APELAçãO – MARCA - Ação de obrigação de fazer e não fazer - Sentença de procedência - Inconformismo ma- nifestado - Descabimento - Anúncios patrocinados - Vinculação da pesquisa do elemento nominativo da marca da autora por meio de serviço prestado pela apelante (Google Ads) - Concorrência desleal parasi- tária caracterizada - Precedentes - Alegações recur- sais incapazes de infirmar a conclusão a que chegou o juízo originário - Sentença mantida - Recurso despro- vido, com observação.(TJSP; Processo nº 1161750-82.2023.8.26.0100; Recurso: Apelação; Relator: RUI CASCALDI; Data do Julgamento: 14 de maio de 2025)
, em 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribu-
nal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento
ao recurso, com observação. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que
integra este acórdão. (Voto nº 60.693)
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores AZUMA
NISHI (Presidente sem voto), TASSO DUARTE DE MELO e CARLOS AL-
BERTO DE SALLES.
São Paulo, 14 de maio de 2025.
RUI CASCALDI, Relator.
Ementa: MARCA - Ação de obrigação de fazer e não
fazer - Sentença de procedência - Inconformismo ma-
nifestado - Descabimento - Anúncios patrocinados -
Vinculação da pesquisa do elemento nominativo da
marca da autora por meio de serviço prestado pela
apelante (Google Ads) - Concorrência desleal parasi-
tária caracterizada - Precedentes - Alegações recur-
sais incapazes de infirmar a conclusão a que chegou o
juízo originário - Sentença mantida - Recurso despro-
vido, com observação.
VOTO
Trata-se de recurso de apelação interposto por GOOGLE BRASIL IN-
TERNET LTDA. contra a sentença, cujo relatório se adota, que julgou proce-
dente o pedido formulado em ação de obrigação de fazer e não fazer proposta
por UNIVERSO ONLINE S.A. e UBN INTERNET LTDA. - para “condenar
as Rés a cessar a utilização, bem como a contratação, da marca ‘UOL Host’
e suas variações, bem como os desdobramentos relacionados a ela, como te-
lefones, websites, whatsapp, endereço, etc., sob qualquer meio ou pretexto, na
plataforma Google Ads”.
Em suas razões recursais, a apelante sustenta, em síntese, que “O ponto
central a ser aqui abordado, objeto principal deste recurso, é a discussão sobre
Jurisprudência - Direito Privado
a possibilidade de uso de uma marca de terceiro como termo ou palavra-chave
na plataforma Google Ads, que determina o disparo de um anúncio [...] O fun-
cionamento regular da plataforma Google Ads é diferente da situação de um
anúncio que faça uso de termo nominativo no texto pelo titular da marca. O
funcionamento do Google Ads não se trata de uso da marca de terceiro no corpo
do anúncio, num formato que faça o anunciante se passar pelo titular da marca,
o que ensejaria confusão do usuário de internet que vê o anúncio [...] Em casos
como esse, em que a marca do terceiro figura apenas como o termo ou pala-
vra-chave imputado pelo usuário no buscador, não há violação marcaria, pela
simples razão de a marca do terceiro não ser aposta no anúncio. Ela é apenas
o critério, parâmetro, que dispara o anúncio junto ao resultado da busca [...]
Não há o uso da marca na identificação de produtos ou serviços e, assim, não
há uso marcário, menos ainda a alegada violação marcaria [...] não há, portan-
to, qualquer violação marcária, e tampouco confusão ao consumidor, inclusive
porque o anúncio vem expressamente identificado como tal, deixando claro ao
usuário que se trata de uma propaganda, apresentada no contexto daquilo que
foi buscado. Conclui pela reforma “para julgar improcedente o pedido inicial
[...] Subsidiariamente, seja complementada a ordem, para que reflita comando
jurisdicional específico, contendo a URL do material questionado e/ou identi-
ficação específica do anunciante, sob pena de nulidade, nos termos dos artigos
19 do Marco Civil da Internet”.
Recurso processado com resposta.
É o relatório.
O apelo desmerece acolhida.
Trata-se de ação de obrigação de fazer e não fazer, por meio da qual as
autoras, ora apeladas, pretendem que as rés, entre elas a ora apelante, se abs-
tenham de utilizar a marca “UOL Host” para acionar anúncios patrocinados de
pesquisa na plataforma Google Ads, ao argumento de que tal conduta configura
concorrência desleal.
A controvérsia, portanto, reside em saber se a utilização de marca regis-
trada de terceiro como palavra-chave no sistema Google Ads caracteriza uso
indevido de marca e concorrência desleal.
Inicialmente, convém destacar que está incontroverso nos autos que a
marca “UOL Host” é de titularidade das apeladas, estando devidamente regis-
trada junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). A ata notarial
apresentada, por sua vez, demonstra que, ao realizar busca pelo termo “UOL
Host” no buscador do Google, aparecem como resultado links patrocinados ad-
quiridos por empresas concorrentes das apeladas.
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A apelante sustenta, em síntese, que a utilização de marca de terceiro
como palavra-chave na plataforma Google Ads não configura uso indevido de
marca ou concorrência desleal, pois não há uso da marca no anúncio, mas apenas
como critério para disparo do anúncio, não havendo confusão ao consumidor.
Jurisprudência - Direito Privado
No entanto, tal argumentação não merece prosperar. Com efeito, a pro-
priedade de marca, nos termos do artigo 129 da Lei nº 9.279/96 (Lei de Pro-
priedade Industrial), confere ao seu titular o uso exclusivo em todo o território
nacional. O artigo 130, inciso III, por sua vez, prevê a prerrogativa de o titular
“zelar pela sua integridade material ou reputação”.
Nessas circunstâncias, o uso de marca alheia como palavra-chave em me-
canismo de pesquisa, de modo a direcionar o internauta para anúncios de em-
presas concorrentes, viola a proteção conferida à marca pela Lei de Propriedade
Industrial, caracterizando-se como ato de concorrência desleal. Aliás, a questão
já foi pacificada pelo STJ, que, em recente julgado, assim se manifestou:
“RECURSO ESPECIAL. ORDEM ECONÔMICA. LIVRE CONCOR-
RÊNCIA. DESVIO DE CLIENTELA E CONCORRÊNCIA DESLEAL. RE-
VOLUÇÃO TECNOLÓGICA. INTERNET. COMÉRCIO ELETRÔNICO.
PROVEDORES DE BUSCA. LINKS PATROCINADOS. PALAVRA-CHA-
VE. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE MARCA REGISTRADA.
CONFUSÃO DO CONSUMIDOR. DILUIÇÃO DA MARCA. PERDA DE
VISIBILIDADE. INFRAÇÃO À LEGISLAÇÃO DE PROPRIEDADE IN-
TELECTUAL.
[...]
5. É lícito o serviço de publicidade pago, oferecido por provedores de
busca, que, por meio da alteração do referenciamento de um domínio,
com base na utilização de certas palavras-chave, coloca em destaque
e precedência o conteúdo pretendido pelo anunciante “pagador” (links
patrocinados).
6. Todavia, infringe a legislação de propriedade industrial aquele que
ele como palavra-chave, em links patrocinados, marcas registradas por
um concorrente, configurando-se o desvio de clientela, que caracteriza
ato de concorrência desleal, reprimida pelo art. 195, III e V, da Lei da
Propriedade Industrial e pelo art. 10 bis, da Convenção da União de
Paris para Proteção da Propriedade Industrial.
7. Utilizar a marca de um concorrente como palavra-chave para dire-
cionar o consumidor do produto ou serviço para o link do concorrente
usurpador é capaz de causar confusão quanto aos produtos oferecidos ou
a atividade exercida pelos concorrentes. Ainda, a prática desleal conduz
a processo de diluição da marca no mercado e prejuízo à função publici-
tária, pela redução da visibilidade”.
(REsp n. 1.937.989/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Tur-
ma, julgado em 23/8/2022, DJe de 7/11/2022.)
A apelante tenta afastar a ilicitude de sua conduta argumentando que não
há confusão ao consumidor, pois os anúncios são identificados como tal. Contu-
Jurisprudência - Direito Privado
do, esse argumento não se sustenta - eis que, apesar da identificação dos anún-
cios, a utilização de marca alheia como palavra-chave prejudica a função de
indicação de origem da marca, além de causar prejuízo à função de publicidade
e de investimento da marca, conforme bem destacou o Min. Luis Felipe Salo-
mão no julgado acima citado.
Nesse mesmo sentido, nesta Câmara:
“APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER C.C. INDE-
NIZATÓRIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO PROVIDO
EM PARTE. Apelação. Ação de obrigação de não fazer c.c. indeniza-
tória. Sentença de procedência. Insurgência da corré. 1. ANÚNCIOS
PATROCINADOS. VIOLAÇÃO DA MARCA MISTA DA APELADA. Vin-
culação da pesquisa do elemento nominativo da marca da recorrida
por meio de serviço prestado pela apelante (Google Ads). Enunciado
XVII do Grupo de Câmaras Reservadas de Direito Empresarial do E.
TJSP. Concorrência parasitária. Violação do art. 19, §1ª, do Marco
Civil da Internet. Descabimento. Jurisprudência. 2. INDENIZAÇÃO
POR DANOS PATRIMONIAL E EXTRAPATRIMONIAL. CONFI-
GURAÇÃO. Uso indevido de marca que dispensa a prova de efetivo
prejuízo, pois in re ipsa. Jurisprudência [...]”. (TJSP; Apelação Cível
1009460-87.2020.8.26.0100; Relator (a): J.B. Paula Lima; Órgão Julga-
dor: 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do Julgamento:
12/02/2025).
Como bem destacou o Magistrado sentenciante:
“Ainda que a ferramenta de publicidade em questão não possa ser con-
siderada, a priori, ato de concorrência desleal, a utilização da marca
alheia para aproximar potenciais clientes, no mesmo ramo e mercado
de atuação, constitui verdadeiro modelo de publicidade parasitário, ao
exemplo do que se convencionou chamar ‘efeito carona’ ou ‘free riding’.
Por consequência, a conduta prejudica a função de indicação de origem
da marca, pois a publicidade, quando exibida na busca pela palavra-
chave que corresponde exatamente à marca titularizada por terceiro, não
permite identificar se os produtos ou os serviços oferecidos e identifica-
dos pelo anúncio provêm do titular da marca ou de uma empresa econo-
micamente ligada a este ou, pelo contrário, de um terceiro ou, ao menos,
gera considerável dificuldade ao consumidor/internauta, mesmo aquele
normalmente informado e razoavelmente atento”.
Destaque-se, ainda, que a conduta em análise não se confunde com a
propaganda comparativa lícita eis que nessa há clara identificação dos produtos
ou serviços comparados, com informações objetivas sobre suas características,
permitindo ao consumidor uma escolha consciente; enquanto no caso o que
ocorre é o aproveitamento parasitário da reputação da marca alheia para desviar
clientela, o que é vedado pela Lei de Propriedade Industrial.
Jurisprudência - Direito Privado
Quanto ao argumento de necessidade de identificação específica das
URLs ou dos anunciantes, nos termos do artigo 19 do Marco Civil da Internet
(Lei nº 12.965/2014), também não merece acolhida. Isso porque, no caso, a pró-
pria apelante é a responsável pela plataforma Google Ads, e tem plenas condi-
ções de identificar e impedir a contratação de anúncios utilizando a marca “UOL
Host” como palavra-chave por empresas concorrentes das apeladas. Até porque,
a ordem judicial foi específica e clara, determinando a cessação da utilização
e contratação da marca “UOL Host” e suas variações como palavra-chave na
plataforma Google Ads, sendo plenamente possível seu cumprimento.
Daí que a sentença apelada desmerece a crítica que se lhe dirigiu - ficando
mantida, inclusive por seus próprios fundamentos, aos quais estes se acrescem,
sem necessidade de sua transcrição, nos termos do art. 252 do Regimento Inter-
no deste Tribunal.
Em desfecho, consigne-se prequestionada toda matéria infraconstitucio-
nal e constitucional aqui enfrentada - observado o pacífico entendimento no
sentido de que é desnecessária a citação numérica dos dispositivos legais, com
a advertência de que embargos procrastinatórios serão penalizados com multa.
Isto posto, NEGA-SE PROVIMENTO ao recurso. Mantida a sucum-
bência tal como estabelecida, os honorários advocatícios ficam majorados para
16% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 11 do CPC, em
conformidade com os critérios do § 2º do aludido artigo.