RECURSO – Documento:7014324 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5002941-72.2024.8.24.0058/SC RELATORA: Desembargadora ROSANE PORTELLA WOLFF RELATÓRIO R. A. L. ajuizou a ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de tutela de urgência n. 5002941-72.2024.8.24.0058, em face de B. J. P. e R. C. P., perante a 1ª Vara Cível da comarca de São Bento do Sul. A lide restou assim delimitada, consoante relatório da sentença da lavra do magistrado Marcus Alexsandre Dexheimer (evento 100, SENT1): Trata-se de "ação de obrigação de fazer c/c pedido de tutela de urgência proposta por R. A. L. contra B. J. P. e R. C. P., objetivando compelir os requeridos a manterem seus animais presos ou isolados, de modo que não obstruam a servidão de passagem que constitui o único acesso à residência da autora, bem como se abstenham de realizar a criação de suínos no imóvel situado em área urbana.
(TJSC; Processo nº 5002941-72.2024.8.24.0058; Recurso: recurso; Relator: Desembargadora ROSANE PORTELLA WOLFF; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 13 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:7014324 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5002941-72.2024.8.24.0058/SC
RELATORA: Desembargadora ROSANE PORTELLA WOLFF
RELATÓRIO
R. A. L. ajuizou a ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de tutela de urgência n. 5002941-72.2024.8.24.0058, em face de B. J. P. e R. C. P., perante a 1ª Vara Cível da comarca de São Bento do Sul.
A lide restou assim delimitada, consoante relatório da sentença da lavra do magistrado Marcus Alexsandre Dexheimer (evento 100, SENT1):
Trata-se de "ação de obrigação de fazer c/c pedido de tutela de urgência proposta por R. A. L. contra B. J. P. e R. C. P., objetivando compelir os requeridos a manterem seus animais presos ou isolados, de modo que não obstruam a servidão de passagem que constitui o único acesso à residência da autora, bem como se abstenham de realizar a criação de suínos no imóvel situado em área urbana.
Relatou a parte autora, em apertada síntese, que adquiriu o imóvel registrado sob a matrícula n. 49.003, cujo acesso se dá exclusivamente pela servidão de passagem Hellmuth Alfredo Petrocefski. Alegou que os requeridos mantêm animais soltos na servidão, como vacas, ovelhas e galinhas, o que impede o livre trânsito, colocando em risco sua integridade física e de sua família, especialmente de sua filha menor. Sustentou ainda que os requeridos realizam criação de suínos em desacordo com o art. 98 da Lei Municipal n. 742/1996, causando prejuízos à saúde e ao meio ambiente.
Requereu, ao final, a concessão de tutela de urgência para que os réus mantenham os animais isolados, a retirada de placa afixada no portão da servidão e, no mérito, a procedência da ação para que os réus sejam compelidos a manter os animais presos e se abstenham da criação de suínos.
No evento 16.1 indeferiu-se a tutela de urgência postulada, o que foi modificado em grau recurso, que determinou que a parte ré, "no prazo de 10 (dez) dias, adeque a sua propriedade para impedir que os animais obstruam a servidão de passagem, sob pena de multa de R$ 100,00 (cem) reais por dia, em caso de descumprimento".
Devidamente citados (eventos 40.1 e 42.1), apresentaram os réus defesa em forma de contestação (evento 71.1). Sustentaram que a autora possui outro acesso ao imóvel, que não se trata de prédio encravado, e que não há prova dos alegados riscos. Alegaram que a placa afixada no portão apenas informa a existência de demanda judicial ainda pendente de recurso. Defenderam o direito à propriedade e à criação de animais como fonte de renda, invocando os arts. 5º, XXII e XXIII, e 170, III, da Constituição Federal. Pugnaram, ao fim da peça de defesa, pela improcedência dos pedidos iniciais.
Instada, a parte autora apresentou réplica (evento 75.1), refutando as alegações da defesa e reiterando os termos da inicial.
Despacho saneador proferido no evento 78.1.
Os réus apresentaram alegações finais (evento 95.1).
Relato do indispensável. Decido.
Na parte dispositiva da decisão constou:
Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos formulados por R. A. L. em face de R. C. P. e B. J. P., partes qualificadas, e resolvo o mérito, na forma do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Via de consequência, confirmo a tutela de urgência concedida no agravo de instrumento nº 5034038-70.2020.8.24.0000, com a imposição definitiva aos réus de adequarem o imóvel para evitar a obstrução da servidão de passagem por animais, sob pena de multa diária de R$ 100,00 em caso de descumprimento.
Além disso, determino que os réus, no prazo de 15 dias, se abstenham de realizar a criação de suínos no imóvel situado em área urbana, conforme vedação expressa do art. 98 da Lei Municipal n. 742/1996 e retirem a placa afixada no portão da servidão de passagem que menciona processo judicial já transitado em julgado, ambos sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais).
Condeno os requeridos, pro rata, no pagamento das custas/despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 2.000,00, em observância ao disposto no § 8º do artigo 85 do Código de Processo Civil.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Cumpridas as formalidades legais, arquive-se.
Irresignada, a parte Ré interpôs Recurso de Apelação (evento 107, APELAÇÃO1) e alegou, em resumo, que: a) é devida a concessão do benefício da justiça gratuita, pois "alterou-se a situação financeira dos recorrentes, pois, diante da liminar aqui deferida, os animais dos recorrentes que antes ficavam soltos e ganhavam peso, necessariamente tiveram que ficar confinados, o que, causou a perda de peso e porquanto os recorrentes tiveram que praticamente extinguir tal criação"; b) a Autora é parte ilegítima, vez que "a requerente, Sra Raquel, não é proprietária do terreno em questão, pois, conforme certidão do registro de imóveis, os proprietários são Ermelino e Erotides"; c) "a Sra Raquel juntou um contrato de compra e venda, da empresa URBANEK CONSTRUTORA & INCORPORADORA LTDA, CNPJ n. 31.734.003/0001-82, sendo como único sócio o Sr. Jair Cesar Urbanek, não tendo porquanto nenhuma relação com a requerente"; e d) "os recorrentes complementavam sua renda, diga-se aposentadoria de salário mínimo, com a criação de animais para venda, que, com a decisão de evento 8, trouxeram prejuízos irreparáveis aos mesmos, tendo em vista que a prisão dos animais causam estresse nestes e por conseguinte a perda de peso, o que levou por conseguinte a venda dos animais com prejuízo, ferindo de morte inclusive o artigo 1385 do Código Civil".
Ao final, requereu o conhecimento e provimento do Recurso.
Não houve apresentação de contrarrazões (evento 119).
Após, ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.
Intimada para comprovar a alegada hipossuficiência, a parte Apelante apresentou documento no evento 15 do caderno recursal.
É o relatório.
VOTO
1 Do pedido de justiça gratuita
De início, pleiteia a parte Apelante a concessão da benesse de justiça gratuita, defendendo, em suma, que "alterou-se a situação financeira dos recorrentes, pois, diante da liminar aqui deferida, os animais dos recorrentes que antes ficavam soltos e ganhavam peso, necessariamente tiveram que ficar confinados, o que, causou a perda de peso e porquanto os recorrentes tiveram que praticamente extinguir tal criação".
A gratuidade processual, que poderá ser concedida à pessoa física ou jurídica nos termos dos artigos 98 e 99 do Código de Processo Civil, abrange a análise pelas novas regras do Código de Processo Civil, que assim dispôs:
Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.
[...]
Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.
§ 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso.
§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.
§ 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.
§ 4º A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça.
§ 5º Na hipótese do § 4o, o recurso que verse exclusivamente sobre valor de honorários de sucumbência fixados em favor do advogado de beneficiário estará sujeito a preparo, salvo se o próprio advogado demonstrar que tem direito à gratuidade.
§ 6º O direito à gratuidade da justiça é pessoal, não se estendendo a litisconsorte ou a sucessor do beneficiário, salvo requerimento e deferimento expressos.
§ 7º Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento.
Em contrapartida, não se pode deixar de destacar que o Estado-Juiz, diante da realidade da situação que lhe for apresentada, possui a liberdade para determinar a exibição de documentos que comprovem a situação de hipossuficiência econômica daquele que objetiva a benesse da gratuidade processual - inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal.
Especificamente acerca da concessão da gratuidade processual às pessoas jurídicas, foi editada a Súmula n. 481 pelo Superior Tribunal de Justiça, no seguinte sentido: "Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais".
Portanto, a presunção de hipossuficiência vigora, apenas, em relação à pessoa física - consoante a disposição do § 3º, do art. 99, do Código de Processo Civil -, cabendo à pessoa jurídica, como se viu, a efetiva demonstração de que o pagamento das despesas processuais prejudique a situação econômica.
Na hipótese, infere-se que os recorrentes apresentaram cópias das carteiras de trabalho, das quais não se evidencia vínculo de emprego ativo, extratos bancários sem movimentações financeiras expressivas e declaração de imposto de renda (evento 15, DOCUMENTACAO2 a evento 15, DOCUMENTACAO4 do caderno recursal).
Assim, é possível apurar a incapacidade econômica da parte Apelante para arcar com as custas processuais, fazendo jus, portanto, ao benefício da justiça gratuita.
2 Da preliminar de ilegitimidade ativa - inovação recursal
Aduziu a parte Ré que a Autora é parte ilegítima, vez que "a requerente, Sra Raquel, não é proprietária do terreno em questão, pois, conforme certidão do registro de imóveis, os proprietários são Ermelino e Erotides"; e "a Sra Raquel juntou um contrato de compra e venda, da empresa URBANEK CONSTRUTORA & INCORPORADORA LTDA, CNPJ n. 31.734.003/0001-82, sendo como único sócio o Sr. Jair Cesar Urbanek, não tendo porquanto nenhuma relação com a requerente".
No entanto, da análise da contestação (evento 71, CONT1), observa-se que a matéria não foi alegada, sendo que não foi submetida à análise do Juízo originário.
Assim, não há como conhecer das alegações, pois evidente a inovação recursal.
Nesse sentido é o ensinamento de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:
Proibição de inovar. Por inovação entende-se todo elemento que pode servir de base para a decisão do tribunal, que não foi arguido ou discutido no processo, no procedimento de primeiro grau de jurisdição. Não se pode inovar no juízo de apelação, sendo defeso às partes modificar a causa de pedir ou o pedido (nova demanda). Todavia, a norma comentada permite que sejam alegadas questões novas, de fato, desde que se comprove que não foram levantadas no primeiro grau por motivo de força maior. Pela proibição do ius novorum prestigia-se a atividade do juízo de primeiro grau.
(Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 11ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 898).
No mesmo sentido, decidiu esta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO DE CONVIVÊNCIA AVOENGA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. NARRATIVA E PLEITO INICIAL APONTANDO APENAS UM DOS NETOS. MUDANÇA DO PEDIDO APENAS EM SEDE RECURSAL. INOVAÇÃO QUE IMPEDE CONHECIMENTO. GENITORES, PAIS NÃO SEPARADOS, QUE CONCORDAM AUSENTE VÍNCULO AFETIVO ENTRE OS ENVOLVIDOS E PRESENTE DISTÂNCIA FÍSICA ENTRE AS RESIDÊNCIAS CAPAZ DE IMPEDIR AS VISITAS NA FORMA PRETENDIDA. AVÓ QUE RESIDE EM ESTADO DIVERSO E PRETENDE CONVIVÊNCIA QUINZENAL, INCLUSIVE COM DESLOCAMENTO DO MENOR. INVIABILIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO INDICANDO QUE FILHA E GENRO, ADEMAIS, NÃO IMPEDEM VERDADEIRAMENTE O CONVÍVIO. EMBARAÇOS FÁTICOS QUE AFASTAM POSSIBILIDADE À REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS NA FORMA ALMEJADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5002087-88.2022.8.24.0045, do , rel. Edir Josias Silveira Beck, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 01-02-2024 sem grifo no original).
Por conseguinte, não se conhece da Insurgência da parte Ré no ponto.
3 Ofensa ao princípio da dialeticidade
Aduziram, ainda, os Recorrentes que "complementavam sua renda, diga-se aposentadoria de salário mínimo, com a criação de animais para venda, que, com a decisão de evento 8, trouxeram prejuízos irreparáveis aos mesmos, tendo em vista que a prisão dos animais causam estresse nestes e por conseguinte a perda de peso, o que levou por conseguinte a venda dos animais com prejuízo, ferindo de morte inclusive o artigo 1385 do Código Civil".
Todavia, tal argumentação não ataca especificamente todos os fundamentos da sentença, da qual constou (evento 100, SENT1):
[...]
Conforme relatado alhures, trata-se de ação de obrigação de fazer, demanda por meio da qual a parte autora objetiva compelir os réus a manterem seus animais isolados, impedindo a obstrução da servidão de passagem, bem como cessarem a criação de suínos em área urbana e a retirada de placa afixada no portão da servidão de passagem que menciona processo judicial já julgado. (autos nº 50000663720218240058).
Compulsando os autos, verifica-se que a autora demonstrou, por meio de documentos, fotos, vídeos e ata notarial, que os animais dos réus circulam livremente pela servidão de passagem, dificultando o acesso à sua residência. A servidão está registrada na matrícula do imóvel da autora, sendo o único logradouro oficial de acesso, conforme consta nos registros municipais.
A jurisprudência do TJSC corrobora este entendimento:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER/NÃO FAZER E RECONVENÇÃO. OBSTRUÇÃO DE SERVIDÃO DE PASSAGEM APARENTE. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO PRINCIPAL E IMPROCEDÊNCIA DO PLEITO RECONVENCIONAL. RECLAMO DOS RÉUS/RECONVINTES. TESE DE INEXISTÊNCIA DE IMPEDIMENTO DE ACESSO AO IMÓVEL DO AUTOR. ALEGAÇÕES DE FACILIDADE NO MANUSEIO DAS PORTEIRAS EXISTENTES À ÉPOCA DA AQUISIÇÃO DO TERRENO, AUSÊNCIA DE CERCA ELETRIFICADA E PASSAGEM ESPORÁDICA PELO LOCAL. INSUBSISTÊNCIA. IMÓVEL ENCRAVADO LOCALIZADO AO FINAL DE UMA ESTRADA RURAL VISÍVEL E INSTITUÍDA HÁ LONGA DATA. INEQUÍVOCA A INSTALAÇÃO DE DOIS PORTÕES COM ARAME FARPADO AO LONGO DO CAMINHO QUE DIFICULTA A PASSAGEM DO AUTOR E DE TERCEIROS. PEDIDO LIMINAR DE DETERMINAÇÃO DE FECHAMENTO DAS PORTEIRAS. DESCABIMENTO. PROVIDÊNCIAS PARA EVITAR A FUGA DE ANIMAIS QUE DEVEM SER ADOTADAS PELOS SEUS PROPRIETÁRIOS E NÃO POR MEIO DO TRANCAMENTO DO CAMINHO PÚBLICO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5000611-97.2022.8.24.0050, do , rel. Jairo Fernandes Gonçalves, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 16-07-2024).
E ainda,
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CONFESSÓRIA PARA RECONHECIMENTO DE SERVIDÃO DE PASSAGEM. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA QUE DETERMINA A REINTEGRAÇÃO DE POSSE DO CAMINHO SOBRE A PROPRIEDADE DO RÉU AO ARGUMENTO DE HAVER ELEMENTOS CONCRETOS DE QUE SE TRATA DE SERVIDÃO DE PASSAGEM APARENTE. RECURSO DO RÉU.
INSISTÊNCIA NA TESE DE MERA TOLERÂNCIA E NA EXISTÊNCIA DE ESTRADA ALTERNATIVA PARA A PROPRIEDADE DO AUTOR. REJEIÇÃO. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA A EXISTÊNCIA DE UMA SERVIDÃO PERMANENTE E CONSOLIDADA, UTILIZADA PELO AUTOR HÁ MAIS DE 14 ANOS, SEM OPOSIÇÃO. RÉU QUE CONFESSA NUNCA TER IMPEDIDO O SEU INGRESSO. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE MERA TOLERÂNCIA. ACESSO POR OUTRO CAMINHO QUE FOI UTILIZADO EM APENAS UMA OPORTUNIDADE E QUE, ATUALMENTE, NÃO MAIS EXISTE. PROTEÇÃO POSSESSÓRIA QUE, ADEMAIS, DEVE SE DAR À SERVIDÃO APARENTE INDEPENDENTEMENTE DA EXISTÊNCIA DE CAMINHO ALTERNATIVO, DESDE QUE PROVADOS OS REQUISITOS LEGAIS. ESBULHO TAMBÉM SATISFATORIAMENTE DEMONSTRADO. OBSTRUÇÃO DA PASSAGEM COM A COLOCAÇÃO DE ANIMAIS E DE CERCA ELÉTRICA. MANEJO DO GADO QUE PODE OCORRER EM OUTRO LOCAL NA GRANDE EXTENSÃO DE PROPRIEDADE DO AUTOR. PROTEÇÃO POSSESSÓRIA QUE É ADEQUADA. SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5001663-81.2019.8.24.0035, do , rel. Helio David Vieira Figueira dos Santos, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 10-04-2025).
Ademais, a criação de suínos em área urbana é expressamente vedada pelo art. 98 da Lei Municipal n. 742/1996 de São Bento do Sul:
“Art. 98 – Não é permitida a criação de suínos dentro da área urbana.”
O Código Civil também ampara a pretensão autoral:
Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.
Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.
A alegação dos réus de que há outro acesso ao imóvel foi refutada pela autora, que demonstrou que tal acesso não é oficial, tampouco viável, sendo necessário atravessar propriedades de terceiros. O e. TJSC já decidiu pela manutenção da servidão em processo anterior (Apelação n. 5000066-37.2021.8.24.0058), reconhecendo sua utilidade e necessidade, de modo que deverão os réus também retirar da placa afixada no portão.
Dessa forma, é legítima a imposição da totalidade das medidas postuladas pela demandante.
[...]
Deve-se ter presente que imprescindível estabelecer vínculo argumentativo com a decisão contra a qual se insurge, visando, assim, a derruir sua ratio decidendi, para, ao final, exatamente por isso, alcançar sua reforma.
Sobre o tema, Araken de Assis disserta:
O fundamento do princípio da dialeticidade é curial. Sem cotejar as alegações do recurso e a motivação do ato impugnado, mostrar-se-á impossível ao órgão ad quem avaliar o desacerto do ato, a existência de vício de juízo (error in judicando), o vício de procedimento (error in procedendo) ou o defeito típico que enseja a declaração do provimento. A motivação do recurso delimita a matéria impugnada (art. 515, caput). É essencial, portanto, à predeterminação da extensão e profundidade do efeito devolutivo. Por outro lado, a falta da motivação prejudica o contraditório: desconhecendo as razões do recorrente, o recorrido não pode se opor eficazmente à pretensão recursal.
(Manual dos recursos. 2ª ed. São Paulo: RT, 2008, p. 98, frisou-se).
Deveras, exige-se, por expresso preceptivo legal, que o Inconformismo contenha fundamentos de fato e direito, os quais, nessa qualidade, constituirão a matéria impugnada a ser devolvida à Segunda Instância, conforme art. art. 1.010, incisos II e III, do Código de Processo Civil, permitindo, ademais, sua perfeita dialeticidade que dá nome ao correspondente princípio.
Assim sendo, cumpria à parte Recorrente revolver toda a fundamentação da decisão atacada, a fim de expor o seu desacerto.
Se não o fez, não há que se falar na admissibilidade do Recurso, por ser desconexo com o decisum, deixando de estabelecer o necessário liame apto a demonstrar o eventual error in judicando, isto é, demonstrando e fundamentando, ao contrário do que entendeu o Magistrado da origem.
Nesse sentido, aliás, farta a jurisprudência deste Colegiado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INSURGÊNCIA CONTRA A DECISÃO QUE REJEITA A IMPUGNAÇÃO AO FUNDAMENTO DE QUE NÃO OBSERVADO O PRAZO DECADENCIAL PREVISTO NO ART. 33, § 1º, DA LEI N. 9.307/96.
AGRAVANTE QUE NÃO APRESENTA QUALQUER ARGUMENTO PARA, EFICIENTEMENTE, COMBATER O COMANDO JUDICIAL ATACADO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO DO RECLAMO NO PONTO.
A parte recorrente, ao aviar sua insurgência recursal, em estrita obediência ao princípio da dialeticidade, tem o ônus insuperável de investir contra os argumentos timbrados na decisão açoitada, objetivando demonstrar o seu desacerto, a sua dissonância com a melhor dição do direito aplicável ao litígio plantado nos autos, tudo com a finalidade de alimentar a Superior Instância com elementos que possam reverter o édito lançado em seu desfavor. Por isto, não deve ser conhecido o recurso cujas razões preservam intactos os fundamentos que serviram de suporte à conclusão exposta no dispositivo da decisão agravada.
MULTA FIXADA EM SEDE DE EMBARGOS DECLARATÓRIOS. AFASTAMENTO. AUSÊNCIA DE INTENÇÃO PROTELATÓRIA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA EXTENSÃO, PROVIDO.
(TJSC, Agravo de Instrumento n. 4033476-54.2019.8.24.0000, da Capital, rel. Des. Jorge Luis Costa Beber, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 12-03-2020, destacou-se).
Assim sendo, não merece conhecimento a Insurgência da parte Requerida quanto ao mérito.
Ademais, acrescenta-se, por oportuno, que a sentença não ofende o direito de propriedade dos autores, vez que apenas determinou o impedimento da obstrução da servidão de passagem, a retirada da placa fixada no portão da servidão, bem como o cumprimento da legislação (art. 98 da Lei Municipal n. 742/1996).
4 Dos honorários recursais
Por derradeiro, deixo de majorar a verba advocatícia nos termos do artigo 85, § 11, da Lei Adjetiva, uma vez que não configurados, em sua totalidade, os requisitos estabelecidos pelo Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5002941-72.2024.8.24.0058/SC
RELATORA: Desembargadora ROSANE PORTELLA WOLFF
EMENTA
direito civil. APELAÇÃO CÍVEL. ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de tutela de urgência. possibilidade de concessão do benefício da justiça gratuita à parte Ré. preliminar de ilegitimidade ativa que configura inovação recursal. ofensa ao princípio da dialeticidade quanto ao mérito. RECURSO PARCIALMENTE conhecido e, na parte conhecida, PROVIDO.
I. Caso em exame
1. Apelação cível objetivando a reforma de sentença que julgou procedentes os pedidos elaborados em ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de tutela de urgência.
II. Questão em discussão
2. As questões em discussão consistem em verificar: (i) a possibilidade de concessão do benefício da justiça gratuita ao réus; e (ii) a viabilidade de conhecimento da preliminar de ilegitimidade ativa e do mérito recursal.
III. Razões de decidir
3. Quanto à pretensão de gratuidade processual, na hipótese, infere-se que os recorrentes apresentaram cópias das carteiras de trabalho, das quais não se evidencia vínculo de emprego ativo, extratos bancários sem movimentações financeiras expressivas e declaração de imposto de renda. Assim, é possível apurar a incapacidade econômica da parte Apelante para arcar com as custas processuais, fazendo jus, portanto, ao benefício da justiça gratuita, a partir deste acórdão, razão pela qual as verbas sucumbenciais arbitradas na sentença objurgada continuam sendo devidas pela parte apelante, ou seja, o benefício é deferido com efeitos ex nunc, isentando a parte recorrente apenas do recolhimento do preparo recursal, bem como demais condenações neste grau de jurisdição.
4. A preliminar de ilegitimidade ativa não foi apresentada na contestação pela parte Demandada, de modo que não pode ser conhecida neste grau de jusrisdição, pois configurada a inovação recursal.
5. No mérito, aduziram os Requeridos ofensa ao direito de propriedade, sendo que tal argumentação é dissociada do reconhecimento da sentença de obstrução da servidão de passagem registrada na matrícula do imóvel. Deveras, exige-se, por expresso preceptivo legal, que o Inconformismo contenha fundamentos de fato e direito, os quais, nessa qualidade, constituirão a matéria impugnada a ser devolvida à Segunda Instância, conforme art. 1.010, incisos II e III, do Código de Processo Civil, permitindo, ademais, sua perfeita dialeticidade que dá nome ao correspondente princípio. Assim sendo, cumpria à parte Recorrente revolver toda a fundamentação da decisão atacada, a fim de expor o seu desacerto. Se não o fez, não há que se falar na admissibilidade do Recurso, por ser desconexo com o decisum, deixando de estabelecer o necessário liame apto a demonstrar o eventual error in judicando, isto é, demonstrando e fundamentando, ao contrário do que entendeu o Magistrado da origem.
6. Honorários recursais indevidos.
IV. Dispositivo e tese
7. Recurso de apelação conhecido em parte e, na parte conhecida, provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, conhecer em parte do Recurso e, na parte conhecida, dar-lhe provimento para conceder à parte Ré o benefício da justiça gratuita, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por ROSANE PORTELLA WOLFF, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7014319v6 e do código CRC 1804e3b8.
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 13/11/2025 A 19/11/2025
Apelação Nº 5002941-72.2024.8.24.0058/SC
RELATORA: Desembargadora ROSANE PORTELLA WOLFF
PRESIDENTE: Desembargador MONTEIRO ROCHA
PROCURADOR(A): LENIR ROSLINDO PIFFER
Certifico que este processo foi incluído como item 101 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 13/11/2025 às 00:00 e encerrada em 13/11/2025 às 15:39.
Certifico que a 2ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 2ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER EM PARTE DO RECURSO E, NA PARTE CONHECIDA, DAR-LHE PROVIMENTO PARA CONCEDER À PARTE RÉ O BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora ROSANE PORTELLA WOLFF
Votante: Desembargadora ROSANE PORTELLA WOLFF
Votante: Desembargador JOÃO MARCOS BUCH
Votante: Desembargador MONTEIRO ROCHA
YAN CARVALHO DE FARIA JUNIOR
Secretário
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