RECURSO – Documento:7084789 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5000791-61.2025.8.24.0001/SC DESPACHO/DECISÃO Trata-se de recursos de apelação cível (evento 39, APELAÇÃO1 e evento 43, APELAÇÃO1) interpostos pelas partes contra a sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial (evento 31, SENT1), para declarar a inexistência de relação jurídica entre as partes quanto aos termos do contrato n. 816987856 e para condenar o réu à repetição simples e dobrada dos valores indevidamente descontados, autorizada a compensação com eventuais valores disponibilizados à autora.
(TJSC; Processo nº 5000791-61.2025.8.24.0001; Recurso: recurso; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7084789 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5000791-61.2025.8.24.0001/SC
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de recursos de apelação cível (evento 39, APELAÇÃO1 e evento 43, APELAÇÃO1) interpostos pelas partes contra a sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial (evento 31, SENT1), para declarar a inexistência de relação jurídica entre as partes quanto aos termos do contrato n. 816987856 e para condenar o réu à repetição simples e dobrada dos valores indevidamente descontados, autorizada a compensação com eventuais valores disponibilizados à autora.
Irresignada, a autora interpôs recurso de apelação sustentando que os descontos indevidos em seu benefício previdenciário ultrapassaram o mero engano justificável, causando-lhe extrema preocupação e sofrimento que caracterizam dano moral indenizável, o qual requer seja fixado em R$ 15.000,00. Postula ainda a redistribuição dos ônus de sucumbência e a majoração dos honorários advocatícios para R$ 4.000,00.
Por sua vez, o banco réu também recorreu arguindo preliminarmente a prescrição trienal. No mérito, sustenta a regularidade da contratação, comprovada pela disponibilização do valor em conta da autora. Subsidiariamente, pugna pela devolução simples dos valores ante a ausência de má-fé. Disse, também, que a multa fixada para o caso de descumprimento da suspensão dos descontos é descabida, razão pela qual deve ser afastada ou ao menos readequada a sua periodicidade.
Com as contrarrazões (evento 57, CONTRAZAP1 e evento 59, CONTRAZ1), vieram os autos conclusos para julgamento.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, os recursos devem ser conhecidos.
De início, adianto que o feito comporta julgamento monocrático definitivo.
Isso porque, além de estar em consonância com os incisos do art. 932 do Código de Processo Civil e com os incisos XV e XVI do artigo 132 do Regimento Interno deste , desta relatora, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 04-11-2021) (grifou-se).
Também:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C CONDENAÇÃO EM DANOS MORAIS. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DECORRENTE DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO CONTRATADO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
(...)
ALEGADA INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO. INSUBSISTÊNCIA. IMPUGNAÇÃO DO AUTOR ACERCA DA ASSINATURA APOSTA NO CONTRATO. PEDIDO DE PERÍCIA GRAFOTÉCNICA DEFERIDO. DEMANDADO QUE, INTIMADO, INFORMOU QUE A VIA ORIGINAL DO INSTRUMENTO DO NEGÓCIO JURÍDICO HAVIA SIDO DESCARTADA, EM VIRTUDE DA DIGITALIZAÇÃO DESTA. NECESSIDADE DE, PREVIAMENTE AO DESCARTE, AVERIGUAR SE A ELIMINAÇÃO PODERIA IMPEDIR A PRODUÇÃO DE PROVAS (ART. 10, §2º, RESOLUÇÃO N. 4.474/16 DO BACEN). DEVER DE GUARDA DO DOCUMENTO ATÉ QUE OCORRA A PRESCRIÇÃO OU DECADÊNCIA (ART. 1.194, CÓDIGO CIVIL). AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DA VIA ORIGINAL QUE INVIABILIZOU A REALIZAÇÃO DA PERÍCIA. PARECER EMITIDO POR PREPOSTA DO RÉU, ACERCA DA QUAL NÃO SE TEM INFORMAÇÕES SOBRE SUA FORMAÇÃO OU QUAIS TÉCNICAS E MÉTODOS CIENTÍFICOS FORAM EMPREGADOS, QUE NÃO POSSUI O CONDÃO DE ATESTAR A INEXISTÊNCIA DE FRAUDE. ÔNUS DE COMPROVAR A AUTENTICIDADE DA ASSINATURA QUE CABIA AO RÉU. EXEGESE DO ART. 429, II, DO CPC.
DEPÓSITO DA QUANTIA REFERENTE AO EMPRÉSTIMO NA CONTA DO REQUERENTE QUE NÃO É SUFICIENTE PARA COMPROVAR O VÍNCULO JURÍDICO. ENVIO DE SERVIÇO, SEM SOLICITAÇÃO PRÉVIA DO CONSUMIDOR, QUE CONFIGURA PRÁTICA ABUSIVA (ART. 39, III, CDC) E, PARA QUE HAJA DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, SE FAZ NECESSÁRIO O CONSENTIMENTO DO APOSENTADO (ART. 2º, §1º, LEI N. 10.820/03). ADEMAIS, HOUVE DEPÓSITO EM JUÍZO DO RESPECTIVO VALOR. ATO ILÍCITO CARACTERIZADO. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE AS PARTES CONFIGURADA. SENTENÇA MANTIDA.
(...)
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5003141-84.2021.8.24.0058, do , desta relatora, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 07-06-2022) (grifou-se).
Frisa-se, ainda, que não é possível considerar que houve a formalização do negócio jurídico apenas porque o demandado efetuou a transferência da quantia atinente ao empréstimo para conta de titularidade da autora.
Em primeiro, é considerada como prática abusiva o envio, sem solicitação prévia, de qualquer serviço ao consumidor (art. 39, inc. III, CDC). Em segundo, por se tratar de transação financeira com desconto em benefício previdenciário, seria imprescindível a autorização da aposentada para tanto (art. 2º, §1º, Lei n. 10.820/03), além de ser necessária a verificação dos termos pactuados, como juros e encargos. Dessa forma, não comprovada a solicitação do serviço e inexistindo manifestação de vontade autorizando os descontos, não há falar em existência da relação jurídica.
Logo, diante da não contratação do empréstimo objeto dos autos, deve ser mantida a decisão atacada.
Em seu recurso, a parte autora pretende que o réu seja condenado também ao pagamento de danos morais.
Pois bem.
Como é sabido, a Constituição da República prevê a compensação por danos morais no título referente aos direitos e garantias fundamentais, mais precisamente nos incisos V e X do art. 5º, in verbis:
Art. 5º (...)
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à imagem;
(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
Os elementos da responsabilidade civil nas relações de consumo consistem na conduta, dano e nexo de causalidade entre eles, excluída aqui a culpa ou dolo, visto que se trata de responsabilidade objetiva. Portanto, para que haja o dever de indenizar, é preciso verificar a presença desses pressupostos.
Acerca da conduta, verifica-se que ocorreram descontos no benefício previdenciário da demandante por conta de empréstimo não contratado por ela. O ato ilícito foi reconhecido em primeiro grau e mantido em sede recursal.
Não obstante, o reconhecimento de um dos pressupostos do dever de indenizar não é suficiente, por si só, para condenação da parte adversa ao pagamento de danos morais. É necessário, pois, prosseguir com a análise dos requisitos.
Em relação ao segundo pressuposto da responsabilidade civil, cuida-se de situação em que o dano depende de prova concreta e objetiva, não se aplicando, no caso, a presunção de abalo moral.
Sobre o tema, Sérgio Cavalieri Filho leciona que:
O dano é o grande vilão da responsabilidade civil, encontra-se no centro da obrigação de indenizar. Não haveria que se falar em indenização, nem em ressarcimento, se não fosse o dano. Pode haver responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano. O dever de reparar só ocorre quando alguém pratica ato ilícito e causa dano a outrem. Em outras palavras, a obrigação de indenizar pressupõe o dano e sem ele não há indenização devida. Não basta o risco de dano, não basta a conduta ilícita. Sem uma consequência concreta, lesiva ao patrimônio econômico ou moral, não se impõe o dever de reparar. (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2020, p. 86)
Imprescindível, portanto, avaliar as peculiaridades do caso, a fim de verificar se houve prejuízos extrapatrimoniais capazes de ensejar a indenização.
No caso concreto, a autora aduz que o dano encontra-se consubstanciado no débito mensal em parcela de natureza salarial por um serviço nunca utilizado ou contratado, destacando que qualquer desconto indevido em seu benefício causa transtornos na manutenção de sua subsistência.
Entretanto, não trouxe comprovação no sentido de que as deduções mensais de R$ 85,71, que representam 8,2% de seu benefício previdenciário de R$ 1.032,76, comprometeram sua vida financeira a ponto de ficar impossibilitada de adimplir alguma dívida, adquirir algum produto que fosse de sua conveniência ou, ainda, que tenha ocorrido impacto financeiro em seu orçamento.
Aliás, frisa-se que a demanda foi proposta em 06/03/2025 e os descontos iniciaram em 07/2021, o que faz presumir que não estavam afetando significativamente a condição financeira da autora, já que ocorreram por longo período.
De mais a mais, deve ser considerado que haverá a restauração do status quo ante e as quantias indevidamente debitadas serão restituídas, de modo que a requerente não experimentará qualquer prejuízo financeiro.
É claro que a dedução mensal indevida, oriunda de contratação fraudulenta, é situação que gera indignação por parte da vítima que percebeu descontos em seu benefício previdenciário sem sua autorização. Entretanto, é preciso ter em mente que, para que seja configurado o dever de indenizar, o evento noticiado precisa ter gerado efetivo dano à personalidade.
Nesse sentido, Sérgio Cavalieri Filho ensina que:
(...) só deve ser reputado como dano moral a agressão a um bem ou atributo da personalidade que cause dor, vexame, sofrimento ou humilhação; que fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos. (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2020, p. 102)
Portanto, mais do que alegar que sofreu inúmeros transtornos e que os prejuízos decorrentes dos descontos são notórios, a requerente precisaria ter relatado as peculiaridades do seu caso concreto a fim de demonstrar, efetivamente, o dano sofrido em decorrência do ilícito praticado pelo requerido. Como na espécie não consta dos autos a narrativa de situação particular e tampouco comprovação da ocorrência do abalo anímico, não é possível vislumbrar a existência de dano a ser indenizado.
É este o entendimento desta Câmara em casos semelhantes:
RESPONSABILIDADE CIVIL - DANOS MORAIS E RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO - EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - DÉBITO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO - ATO ILÍCITO CONFIGURADO - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - DESCABIMENTO - ABALO ANÍMICO NÃO EVIDENCIADO
Os descontos indevidos promovidos por entidade financeira no benefício previdenciário do aposentado, sem que tenha este demonstrado forte perturbação ou afetação à sua honra ou tranquilidade de vida, não configuram danos morais indenizáveis.
Afinal, consoante entende este Tribunal, "embora não se elimine o aborrecimento sofrido pela demandante, por conta do desconto indevido em seu benefício previdenciário, tal fato, por si só, não faz presumir a existência de dano moral indenizável, sobretudo à falta de prova de evento grave que possa expor a vítima à humilhação, vexame ou abalo psicológico significativo" (AC n. 0301583-51.2015.8.24.0074, Des. João Batista Góes Ulysséa).
(TJSC, Apelação n. 5000937-57.2021.8.24.0029, do , rel. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 14-12-2021) (grifou-se).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS COM PEDIDO LIMINAR. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO CONTRATADO E DESCONTADO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO RÉU PLEITO DE AFASTAMENTO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA INSCRIÇÃO DO NOME DA DEMANDANTE NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO OU DE QUALQUER OUTRA CIRCUNSTÂNCIA VEXATÓRIA. COBRANÇA INDEVIDA DA DÍVIDA QUE NÃO CARACTERIZA, POR SI SÓ, O ABALO ANÍMICO. SITUAÇÃO QUE NÃO REPERCUTIU NA ESFERA ÍNTIMA DA REQUERENTE A PONTO DE OFENDER-LHE A HONRA E A DIGNIDADE. MERO DISSABOR. DEVER DE INDENIZAR NÃO CARACTERIZADO. ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. NECESSIDADE DE REDISTRIBUIÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DESSAS VERBAS EM RELAÇÃO À AUTORA, POR SER BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA, NA FORMA DO ART. 98, § 3º, DO CPC. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0302468-38.2016.8.24.0007, de Biguaçu, desta Relatora, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 05-05-2020) (grifou-se).
Assim, não comprovada a existência de dano, inexiste o dever de indenizar, de forma que não há falar em fixação de danos morais. Dessa forma, a sentença apelada deve ser mantida.
No mais, também não merece acolhida a pretensão do réu de devolução simples dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da autora.
O direito à repetição está inserto no art. 876 do Código Civil:
Art. 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.
Tratando-se de relação regida pelas normas do Código de Defesa do Consumidor, incide o previsto no art. 42 deste diploma:
Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
Não obstante, a jurisprudência desta Corte alinhava-se no sentido de que, somente em caso de má-fé comprovada por parte daquele que se beneficia da indevida cobrança é que se autorizaria a devolução de forma duplicada. Isto é, considerando a presunção de boa-fé, apenas haveria restituição em dobro nos casos em que ficasse comprovada, de forma concreta, a existência de dolo daquele que cobrou indevidamente.
Entretanto, não se pode olvidar a decisão recente da Corte Especial do STJ que modificou este entendimento, oportunidade em que concluiu pela incidência em dobro mesmo sem má-fé, mas modulando os efeitos dessa orientação:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.
HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC.
REQUISITO SUBJETIVO. DOLO/MÁ-FÉ OU CULPA. IRRELEVÂNCIA. PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. MODULAÇÃO DE EFEITOS PARCIALMENTE APLICADA. ART. 927, § 3º, DO CPC/2015.
IDENTIFICAÇÃO DA CONTROVÉRSIA 1. Trata-se de Embargos de Divergência que apontam dissídio entre a Primeira e a Segunda Seções do STJ acerca da exegese do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor - CDC. A divergência refere-se especificamente à necessidade de elemento subjetivo para fins de caracterização do dever de restituição em dobro da quantia cobrada indevidamente. (...)
TESE FINAL 28. Com essas considerações, conhece-se dos Embargos de Divergência para, no mérito, fixar-se a seguinte tese: A REPETIÇÃO EM DOBRO, PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC, É CABÍVEL QUANDO A COBRANÇA INDEVIDA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA, OU SEJA, DEVE OCORRER INDEPENDENTEMENTE DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO.
MODULAÇÃO DOS EFEITOS 29. Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado - quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público - se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão. (...)
(EAREsp 600.663/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Rel. p/ Acórdão Ministro HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/2020, DJe 30/03/2021) (grifou-se).
Acerca da modulação dos efeitos da decisão, o Min. Herman Benjamin, em seu voto vista, esclarece que:
(...)
A novel legislação processual prevê, portanto, a possibilidade de modulação de efeitos não somente quando alterada a orientação firmada em julgamento de recursos repetitivos, mas também quando modificada jurisprudência dominante no STF e nos tribunais superiores.
(...)
Na hipótese aqui tratada, a jurisprudência da Segunda Seção, relativa a contratos estritamente privados, seguiu compreensão (critério volitivo doloso da cobrança indevida) que, com o presente julgamento, passa a ser superada, o que faz sobressair a necessidade de privilegiar os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança dos jurisdicionados.
Parece prudente e justo, portanto, que se deva modular os efeitos da presente decisão, de maneira que o entendimento aqui fixado seja aplicado aos indébitos de natureza contratual não pública pagos após a data da publicação deste acórdão. (EAREsp 600.663/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Rel. p/ Acórdão Ministro HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/2020, DJe 30/03/2021, p. 71-72). (grifou-se)
Assim sendo, para as parcelas cobradas e pagas antes de 30/03/2021 (publicação do julgado), a repetição deve se dar de forma simples, exceto se comprovada a má-fé na cobrança. Já as prestações que foram adimplidas após a referida data, a repetição passa a ser feita em dobro nos casos de conduta contrária à boa-fé objetiva, independente do elemento volitivo daquele que cobrou.
No caso em concreto, observa-se que o empréstimo impugnado foi incluído no INSS em 18/06/2021, com início dos descontos em 07/2021 (evento 1, HISCRE6).
Desse modo, tem-se que, no caso sob análise, deve ser mantida a sentença que determinou a restituição dobrada dos valores deduzidos no benefício previdenciário da autora após 30/03/2021.
Ressalta-se que as parcelas a serem repetidas poderão ser verificadas pelo expediente dos §§ 3º e 5º do art. 524 do CPC, ou seja, mediante incidente de exibição de documentos em fase de cumprimento de sentença por cálculos.
No mais, o banco réu alega que o feito deve ser extinto, porquanto ocorreu a prescrição da pretensão da parte autora.
A tese de prescrição, reiterada pelo requerido, não pode ser conhecida, tendo em vista a ocorrência da preclusão, pois o réu, apesar de devidamente intimado (evento 22, DESPADEC1), não se insurgiu contra a decisão que afastou a referida prejudicial de mérito (art. 1.015, inc. II, do CPC).
Ademais, muito embora a matéria seja de ordem pública, sendo passível de análise a qualquer tempo e grau de jurisdição, tem-se entendido pela impossibilidade de reexame do tema, quando julgadas por decisão interlocutória irrecorrida ou improvido o agravo de instrumento, sob pena de violar os princípios da segurança jurídica e da duração razoável do processo. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL - PRESCRIÇÃO - DECISÃO INTERLOCUTÓRIA - AUSÊNCIA DE RECURSO - PRECLUSÃO TEMPORAL A decisão que afasta a prescrição desafia o recurso de agravo de instrumento, a teor do art. 1.015, inc. II, do Código de Processo Civil, que deve ser interposto no prazo legal, não podendo a parte pretender, em sede de apelação, rediscutir a matéria, haja vista a ocorrência da preclusão. A circunstância legal de a prescrição poder ser suscitada em qualquer grau de jurisdição não afasta a preclusão no caso de, uma vez rejeitada, não ter sido interposto o recurso cabível. [...] (TJSC, Apelação n. 0300852-89.2016.8.24.0019, de TJSC, rel. LUIZ CÉZAR MEDEIROS, 5ª Câmara de Direito Civil, j. 30-06-2020- grifei).
O requerido pugna, ainda, pela alteração da periodicidade das astreintes fixadas para o caso de descumprimento da decisão.
Razão lhe assiste.
No presente caso, a aplicação da multa deve observar o evento violador em si e a sua reiteração, não sendo razoável que sua aplicação ocorra de forma diária, porquanto geraria demasiado ônus à parte ré, que, como dito, realiza descontos apenas mensais no benefício previdenciário.
Sabe-se que a sanção pecuniária tem por finalidade única impelir a parte ao cumprimento da ordem judicial. Assim, tratando-se de obrigação de fazer, revela-se mais adequado punir a parte ré por cada ato de descumprimento da decisão.
Desta forma, deve ser reformada no ponto a sentença para que a multa incida sobre cada evento ilícito mensal, ou seja, sobre cada desconto indevido realizado no benefício previdenciário.
Com relação ao valor multa, verifica-se que, em razão alteração da periodicidade das astreintes, o montante de R$ 100,00 arbitrado na origem revela-se insuficiente, não atendendo ao seu caráter pedagógico.
Assim, observando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade e tendo em vista a finalidade coercitiva da multa, torna-se necessária a sua majoração ex officio para o montante de R$ 1.000,00 para cada desconto indevido.
Sobre o tema, cita-se julgado desta Quinta Câmara de Direito Civil:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DESCONSTITUTIVA E CONDENATÓRIA. INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA À ORIGEM. RECURSO DO RÉU.
TUTELA DE URGÊNCIA. ART. 300, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REQUISITOS. PROBABILIDADE DO DIREITO E PERIGO DE DANO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SUPOSTA FRAUDE NA CONTRATAÇÃO. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS SATISFEITOS. DECISÃO MANTIDA.
"Alegada a ocorrência de fraude, e presentes a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, deve ser mantido o interlocutório que deferiu a tutela de urgência para suspender os descontos no benefício previdenciário da parte autora. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4020362-48.2019.8.24.0000, de Blumenau, Quinta Câmara de Direito Civil, deste Relator, j. 8-10-2019).
ASTREINTES. ART. 537 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PRETENSO AFASTAMENTO DA MULTA COMINATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. MEDIDA NECESSÁRIA AO CUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL. PERIDICIOSIDADE. ALTERAÇÃO DE OFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO E, DE OFÍCIO, ALTERADA A PERIDICIOSIDADE DE INCIDÊNCIA DA MULTA COMINATÓRIA. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5027176-25.2020.8.24.0000, do , rel. Ricardo Fontes, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 04-05-2021- grifei).
Extrai-se do corpo do acórdão:
O recurso envereda contra decisão interlocutória que concedeu tutela de urgência para determinar a ré/agravante a suspensão dos descontos efetuados no benefício previdenciário do autor/agravado, sob pena de multa diária de R$ 300,00 (trezentos reais) [...]
Contudo, deve ser realizada, de ofício, pequena alteração quanto a periodicidade das astreintes.
Isso porque a abstenção determinada pela autoridade judiciária de primeiro grau - frise-se, proibição de desconto em benefício previdenciário - renova-se mensalmente, de modo que a penalidade deve ter como base este período temporal. Assim, em caso de descumprimento do comando judicial, deverá incidir multa cominatória de R$ 1.000,00 (hum mil reais) por cada desconto indevido no benefício previdenciário do autor/agravado [...].
E ainda:
PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DESCONTOS MENSAIS. RELAÇÃO JURÍDICA. INEXISTÊNCIA. ALEGAÇÃO. TUTELA DE URGÊNCIA. REQUISITOS. PRESENÇA. DEFERIMENTO. MULTA. PERIODICIDADE. ADEQUAÇÃO. QUANTUM. MAJORAÇÃO EX OFFICIO. DECISÃO AGRAVADA. REFORMA PARCIAL.
I – Nos feitos onde se alega a inexistência de relação jurídica, a jurisprudência vem entendendo ser devida a suspensão dos descontos realizados em beneficio previdenciário, enquanto pendente a instrução do feito, dada a impossibilidade da produção da prova negativa, evitando, assim, possível dano ao consumidor.
II – Evidenciado o cumprimento dos requisitos da tutela de urgência, imperativa é a manutenção da decisão que determinou a suspensão dos descontos de parcelas de suposto contrato de mútuo do beneficio previdenciário da Agravada enquanto pendente de julgamento a demanda. III –
Quando a obrigação de fazer ou de não fazer imposta judicialmente for mensal, a multa cominatória deve ser arbitrada respeitando-se a mesma periodicidade, razão do provimento do agravo apenas em relação ao pleito recursal de readequação da periodicidade da astreinte, de diária para mensal.
IV – Conforme dispõe o artigo 573, §1º, I, do CPC, o valor da astreinte pode se majorado, ex officio, quando o magistrado verificar que o mesmo se tornou insuficiente. RECURSO PROVIDO EM PARTE. VALOR DA MULTA MAJORADO DE OFÍCIO. (Classe: Agravo de Instrumento,Número do Processo: 8024680-97.2020.8.05.0000,Relator(a): HELOISA PINTO DE FREITAS VIEIRA GRADDI,Publicado em: 25/03/2021- grifei).
Extrai-se do corpo do acórdão:
Pelas razões expostas, e em atenção aos Princípios da proporcionalidade e razoabilidade, de oficio, majoro a astreinte para R$ 1.000,00 (um mil reais), para cada mês de descumprimento da obrigação imposta, até o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
O pedido da autora de que as despesas processuais sejam pagas somente pelo réu também não deve ser aceito.
A recorrente formulou três pedidos e obteve sucesso em relação a dois deles: a declaração de nulidade do contrato e devolução dos valores.
Portanto, é correto o entendimento da magistrada de origem de que as despesas devem ser divididas entre as partes.
Quanto aos honorários advocatícios sucumbenciais, a autora pleiteia a fixação de forma equitativa no valor de R$ 4.000,00, conforme Tabela de Honorários da OAB/SC, em substituição ao percentual de 10% sobre o valor da condenação fixado na sentença.
Razão lhe assiste em parte.
Isso porque, o valor da condenação, que consiste na devolução em dobro das parcelas indevidamente descontadas - pelo menos 48 parcelas de R$ 85,71 até a sentença - resultaria em honorários advocatícios irrisórios, incompatíveis com o trabalho desenvolvido nos autos.
Sendo assim, a fixação dos honorários advocatícios sobre o montante da condenação arbitrada na sentença, que no caso é a restituição dobrada do que foi indevidamente descontado, se torna inviável no caso, por ser irrisória, motivo pelo qual deve ser reformada a sentença, tão somente para alterar a base de cálculo dos honorários para que incida sobre o valor da causa (R$ 26.372,06).
Por conseguinte, quanto aos honorários recursais previstos no art. 85, § 11, do CPC, embora a sentença tenha sido prolatada na vigência do atual Código de Processo Civil, estes não são devidos em razão do parcial provimento dos recursos, conforme estabelecido no Tema Repetitivo n. 1.059 do STJ.
Ante o exposto, com amparo no art. 932, VIII, do Código de Processo Civil, e no art. 132, XVI, do RITJSC, conheço do recurso do réu e dou-lhe parcial provimento, para readequar a periodicidade da astreinte, de diária para mensal (para cada desconto indevido), majorando de ofício o valor da multa arbitrada, nos termos da fundamentação supra e conheço do recurso da autora e dou-lhe parcial provimento, tão somente para alterar a base de cálculo dos honorários para que incida sobre o valor da causa (R$ 26.372,06).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
assinado por CLÁUDIA LAMBERT DE FARIA, Diretora Judiciária, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7084789v20 e do código CRC 1b786e98.
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Data e Hora: 16/11/2025, às 12:01:54
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