Decisão TJSC

Processo: 0004126-97.2013.8.24.0033

Recurso: embargos

Relator: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA

Órgão julgador:

Data do julgamento: 06 de agosto de 2012

Ementa

EMBARGOS – Documento:6813185 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 0004126-97.2013.8.24.0033/SC RELATOR: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA RELATÓRIO Na comarca de Itajaí, o Ministério Público ofereceu denúncia contra C. A. C. dando-o como incurso nas sanções dos arts. 168, §1º, III, e 155, §4º, II, (este por duas vezes) ambos do Código Penal, em razão dos fatos assim narrados na exordial acusatória (evento 172): O denunciado C. A. C. é um dos sócios da empresa SÚPER YACHTS DISTRIBUIDORA e IMPORTADORA DE EMBARCAÇÕES LTDA, sediada na cidade de São Paulo/SP, cujas atividades se referem ao comércio de máquinas, equipamentos, embarcações e aeronaves.

(TJSC; Processo nº 0004126-97.2013.8.24.0033; Recurso: embargos; Relator: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 06 de agosto de 2012)

Texto completo da decisão

Documento:6813185 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 0004126-97.2013.8.24.0033/SC RELATOR: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA RELATÓRIO Na comarca de Itajaí, o Ministério Público ofereceu denúncia contra C. A. C. dando-o como incurso nas sanções dos arts. 168, §1º, III, e 155, §4º, II, (este por duas vezes) ambos do Código Penal, em razão dos fatos assim narrados na exordial acusatória (evento 172): O denunciado C. A. C. é um dos sócios da empresa SÚPER YACHTS DISTRIBUIDORA e IMPORTADORA DE EMBARCAÇÕES LTDA, sediada na cidade de São Paulo/SP, cujas atividades se referem ao comércio de máquinas, equipamentos, embarcações e aeronaves. De igual forma, o denunciado também é um dos sócios da empresa SULMARINE REVENDA DE BARCOS LTDA, estabelecida na cidade de Balneário Camboriú/SC. Assim sendo, na qualidade de administrador das ditas empresas, Carlos Alberto intermediava a distribuição (venda) das embarcações fabricadas pela empresa AZIMUT DO BRASIL FABRICAÇÃO DE IATES LTDA, sediada nesta cidade e para tanto, oferecia o produto para o mercado de iates. Pois bem, no dia 06 de agosto de 2012, a Sulmarine Revenda de Barcos Ltda, com a anuência da Súper Yachts Distribuidora e Importadora de Embarcações Ltda, intermediou a venda, para a empresa FF Group S/A, de uma embarcação nova, da marca Azimut, modelo Azimut 60, de propriedade da Azimut do Brasil, pelo valor total de R$ 4.600.00.00 (quatro milhões e seiscentos mil reais), que deveriam ser pagos da seguinte forma: a quantia de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) no dia 13 de agosto de 2012 e mais 9 (nove) parcelas mensais e subsequentes de R$ 144.445,00 (cento e quarenta e quatro mil e quatrocentos e quarenta e cinco reais) e, por fim, a entrega de uma embarcação usada da marca Intermarine, modelo 600 Full, ano 2007, avaliada em R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais). Assinado o contrato de compra e venda, todos os cheques foram emitidos pela compradora em favor da revendedora, ressaltando-se os prazos préestabelecidos. Acontece que o denunciado, ao receber o cheque de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) da FF Group (vide fl. 35), em vez de repassá-lo para a fabricante e proprietária da embarcação, qual seja, a Azimut do Brasil, apropriou-se indevidamente dessa quantia, dando a ela destino diverso, em razão de suas atividades comerciais. E para que a sua ação criminosa não fosse descoberta, fez de fato, um depósito na conta corrente da Azimut, identificando-o, porém, como se fora de Florisvaldo Lesko, o outro comprador, conforme positivado a fl. 34 dos autos. A FF Group Participações, certa de que seu cheque havia sido depositado na conta da Azimut, começou a questionar o porquê da não entrega da embarcação, momento em que soube que o depósito reconhecido pela fabricante não era o seu e sim de um outro cliente. Todavia, a Azimut, para honrar com seu compromisso, acabou entregando a FF Group a embarcação adquirida e descrita no contrato de compra e venda reconhecido entre as partes, mesmo tendo reconhecido a apropriação indébita feita pelo denunciado. Do relatado, conclui-se que faltava a Azimut receber os R$ 300.00,00 (trezentos mil reais) relativos à compra da embarcação de Floresvaldo Lesko, que somente foi liberada para o referido comprador, mediante a informação falsa da empresa do acusado, no sentido de que ele já havia pago a entrada respectiva, feita por sua funcionária Maristela Alves. Frisa-se que o denunciado recebeu, ainda, o valor de R$ 300.00,00 (trezentos mil) reais, relativo à entrada paga por Floresvaldo para a compra do barco vendido pela Azimut, contudo, nunca repassou tal valor a esta, o que caracteriza o crime de apropriação indébita circunstanciada praticada pelo acusado, pois o aludido comprador, quando ouvido perante a autoridade policial confirmou a compra da sua embarcação por intermédio da empresa Súper Yachts, efetuando para o denunciado, os pagamentos devidos, inclusive os R$ 300.00,00 (trezentos mil) reais, consoante comprovado. Ou seja, essa quantia foi recebida pela empresa Súper Yachts mas nunca foi repassada à empresa Azimut. Dando continuidade a sua empreitada criminosa, Carlos Roberto ao receber os cheques valorados em R$ 144.445,00 (cento e quarenta e quatro mil quatrocentos e quarenta e cinco reais), de propriedade da FF Group, os quais estavam nominais à Azimut, subtraiu dois deles, especificados às fls. 36/37, e em vez de depositá-los na conta corrente da fabricante, fraudou as respectivas cártulas, caracterizando uma manobra ardilosa, na medida em que endossou esses cheques, por meio de oposição de assinatura falsa, fazendo-se passar por representante da Azimut, criando uma situação especial de vantagem econômica, voltada a gerar um engano à vítima (FF Group), pois em vez de depositar na conta da referida empresa, o fez na conta corrente da empresa Sulmarine, também de sua propriedade. O cerne da questão diz respeito ao modo de atuação da vítima, diante do engodo programado pelo acusado, ou seja, não obstante a vítima tenha feito a entrega dos cheques para o acusado espontaneamente, o fato é que Carlos Alberto planejou tudo desde o início, ardilosamente, mantendo a vítima em uma situação enganosa, fazendo parecer realidade o que efetivamente não era, pois desde o início planejava utilizar os cheques, com endosso falso, para obter vantagem econômica. A Azimut nunca endossou esses cheques. Após a regular instrução do processo, sobreveio sentença que julgou improcedente a denúncia, conforme o seguinte dispositivo (evento 498): Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão punitiva contida na Denúncia e, em consequência, ABSOLVO o acusado C. A. C. das imputações que lhe foram feitas, por ausência de provas suficientes à condenação (CPP, art. 386, VII). Sem custas.  Os embargos de declaração opostos pela assistente de acusação (evento 505) foram rejeitados (evento 518). Inconformada, a assistente de acusação interpôs recurso de apelação (Evento 13), oportunidade em que alegou, preliminarmente, nulidade da sentença por violação ao princípio da obrigatoriedade da fundamentação das decisões judiciais, conforme previsto no artigo 93, IX, da Constituição Federal. Sustentou que a sentença se valeu da técnica da fundamentação per relationem de forma insuficiente e inconstitucional, limitando-se a transcrever, na íntegra, as alegações finais do Ministério Público, que pugnara pela absolvição, sem realizar qualquer exame crítico das provas ou confrontar detidamente os argumentos suscitados pela própria assistência de acusação em seus memoriais. No mérito, pleiteou a reforma integral da sentença, argumentando que os autos continham provas robustas e contundentes de autoria e materialidade delitivas, sendo imperiosa a condenação do réu. No que concerne ao crime de apropriação indébita, relatou que o réu, na condição de proprietário das empresas intermediadoras Super Yachts e Sulmarine, se apropriou de um cheque no valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), emitido pela compradora FF Group nominalmente à Azimut. Alegou que o acusado deliberadamente induziu a empresa vítima em erro ao informar, ardilosamente, que o depósito proveniente daquele cheque se referia ao pagamento de outro cliente, Floresvaldo Lesko, permitindo indevidamente a liberação de outra embarcação sem o repasse dos valores devidos à Azimut, configurando o dolo de apropriação. Em relação ao crime de furto mediante fraude, sustentou que a prática delitiva configurou-se pela subtração de dois cheques, cada um no valor de R$ 144.445,00 (cento e quarenta e quatro mil, quatrocentos e quarenta e cinco reais), também emitidos pela FF Group e nominais à Azimut. Afirmou que, de forma fraudulenta, o réu falsificou a assinatura de endosso nas cártulas, fazendo-se passar por representante legal da Azimut, depositando os valores nas contas de suas próprias empresas, Sulmarine e Super Yachts. A prova da fraude, consoante as razões recursais, residia no depoimento testemunhal do senhor Felipe Daniel Berra, superintendente da Azimut à época e única pessoa com poderes de endosso, que peremptoriamente negou a validade das assinaturas apostas nos cheques. Foram ofertadas contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento do apelo (evento 16). A Procuradoria de Justiça Criminal manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 22). No evento 26, o julgamento foi convertido em diligência e determinada intimação do Acusado/Apelado para apresentar contrarrazões. Cumprida a determinação, ocasião em que o Réu manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (evento 31), os autos foram encaminhados à Procuradoria-Geral de Justiça que, por meio da manifestação do evento 34, ratificou as conclusões adotadas no parecer do evento 22. Este é o relatório necessário. VOTO Trata-se de recurso de apelação interposto por Azimut do Brasil - Fabricação de Iates Ltda contra sentença que absolveu C. A. C. das imputações que lhe foram atribuídas na denúncia (arts. 168, §1º, III, e 155, §4º, II, ambos do Código Penal). O recurso deve ser conhecido, porquanto estão presentes os pressupostos de admissibilidade. A apelante alegou, preliminarmente, violação ao artigo 93, IX, da Constituição Federal, em razão da utilização indevida da técnica de fundamentação per relationem. Para tanto, argumentou que "[...] a sentença se baseou, única e exclusivamente, nas alegações finais apresentadas pelo Ministério Público (que requereu a absolvição), utilizando de forma insuficiente a fundamentação per relationem, transcrevendo integralmente os argumentos apresentados pelo Ministério Público e repetindo-os, sem qualquer exame crítico ou fundamento próprio apresentado por esta assistência" (evento 13, f. 02). Ao contrário do sustentado, a argumentação utilizada pela Magistrada foi devidamente fundamentada, pois como apontou a própria apelante em suas razões recursais, o Juiz utilizou a chamada fundamentação per relationem, aquela em que a autoridade judiciária adota como fundamento de sua decisão as alegações contidas na manifestação das partes. No caso em exame, a Juíza de primeiro grau, ao proferir a sentença, adotou como razões de decidir os argumentos contidos no parecer ministerial, que se mostrou completo, lógico e amparado nas provas produzidas durante a persecução penal. A sentença, portanto, não é desprovida de fundamentação, mas, sim, remissiva, o que é plenamente válido. O magistrado, ao se valer da manifestação do Parquet, demonstrou sua convicção e alinhamento com as razões ali expostas, conferindo-lhes o seu próprio valor de fundamentação. Acerca da validade da utilização da técnica da fundamentação per relationem, extrai-se da jurisprudência do Superior , rel. Hildemar Meneguzzi de Carvalho, Segunda Câmara Criminal, j. 26-08-2025). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CRIMINAL. APONTADA OMISSÃO NO ACÓRDÃO. VÍCIO NÃO DETECTADO. MANIFESTO INTERESSE NA REDISCUSSÃO DO MÉRITO DA APELAÇÃO. VIA INAPROPRIADA. ADEMAIS, UTILIZAÇÃO DA TÉCNICA DA FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM QUE NÃO CONFIGURA OFENSA AO DISPOSTO NO ART. 93, INC. IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PREQUESTIONAMENTO. MEIO INADEQUADO. RECURSO VINCULADO ÀS HIPÓTESES LEGAIS. EMBARGOS REJEITADOS.  (TJSC, Apelação Criminal n. 5001059-02.2022.8.24.0008, do , rel. Alexandre d'Ivanenko, Quarta Câmara Criminal, j. 12-12-2024). Afasta-se, portanto, a prefacial invocada. No mérito, a Recorrente requereu a condenação do réu nos termos descritos na denúncia, ao argumento de que existem provas suficientes da materialidade e da autoria.  Sem razão. Isso porque a materialidade e autoria dos crimes não restaram comprovadas estreme de dúvidas, como se verá a seguir. Na delegacia de polícia, foram ouvidos Felipe Daniel Berra e Kátia dos Santos Lima, funcionários da empresa Azimut (evento 125, INQ177 e evento 141, INQ226), e Marcello Chromiec Lauer, funcionário da empresa FF Group, nesta ordem:   Com relação à prova oral produzida em audiência, utilizar-se-á da narrativa efetuada pelo Promotor de Justiça Guilherme Brodbeck, em sede de alegações finais, pois fiel ao que consta nas mídias dos eventos 435 e 453, bem como para evitar desnecessária repetição: Em juízo, a testemunha Felipe Daniel Berra ratificou suas declarações prestadas perante a Autoridade Policial (evento 435): [...] que é excolega de trabalho do acusado; [...] que trabalhou entre 2010 e 2013 na empresa Azimut como diretor industrial; [...] que nessa época somente ele tinha autorização para assinar e movimentar cheques; [...] que na época do crime foi lhe apresentado alguns cheques; que foi questionado se a assinatura destes cheques era sua; que as assinaturas não eram suas; [...] que os carimbos utilizados nos cheques não eram aqueles que eram utilizados pela empresa; [...] que as assinaturas dos cheques juntados aos autos não são suas; [...] que no final de 2012 houve um mandado de busca e apreensão dentro da empresa de um dos barcos em razão de um processo judicial; que um cliente alegava em juízo que havia pago o barco e não havia recebido; que foi apurado que os valores do barco foram depositados por outro cliente; [...] que quem verificava os valores de depósito de cada um dos barcos era a empresa comercial que representava a Azimut; [...] que foi identificado que o pagador era Florisvaldo; que quem alegou o pagamento do barco foi a empresa FF Group; [...] que não ofereceu o carimbo original da empresa para a polícia. Na fase judicial, a testemunha novamente relatou que trabalhava na Azimut de 2010 até fevereiro de 2013 como analista financeira; [...] que não se recorda do caso; [...] que se recorda de ter enviado o e-mail anexo no Evento 116, ANEXO32 dos autos; que todos os depósitos feitos para Azimut eram passados por ela; [...] que ocorriam diversos problemas com a empresa Yatch Brasil; que em certos momentos a empresa informava que o pagamento foi feito por certo cliente quando era feito por outro; que em ocasião um cliente fazia os pagamentos corretamente mas seus pagamentos eram atribuídos a outro que estava sem pagar; que Florisvaldo tinha comprovante de pagamento; que em determinado momento oficiais de justiça com apoio da policia federal apareceram na empresa para apreender o barco; que não foi único caso dentro da empresa; que seu contato era diretamente com o pessoal da Yatch Brasil; que o valor recebido era R$ 300.000,00; que não se recorda de outras situações; [...] que no ano de 2012 para 2013 houve muitas vendas na empresa para Yatch Brasil; [...] que era normal o pagamento vir do representante da empresa; que outro processo em que o presidente, Luca Morango, havia roubado a empresa correu em final de 2012; que um gerente chamado Fausto percebeu a situação e denunciou Luca Morango para a sede italiana da empresa [...] (evento 435). O funcionário da empresa FF Group, na fase instrutória, disse que acompanhou a compra investigada nos autos; que as compras eram feitas por intermédio do dealer da Azimut; [...] que a compra foi feita por Carlos Eduardo, vulgo "Cadu", na época; que Cadu fazia parte do fechamento dessas negociações; que Marcelo inclusive participou dessa venda específica; que uma parte do pagamento foi feita em embarcação e outra parte foi feita em cheques; que surgiu um problema; que o barco não foi entregue; [...] que a empresa cumpriu as suas obrigações mas não recebeu a embarcação no prazo; que ficaram sabendo que a Azimut não recebeu o valor mas que mesmo assim os cheques haviam sido emitidos em nome da Azimut; que aconteceu situação diferente do acordado durante a compra; que no fim foi necessária entrar com uma ação judicial para que a embarcação prometida fosse entregue; que os cheques foram mostrados a ele na época do Inquérito Policial; que a Super Yacht, empresa que Carlos Eduardo representava, era uma empresa bem conhecida no ramo; [...] que a Azimut não liberou o barco em razão do não pagamento; que somente resolveu o problema durante a ação judicial; [...] que o dono de Azimut sempre falava diretamente com Cadu sobre os atrasos de pagamento; que as informações nem sempre eram precisas; [...] que os vendedores faziam a parte operacional; [...] que não se recorda se as partes fizeram acordo em novembro de 2012 [...](evento 435). A testemunha Florisvaldo Lesko – comprador de uma embarcação na empresa do acusado -, contou que comprou uma embarcação e foi fazendo pagamentos mensais até a entrega, que existia uma cláusula no contrato de que quando a embarcação tivesse pronta teria que fazer o pagamento do saldo, que era de R$300.000,00, em TED, que fez o pagamento, que não lhe entregavam o barco, informaram que faltava o pagamento, que atrasaram e depois lhe entregaram. Que ficou sabendo posteriormente que a empresa entrou em falência, que uns 2 (dois) anos depois foi intimado na delegacia para informar qual era seu envolvimento com o Júnior, empresário. Que depois ficou sabendo que ele também pegou o valor de R$ 300.000,00 em cheques mas que sua pessoa pagou por meio de TED. Que atrás desses cheques escreveram que os valores eram para pagamento do saldo de seu barco. Que os vendedores nunca lhe falaram que não entregaram o barco por falta de pagamento, que quando ligou na fábrica foi informado que a problemática ocorrera por falta de pagamento. Que na empresa representante fazia contato com Cadu e com o financeiro, o contato inicial com vendedores e depois com o financeiro. Que conversou com Carlos Alberto, que negociou com um vendedor dele, que para a sua pessoa quem estava por trás da empresa era o Cadu, já que ele era um dos proprietários. Repetiu que, em algum momento, conversou com ele sobre a transação e que todos falavam que resolveriam a situação (evento 453). Sob o crivo do contraditório o acusado C. A. C. negou a prática delitiva e sustentou o seguinte: que trabalhou 25 (vinte e cinco) anos no ramo náutico e sempre trabalhou na intermediação de venda embarcação. Teceu narrativa extensa sobre suas empresas [...]. Que a venda narrada na denúncia foi feita na sua empresa, que foi feito contrato entre a Sulmarine e Super Yachts, que Azimut não aparece no contrato, vez que não era parte, era a fabricante do barco. Que seus vendedores foram buscar os cheques na FF Group, que esses cheques foram nominados à Azimut do Brasil, por erro, que os cheques foram recebidos e direcionados à Súper Yachts, que eram mais cheques de R$ 144.000,00. Acerca do primeiro cheque, confirma que recebeu e que não deveria repassar a empresa Azimut, que eles foram direcionados a empresa matriz, que nunca recebeu esse cheque, que não cuidava do financeiro, que foi Maristela quem fez esse depósito. Que a FF Group recebeu o barco. Que a sua empresa fez a intermediação da venda do barco do Florisvaldo. Que Super Yatchs era sua empresa. Que os cheques foram direcionados à Super Yatchs, que era responsável por pagar a Azimut para liberação do barco, que depositaram um cheque de R$ 300.000,00 à Azimut, que os outros dois cheques de R$ 144.000,00 era de nossa responsabilidade, sua comissão. Que solicitaram à Maristela que, como o cheque era nominal, pedisse o endosso do cheque à Azimut, que ela devolveu os cheques endossados, que os cheques eram seus, o que estava errado era a grafia mas Azimut endossou. Que foram feitas diversas tratativas com Azimut, que assinaram um termo de compromisso em que nada fala sobre eventual apropriação. Que Azimut não quis entregar o barco. Que houve interesse comercial já que a Super Yatchs foi dissolvida. Que a FF Group impetrou mandado de segurança e foi até a fábrica retirar o barco, na Azimut do Brasil. Que a Azimut fez um acordo extrajudicial com a FF Group e eles pagaram aqueles 7 (sete) cheques que seriam nossos diretamente à Azimut (evento 453). Com relação ao delito de apropriação indébita (CP, 168, §1º, III), a Apelante sustentou que o réu apropriou-se dolosamente de cheque no valor de R$ 300.000,00 da FF Group, induzindo a Azimut em erro ao alegar que esse depósito se referia à quitação da dívida de Floresvaldo Lesko, logrando com isso manter os valores em sua conta e obter a liberação de um barco indevidamente. De fato, o contexto fático revela uma gestão financeira, por parte das empresas pertencentes ao réu, extremamente confusa e desorganizada, evidenciando uma possível violação das obrigações contratuais de repasse. As provas demonstram que houve o recebimento, pela empresa Super Yachts (do réu), do cheque n. 282.383, emitido pela FF Group, nominal à Azimut. O réu, por intermédio de seus funcionários, informou à Azimut que o depósito correspondente se referia ao cliente Floresvaldo Lesko. A prova documental demonstra que Floresvaldo, de fato, realizou um TED de R$ 300.000,00 em data anterior (28.02.2012) para a conta da Super Yachts. O crime de apropriação indébita exige a demonstração inequívoca do animus rem sibi habendi, ou seja, a intenção de ter a coisa para si, invertendo a posse de forma dolosa. No intricado cenário de negociações entre a Azimut e os representantes do réu, que envolviam mútuas transações, débitos e créditos, a simples não comunicação correta sobre a origem do pagamento ou o ardil utilizado para liberar a embarcação de Floresvaldo não é suficiente para sacramentar a esfera penal, conforme bem ponderou a sentença recorrida. O Juízo de primeiro grau destacou, e esta instância ratifica, a existência de contradições cruciais nos depoimentos das partes e dos funcionários da própria Azimut. O réu, em seu interrogatório, embora confuso em suas declarações sobre ter ou não "posto a mão" no cheque, buscou sustentar que o valor do cheque da FF Group (R$ 300.000,00) estava sujeito ao contrato de revenda e que não era de sua responsabilidade repassá-lo integralmente à Azimut naquele momento específico (Evento 453). A testemunha Kátia dos Santos Lima, analista financeira da Azimut, mencionou que "em certos momentos a empresa informava que o pagamento foi feito por certo cliente quando era feito por outro" e que o caso não fora o único na fábrica (Evento 435), sinalizando que a confusão de atribuição de pagamentos era uma realidade na dinâmica comercial entre as empresas. Ademais, o valor de R$ 300.000,00 foi depositado na conta da Azimut, conforme comprovante juntado no evento 116, anexo 33, indicando que o dinheiro não foi retido pelo intermediador, mas sim repassado à fabricante, ainda que com a informação de origem equivocada. Isso mitiga substancialmente a prova do dolo de apropriação, uma vez que o animus rem sibi habendi implica dispor do valor como se fosse próprio, e não, como ocorreu, repassar o montante (embora confundindo a proveniência) para a conta da vítima. Esta ambiência fática complexa e altamente volátil, repleta de imputações recíprocas de descumprimento contratual, impossibilita que se fixe, com a certeza necessária ao decreto condenatório, o dolo de apropriação. Permanece a dúvida se a conduta constituiu um crime ou uma falha de repasse no âmbito de um desacordo de natureza cível. Considerando a insuficiência de elementos probatórios que superem a barreira da dúvida razoável, a manutenção da absolvição quanto à apropriação indébita é a medida que se impõe. No que diz respeito ao crime de furto mediante fraude (CP, 155, §4º, II), a Apelante insiste na prova da fraude material, indicando que a subtração dos dois cheques (R$ 144.445,00 cada) ocorreu mediante a falsificação da assinatura de endosso, depositando os valores em contas de suas empresas coligadas. A tese recursal apoia-se substancialmente no fato de que o Sr. Felipe Daniel Berra, gerente com poderes de representação e endosso na Azimut, negou categoricamente ser o autor das assinaturas apostas nas respectivas cártulas. Embora o depoimento do Sr. Felipe Daniel Berra seja elemento relevante para o histórico dos fatos e para a configuração de indícios, a prova da materialidade e da autoria do crime de furto mediante fraude, pautado essencialmente na falsificação do endosso em títulos de crédito, exige evidência técnica e inequívoca, especialmente quando se trata de vincular a autoria da fraude a um indivíduo específico em uma complexa relação de intermediação comercial. O ponto nodal que fulmina o acolhimento da tese condenatória é o resultado da prova pericial produzida nos autos, que se revelou infrutífera para os fins de identificação da autoria falsa. Conforme corretamente destacado pelo Juízo a quo, o Exame Grafoscópico (Evento 166, Inq326-329) foi inconclusivo. A expert consignou expressamente que "não foram encontrados elementos de identificação gráfica entre as assinaturas questionadas e as lançadas pelo titular dos padrões de confronto, entretanto não existem elementos grafocinéticos suficientes para concluir se as mesmas (questionadas e padrões) procederam ou não do mesmo punho". O laudo ainda trouxe a ressalva de que a limitação de sua conclusão decorreu, em grande parte, de ter sido realizado sobre documentos digitalmente reproduzidos, o que potencialmente comprometeu em definitivo a análise detalhada dos elementos grafocinéticos necessários para uma conclusão categórica. Assim, registra-se que não há como se tolerar uma condenação baseada em mera suposição, em indícios que não foram tecnicamente corroborados ou em provas que deixam margem para que a autoria seja de terceiro. A negativa de um único funcionário, por si só, desacompanhada de prova técnica que vincule a falsificação diretamente ao réu ou que descarte a autoria de outra pessoa ligada à cadeia negocial e documental, não é suficiente para demonstrar a autoria e a materialidade delitivas com o grau de certeza inabalável exigido. E, "se da análise dos elementos probatórios contidos nos autos não for possível extrair a certeza necessária da autoria do crime, a absolvição é medida que se impõe, em homenagem ao princípio in dubio pro reo" (TJSC, ApCrim 0010808-07.2017.8.24.0008, 2ª Câmara Criminal, Relator para Acórdão ROBERTO LUCAS PACHECO, D.E. 04/10/2023). Desse modo, a prova da autoria dos endossos fraudulentos, requisito indispensável para a caracterização do furto mediante fraude no contexto apresentado, paira irremediavelmente sob a égide da dúvida insuperável. Reiterando o entendimento de primeiro grau, a dúvida razoável sobre a autoria e a materialidade do crime deve redundar inexoravelmente em favor do acusado, pois a condenação criminal exige a certeza plena e não a mera probabilidade de ocorrência, prevalecendo, indubitavelmente, o postulado constitucional do in dubio pro reo. Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento. assinado por ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6813185v25 e do código CRC 5a81d204. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA Data e Hora: 14/11/2025, às 16:43:44     0004126-97.2013.8.24.0033 6813185 .V25 Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:06:57. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Documento:6813186 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Criminal Nº 0004126-97.2013.8.24.0033/SC RELATOR: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA EMENTA DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA E FURTO MEDIANTE FRAUDE. ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. Insurgência DA ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que absolveu o acusado, com fulcro no art. 386, III, do CPP, das imputações que lhe foram atribuídas na denúncia (arts. 168, §1º, III, e 155, §4º, II, ambos do Código Penal). II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se a sentença é nula por ausência de fundamentação própria, em razão da adoção da técnica de fundamentação per relationem; e (ii) saber se há provas suficientes para a condenação pelos crimes de apropriação indébita e furto mediante fraude, diante da alegada retenção indevida de valores e falsificação de endosso em cheques. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A fundamentação per relationem é técnica válida e reconhecida pela jurisprudência, desde que os fundamentos adotados sejam claros e suficientes, como ocorreu no caso. 4. A prova dos autos não permite concluir, com segurança, pela existência de dolo na retenção de valores, tampouco pela autoria da falsificação de endosso nos cheques, sendo insuficiente para afastar a dúvida razoável. 5. O exame grafoscópico realizado foi inconclusivo quanto à autoria das assinaturas nos cheques, não sendo possível vincular tecnicamente o réu à prática da fraude. 6. A dúvida quanto à autoria e à materialidade dos delitos impõe a manutenção da absolvição, em respeito ao princípio do in dubio pro reo. IV. DISPOSITIVO  7. Recurso conhecido e desprovido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Câmara Criminal do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Florianópolis, 11 de novembro de 2025. assinado por ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6813186v3 e do código CRC 9cb916b0. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA Data e Hora: 14/11/2025, às 16:43:44     0004126-97.2013.8.24.0033 6813186 .V3 Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:06:57. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 06/11/2025 A 12/11/2025 Apelação Criminal Nº 0004126-97.2013.8.24.0033/SC RELATOR: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA REVISORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO PRESIDENTE: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA PROCURADOR(A): PEDRO SERGIO STEIL Certifico que este processo foi incluído como item 130 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 21/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 06/11/2025 às 00:00 e encerrada em 11/11/2025 às 19:00. Certifico que a 1ª Câmara Criminal, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão: A 1ª CÂMARA CRIMINAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO. RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA Votante: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA Votante: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO Votante: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO ALEXANDRE AUGUSTO DE OLIVEIRA HANSEL Secretário Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:06:57. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas