença mantida – Recursos não providos.





VOTO

Jurisprudência - Direito Público Trata-se de embargos à execução fiscal opostos pela Petróleo Brasileiro S.A. contra o Estado de São Paulo. Diz a inicial que a embargante foi autuada (AIIM nº 4.045.095-8) em razão do não pagamento de ICMS no valor de R$ 2.309.424,97 no período de janeiro a dezembro de 2011. Sustentou que fretou navios na modalidade por tempo (time charter party) para movimentar petróleo e seus derivados, exportar, importar e buscar nos seus campos de produção em alto-mar o petróleo. Apontou que contratualmente cabe aos afretadores a res- ponsabilidade pelo abastecimento da embarcação, logo, é detentora de ambos os papeis, produtora e afretadora, razão pela qual promove os abastecimentos de combustíveis produzidos e consumidos pela mesma empresa, o que não confi- gura fato gerador do ICMS, pois se trata de autoconsumo. Ponderou que a Fesp está equivocada ao entender que o afretamento de navio por tempo constitui uma prestação de serviço de transporte e que houve compra e venda de com- bustível. Aduziu que o contrato de afretamento tem tratamento específico em lei especial e não está sujeito a tributação. Defendeu que o contrato de afretamento não se confunde com contrato de transporte, na medida em que seu objeto é a exploração comercial e a disponibilidade do navio (através de aluguel/locação do bem, do navio), que sempre será individualizado. Afirmou que a disponibi- lização de bunker (óleo combustível marítimo) para que os navios objeto de afretamento circulem, também não pode ser tributada, pois não há a obtenção de combustível de terceiro, nem alienação para o armador ou fretador, ou seja, não existe circulação de mercadoria. Disse que o fornecimento para consumo interno não está sujeito ao ICMS. Argumentou, ainda, que não há tributação no caso de operações ocorridas entre estabelecimentos do mesmo contribuinte. Alegou a aplicação de juros de mora inconstitucionais. Apontou que a multa só é devida depois do dia 10 do mês subsequente para o cálculo dos juros. Pediu a anulação do AIIM nº 4.045.095-8 ou, subsidiariamente, o recálculo dos juros de mora e da multa. Foi concedido o efeito suspensivo aos embargos (fl. 1377). Citada, a Fesp impugnou (fls. 1381/1398), alegando que o “contrato de afretamento” foi apenas o nomen juris utilizado pela embargante e sua contra- tante, de modo a camuflar um contrato de transporte, e com isso eludir o paga- mento do ICMS Transporte. Sustentou que em relação à modalidade alegada- mente contratada só não haverá incidência de ICMS quando o afretador utiliza o navio e sua tripulação para entregar cargas de terceiros, mas incide o tributo quando a própria interessada no transporte contrata o serviço, para seu próprio uso, sendo que o seu objeto social predominante é outro. Apontou que o negócio 390 simulado é nulo. Ponderou que apesar de constar como objeto social da embar- gante a navegação, é fato notório que sua atividade é petrolífera. Aduziu que, no caso, não foi a embargante, afretadora, que assumiu a responsabilidade pela es- tiva, já que a Transpetro se responsabilizou objetivamente por qualquer dano ou Jurisprudência - Direito Público prejuízo decorrente da execução do contrato, ou seja, quem exercia a atividade de navegação e arcava com os riscos do empreendimento, mesmo aqueles que não decorressem de culpa, era a Transpetro. Defendeu que a operação envolveu duas pessoas jurídicas distintas. Afirmou a regularidade da multa aplicada. Réplica, às fls. 1405/1415. Os embargos foram acolhidos em parte (fls. 1422/1441) pela juíza Pa- tricia Naha, para compelir a Fesp a apresentar memória atualizada do crédito mencionado na CDA nº 1.339.040.142 apurado no AIIM nº 4.045.095-8, com recálculo dos juros moratórios que não devem exceder à taxa SELIC, bem como para que os débitos referidos na inicial não sejam óbice à emissão de certidão positiva de débitos com efeitos de negativa, abstendo-se a Fesp de incluir o nome da embargante no CADIN e lançar protesto pela dívida, considerando a garantia ofertada e desde que o valor nela constante, seja suficiente para abran- ger o principal e acessórios dos créditos tributários. Sucumbência recíproca reconhecida, ficando as partes condenadas ao rateio das custas e despesas pro- cessuais, bem como ao pagamento dos honorários advocatícios ao patrono da parte contrária, fixados em desfavor da Fesp em percentual mínimo do proveito econômico (diferença referente aos juros acima da SELIC), previsto no artigo 85, §3, do Código de Processo Civil, e em desfavor da embargante em 10% sobre o valor da causa atualizado. Foram opostos embargos de declaração pela embargante e pela Fesp (fls. 1444/1446 e 1448/1450), que foram rejeitados (fls. 1452). Insatisfeita, apelou a Fesp (fls. 1456/1464), alegando a inexistência de sucumbência recíproca, pois perdeu em parte mínima. Subsidiariamente, requer a minoração dos honorários advocatícios fixados, pois desproporcionais ao tra- balho realizado. Insatisfeita, também apelou a embargante (fls. 1466/1479), alegando, preliminarmente, o cerceamento de defesa, pois a prova pericial se mostra im- prescindível para definir se o contrato de afretamento sob a modalidade de time charter party (TCP) realizado tem natureza jurídica das saídas de produtos para abastecimento desses navios: consumo interno (sem ICMS) ou operações de venda (com ICMS). No mérito, repete os argumentos alegados na petição inicial no sentido de que o contrato em questão não permite a incidência do ICMS. Aponta que era a responsável pela operação das embarcações afretadas e pelo abastecimento delas. Pondera que o ônus para o fornecimento de combustível para as embarcações afretadas por tempo à embargante não resulta de uma con- venção celebrada entre particulares, as do artigo 2º, II, da Lei nº 9.432/1997. Aduz que há previsão no contrato de que ao final, a fretadora voltará a ter a posse da embarcação que estava afretada, e se, neste momento, houver uma quantidade maior de combustível marítimo daquela que havia no início do ajus- te, a fretadora irá pagar pelo combustível excedente, operação em que haverá Jurisprudência - Direito Público incidência regular de ICMS, na medida em que, ao término do contrato, deixou ocorrer o autoconsumo. Recursos tempestivos e contrariados (fls. 1486/1491 e 493/1498). É o relatório. A embargante alega preliminarmente a ocorrência de cerceamento de de- fesa, uma vez que não foi oportunizada a realização de perícia técnica para esclarecer como são feitas as operações de afretamento, com descrição de suas particularidades e práticas de mercado. Entretanto, o cerceamento não pode ser reconhecido, pois as provas docu- mentais produzidas nos autos se mostraram suficientes para que o juiz pudesse analisar os fatos apresentados na inicial e impugnados, formando a sua convic- ção. De fato, a decisão de proferir julgamento antecipado se mostrou acertada, pois embora a embargante afirme a necessidade de perícia para esclarecer sua operação, tal pode ser apreendido da análise dos termos do contrato firmado com a Transpetro. Aliás, quando a Fesp alega que a embargante simulou contrato de afreta- mento por tempo para camuflar um contrato de transporte e obstar a cobrança de ICMS, o faz mediante a análise das cláusulas contratuais, o que confirma a desnecessidade de perícia técnica. Assim, os documentos juntados aos autos são suficientes para a análise da questão controvertida, mostrando-se desnecessária a realização de perícia técnica. Superada a preliminar, passa-se ao mérito. Consta dos autos que a Petrobras foi autuada (AIIM nº 4.045.095-8) em razão do não pagamento de ICMS no valor de R$ 2.309.424,97, referente ao período de janeiro a dezembro de 2011, em operações de saída de combustíveis destinados a embarcações afretadas na modalidade time charter party – TCP, entendendo que esta modalidade de afretamento constitui prestação de serviço de transporte. A apelante, por sua vez, pretende a anulação do AIIM sob o argumento de que o contrato de afretamento não é contrato de transporte, mas um contrato sui generis, além do fornecimento de combustíveis aos navios afretados constituir consumo interno, não tributável. As modalidades de afretamento estão previstas na Lei nº 9.432/1997, que assim dispõe: 392 “Art. 2º Para os efeitos desta Lei, são estabelecidas as seguintes defini- ções: I - afretamento a casco nu: contrato em virtude do qual o afretador tem a posse, o uso e o controle da embarcação, por tempo determinado, incluin- Jurisprudência - Direito Público do o direito de designar o comandante e a tripulação; II - afretamento por tempo: contrato em virtude do qual o afretador recebe a embarcação armada e tripulada, ou parte dela, para operá -la por tempo determinado; III - afretamento por viagem: contrato em virtude do qual o fretador se obriga a colocar o todo ou parte de uma embarcação, com tripulação, à disposição do afretador para efetuar transporte em uma ou mais viagens.” Ao que se vê, o contrato de afretamento não se confunde com o contra- to de transporte pois seu objeto é a locação de uma embarcação tripulada. No afretamento ocorre a transferência da posse da embarcação ao contratante para o uso do navio, enquanto no contrato de transporte não há transferência, perma- necendo a posse do navio com o seu proprietário, que é quem realiza a condução de pessoas ou bens de acordo com a vontade do afretador. Em outras palavras, a afretadora recebe a embarcação tripulada sem se responsabilizar pela gestão náutica (navegabilidade), se limitando a realizar a gestão comercial, conforme definido na Resolução nº 1811/2010 – ANTAQ: “Art. 2º - Para os efeitos desta norma consideram-se: I- gestão náutica da embarcação: é o controle efetivo pela empresa bra- sileira de navegação sobre a administração dos fatos relativos ao aprovi- sionamento, equipagens, à navegação, estabilidade e manobra do navio, à segurança do pessoal e do material existente a bordo, à operação técnica em geral, ao cumprimento das normas nacionais e internacionais sobre segurança, prevenção da poluição do meio ambiente marinho e direito marítimo, e à manutenção apropriada da embarcação; II- gestão comercial da embarcação: é o controle efetivo pela empresa brasileira de navegação sobre a negociação de contratos de transporte ou de operações de apoio marítimo e portuário, inclusive o adimplemento das obrigações comerciais assumidas nas esferas pública e privada; (...) Art. 3º - Para os fins do disposto no artigo 2º desta Norma, no afretamento a casco nu, ter o controle da embarcação significa ter as gestões náutica e comercial da embarcação; no afretamento por tempo ou período, cabe ao fretador a gestão náutica da embarcação e ao afretador a sua gestão comercial.” Não se pode ignorar, ademais, que no caso de afretamento por tempo, além da locação da embarcação são agregados outros negócios acessórios que não podem ser cindidos para fins de tributação. Nesse sentido já decidiu o Supremo Tribunal Federal: “Os contratos de afretamento por tempo ou por viagem são complexos porque, além da locação da embarcação, com a transferência do bem, há a prestação de uma diversidade de serviços, dentre os quais se inclui Jurisprudência - Direito Público a cessão de mão-de-obra. Trata-se, portanto, de um contrato sui generis, que se adequa perfeitamente ao preconizado na jurisprudência desta Cor- te, segundo a qual os contratos complexos não devem ser desmembrados para fins fiscais.” (REsp 792.444/RJ, Segunda Turma, Rel. Min.ª ELIA- NA CALMON, j. 06/09/2007, DJ 26/09/2007, p. 207). Portanto, considerando as características do contrato de afretamento, po- de-se concluir que ocorre apenas a cessão da posse da embarcação, o que não configura circulação de mercadoria nem transporte de bens, razão pela qual tal avença não está sujeita à incidência de ICMS. Resta saber se a embargante de fato firmou um contrato de afretamento por tempo, ou apenas simulou a avença para mascarar um contrato de transpor- te, como alega a Fesp. Depreende-se do contrato firmado entre a embargante e a TRANSPETRO (fls. 1073/1137) o seguinte: “1.1. O presente CONTRATO tem por objeto o afretamento por perío- do, pela PETROBRAS, dos navios da TRANSPETRO relacionados no Anexo 1. (...) CLÁUSULA SEGUNDA – OBRIGAÇÕES DA TRANSPETRO 1.1. A TRANSPETRO obriga-se a: (...) 1.1.4. Tomar todas as providências, antes e no momento da entrega de cada navio sob este CONTRATO, para que o mesmo esteja: a) em todos os aspectos, apropriado para carregar as respectivas cargas descritas no Anexo 2; b) firme, estanque, forte, em bom estado e em boas condições, em todos os aspectos adequado para o atendimento do afretamento, com seus equi- pamentos, caldeiras e casco em tais condições, que permitam a operação mais econômica, e com plena e eficiente equipe de Comandante, oficiais e tripulação para um navio de seu porte. 1.1.5. Tomar todas as providências para manter ou restaurar o navio como acima descrito, sempre que a passagem do tempo, desgaste ou qualquer outro evento requeira ações nesse propósito. (...) 2.1.11. Diligenciar para que a carga seja embarcada e desembarcada tão rapidamente quanto possível, tanto de noite como de dia, independente- mente de solicitação da PETROBRAS ou de seus agentes. 2.1.12. Tomar as ações compatíveis com a garantia de que o Comandante realizará suas viagens com a máxima presteza e fornecerá toda a assis- 394 tência razoável ao bom desempenho da operação, em conjunto com os oficiais, tripulantes e equipamentos do navio. (...) 2.1.16. Obedecer às determinações legais ou emanadas das autoridades Jurisprudência - Direito Público constituídas, sendo a única responsável pelas providências necessárias e pelos efeitos decorrentes de eventual inobservância delas. 2.1.17. Responder por qualquer dano ou prejuízo causado a terceiros, em decorrência da execução do presente CONTRATO, e à PETROBRAS, nos termos deste instrumento. (...) 2.1.19. Responder pela supervisão, direção técnica e administrativa e mão-de-obra necessárias à execução do CONTRATO, como única e ex- clusiva responsável. (...) 3.1. PETROBRAS se obriga a: (...) 3.1.2. Fornecer as instruções relativas à gestão comercial do navio. (...) 3.1.5. Fornecer e pagar os combustíveis necessários à operação do navio, quando a serviço da PETROBRAS. (...) CLÁUSULA DÉCIMA ENTREGA E DEVOLUÇÃO DO NAVIO 1.1. Por ocasião da entrega do navio, a PETROBRAS e a TRANSPE- TRO farão uma vistoria conjunta no navio, seus equipamentos, sistemas, documentos, bem como sondagens em seus tanques de carga, lastro, com- bustível, óleo diesel, água potável e em todos os compartimentos julgados necessários, a fim de verificar e registrar as condições em que o navio está sendo entregue pela TRANSPETRO à PETROBRAS. 10.2 Ao término deste CONTRATO, o navio deverá ser devolvido com a mesma quantidade de combustível que nele havia quando de sua entrega. (...) CLÁUSULA DÉCIMA TERCEIRA PROCEDIMENTOS ESPECÍ- FICOS 13.1. No que concerne apenas ao gerenciamento comercial do navio, o Comandante estará sob as ordens da PETROBRAS no que se refira ao emprego do navio e relacionamento com agências e outras entidades liga- das ao transporte de carga. 13.2. A PETROBRAS encaminhará à TRANSPETRO direcionadas apenas ao comandante do navio, as instruções necessárias à realização de cada viagem. 13.2.1. Os portos de descarga e as condições para entrega da carga são de responsabilidade da PETROBRAS, devendo o Comandante acatar todas as ordens e instruções da PETROBRAS a esse respeito. (...) 13.5. Os estivadores, quando requeridos, deverão ser contratados e pagos pela PETROBRAS, cabendo, todavia, à TRANSPETRO a responsabi- lidade, em tempo integral, pela realização da estivagem adequada, a ser controlada pelo Comandante, que deverá manter um rígido controle de Jurisprudência - Direito Público toda a carga carregada e descarregada.” Analisando o contrato é possível dizer que a apelante ficou responsável pela gestão comercial e a TRANSPETRO pela gestão náutica, embora em al- guns pontos as partes tenham convencionado de maneira diversa. No caso da estiva, por exemplo, embora esteja relacionada à gestão co- mercial, foi atribuída à PETROBRAS a contratação e à TRANSPETRO a res- ponsabilidade, em tempo integral, pela realização da estivagem. Também assumiu a TRANSPETRO a responsabilidade pelos danos ou prejuízos decorrentes do contrato (Cláusula 2.1.17). Por outro lado, a apelante acabou por assumir a responsabilidade pelo abastecimento da embarcação com o combustível necessário, embora tal ques- tão se refira à gestão náutica. Tais previsões contratuais, contudo, não são suficientes para descaracte- rizar o afretamento por tempo, vez que sua essência permanece no restante da avença, ou seja, há a locação da embarcação tripulada para que a afretadora a opere por tempo determinado. Assim, não há como reconhecer o desvirtuamento da contratação, inexis- tindo elementos que caracterizem o contrato de transporte. Já no que concerne à incidência de ICMS sobre o combustível fornecido pela embargante, razão assiste à Fesp. Conforme apontado anteriormente, o afretamento não implica na trans- ferência da propriedade do navio, mas apenas de sua operação por um tempo determinado por um terceiro. Sendo assim, ainda que as partes tenham convencionado que o combus- tível necessário para as operações seria fornecido pela PETROBRAS, produto- ra do combustível náutico, não se pode reconhecer autoconsumo se os navios abastecidos permanecem sendo de pessoa jurídica diversa, qual seja a TRANS- PETRO. Em verdade, o intuito das partes ao convencionarem que a produtora do combustível fosse a responsável pelo abastecimento dos navios alugados, e não o contrário como ocorreria, já que o fornecimento dos meios para a navegabi- lidade é de responsabilidade da fretadora, foi mascarar o contrato de compra e venda a ser realizado se a TRANSPETRO fornecesse o combustível. Ao se sub-rogar nessa obrigação, a PETROBRAS, afretadora, pretendia ter confundido o seu papel de credora e devedora na mesma pessoa, evitando a incidência do ICMS sobre a operação. A alteração, por convenção, das responsabilidades tributárias inerentes ao contrato de afretamento, contudo, não são oponíveis à Fazenda Pública, confor- 396 me disposto no artigo 123 do CTN: “Art. 123 Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particula- res, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito Jurisprudência - Direito Público passivo das obrigações tributárias correspondentes.” Portanto, mostra-se correta a autuação, já que a compra do combustível pela afretadora implicaria na incidência do ICMS. Nesse sentido já decidiu esse Tribunal de Justiça: “PROCESSO CIVIL – Pedido de anulação da sentença, mediante alega- ção de que a decisão é “citra” e “ultra petita” – Não ocorrência. A fun- damentação do d. Magistrado “a quo” não configura nulidade insanável, pois, pela análise da decisão recorrida, é possível se notar que houve pronunciamento específico sobe o pedido de não incidência de ICMS sobre as operações de fornecimento de óleo combustível (pela Petrobrás), para os navios afretados. APELAÇÃO – AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL – ICMS – Contrato de Afretamento na modalidade “Time Charter Party” (TCP) – Modalidade contratual que implica em transporte e prestação de serviço por parte da fretadora, que se obriga a prestar o serviço de gestão náutica, fornecendo, para tanto, a tripulação e o aprovisionamento. Questão a ser analisada neste feito: Fornecimento do combustível pela contratante, PETROBRAS, à empresa fretadora, que deixa de recolher o referido tributo na compra de combustível para pres- tação do serviço, promovendo razoável abatimento no custo dos serviços prestados. Não configurado o autoconsumo de combustível aquaviário bunker ou deslocamento físico entre estabelecimentos de mesmo contri- buinte. Transferência de mercadoria para terceiro que enseja a incidência do ICMS, conforme artigo 155, II, do CFRB. Convenção particular que não é oponível a Fazenda Pública para fins de afastar a incidência do im- posto. IMPOSTO DEVIDO SOBE O FORNECIMENTO DE COMBUS- TÍVEL – IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO DA PETROBRÁS. AUTO DE INFRAÇÃO – Multa por supostas infrações relativas à circulação de óleo combustível marítimo pela Petrobrás para a fretadora da embarcação e tripulação Transpetro – Recurso administrativo das autuações – Decisão administrativa que alterou o AIIM, anulando os itens 2, 6 e 11, agregou os itens 8,9 e 10, pela similitude do assunto, deferindo apenas na natureza da operação (tributada ou não tributada e período de autuação); e agregou os itens 1, 3, 4 e 5 por possuírem o mesmo substrato fático – JUROS DE MORA – Aplicação da Lei nº 13.918/2009 – A lei infraconstitucional, exatamente neste ponto, não poderia ser aplicada em qualquer hipótese pela autoridade fiscal, haja vista o reconhecimento de sua incompatibili- dade com o texto constitucional, reconhecida pelo C. Órgão Especial des- 396 te E. TJSP, quando do julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade nº 0170909-61.2012.8. Adequação, também, dos juros incidentes. Afasta- mento da Lei nº 13.918. Aplicação, ao caso, da Taxa SELIC. O reconhe- cimento do excesso de juros não implica em invalidação total do título Jurisprudência - Direito Público executivo, nem mesmo em suspensão da exigibilidade da dívida inteira. Determinação, de ofício, de adequação do Auto de Infração. SENTEN- ÇA REFORMADA – IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO – RECURSO DA FAZENDA PROVIDO – PREJUDICADA A ANÁLISE DO RECURSO DA PETROBRÁS.” (Apelação nº 1056115-93.2022.8.26.0053, Relator: Antonio Celso Faria, Comarca: São Paulo, Órgão julgador: 8ª Câmara de Direito Público, Data do julgamento: 17/05/2023, Data de publicação: 17/05/2023) Por fim, não se justifica a alteração da condenação da Fesp ao pagamento de honorários advocatícios. A embargante formulou o pedido principal de anulação do AIIM nº 4.045.095-8 além de pleitear, subsidiariamente, o recálculo da multa e dos juros de mora. Em sentença, foi dado provimento apenas ao pedido de recálculo dos juros de mora, restando os demais improvidos. Em que pese a Fesp alegue que sua sucumbência teria sido irrisória, não é o que se verifica, uma vez que os juros de mora expressam valor significativo do crédito exigido (R$ 4.307.297,33 – fl.28). Portanto, correto o reconhecimento da sucumbência recíproca. No que se refere ao quantum fixado, é necessário apontar que o Juízo a quo fixou os honorários advocatícios devidos pela Fesp em “percentual mínimo do proveito econômico (diferença referente aos juros acima da SELIC)”. Apesar da alegação de desproporcionalidade do valor, não se demonstrou nos autos quanto é o proveito econômico obtido com a substituição do índice dos juros de mora. Sem qualquer parâmetro não há como verificar o equívoco na fixação. No mais, o escalonamento entre as faixas fixadas no artigo 85, §3º, do CPC decorre da própria lei, não sendo necessária a referência expressa à sua observância. Ante o exposto, mantem-se a sentença. Em atenção ao § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil, majora-se em 2% a honorária antes fixada a título de honorários recursais. Dessarte nega-se provimento aos recursos.