APELAçãO – DIREITO CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO ANULATÓRIA DE ARREMATAÇÃO JUDICIAL. RECURSO PROVIDO. 1. A autora adquiriu o apartamento, com quitação integral em 2009. O compromisso de compra e ven- da não foi registrado na matrícula do imóvel. A cons- trutora alienou fiduciariamente o imóvel ao Banco Semear S.A., que cedeu o crédito ao fundo apelado. Embargos de terceiro foram julgados procedentes, reconhecendo a aquisição do bem pela autora antes da penhora. 2. A questão em discussão consiste em determinar se a falta de registro do compromisso de compra e venda impede a autora de reivindicar a propriedade do imó- vel e anular a arrematação judicial. 3. jurisprudência do STJ admite a oposição de em- bargos de terceiro com base na posse advinda de com- promisso de compra e venda, mesmo sem registro, conforme Súmula 84. 4. A promessa de compra e venda, ainda que não re- gistrada, é oponível a terceiros, não podendo a ausên- cia de registro ser suficiente para subtração do direito da autora. 186 5. Recurso provido. A sentença é reformada para jul- gar procedentes os pedidos iniciais e anular a arrema- tação realizada. Legislação citada: Código Civil, arts. 1.417 e 1.418. Jurisprudência - Direito Privado Código de Processo Civil, art. 487, inciso I; art. 85, §11. Jurisprudência citada: STJ, REsp n. 1.221.369/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe de 30/8/2013. TJSP, Apelação Cível 1015689-35.2021.8.26.0001, Rel. Enio Zuliani, j. 05/06/2025. TJSP, Apelação Cí- vel 1006634-26.2022.8.26.0001, Rel. Eduardo Gesse, j. 27/11/2024(TJSP; Apelação 1015689-35.2021.8.26.0001; Relator: ALEXANDRE LAZZARINI; Órgão Julgador: Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça; Data do Julgamento: 8 de julho de 2025)
, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça
de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V.U.
Sustentou oralmente o Dr. João da Silva Oliveira Junior, OAB/SP 450.893.”, de
conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. (Voto nº 33.018)
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ALE-
XANDRE LAZZARINI (Presidente), EDSON LUIZ DE QUEIROZ e CÉSAR
PEIXOTO.
São Paulo, 8 de julho de 2025.
ALEXANDRE LAZZARINI, Relator
Ementa: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO
ANULATÓRIA DE ARREMATAÇÃO JUDICIAL.
RECURSO PROVIDO.
1. A autora adquiriu o apartamento, com quitação
integral em 2009. O compromisso de compra e ven-
da não foi registrado na matrícula do imóvel. A cons-
trutora alienou fiduciariamente o imóvel ao Banco
Semear S.A., que cedeu o crédito ao fundo apelado.
Embargos de terceiro foram julgados procedentes,
reconhecendo a aquisição do bem pela autora antes
da penhora.
2. A questão em discussão consiste em determinar se a
falta de registro do compromisso de compra e venda
impede a autora de reivindicar a propriedade do imó-
vel e anular a arrematação judicial.
3. jurisprudência do STJ admite a oposição de em-
bargos de terceiro com base na posse advinda de com-
promisso de compra e venda, mesmo sem registro,
conforme Súmula 84.
4. A promessa de compra e venda, ainda que não re-
gistrada, é oponível a terceiros, não podendo a ausên-
cia de registro ser suficiente para subtração do direito
da autora.
186
5. Recurso provido. A sentença é reformada para jul-
gar procedentes os pedidos iniciais e anular a arrema-
tação realizada.
Legislação citada: Código Civil, arts. 1.417 e 1.418.
Jurisprudência - Direito Privado
Código de Processo Civil, art. 487, inciso I; art. 85, §11.
Jurisprudência citada: STJ, REsp n. 1.221.369/RS,
relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe de 30/8/2013.
TJSP, Apelação Cível 1015689-35.2021.8.26.0001,
Rel. Enio Zuliani, j. 05/06/2025. TJSP, Apelação Cí-
vel 1006634-26.2022.8.26.0001, Rel. Eduardo Gesse, j.
27/11/2024
VOTO
Trata-se de apelação interposta contra a r. sentença (fls. 288/292), cujo
relatório adota-se, que julgou improcedente a “ação anulatória de arrematação
judicial com pedido de tutela antecipada c.c. pedido liminar”, proposta por Elia-
ni Terto de Araujo, Arlete Monteiro da Silva em face de Sato Leilões e Meinberg
Fundo de Investimentos em Direitos Creditórios Multissetorial.
Deixou de condenar a autora ao pagamento de custas e honorários por ser
beneficiária da gratuidade judiciária.
Apelação da autora (fls. 295/302). Insurge-se a apelante sustentando, em
síntese, que: a) foi ignorado o v. acórdão proferido em sede de apelação em em-
bargos de terceiro no qual se reconheceu a procedência do pedido da apelante,
determinando o levantamento da constrição que recaía sobre matrícula do imó-
vel; b) a procedência dos embargos de terceiro comprova o direito da apelante
sobre o imóvel; c) a apelante de fato pagou e quitou o apartamento; d) devem
ser aplicadas as disposições consumeristas à relação entre as partes; e) a com-
provação do pagamento da quitação do imóvel reforça tese e evidencia a boa-fé
na aquisição do bem; f) a apelante, ao efetuar o pagamento integral do imóvel
adquiriu o direito de propriedade, ainda que a formalização da transferência não
tenha sido concluída em tempo hábil.
Requer, por fim, que a r. sentença seja reformada para julgar totalmente
procedentes os pedidos iniciais.
Contrarrazões de apelação apresentadas às fls. 314/320 e às fls. 321/339.
Houve oposição ao julgamento virtual (fl. 343).
É o relatório.
I) A r. sentença recorrida foi proferida nos seguintes termos (fls. 288/292):
“É o relatório.
Decido;
Deixo de apreciar as questões preliminares em atenção ao princí-
pio da primazia do julgamento de mérito.
E o pedido é improcedente.
Com efeito, o ponto de partida da petição inicial é a propriedade
da autora em relação ao imóvel de matrícula nº 183.680, do 6º Registro de
Imóveis da Capital. Contudo, para comprovar o domínio, a autora juntou
certidão da matrícula do imóvel ilegível, porque tem o conteúdo recôndito
Jurisprudência - Direito Privado
por aposição de tarja preta que cobre in totum o documento, como se vê
de fls. 12/19.
No entanto, a ré MEINBERG FUNDO DE INVESTIMENTOS
EM DIREITOS CREDITÓRIOS MULTISSETORIAL juntou o inteiro
teor de tal documento, do qual se constata que, de fato, jamais tal bem
foi transferido para o nome da autora, consoante se infere de fls. 220/225.
Portanto, em relação ao imóvel de matrícula nº 183.680, do 6º Re-
gistro de Imóveis da Capital, jamais foi a autora proprietária dele, pelo
que incabível a defesa do bem com base em título de domínio.
Mutatis mutandis, já se decidiu:
Apelação - Ação de imissão na posse c.c. indenização por danos
materiais e morais - Extinção sem apreciação do mérito - Inconformismo
dos autores - Pedido de imissão promovida contra síndico e condomínio
que não autorizaram o ingresso no imóvel ante a ausência de prova da
propriedade - Não se confunde o fato narrado com imissão na posse - São
ilegítimos o síndico e o condomínio para figurar no polo passivo da imis-
são - Legitimidade, no entanto, para pedido de danos materiais e morais
- Anulação que não se acolhe - Sentença que embora tenha abordado o
mérito do pedido indenizatório não trouxe no dispositivo a improcedência
do pedido - Causa madura para julgamento pelo mérito - Art.1013, §3º,
I do CPC - Danos materiais e morais indevidos - Não autorização para
ingresso no apartamento que decorreu do exercício regular do direito já
que não houve comprovação da propriedade do imóvel pelos autores -
Imóvel que teve consolidada a propriedade em nome do credor fiduciário
- Leilão que não foi informado - Corria ação de cobrança de despesas
condominiais proposta pelo condomínio contra o banco que não informou
do leilão - Autores que não ingressaram com ação de imissão contra quem
de direito, e que não apresentaram ao condomínio prova inequívoca da
propriedade, não servindo para tanto o contrato de financiamento - Fato
do imóvel estar desocupado que não exime os autores das providencias
legais - Disposto no art. 338 do CPC em relação aos honorários que não
se aplica ao caso, já que os autores não acolheram a alegação de ilegitimi-
dade dos réus - Sentença mantida em relação a extinção, sem julgamento
do mérito, do pedido de imissão com improcedência dos pedidos indeni-
zatórios - Apelação desprovida, com observação (TJSP; Apelação Cível
1008231-21.2023.8.26.0704; Relator (a): Silvério da Silva; Órgão Julga-
dor: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional XV - Butantã - 2ª Vara
Cível; Data do Julgamento: 19/03/2025; Data de Registro: 19/03/2025)
Apelação. Reivindicatória. Extinção do processo. Art. 485, IV,
CPC. Inconformismo do autor. Descabimento. prova da titularidade do
domínio. Ausência. Ação petitória exige a prova da propriedade. Docu-
188
mentos apresentados que não comprovam induvidosamente a alegação,
do autor, de ser o proprietário do imóvel. Extinção mantida. Apelação
não provida. (TJSP; Apelação Cível 1001877-58.2022.8.26.0075; Relator
(a): Pedro de Alcântara da Silva Leme Filho; Órgão Julgador: 8ª Câma-
Jurisprudência - Direito Privado
ra de Direito Privado; Foro de Bertioga - 2ª Vara; Data do Julgamento:
30/09/2024; Data de Registro: 30/09/2024)
No caso, porém, a problemática não envolve apenas a falta de pro-
priedade do bem, mas a prova de que o bem jamais pertenceu à autora.
Posto isso, julgo improcedente o pedido deduzido por ELIANI
TERTO DE ARAUJO contra SATO LEILÕES e MEINBERG FUNDO
DE INVESTIMENTOS EM DIREITOS CREDITÓRIOS MULTISSE-
TORIAL e declaro extinto o processo, com resolução de mérito, na forma
do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Deixo de condenar a
autora ao pagamento de custas e honorários por ser beneficiária da assis-
tência judiciária gratuita, de acordo com o entendimento segundo o qual
a Constituição da República, no art. 5º, inciso LXXIV, cria imunidade ao
beneficiário e não mera isenção, falecendo ao art. 98 do novo CPC (mor-
mente §§ 2º e 3º) fundamento constitucional.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.”
II) Inicialmente, para melhor solução da controvérsia dos autos, é caso de
listar a cronologia dos eventos e fatos subjacentes à causa:
a. A apelante adquiriu em 27.05.2007 o apartamento nº 154, localizado na Tor-
re 2 Edifício UP DECK, no empreendimento denominado “Residencial Ibiti-
rama Family Club”, situado à Rua Ibitirama, nº 1.776, matriculado sob nº
183.680, do 6ºCRI de Imóveis de São Paulo (fls. 37/41 dos autos nº 1003196-
72.2021.8.26.0309)
Naqueles autos, há demonstrativo de quitação do contrato que se deu em
2009 (fls. 16/19 dos autos nº 1003196-72.2021.8.26.0309), termo de recebimen-
to da construção e aceitação das chaves (fls. 27/29) e o próprio quadro resumo
firmado em 24/0/2009 (fls. 37/41)
O compromisso de compra e venda não foi registrado na matrícula do
imóvel.
b. Em 19.11.2014, a Flamingo Spe Empreendimentos Imobiliários Ltda. alienou
fiduciariamente ao Banco Semear S.A. o imóvel do litígio, cujo crédito foi cedi-
do em 03.12.2014 ao fundo apelado (fls. 148/149);
c. Em 24.02.2021 o apelante apresentou os embargos de terceiro nº 1003196-
72.2021.8.26.0309 pretendendo a desconstituição da penhora averbada jun-
to à mencionada matrícula em 03/03/2017, decorrente da ação de execução nº
0035870-09.2010.8.26.0309.
Os embargos foram julgados procedentes, reconhecendo que a aquisição
do bem imóvel pela embargante, ora apelante, se seu em data anterior ao ajuiza-
mento da ação que deu origem à penhora, não podendo esta, portanto, subsistir.
d. Em 24.09.2021, houve o inadimplemento por parte da Construtora da quantia
confessada, o que deu ensejo ao início ao procedimento de execução extrajudi-
cial da dívida, nos termos da lei de alienação fiduciária (fls. 226/227).
III) Os documentos de fls. 10/39 comprovam que a autora firmou com a
construtora Flamingo SPE Empreendimentos Imobiliários Ltda compromisso
de compra e venda, inclusive cujo preço foi integralmente pago em 2009.
Jurisprudência - Direito Privado
Deve-se salientar que o C. Superior Tribunal de Justiça, por acórdão re-
latado pela Ministra Nancy Andrighi, manteve a prioridade do direito do com-
promissário comprador, ainda que sem registro do título (Resp. 1221369 RS, DJ
de 30.8.2012):
“DIREITO CIVIL. PROPRIEDADE. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO
ANULATÓRIA. COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA. REGISTRO
IMOBILIÁRIO. OPOSIÇÃO. ADJUDICAÇÃO EM HASTA PÚBLICA. BOA-
FÉ. 1. Discussão sobre se a aquisição do imóvel pelo recorrido, em virtude da
celebração de compromisso de compra e venda quitado anos antes da penhora
efetivada em sede da ação trabalhista, prevalece em relação à propriedade do
recorrente, que adjudicou o bem em hasta pública, seguindo os ditames legais,
à época em que, de acordo com o registro imobiliário, ele se encontrava livre e
desembaraçado de quaisquer ônus. 2. A ausência de decisão sobre os dispositi-
vos legais supostamente violados, não obstante a interposição de embargos de
declaração, impede o conhecimento do recurso especial. Incidência da Súmula
211/STJ. 3. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o tribunal de origem pro-
nuncia-se de forma clara e precisa sobre a questão posta nos autos. 4. Conforme
a estrita técnica processual, quando um terceiro apresenta oposição, pretendendo
a coisa ou o direito sobre o que controvertem autor e réu, antes da audiência, ela
correrá simultaneamente à ação principal, devendo ser julgada pela mesma sen-
tença, que primeiramente deverá conhecer da oposição, dado o seu caráter preju-
dicial. Contudo, na hipótese, não se vislumbra a existência de qualquer prejuízo
ao devido processo legal ou ao recorrente em razão do julgamento da oposição
ter se dado, embora na mesma data, após o julgamento da anulatória. 5. O Códi-
go Civil de 1916, vigente à época da celebração do negócio de compra e venda
pelos recorridos, de fato, exigia, no art. 530, o registro do título translativo da
propriedade imóvel por ato inter vivos, onerosos ou gratuitos, para a transmissão
do domínio do bem. 6. A jurisprudência conferia ao promitente comprador o
direito à adjudicação compulsória do imóvel independentemente de registro
(Súmula n. 239); e, quando registrado, o compromisso de compra e venda
foi erigido à seleta categoria de direito real pelo Código Civil de 2002 (art.
1.225, inciso VII), sendo, portanto, oponível em relação aos terceiros. 7. Esta
Corte, sobrepujando a questão de fundo sobre a questão da forma, como
técnica de realização da justiça, vem conferindo interpretação finalística à
Lei de Registros Públicos. Súmula 84/STJ. 8. Os recorridos agiram com boa-fé
quando celebraram o compromisso de compra e venda do imóvel. O recorrente
também agiu de boa-fé na hipótese, ao seguir todos os trâmites legalmente pre-
vistos para a aquisição da propriedade através da adjudicação do bem em hasta
pública e registro do respectivo título no cartório de imóveis. 9. Diante das pe-
culiaridades da hipótese, não se afigura razoável afastar o direito dos recorridos
sobre o bem, que acreditaram ter adquirido por força do compromisso de compra
e venda, e sobre o qual exercem a posse há aproximadamente 20 (vinte) anos. 10.
190
Recurso especial desprovido.” (REsp n. 1.221.369/RS, relatora Ministra Nancy
Andrighi, Terceira Turma, julgado em 20/8/2013, DJe de 30/8/2013; g.n.)
IV) É bem verdade que, conforme o nosso ordenamento jurídico, o pro-
prietário é aquele indicado na matrícula do imóvel, ocorrendo a transferência da
Jurisprudência - Direito Privado
propriedade do imóvel com a transcrição do título aquisitivo no Ofício Imobi-
liário.
Os réus adotaram a providência de registrar a garantia de alienação fi-
duciária, enquanto a autora deixou de realizar o devido registro da avença por
ela firmada e, consequentemente, deixou de transferir o bem para a sua esfera
patrimonial.
Trata-se esse registro do contrato de compra e venda de um requisito ex
lege, conforme dicção do art. 1.417 do Código Civil.
Não se pode ignorar que o art. 1.418 do Código Civil classifica o contrato
de compra e venda como direito real a aquisição do imóvel, o qual se aperfei-
çoará com a transmissão da propriedade, sendo da substância do negócio jurí-
dico a transmissibilidade do imóvel, preenchidas as condições estabelecidas no
contrato, inclusive com o pagamento do preço.
A existência dos contratos chamados “contrato de gaveta”, por sua vez,
é uma realidade no mundo dos fatos, e as circunstâncias do caso concreto, as
evidências de licitude do negócio jurídico realizado e, sobretudo, a boa-fé da
autora por ocasião da aquisição da unidade devem ser levados em consideração
na ausência de observância da determinação registral legal, de modo que esta
exigência não deve ser vista como absoluta.
Sobre a questão, assim dispõe a Súmula 84 do STJ:
STJ, Súmula 84: É admissível a oposição de embargos de terceiro fun-
dados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de
imóvel, ainda que desprovido do registro.
Do mesmo modo a adjudicação do bem pelo promitente comprador e
desde que pago o preço não encontra obstáculo na jurisprudência, consoante
Súmula 239 do STJ:
STJ, Súmula 239: “O direito à adjudicação compulsória não se condicio-
na ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis.”
A promessa de compra e venda, mesmo que não tenha sido registrada, é
oponível a terceiro, pois tal efeito é da essência do direito.
A ausência de seu registro não pode ser tida como suficiente para subtra-
ção do direito e dos efeitos dele irradiados, maculando o negócio e possibilitan-
do a perda do bem pela adquirente.
V) A evolução do direito contratual está centrada na proteção que o com-
promisso confere, mesmo sem registro, devido a confiança que gera para o com-
prador, sendo prova disso o reconhecimento de que caracteriza justo título para
pleitear usucapião ordinária (Resp. 1584447 MS, DJ de 12-3-2021, Ministro Ri-
cardo Villas Bôas Cueva) e pode ser considerado título para conceder a imissão
na posse (sabidamente ação petitória), conforme exposto pelo Ministro Paulo de
Tarso Sanseverino (Resp. 1724739 SP, DJ de 29-3-2019):
“RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
Jurisprudência - Direito Privado
AÇÃO DE IMISSÃO NA POSSE. AÇÃO PETITÓRIA COM BASE NO DO-
MÍNIO. NECESSIDADE, EM PRINCÍPIO, DA DEMONSTRAÇÃO DA
PROPRIEDADE DO BEM PELO DEMANDANTE. POSSIBILIDADE, NO
ENTANTO, DE O ADQUIRENTE, OSTENTANDO A PROMESSA DE COM-
PRA E VENDA CELEBRADA COM O PROPRIETÁRIO REGISTRADO DO
IMÓVEL, AJUIZAR FRENTE A TERCEIROS QUE NÃO DETENHAM TÍ-
TULO DESSA NATUREZA, A COMPETENTE DEMANDA PARA SE VER
IMITIDO NA POSSE. 1. Controvérsia em torno da viabilidade jurídica do ajui-
zamento de imissão na posse pelo adquirente (promitente comprador) de imóvel,
apresentando o respectivo título aquisitivo, mas ainda não registrado no Cartório
do Registro de Imóveis. 2. O autor, ostentando título aquisitivo de imóvel em
que consta o proprietário registral do bem como promitente vendedor, mas que
não o registrou no álbum imobiliário, nem celebrou a escritura pública apta à
transferência registral, pode se valer da ação de imissão de posse para ser imitido
na posse do bem. 3. Necessário apenas verificar de modo mais aprofundado, no
curso da ação de imissão na posse movida pelo compromissário comprador, se
os réus ostentam título que lhes possa franquear a propriedade do bem, situação
a ser observada pela Corte de origem, pois limitada, tão somente, à análise das
provas coligidas. 4. Acórdão recorrido reformado de modo a se reconhecer a
possibilidade de o compromissário comprador ser imitido na posse do imóvel,
mesmo não sendo ele ainda proprietário, determinando-se, ainda, que a Corte de
origem, à luz das provas produzidas e dos argumentos esgrimidos pelos deman-
dados, verifique se ostentam direito a lhes franquear a propriedade do imóvel,
em detrimento do direito do autor. 5. Doutrina e jurisprudência acerca do tema.
6. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.” (REsp n. 1.724.739/SP, relator Minis-
tro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 26/3/2019, DJe de
29/3/2019.)
VI) Mostra-se relevante ainda apontar que a apelada exerce o direito de
posse do imóvel, o qual lhe foi legitimamente transferido pela construtora, qua-
se dez anos antes da constituição indevida da garantia de alienação fiduciária do
bem pela construtora (fls. 220/225).
Assim e pela intensa notoriedade conquistada como fruto da boa-fé, a
falta de registro do compromisso de compra e venda não pode ser alçada a fator
que conduza a ineficácia do negócio jurídico representado por ele.
Nesse sentido, são os julgados deste E. Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo pena anulação da arrematação:
“APELAÇÃO - AÇÃO ANULATÓRIA DE PENHORA E ADJUDI-
CAÇÃO - Sentença de procedência - Irresignação dos réus - Validade de título
aquisitivo não registrado no cartório imobiliário questionada pelos réus - Autora
que se encontra na posse do bem há 20 anos e não teve ciência da constrição do
imóvel - Ausência de registro antecedendo a penhora e adjudicação que se mos-
192
tra irrelevante perante as circunstâncias do caso - Elementos presentes nos autos
que não apresentam aptidão para macular o direito da autora - Sentença mantida.
Não provimento.” (TJSP; Apelação Cível 1015689-35.2021.8.26.0001; Relator
(a): Enio Zuliani; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional
Jurisprudência - Direito Privado
I - Santana - 7ª Vara Cível; Data do Julgamento: 05/06/2025; Data de Registro:
09/06/2025)
“Apelação. Ação anulatória de arrematação. Sentença de improcedência.
Inconformismo do réu. Autora não intimada da arrematação. Possibilidade do
manejo de ação autônoma, nos termos do art. 903, §4º do CPC. Instrumento de
Compromisso de Compra e Venda firmado e pago muito antes do ajuizamento
da ação. Elementos dos autos que demonstram estar a autora há muito na posse
do bem, com justo título. Ausência de qualquer indicação de fraude à execução
ou contra credores. Anulação da arrematação que é medida de rigor. Precedentes
deste e. TJSP e do c. STJ. Honorários sucumbenciais. Réu que, mesmo após a
ciência de estar o imóvel alienado para eventual terceiro, optou por continuar a
constrição que ensejou na arrematação, por si, do bem. Não se desincumbiu de
verificar informações relativas ao ocupante do bem. Réu, credor, que deu causa
ao ajuizamento da ação. Princípio da causalidade. Redução dos honorários pela
equidade que é inviável. Sentença de procedência mantida. Majoração dos ho-
norários sucumbenciais. Recurso desprovido.” (TJSP; Apelação Cível 1006634-
26.2022.8.26.0001; Relator (a): Eduardo Gesse; Órgão Julgador: 28ª Câmara de
Direito Privado; Foro Regional I - Santana - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento:
27/11/2024; Data de Registro: 27/11/2024)
“Apelação. Cumprimento de sentença. Embargos de terceiro. Penhora,
leilão e arrematação de bem imóvel. Satisfação do ônus da prova da posse pelo
embargante. Aquisição de boa-fé por meio de compromisso de compra e venda
sem registro. Súmula nº 84 do STJ. Anulação dos atos constritivos. Possibili-
dade. Carta de arrematação ainda não expedida. Embargos ora acolhidos. Re-
curso provido. (TJSP; Apelação Cível 1001275-16.2022.8.26.0480; Relator (a):
Luis Fernando Camargo de Barros Vidal; Órgão Julgador: 14ª Câmara de Di-
reito Privado; Foro de Presidente Bernardes - Vara Única; Data do Julgamento:
05/04/2023; Data de Registro: 05/04/2023).
“Compromisso de compra e venda - Demanda anulatória de arrematação
judicial - Irrelevância da falta de registro do formal previamente à constrição
ou mesmo ao ato expropriatório -Orientação jurisprudencial predominante em
tal sentido, inclusive no E. Superior Tribunal de Justiça -Decisão fundamenta-
da - Sentença mantida - Recurso das requeridas desprovido, recurso do autor
provido para alterar a distribuição das sucumbências.” (TJSP; Apelação Cível
1016008-18.2018.8.26.0224; Relator (a): Fábio Quadros; Órgão Julgador: 4ª Câ-
mara de Direito Privado; Foro de Guarulhos - 9ª Vara Cível; Data do Julgamento:
06/04/2022; Data de Registro: 06/04/2022)
VII) Nesse contexto, não há dúvidas quanto ao fato de que o imóvel pe-
nhorado pertence ao patrimônio da parte autora e não da parte ré.
De rigor, pois, a anulação da arrematação.
VIII) Portanto, diante de todos esses fundamentos, deve a r. sentença ser
reformada para julgar os pedidos iniciais procedentes e anular a arrematação
realizada.
Nos termos do art. 85, §11, do CPC/2015, fixo os honorários advocatícios
Jurisprudência - Direito Privado
para 15% do valor da causa.
Diante do exposto, dá-se provimento ao recurso.