Decisão agravo13

Recurso: Apelação

Relator: MILTON CARVALHO

Data do julgamento: 26 de junho de 2025

Ementa Técnica

APELAçãO – LOCAÇÃO. Ação declaratória de nulidade de contrato com pedido subsidiário de revisão de alu- guel. Acolhimento apenas do pedido subsidiário. In- surgência da ré. Preliminares de não conhecimento do recurso rejeitadas. Revisão dos aluguéis que era pos- sível, pois atendidos os requisitos do art. 19 da Lei de Locações. Demonstração, pela autora, de que o valor do aluguel pago pela ré é substancialmente inferior ao praticado em outros espaços do mesmo shopping. Ausência de impugnação aos documentos que instruí- ram a petição inicial. Alegações deduzidas pela ré que são genéricas e desprovidas de respaldo probatório. Revisão do aluguel na forma determinada pelo Juízo 92 “a quo” que era de rigor. Erro material na sentença corrigido de ofício, para determinar que o reajuste do aluguel ocorra anualmente. Recurso desprovido, com observação. Jurisprudência - Direito Privado(TJSP; Relator: MILTON CARVALHO; Data do Julgamento: 26 de junho de 2025)

Voto / Fundamentação

, em sessão permanente e virtual da 36ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Ne- garam provimento ao recurso, com observação. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. (Voto nº 44.738) O julgamento teve a participação dos Desembargadores LIDIA CONCEI- ÇÃO (Presidente) e PEDRO BACCARAT. São Paulo, 26 de junho de 2025. MILTON CARVALHO, Relator


Ementa: LOCAÇÃO. Ação declaratória de nulidade de contrato com pedido subsidiário de revisão de alu- guel. Acolhimento apenas do pedido subsidiário. In- surgência da ré. Preliminares de não conhecimento do recurso rejeitadas. Revisão dos aluguéis que era pos- sível, pois atendidos os requisitos do art. 19 da Lei de Locações. Demonstração, pela autora, de que o valor do aluguel pago pela ré é substancialmente inferior ao praticado em outros espaços do mesmo shopping. Ausência de impugnação aos documentos que instruí- ram a petição inicial. Alegações deduzidas pela ré que são genéricas e desprovidas de respaldo probatório. Revisão do aluguel na forma determinada pelo Juízo 92 “a quo” que era de rigor. Erro material na sentença corrigido de ofício, para determinar que o reajuste do aluguel ocorra anualmente. Recurso desprovido, com observação. Jurisprudência - Direito Privado





VOTO

Trata-se de pedido declaratório de nulidade, cumulado com pedido subsi- diário de revisão de aluguéis, julgados parcialmente procedentes pela respeitá- vel sentença de fls. 190/192, cujo relatório se adota, para fixar o valor do aluguel do imóvel, retroativo à citação, em R$11.960,64, com reajuste mensal pelo IGP -M, com anotação de que as diferenças devidas durante o processo serão pagas corrigidas monetariamente e serão exigíveis a partir do trânsito em julgado, em virtude do que as custas e despesas processuais foram rateadas entre as partes, na razão de 70% para a ré e 30% para a autora, a ré foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre 70% do valor da causa, e a autora, de honorários fixados em 10% sobre 30% do valor da causa. Inconformada, apela a ré, sustentando que o reajuste fixado na sentença corresponde a quase 100% do valor do aluguel atual, que é de R$6.000,00; que a autora alega sofrer prejuízos em decorrência do contrato, no entanto, não houve qualquer irregularidade de sua parte; que a autora apenas pretende reajustar os alugueis sem qualquer justificativa, o que é absurdo, excessivo e gera desequi- líbrio contratual; que a autora não comprovou a ocorrência de quebra do equilí- brio contratual ou a necessidade de restabelecê-lo; que é inadmissível a revisão dos aluguéis que foram pactuados de forma consensual, lógica e razoável; que a autora desenvolve raciocínio propositadamente equivocado com o intuito de induzir o Juízo a erro; que o reajuste determinado na sentença gera enriqueci- mento sem causa para a autora; que deve ser prestigiada a livre manifestação de vontade das partes, na qual se observaram a função social do contrato e a boa- fé objetiva; que deve ser observada a liberdade de contratar e o ato jurídico perfeito; e, que entende que um reajuste de 30% é justo para ambas as partes (fls. 195/203). Houve resposta (fls. 209/225). É o essencial a ser relatado. O apelo não é de ser provido, com observação. A preliminares de não conhecimento do recurso arguidas pela autora não comportam acolhimento. O apelo atende aos requisitos do artigo 1.010 do Código de Processo Ci- vil, pois a ré indicou os fatos e fundamentos jurídicos que embasam o pedido de reforma da sentença, aduzindo, em síntese, que a pretensão da autora de revisar 92 o aluguel é injustificada e que o valor fixado pelo Juízo a quo é excessivo. As- sim, como as alegações deduzidas pela ré são suficientes a impugnar os funda- mentos da sentença, não há que se falar em inépcia recursal por desatendimento ao princípio da dialeticidade. Tampouco se reconhece que as razões deduzidas no apelo configuram Jurisprudência - Direito Privado inovação recursal, uma vez que em contestação a ré impugnou a pretensão de revisão do contrato, alegando que a autora não teria apresentado provas que a respaldassem, que o valor do aluguel apontado como devido na petição inicial era descabido e excessivo, e que não era possível a revisão para aplicar cláusula de reajuste (fls. 162/163). Os argumentos contidos no apelo decorrem daqueles expostos na contes- tação e apenas foram reforçados em razão de a sentença ter acolhido o pedido de revisão contratual, o que não se confunde com indevida inovação recursal. Superadas as preliminares, passa-se à análise do mérito. Na petição inicial a autora alegou que o contrato celebrado entre as partes seria nulo por conter disposições simuladas, em decorrência das quais a auto- ra teria experimentado prejuízos acumulados de R$324.000,00, uma vez que os aluguéis devidos pela ré são muito inferiores aos praticados com relação aos demais lojistas do shopping. Subsidiariamente, pediu a revisão do contrato, para que o aluguel devido pela ré fosse fixado em valor compatível ao pago por outros lojistas (R$15.000,00) e que o aluguel deveria ser corrigido anualmente pelo IGP-M ou pelo INPC. Os pedidos foram julgados parcialmente procedentes e, em que pese o inconformismo manifestado, a respeitável sentença recorrida não compota re- paros. O contrato que fundamenta as pretensões formuladas pela autora é aquele juntado às fls. 45/53, datado em 14/05/2021, pelo qual a ré se obrigou ao pa- gamento de aluguéis mensais de R$6.000,00, sem qualquer previsão acerca de reajuste. A demanda foi ajuizada em julho de 2024, o que era suficiente para re- conhecer o interesse da autora em pedir a revisão dos aluguéis, uma vez que, nos termos do artigo 19 da Lei de Locações, Não havendo acordo, o locador ou locatário, após três anos de vigência do contrato ou do acordo anteriormente realizado, poderão pedir revisão judicial do aluguel, a fim de ajustá-lo ao preço de mercado. A petição inicial foi instruída com outros contratos de locação firmados com lojistas do empreendimento que demonstram que o aluguel pago pela ré (R$6.000,00, sem qualquer reajuste) destoa expressivamente dos demais, cujos valores, entre os anos de 2022 e 2023, variavam de R$11.684,00 a R$12.750,00 (fls. 56/61, 62/77, 78/93, 94/109 e 110/125). Referidos documentos não foram minimamente impugnados em contes- tação, assim como não o foi a alegação da autora de que tais contratos se refe- riam a espaços semelhantes ao ocupado pela ré. 94 Na contestação a ré se limitou a alegar, genericamente, que o aluguel pre- tendido pela autora seria excessivo por ser superior ao pretendido por lei e que geraria para ela enriquecimento sem causa Ocorre que a limitação legal apontada em defesa diz respeito à fixação de Jurisprudência - Direito Privado aluguéis provisórios e não existe impedimento a que a revisão seja superior a 80% do valor vigente quando este for compatível com o efetivo valor de mer- cado. O fundamento da ação revisional é exatamente o da compatibilização do aluguel pactuado entre as partes com o valor de mercado do imóvel, como prevê o já citado artigo 19 da Lei de Locações, diante do que são descabidas as ale- gações deduzidas no sentido de que a sentença violaria a liberdade contratual, a boa-fé objetiva, a função social do contrato ou o ato jurídico perfeito. Não se pode olvidar que a locação impõe às partes obrigações de trato sucessivo e que, portanto, admitem revisão para que seja mantido o equilíbrio contratual entre as partes. Logo, a revisão do aluguel independia da prática de alguma irregularida- de por parte da ré e, para o acolhimento do pedido considerando que no caso foi atendido o requisito temporal bastava que se demonstrasse que o aluguel con- vencionado entre as partes, mesmo que de forma consensual, estava defasado em comparação com o valor de mercado. A propósito, a disparidade entre o valor do aluguel pago pela ré e aquele praticado em espaços no mesmo empreendimento é suficiente para evidenciar que existia sim desequilíbrio na relação contratual em prejuízo da autora. Nesse contexto, na falta de impugnação específica aos documentos que instruíram a petição inicial, era mesmo de se reconhecer que o aluguel pago pela ré é muito inferior àqueles devidos por outros lojistas do mesmo shopping e que se justificava a sua elevação na forma determinada pela sentença. Conquanto a ré alegue que o aumento foi excessivo e que correspondeu a quase 100% do aluguel vigente, é certo que ela não juntou com a contestação qualquer documento que pudesse contrariar aqueles apresentados pela autora, não pediu a anulação da sentença por cerceamento de defesa e, nem mesmo nes- ta fase recursal trouxe elementos objetivos que poderiam respaldar o argumento de que o valor fixado pelo Juízo a quo seria excessivo ou desproporcional. O ônus da prova quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor cabia à ré (artigo 373, II, do Código de Processo Civil), mas deste ela não se desincumbiu. Assim, nem mesmo a pretensão de que o reajuste seja limitado a 30% pode ser acolhida, porquanto desprovida de lastro probatório e não embasada em elementos objetivos. Com efeito, o valor de R$11.960,64 foi definido pelo Juízo a quo a partir de média aritmética dos valores praticados em outros cinco contratos de locação Jurisprudência - Direito Privado do mesmo shopping (que, reitera-se, não foram impugnados pela ré) e nas ra- zões de apelação não foi manifestada qualquer insurgência especifica quanto ao método de definição do novo aluguel adotado. No tocante à correção monetária incidente sobre os aluguéis, embora con- tra ela a ré não tenha se insurgido no recurso interposto, observa-se que houve erro material na sentença que deve ser corrigido de ofício, a fim de se evitar discussões futuras entre as partes. Isso porque, no dispositivo da sentença, constou que o valor do aluguel, retroativo à citação, seria de R$11.960,64, com reajuste mensal pelo IGP-M, no entanto, considerando-se a fundamentação da sentença de que a cláusula de reajuste deveria ser aplicada conforme normalmente praticado em contra- tos similares, é de rigor que a correção monetária pelo IGP- M seja computada anualmente. Assim, realizada a citação em setembro de 2024 (fls. 147/148), o reajuste do valor de R$11.960,64 deverá ocorrer apenas em setembro de 2025. Anote-se, de todo modo, que o reajuste do valor do aluguel não se con- funde com a correção monetária incidente sobre as diferenças devidas com rela- ção aos aluguéis que se venceram no curso do processo, que é devida na forma determinada pelo Juízo a quo. De rigor, portanto, a manutenção da respeitável sentença recorrida, con- quanto com a observação feita com relação à atualização do valor do aluguel (que deve ocorrer anualmente). Por conseguinte, nos termos do artigo 85, §11, do Código de Processo Civil, majoram-se os honorários fixados na sentença para 12% sobre 70% do valor da causa, levando-se em conta o trabalho adicional realizado em grau de recurso e os critérios previstos no § 2º do mesmo artigo 85. Por tais fundamentos, nega-se provimento ao recurso, com observação. Rua Calixto de Almeida, 225 . Freg. do Ó - São Paulo - SP - CEP: 02961-000 email: juridico@advocaciafcruz.com.br / paulo@fcruzadv.com.br / alexandre@fcruzadv.com.br www.advocaciafcruz.com.br | (11) 3977-9522 – (11) 98755-6900