APELAçãO – APELAÇÃO. Ação de rescisão contratual com pedido de indenização por danos materiais e mo- rais. Compra e venda de veículo usado (modalidade “repasse”). Julgamento de improcedência. Irresig- 253 nação do autor. Alegado vício oculto no automóvel. Inocorrência. Carro que, à data da compra e venda, contava com cinco anos de fabricação e utilização e Jurisprudência - Direito Privado mais de 150.000 km rodados. Defeitos apresentados que poderiam ter sido notados no momento da com- pra, tanto é assim que, ao entregar o veículo a um me- cânico de confiança, foi possível a detecção imediata dos problemas. Assim, não cabe falar na existência de vício redibitório, que é aquele oculto, imprevisível ao comprador, afastando-se, por conseguinte, o alegado direito ao desfazimento do negócio e à reparação dos danos morais. Sentença mantida. Recurso não provi- do.(TJSP; Apelação 1002224-13.2022.8.26.0586; Relator: Issa Ahmed; Órgão Julgador: 34ª; Data do Julgamento: 31 de julho de 2025)
, em sessão permanente e virtual da 34ª Câmara de Direito
Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Nega-
ram provimento ao recurso. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que
integra este acórdão. (Voto nº 40.558)
O julgamento teve a participação dos Desembargadores GOMES VAR-
JÃO (Presidente) e ANTONIO NASCIMENTO.
São Paulo, 31 de julho de 2025.
ISSA AHMED, Relator
Ementa: APELAÇÃO. Ação de rescisão contratual
com pedido de indenização por danos materiais e mo-
rais. Compra e venda de veículo usado (modalidade
“repasse”). Julgamento de improcedência. Irresig-
253
nação do autor. Alegado vício oculto no automóvel.
Inocorrência. Carro que, à data da compra e venda,
contava com cinco anos de fabricação e utilização e
Jurisprudência - Direito Privado
mais de 150.000 km rodados. Defeitos apresentados
que poderiam ter sido notados no momento da com-
pra, tanto é assim que, ao entregar o veículo a um me-
cânico de confiança, foi possível a detecção imediata
dos problemas. Assim, não cabe falar na existência de
vício redibitório, que é aquele oculto, imprevisível ao
comprador, afastando-se, por conseguinte, o alegado
direito ao desfazimento do negócio e à reparação dos
danos morais. Sentença mantida. Recurso não provi-
do.
VOTO
Vistos.
Cuida-se de ação ordinária movida por Wagner Decaria Silva contra Itaú
Unibanco Holding, na qual o autor alega que adquiriu do réu um veículo usado,
sucedendo que o automóvel veio a apresentar vício oculto, razão por que requer
o desfazimento do negócio e a condenação do réu na obrigação de devolver o
valor pago. Busca, ademais, a reparação dos danos morais.
A ação foi julgada improcedente, condenando-se o autor ao pagamento
de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10%
do valor da causa.
Apela o autor, buscando a reforma da sentença, ao argumento de que,
imediatamente após a compra, o veículo passou a apresentar defeitos que, até
então, estavam ocultos. Alega que tem direito ao desfazimento do negócio, nos
termos do artigo 18, §1°, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor, bem
como à reparação dos danos morais. Requer, assim, o provimento do recurso.
Vieram contrarrazões, alegando o réu que os defeitos apresentados não
passam de desgastes próprios do tempo de uso do veículo, passíveis de serem
reconhecidos em momento anterior à compra, descabendo falar em vício oculto.
Recurso tempestivo e preparado (fls. 311/312).
Não há oposição ao julgamento virtual.
É o relatório.
O recurso não comporta provimento.
Consta que o autor-apelante adquiriu da ré, na modalidade “repasse”, em
17/11/2023, o automóvel de marca Ford Ranger Diesel, XLS, 4x4, 2.2 CD, au-
tomático, ano/modelo 2016/2017, pelo valor de R$ 98.000,00, sucedendo que,
logo após a compra, o adquirente verificou mau funcionamento do veículo, além
da existência de multas.
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Ao levar o veículo para um mecânico de sua confiança, constatou-se a
necessidade de: troca óleo do câmbio automático e filtro; limpeza do sistema
de arrefecimento; troca de discos de freio e pastilhas; troca dos amortecedores
dianteiros e traseiros; troca de pneus e troca da chave principal com defeito.
Jurisprudência - Direito Privado
Pois bem.
Está-se diante de contrato de compra e venda de automóvel que, à época
da aquisição, contava com cerca de cinco anos de uso e mais de 150.000 km ro-
dados, o que exigia da parte compradora bastante cautela. A esse respeito, bem
registrou o Magistrado que:
“Era de conhecimento do autor que o veículo necessitava de manutenção
e reparos, tratando-se de “carro de repasse”, razão pela qual foi aliena-
do por valor abaixo do praticado no mercado.
Ademais, da análise da vistoria cautelar, verifico que se trata de automó-
vel com 154.076 quilômetros rodados.
Desta feita, é de responsabilidade do adquirente do veículo usado, ainda
mais considerando-se a quilometragem do automóvel, averiguar, no ato
da compra, o efetivo estado em que esse se encontra, o que deixou de ser
observado pela parte requerente, que optou por assumir o risco de com-
prar o veículo em tela, sem observação dessa cautela.
Frise-se que se trata de veículo rodado e com mais de cinco anos de uso,
o que, por si só, pressupõe a existência de desgaste de peças para manu-
tenção, o que, todavia, não se confunde com vício oculto.
Esse desgaste de peças é possível observar das próprias fotografias ane-
xadas pelo autor às fls. 36/48 e que poderiam ter sido facilmente verifi-
cadas caso levasse o veículo em um mecânico de sua confiança antes de
celebrar o negócio jurídico.
Portanto, ciente de que se tratava de veículo usado, cabia ao comprador
avaliar as condições do negócio antes de realizar a compra” (quarta lau-
da da sentença - fls. 279).
Ressalte-se que os defeitos apresentados poderiam ter sido notados no
momento da compra, tanto é assim que foram facilmente detectados pelo mecâ-
nico de confiança do comprador, segundo relato do próprio autor.
Consigne-se que os defeitos constatados são fruto do desgaste próprio do
tempo de uso do veículo, à exemplo da necessidade da troca de óleo, filtros e
pastilhas de freio, pneus, etc.
Quanto ao defeito na turbina, o autor-apelante deixou de esclarecer quais
teriam sido as causas do problema, havendo de se considerar que, quando o
problema aconteceu, o veículo já havia passado pelas mãos de mecânico de con-
fiança do autor. Isto é, não é possível afirmar, estreme de dúvida, que o defeito
já existia no momento da compra.
Os defeitos estruturais, a seu turno (defeito no para-choque, lanterna, etc),
estavam bem discriminados no laudo recebido pelo autor em momento anterior
à compra e, como lá constou, são passíveis de reparo.
Bem por isso, não cabe falar na existência de vício redibitório, que é
Jurisprudência - Direito Privado
aquele oculto, imprevisível ao comprador, afastando-se, por conseguinte, o ale-
gado direito ao desfazimento do negócio e à reparação dos danos e morais.
Em caso semelhante, assim decidiu esta Colenda Câmara, como se vê:
RECURSO DE APELAÇÃO. Ação de indenização por danos morais e
materiais. Compra e venda de veículo usado. Transação realizada entre
duas pessoas jurídicas atuantes no ramo de comercialização de carros
usados. Inexistência de relação de consumo. Alegado vício oculto no au-
tomóvel. Inocorrência. Carro que, à data da compra e venda, contava
20 anos de fabricação e utilização. Defeitos constatados no sistema da
suspensão a ar do veículo que decorrem do desgaste natural do uso do
veículo, que, por ser blindado, sabidamente conta com grande incremen-
to em seu peso. Automóvel inspecionado no ato da compra por preposto
da autora que conta mais de 05 décadas de experiência no ramo de co-
mercialização de veículos. Carro que apresentava outros problemas, a
denotar ter sido cientemente negociado no estado em que se encontrava.
Autora que não de desincumbiu de provar suas alegações. Improcedên-
cia da ação que se impunha. Recurso desprovido (TJSP; Apelação Cível
1002224-13.2022.8.26.0586; Relator: Issa Ahmed; Órgão Julgador: 34ª
Câmara de Direito Privado; Foro de Campinas - 7ª Vara Cível; Data do
Julgamento: 23/08/2023; Data de Registro: 23/08/2023).
Assim, mantém-se a sentença, com a majoração dos honorários advoca-
tícios anteriormente arbitrados, passando de 10% para 11% do valor atualizado
da causa, nos termos do artigo 85, §11, do Código de Processo Civil.
Tem-se por prequestionada e reputa-se não violada toda a matéria consti-
tucional e infraconstitucional invocada, anotando-se a desnecessidade de men-
ção expressa a todos os dispositivos legais e argumentos trazidos pelas partes,
conforme entendimento pacífico dos Colendos Tribunais Superiores.
Nesses termos, nego provimento ao recurso.