APELAçãO – APELAÇÃO. AÇÃO DE SOBREPARTI- LHA C.C. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. Sentença que julgou improcedente os pedidos de sobrepartilha e indenizatório referentes a fatos ocorridos na constância da união estável, bem como extinguiu o processo, sem resolução do méri- to, por incompetência do juízo, em relação aos fatos posteriores a sua dissolução. Irresignação da autora. Partes que firmaram escritura pública de dissolução consensual de união estável. Cláusula expressa de quitação recíproca. Alegação de omissão no acordo de valores referentes à reforma realizada no imóvel de propriedade do requerido e sua respectiva valo- rização, em virtude de condutas abusivas e pressão exercida pelo companheiro. Ausência de pedido de anulação do ajuste por vício do consentimento. Ape- lante, ademais, que é advogada e tinha plena ciência dos efeitos jurídicos da avença. Sobrepartilha inviá- vel. Reforma do imóvel que já era do conhecimento da autora quando da separação. Não configuração de qualquer das hipóteses previstas no art. 669 do Códi- go de Processo Civil. Improcedência acertada no to- cante aos pedidos relacionados ao período da união estável. Incompetência do Juízo da Família quanto aos pleitos referentes a fatos ocorridos após a disso- lução da convivência marital. Matéria de natureza es- tritamente cível. Condenação da autora à devolução ao requerido dos valores despendidos a título de men- salidades de plano de saúde que é descabida. Verba de natureza alimentar irrepetível. Ausência de dolo da demandante. Litigância de má-fé não caracterizada. Recurso parcialmente provido.(TJSP; Apelação 0004949-96.2025.8.26.0000; Relator: DANIELA CILENTO MORSELLO; Órgão Julgador: Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo,; Data do Julgamento: 24 de junho de 2025)
, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo,
proferir a seguinte decisão: “Deram provimento em parte ao recurso.
V.U. Sustentaram oralmente a Dra. Andrea Pedrina Dias de Alexandria OAB/SP
439.578 e a Dra. Celia Cristina Martinho, OAB/SP 140.553.”, de conformidade com o voto da
Relatora, que integra este acórdão. (Voto nº 17.485)
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores DA- NIELA CILENTO
MORSELLO (Presidente), WILSON LISBOA RIBEIRO e LUIS FERNANDO CIRILLO.
São Paulo, 24 de junho de 2025.
DANIELA CILENTO MORSELLO, Relatora
Ementa: APELAÇÃO. AÇÃO DE SOBREPARTI- LHA C.C.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
E MATERIAIS. Sentença que julgou improcedente os pedidos de
sobrepartilha e indenizatório referentes a fatos ocorridos na
constância da união estável, bem como extinguiu o processo, sem
resolução do méri- to, por incompetência do juízo, em relação aos
fatos posteriores a sua dissolução. Irresignação da autora. Partes que
firmaram escritura pública de dissolução consensual de união estável.
Cláusula expressa de quitação recíproca. Alegação de omissão no
acordo de valores referentes à reforma realizada no imóvel de
propriedade do requerido e sua respectiva valo- rização, em virtude
de condutas abusivas e pressão exercida pelo companheiro. Ausência
de pedido de anulação do ajuste por vício do consentimento. Ape-
lante, ademais, que é advogada e tinha plena ciência dos efeitos
jurídicos da avença. Sobrepartilha inviá- vel. Reforma do imóvel que
já era do conhecimento da autora quando da separação. Não
configuração de qualquer das hipóteses previstas no art. 669 do Códi-
go de Processo Civil. Improcedência acertada no to- cante aos pedidos
relacionados ao período da união estável. Incompetência do Juízo da
Família quanto aos pleitos referentes a fatos ocorridos após a disso-
lução da convivência marital. Matéria de natureza es- tritamente cível.
Condenação da autora à devolução ao requerido dos valores
despendidos a título de men- salidades de plano de saúde que é
descabida. Verba de natureza alimentar irrepetível. Ausência de dolo
da demandante. Litigância de má-fé não caracterizada. Recurso
parcialmente provido.
VOTO
Trata-se de recurso de apelação interposto em face da r. sentença (fls. 1.215/1.223), cujo
relatório se adota, que, em ação de sobrepartilha c.c. indeni- zação por danos morais e materiais,
julgou improcedentes os pedidos de: 1) de sobrepartilha da valorização do imóvel de propriedade
do requerido, reformado e decorado durante a união estável; 2) de indenização pelos gastos que
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a autora alega ter tido com a reforma e a decoração do imóvel do requerido; e 3) para que o
requerido, em decorrência de abusos e de violência física e psicológica supostamente praticados
contra ela durante a união estável, mantenha o plano de saúde em favor dela e arque com os
medicamentos até que sobrevenha a alta médica, bem como que seja condenado a pagar, a título
de indenização por da- nos morais, o valor de R$ 77.000,00 (setenta e sete mil reais), e pensão
mensal e vitalícia de R$ 6.000,00 (seis mil reais), porque os abusos provocaram a redução de sua
capacidade laborativa. Também julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, por
incompetência do juízo (art. 485, IV, do CPC), em relação aos pedidos: 1) de que o requerido,
em decorrência de abusos e de violência física e psicológica supostamente praticados contra ela
após o término da união estável, mantenha o plano de saúde em favor dela e custeie seus
medicamentos até a alta médica, bem como que seja condenado a pagar indenização por danos
morais e pensão mensal e vitalícia; 2) de pagamento do valor de dois Iphones supos- tamente
danificados pelo requerido em momento posterior ao término da união estável; e 3) de reembolso
dos valores que a autora despendeu com advogados particulares para acompanhar inquérito
policial e para pedir medida protetiva contra o requerido. Deixou de condenar a demandante ao
pagamento de despe- sas processuais e honorários advocatícios por ser beneficiária da gratuidade
da justiça, mas condenou-a a devolver ao requerido os valores que ele despendeu a título de
mensalidades de plano de saúde, eventuais valores de coparticipações e pagamentos de consultas
e tratamentos particulares não-abrangidos pelo plano de saúde ou em período de carência, a partir
da data de concessão da tutela de urgência antecipada, com correção monetária desde o dispêndio
pelo requerido e juros de 1% (um por cento) ao mês a partir da data da prolação desta sentença.
Condenou a autora, ainda, a pagar ao requerido multa de 5% (cinco por cento) do valor corrigido
da causa, por litigância de má-fé.
Argui a recorrente, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de de- fesa pelo indeferimento
da produção de prova oral. No mérito, aduz que o pano de fundo do pedido de sobrepartilha é o
abuso praticado pelo apelado contra ela durante a convivência, com agressões verbais e físicas,
inclusive a pressão efetuada para que ela assinasse apressadamente o acordo de dissolução da
união estável, o que lhe ocasionou diversos transtornos físicos e psíquicos e a fez es- quecer de
incluir no ajuste a reforma e valorização do imóvel. Alega ausência de interesse na anulação do
acordo celebrado, razão pela qual postulou a sobrepar- tilha. Afirma que o contexto de violência
doméstica vivenciado, que provocou o quadro de depressão grave e diversos problemas de saúde,
também justificam os pedidos de manutenção do plano médico, indenização e de pensão
vitalícia. Sustenta a competência do Juízo da Vara da Família para apreciar todos os plei- tos,
posto decorrentes da relação familiar, havendo risco de prolação de decisões conflitantes.
Acrescenta que, na última discussão ocorrida após a assinatura do acordo, o apelado a agrediu
fisicamente e quebrou o seu celular e o do seu filho, que tentava filmar o ocorrido, teve que
contratar advogado em virtude da ins- tauração de inquérito policial, devendo ser indenizada.
Observa que a obrigação imposta na tutela de urgência concedida para que o apelado continuasse
a pagar o plano de saúde possui natureza alimentar, sendo indevida a devolução dos respectivos
valores, além de ser contraditória a determinação judicial, por ter o magistrado se declarado
incompetente para a julgar o pleito. Ressalta, por fim, que não houve litigância de má-fé.
Recurso tempestivo, isento de preparo e contrarrazoado (fls. 1.255/1.285). Houve oposição
ao julgamento virtual (fls. 1.292).
É o relatório.
Por proêmio, registra-se que esta Relatora assumiu a cadeira do Desem- bargador Piva
Rodrigues nesta Colenda 9ª Câmara de Direito Privado em 28 de setembro de 2023, ocasião em
que recebeu um acervo de 1.253 (um mil, duzen- tos e cinquenta e três) recursos pendentes de
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julgamento, de modo que não deu causa ao atraso na apreciação deste recurso.
A preliminar de cerceamento de defesa não comporta guarida.
Com efeito, incumbe ao juiz, na qualidade de destinatário das provas que formarão o seu
convencimento, determinar a realização daquelas que se revelem pertinentes e necessárias para o
desate da controvérsia posta nos autos, indefe- rindo as diligências inúteis ou protelatórias,
consoante previsto no artigo 370 do Código de Processo Civil.
Consoante o escólio de VITOR DE PAULA RAMOS, “por necessária deve-se entender
aquela prova que tiver aptidão para, em tese, fazer com que um fato que faz parte do mérito da
causa seja mais ou menos provável do que seria sem a prova. Será admissível a prova que, ao
mesmo tempo, for pertinen- te e relevante - pertinente será aquela prova que disser respeito ao
mérito da causa, e relevante aquela que tiver o condão em tese, de alterar o resultado do
julgamento” (Código de Processo Civil Anotado, Coordenador JOSÉ ROGÉ- RIO CRUZ E
TUCCI e OUTROS, GZ Editora, Rio de Janeiro, 2016, p.534).
A propósito também leciona, com acuidade, JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS BEDAQUE:
“Ninguém melhor do que o juiz, a quem está afeto o julgamento para decidir sobre a
necessidade de produzir determinada prova. Como ele é destinatário dela, pode avaliar quais os
meios de que necessita para formação de seu convencimento. Nessa medida, e considerando o
escopo da atividade jurisdicional, a colheita de elementos probatórios interessa tanto ao juiz
quanto às partes”. (Poderes Instrutórios do Juiz. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013,
p. 17).
E, no caso em testilha, era efetivamente despicienda a dilação probatória, ante a farta prova
documental acostada aos autos.
No que tange ao mérito, verifica-se que as partes conviveram em união estável de 15 de
janeiro de 2019, pelo regime da separação total de bens (fls. 32/35), até 21 de agosto de 2021,
quando firmaram a escritura pública de disso- lução consensual dessa união (fls. 287/290).
Quase um ano após a celebração do referido acordo, a autora ajuizou a presente demanda,
sob o argumento de que vivia uma relação abusiva com o requerido, que era controlador e a
humilhava constantemente. E embora tenha tentado se desvencilhar do relacionamento várias
vezes, ele sempre a procurava com desculpas e “promessas de amor”, geralmente acompanhadas
de presentes. Aduziu que, por esse motivo, passou apresentar quadro de depressão, alergia,
problemas ginecológicos e queda de cabelo, o que somado à pressão para que assinasse, às
pressas, o acordo de dissolução da união estável, foram omitidas nesse ajuste a reforma e a
valorização do imóvel de propriedade do requerido por ela realizadas, que devem ser objeto de
sobrepartilha. Acrescentou que, em uma discussão ocorrida após a assinatura do ajuste e sua
saída do imóvel, o re- querido destruiu o seu Iphone 12, que tinha apenas 6 (seis) meses de uso,
bem como o aparelho celular do seu filho, que tentava gravar a briga, o que ensejou pedido de
concessão de medida protetiva em seu favor, ocasião em que precisou contratar advogado, cujas
despesas devem ser ressarcidas. Asseverou que o réu deu causa aos transtornos psicológicos de
que padece, por isso o plano de saúde deve ser mantido, devendo o apelado também custear os
medicamentos de que necessita até sua alta médica. Ainda, requereu indenização por danos
morais no importe de R$ 77.000,00 (setenta e sete mil reais), decorrentes da frequente
humilhação que sofria, das ameaças, do cancelamento da festa de casamento após a contratação
de buffet, de DJ, da compra do vestido de noiva, tendo sido obrigada a rescindir todos os
contratos sozinha, além da agressão sofrida na discussão que se deu após a celebração do acordo
que ensejou a quebra do seu celular e o de seu filho. Por fim, em virtude da redução da capacidade
laborativa pelos transtornos mentais sofridos, entende fazer jus ao recebimento de pensão civil
mensal e vitalícia no valor de R$6.000,00 (seis mil reais).
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Pois bem.
Consoante se extrai da escritura pública de dissolução consensual da
união estável (fls. 287/290), as partes renunciaram reciprocamente aos alimen tos, estabeleceram
o prazo de desocupação do imóvel de propriedade do reque- rido pela autora, bem como a divisão
dos bens que guarneciam a residência do casal. Também ficou consignado que o réu, por mera
liberalidade, pagaria à autora a quantia de R$200.000,00 (duzentos mil reais), dos quais
R$100.000,00 (cem mil reais) seriam depositados no primeiro dia útil após a desocupação do
imóvel e o restante em 10 (dez) parcelas fixas e mensais de R$10.000,00 (dez mil reais),
vencendo-se a primeira 30 (trinta) dias após a desocupação e as de- mais no mesmo dia dos
meses subsequentes. Durante o período de pagamento dessas parcelas, o requerido se
comprometeu a manter e custear um plano de saúde em nome da demandante.
Por fim, as partes outorgaram-se reciprocamente ampla e geral quitação, nos seguintes
termos: “Da quitação recíproca: Da mútua quitação recíproca: Pelo presente instrumento
público, os outorgantes expressamente outorgam, de forma mútua, concomitante, recíproca,
irrevogável e irretratável, a mais ampla e rasa quitação por qualquer possibilidade de arguição
por danos de qualquer natureza ou mesmo direitos por qualquer tipo de relação ou vínculo
havido em decorrência da união estável havida e ora dissolvida, com exceção do valor acima
estabelecido e ainda a ser depositado”.
Por conseguinte, não obstante os argumentos da recorrente, há cláusula expressa na
escritura pública de declaração de dissolução consensual de união estável de quitação recíproca
no tocante a quaisquer questões relacionadas ao período de convivência das partes.
E conforme bem ponderado pelo juízo a quo: “O significado dessa cláu- sula claramente
é o de que a autora, terminada a relação afetiva mantida com o requerido, renunciou
expressamente a quaisquer direitos de que ela porventura seria titular, incluindo indenização
por quaisquer danos a que eventualmente faria jus.”.
Note-se que o acordo foi livremente pactuado entre as partes, sem qual- quer mácula,
cumprindo ressaltar que a apelante é advogada e, portanto, tinha plena ciência de todas as
implicações e consequências dos seus termos quando de sua celebração.
A apelante insiste na sobrepartilha relacionada aos valores da reforma e valorização do
imóvel de propriedade do apelado, ocorrida na constância da união estável, ao argumento de que
se esqueceu de incluí-los no pacto em virtu- de dos transtornos psicológicos e da pressão sofrida.
Todavia, inexiste qualquer arguição de defeito do negócio jurídico por vícios de
consentimento, tanto que a apelante não busca a sua anulação.
Doutra banda, versando a avença sobre direito disponível, com clausula válida de
quitação recíproca, é inviável a realização da postulada sobrepartilha.
Nem mesmo o aventado “esquecimento de ordem emocional” constitui motivo hábil para
se desconsiderar o ajustado.
Apenas a título de argumentação, a despeito do quadro depressivo e an- sioso da autora
mencionado nos relatórios médicos acostados aos autos, não há qualquer indício de que ela
estivesse incapacitada para tomada de decisões naquela ocasião (fls. 385, 1.1369/1140).
Se não bastasse, conforme assinalado na r. sentença, além de o regime de convivência
adotado pelas partes ter sido o da separação total de bens, a autora já tinha pleno conhecimento
da reforma do imóvel quando da separação, de modo que não está caracterizada nenhuma das
hipóteses de sobrepartilha, pre- vistas no artigo 669 do Código de Processo Civil.
Ademais, a sobrepartilha não se presta para veicular eventual arrependi- mento em relação
ao acordo validamente celebrado pelas partes.
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Outrossim, também em razão da validade da cláusula de quitação para nada mais ser
reclamado a título de indenização ou direitos relativos ao período da união estável, também
devem ser afastados os pedidos de manutenção do plano de saúde da recorrente por prazo
indeterminado, indenização por danos morais e pensão vitalícia, sendo desnecessário repetir os
acertados fundamentos da bem lançada sentença de improcedência.
Sob outro vértice, no tocante aos pleitos atinentes a fatos ocorridos após a dissolução da
união estável, o Juízo da Família é absolutamente incompetente para a sua apreciação.
Isto porque versam sobre questão patrimonial, de natureza estritamente cível, e o fato de
o alegado ato ilícito ter sido praticado pelo ex-companheiro não desloca a competência para a
Vara Especializada, uma vez que não mais se discute a união estável e nem se cuida de ação de
estado.
Não se pode olvidar, que a competência absoluta das Varas de Família e Sucessões está
restrita às matérias elencadas no rol insculpido no artigo 37 do Código Judiciário do Estado de
São Paulo (Decreto-Lei Complementar nº 3/69), in verbis:
“Artigo 37 - Aos Juízes das Varas da Família e Sucessões compete: I - processar e julgar: a) as
ações relativas a estado, inclusive alimentos e sucessões, seus acessórios e incidentes; b) os
inventários, arrolamentos e partilhas, bem como a divisão geodésica das terras partilhadas e a
demarcação dos quinhões. II - conhecer e decidir as questões relativas a: a) capacidade, pátrio
poder, tutela e curatela, inclusive prestação de contas; b) bens de incapazes; c) registro e cum-
primento de testamentos e codicilos; d) arrecadação de herança jacente, bens de ausentes e vagos;
e) suprimento de idade e consentimento, inclusive outorga marital e uxória; f) vínculos, usufruto
e fideicomisso; g) adoção e legitimação adotiva, ressalvados os casos de competência das Varas
de Menores; h) funda- ções instituídas por particulares e sua administração.”.
Doutra banda, é da competência do Juízo Cível dirimir as questões estam- padas no artigo
34 do Decreto-Lei supra referido:
“Artigo 34 - Aos Juízes das Varas Cíveis compete, ressalvados os casos de competência especifica:
I - processar, julgar e executar os feitos, contenciosos ou administrativos, de natureza civil ou
comercial, bem como seus respectivos inci- dentes; II - conhecer e decidir os processos acessórios,
contenciosos ou não, de natureza civil ou comercial; III - praticar todos os demais atos atribuídos
pelas leis processuais civis a juiz de primeira instância.”
Em casos análogos, já decidiu este E. Tribunal de Justiça Colenda Câma- ra Especial:
“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - Ação de indenização por da- nos morais e
materiais ajuizada pelo cônjuge virago contra o cônjuge varão
- Determinação de redistribuição para a Vara de Família e Sucessões da co- marca -
Descabimento - Pleito que não abrange matéria afeta ao Direito de Família e Sucessões - Questão
de cunho estritamente patrimonial, que deve ser conhecida pelo Juízo Cível - Matéria que não
está afeta à competência absoluta das Varas especializadas - Precedentes - Conflito conhecido
para de- clarar a competência do Juízo suscitado.” (Conflito de Competência Cível nº 0018740-
74.2021.8.26.0000; Relator Guilherme G. Strenger; Câmara Especial;
j. 02.07.2021);
“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. Ação indenizatória. Distribui- ção livre para a 1ª
Vara do Juizado Especial Cível do Foro Central dos Juizados Especiais Cíveis da capital. Remessa
para a 10ª Vara de Família e Sucessões do Foro Central, por dependência à ação de divórcio
litigioso envolvendo as mesmas partes. Matéria debatida que não possui natureza familiar, mas é
dotada de caráter exclusivamente patrimonial, não afeto à competência das Varas de Família e
Sucessões. Inteligência do artigo 37 do Código Judiciário Paulista. Competência do Juízo
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suscitado da 1ª Vara do Juizado Especial Cível do Foro Central dos Juizados Especiais Cíveis da
capital. (Conflito de competência cí- vel nº 0004949-96.2025.8.26.0000; Relator Egberto de
Almeida Penido; Câmara Especial; j. 31/03/2025).
Por fim, o parcial provimento do recurso diz respeito à condenação da autora à devolução
ao requerido dos valores por ele despendidos a título de mensalidades de plano de saúde,
coparticipações, consultas e tratamentos parti- culares, a partir da data da decisão que concedeu a
tutela de urgência, bem como à multa por litigância de má-fé.
Certo é que, conforme bem ponderado pelo magistrado sentenciante, o pedido de
manutenção da autora no plano de saúde pago pelo réu está fundado na suposta conduta abusiva
por ele perpetrada e, portanto, em ato ilícito, e não na Lei nº 5.478/1968, ostentando, portanto,
natureza indenizatória.
Todavia, esta C. Câmara ao julgar o agravo de instrumento nº 2224845-
15.2022.8.26.0000 (fls. 1.178/1.185), interposto pelo réu contra a decisão que concedeu a tutela
de urgência para impor ao requerido a obrigação de continuar a pagar o plano de saúde em favor
da autora, também reconheceu o caráter ali- mentar dessa verba ao consignar que:
“Por ocasião da sessão telepresencial de julgamento, atento às razões expostas em sustentação
oral pela advogada constituída pela parte ré agravan- te, foi pela Turma Julgadora considerado
necessário aplicar um limite temporal máximo para a continuidade do desfrute do plano de saúde,
sob custeio do réu, exatamente o período de seis meses contados da data da contratação do novo
plano comunicada pelo recorrente nos autos, aferindo-se aí natureza alimentar nesse
prosseguimento do desfrute de plano de saúde pela agravada sob expensa do ex-companheiro.”
Ademais, os alimentos, ainda decorrentes de ato ilícito, são, em regra, irrepetíveis e
incompensáveis, portanto, não são passíveis de devolução ou com- pensação, de acordo com o
artigo 373, inciso II, do Código Civil.
É certo que, em situações excepcionais a doutrina e a jurisprudência têm admitido a
repetição dos alimentos, quando comprovado o dolo ou má-fé do credor, a fim de evitar o
enriquecimento sem causa.
No caso em testilha, contudo, não se vislumbra a má-fé da apelante ao pleitear a
manutenção do plano de saúde, uma vez que o seu diagnóstico e tra- tamento estavam
comprovados pelos relatórios e prescrições médicas acostadas aos autos, assim como havia
medida protetiva concedida em seu favor por su- posta prática de violência doméstica pelo réu
(fls. 304/309), embora tenha sido posteriormente revogada em face do arquivamento do
inquérito policial (fls. 1.166/1173).
Tanto é assim que, diante da demonstração dos requisitos previstos no ar- tigo 300 do
Código de Processo Civil, foi concedida, em primeiro grau, a tutela de urgência para compelir o
requerido a continuar a arcar com o plano de saúde da autora, parcialmente confirmada por esta
C. Câmara.
Portanto, ainda que esse direito não tenha sido reconhecido por sentença, deve prevalecer
o princípio da irrepetibilidade dessa verba, razão pela qual deve ser excluída a condenação da
virago à devolução dos valores referentes ao seu tratamento e à mensalidade do plano de saúde.
Nesse diapasão, já decidiu este. E Tribunal de Justiça:
“APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. OBRIGAÇÃO DE FAZER.
PENSÃO MENSAL DECORRENTE DE ATO ILÍCITO. Sentença de procedên- cia. Insurgência do
réu. Cabimento. Cobrança de valores pago a maior pela autora. Aos alimentos decorrentes de ato
ilícito aplica-se o mesmo regime jurí- dico geral protecionista das verbas alimentares, cujo
fundamento é a finalidade da prestação (sustento e sobrevivência do beneficiário) e não sua
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origem. Ali- mentos, independente da sua origem, são, em regra, irrepetíveis e incompensá- veis,
pois presumem-se que já foram utilizados na sobrevivência do beneficiário. Ausência de
comprovação de má-fé por parte do beneficiário. Má interpre- tação do acordo e erro
administrativo imputáveis exclusivamente à Apelada. Repetição indevida. Sentença reformada.
Recurso provido. (Apelação Cível nº 1000692-11.2019.8.26.0650; Relatora Lia Porto; 7ª Câmara
de Direito Privado;
j. 17/08/2023).
Pelo mesmo motivo, afasta-se a sua condenação ao pagamento de multa por litigância de má-
fé, uma vez que não se vislumbra malícia ou dolo na conduta da recorrente ao ajuizar a demanda,
a despeito da existência do acordo entabulado pelas partes, sobretudo considerando que alguns
dos motivos que ensejaram a sua propositura ocorreram após a celebração do ajuste.
Considera-se prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitu- cional declarada,
observando o sólido entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça de que “é desnecessária
a citação numérica dos dispositivos legais, bastando que a questão posta tenha sido decidida”
(EDcl no RMS nº 18.205/SP, Relator Ministro Felix Fischer, j. 18.04.2006).
Pelo exposto, dá-se parcial provimento ao recurso.
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