RECURSO – direito CIVIL. apelação cível. ERRO MÉDICO. RESPONSABILIDADE CIVIL. desprovimento.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível contra sentença que julgou improcedente o pedido de indenização por dano material, moral e estético, além de pensionamento vitalício, por reconhecer a inexistência de erro médico perpetrado pela parte ré.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há três questões em discussão: (i) saber se há nulidade da sentença em razão da ausência de abertura de prazo as partes para apresentação de alegações finais; (ii) saber se houve cerceamento de defesa em decorrência do indeferimento do pedido de nova perícia; (iii) saber se o descolamento de retina apresentado pela autora decorre de erro médico imputável à parte ré, apto a ensejar sua responsabilização civil; e, (iv) saber se houve falha no dever de informação.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A intimação para apresentação de alegações finais foi re...
(TJSC; Processo nº 0303290-17.2016.8.24.0075; Recurso: recurso; Relator: Desembargador EDUARDO GALLO JR.; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 11 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6827819 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 0303290-17.2016.8.24.0075/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
RELATÓRIO
F. C. D. A. propôs "ação de indenização por danos morais, estéticos e materiais", perante o Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Tubarão, contra R. E. S., NPM CLINICA MÉDICA e HOSPITAL DE CARIDADE SENHOR BOM JESUS DOS PASSOS.
Na inicial, narrou que, após ser atendida na Clínica NPM, o médico réu a diagnosticou com catarata em ambos os olhos e lhe indicou cirurgia para correção do problema. Alegou que, apesar de receosa, foi tranquilizada pelo profissional, que lhe assegurou se tratar de procedimento simples e sem riscos, razão pela qual concordou em realizá-lo. Relatou que a cirurgia do olho esquerdo ocorreu em 09/05/2014, no Hospital de Caridade Senhor Bom Jesus dos Passos, mediante pagamento de R$ 2.000,00, (dois mil reais) relativo a lente intraocular não coberta pelo plano de saúde. No dia seguinte ao precedimento, contudo, não recuperou a visão, sendo informada pelo médico, em consulta de retorno, que a demora decorria da anestesia local aplicada. Em retornos sucessivos (14/05, 21/05 e 28/05/2014), continuava sem enxergar, até que, no último, após aa realização de exames mais detalhados, foi diagnosticado descolamento de retina, momento em que foi encaminhada a especialista. Afirmou que, devido ao atraso no diagnóstico, perdeu definitivamente a visão do olho esquerdo, conforme atestado por outros profissionais.
Afirmou que ainda se submeteu a novo procedimento em 12/06/2014 no Hospital de Olhos Sadalla, em Joinville, para tentar estabilizar a lesão, mas não obteve êxito. Sustentou que a perda da visão e as sequelas estéticas lhe causaram intenso sofrimento psicológico, levando-a a desenvolver quadro depressivo. Atribuiu responsabilidade solidária ao médico, à clínica e ao hospital, sob o fundamento de falha na prestação dos serviços e violação do dever de informação, pois não lhe foi alertado nenhum risco, apontando condutas de imperícia e negligência tanto no ato cirúrgico quanto no acompanhamento pós-operatório.
Ao final, requereu: i) a concessão da justiça gratuita e a prioridade na tramitação; ii) o reconhecimento da relação de consumo e a inversão do ônus da prova; iii) a declaração de responsabilidade solidária dos demandados; v) a condenação ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 4.444,00 (quatro mil quatrocentos e quarenta e quatro reais); vi) a fixação de pensão mensal vitalícia, a ser paga em parcela única ou de forma periódica, no valor de quatro salários mínimos ou em percentual da remuneração da autora; vii) a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, sugerindo-se o montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais); viii) a condenação ao pagamento de indenização por danos estéticos, sugerindo-se o montante de R$ 20.000,00 (vinte mil reais); e, ix) a incidência de correção monetária pelo INPC e juros de mora de 1% ao mês desde o evento danoso (evento 1, DOC1).
A justiça gratuita foi deferida à autora (evento 10, DOC27).
Citado, o hospital réu contestou o feito. Alegou, preliminarmente, a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, sustentando que a autora foi atendida pelo plano SC Saúde e não por contrato particular, o que afastaria a caracterização de relação de consumo e a consequente inversão do ônus da prova. Também arguiu ilegitimidade passiva, defendendo que a autora não foi internada em suas dependências, mas apenas realizou cirurgia em caráter ambulatorial, conduzida pelo médico, profissional liberal, sem vínculo de emprego ou subordinação com o hospital. Aduziu que sua responsabilidade não poderia ser reconhecida, já que se limitou a ceder espaço físico e prestar serviços auxiliares (instalações, medicamentos, enfermagem), não havendo falha naquilo que lhe competia.
No mérito, aduziu não haver erro médico ou falha nos serviços hospitalares, ressaltando que a cirurgia de catarata com implante de lente intraocular foi realizada dentro da técnica exigida, tendo a paciente permanecido em observação até ser liberada pelo cirurgião responsável. Argumentou que o deslocamento de retina pode ocorrer espontaneamente e não há prova de que decorreu do procedimento cirúrgico. Impugnou documentos apresentados pela autora, alegando contradições e ausência de nexo causal entre o ato médico e a perda da visão. Ressaltou que a responsabilidade do médico é subjetiva, de obrigação de meio, cabendo à autora comprovar culpa, o que não teria ocorrido.
Ao final, requereu o acolhimento das preliminares, com a sua exclusão do polo passivo da lide e a improcedência total dos pedidos indenizatórios, por inexistência de nexo causal e de falha na prestação do serviço. Subsidiariamente, em caso de condenação, postulou pela fixação de indenização por danos morais em valor módico e o reconhecimento da condição de entidade beneficente para fins de isenção de custas (evento 23, DOC37).
O médico réu e a Clínica ré apresentaram contestação. Preliminarmente, arguiram a ilegitimidade passiva da clínica, sustentando que se trata de sociedade simples pura, sem subordinação sobre os atos médicos, praticados de forma autônoma e pessoal pelo profissional, razão pela qual não poderia responder solidariamente por eventual erro. Também impugnaram o deferimento da justiça gratuita à autora, alegando omissão de informações sobre a renda familiar e ausência de comprovação de hipossuficiência.
No mérito, defenderam que a obrigação médica é de meio, e não de resultado, cabendo ao profissional empregar diligência e técnica adequadas, mas sem garantia de cura. Relataram minuciosamente o histórico de atendimentos: diagnóstico de catarata em ambos os olhos, explicação dos riscos e entrega do termo de consentimento, escolha pela autora de lente asférica mediante pagamento de R$ 2.000,00 (dois mil reais) e realização da cirurgia em 09/05/2014. Afirmaram que o edema de córnea foi detectado já no primeiro dia pós-operatório e que o descolamento de retina só se tornou possível de diagnosticar no 19º dia, por meio de ultrassonografia, não havendo omissão de conduta. Alegaram que o quadro decorreu de fatalidade, possivelmente associado ao não cumprimento das orientações pós-operatórias pela paciente, e não de erro médico. Ressaltaram que a autora já apresentava baixa acuidade visual antes da cirurgia, considerada legalmente cega, além de possuir histórico de diabetes e depressão preexistentes. Contestaram a alegação de dano estético, sustentando que a autora se submeteu a blefaroplastia por dermatocálase anterior ao procedimento de catarata. Impugnaram também os documentos referentes a despesas médicas particulares, defendendo ausência de nexo causal e enriquecimento ilícito.
Ao final, requereram: i) o acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva da NPM Clínica Médica; ii) a revogação da justiça gratuita; e, iii) a improcedência integral da ação, por inexistência de culpa, dolo ou nexo causal. Subsidiariamente, a redução dos valores pleiteados a título de danos morais, estéticos, materiais e pensão vitalícia, por serem exorbitantes; v) o indeferimento da inversão do ônus da prova; e, vi) a condenação da autora por litigância de má-fé, com aplicação de multa (evento 24, DOC43).
Réplica ofertada (evento 29, DOC94).
A parte autora peticionou postulando a concessão da tutela de urgência em caráter incidental para a produção antecipada de prova pericial de avaliação, nomeando perito para avaliar se há ocorrência de erro médico, e qual a extensão do dano causado, na forma dos art. 464 a 480, do CPC, disponibilizando às partes o respectivo laudo pericial (evento 31, DOC98).
Em decisão interlocutória, o juízo: i) rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam arguida pela clínica ré; ii) rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo hospital réu; iii) indeferiu a concessão da justiça gratuita requerida pela clínica ré; e, iv) revogou a gratuidade deferida à parte autora, intimando-a para recolher as custas iniciais. Na mesma ocasião, consignou que, apesar de tratar-se de relação de consumo, com incidência do Código de Defesa do Consumidor, não tem aplicação a regra da inversão do ônus probatório porque não se faz presente a verossimilhança das alegações da autora, a demandar prova técnica. Ainda, indeferiu o pedido de produção de prova documental, porquanto preclusa e determinou a realização de perícia médica "para verificação de imperícia/negligência/desídia na conduta e procedimentos adotados pelo médico, na cirurgia realizada no dia 14.05.2014 e no acompanhamento pós-cirúrgico, segundo os padrões determinados pela literatura médica" (evento 32, DOC100).
O hospital réu, o médico réu e a clínica ré apresentaram quesitos periciais (evento 36, DOC106 e evento 37, DOC107).
O recurso de agravo de instrumento interposto pela autora contra a decisão do evento 32, DOC100 foi conhecido e, no mérito, desprovido por esta Sexta Câmara de Direito Civil, sob a relatoria do Exmo. Des. Stanley Braga, mantendo-se a revogação da concessão do benefício da justiça gratuita, conforme acórdão assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, ESTÉTICOS E MATERIAIS. JUSTIÇA GRATUITA. REVOGAÇÃO NO JUÍZO A QUO ANTE A NÃO COMPROVAÇÃO DOS RENDIMENTOS DO NÚCLEO FAMILIAR. HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA NÃO DELINEADA NOS AUTOS. RECORRENTE QUE POSSUI CONDIÇÕES PARA SUPORTAR AS CUSTAS PROCESSUAIS SEM PREJUÍZO À PRÓPRIA SUBSISTÊNCIA. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (evento 54, DOC120).
Foi novamente determinada a intimação da parte autora para recolher as custas iniciais (evento 62, DOC124).
O recurso especial interposto pela autora não foi admitido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 0303290-17.2016.8.24.0075/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
EMENTA
ementa: direito CIVIL. apelação cível. ERRO MÉDICO. RESPONSABILIDADE CIVIL. desprovimento.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível contra sentença que julgou improcedente o pedido de indenização por dano material, moral e estético, além de pensionamento vitalício, por reconhecer a inexistência de erro médico perpetrado pela parte ré.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há três questões em discussão: (i) saber se há nulidade da sentença em razão da ausência de abertura de prazo as partes para apresentação de alegações finais; (ii) saber se houve cerceamento de defesa em decorrência do indeferimento do pedido de nova perícia; (iii) saber se o descolamento de retina apresentado pela autora decorre de erro médico imputável à parte ré, apto a ensejar sua responsabilização civil; e, (iv) saber se houve falha no dever de informação.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A intimação para apresentação de alegações finais foi regularmente realizada, inexistindo nulidade processual.
4. O indeferimento do pedido de nova perícia não configura cerceamento de defesa, pois o laudo produzido é suficiente e adequado para o julgamento da causa.
5. Os quesitos complementares apresentados pela autora não se destinavam a esclarecer omissões ou contradições do laudo, mas a introduzir novos questionamentos baseados em informações já constantes do prontuário médico, razão pela qual se encontram acobertados pela preclusão.
6. O laudo técnico é categórico ao afirmar que a cirurgia de catarata foi corretamente indicada, executada mediante técnica adequada e sem intercorrências, e que o acompanhamento pós-operatório observou a rotina esperada, inexistindo negligência, imprudência ou imperícia.
7. O descolamento de retina constitui complicação possível e reconhecida na literatura médica, não havendo prova de ato ilícito, nem de nexo causal entre o dano suportado pela autora e a conduta dos réus.
8. O dever de informação foi devidamente observado, conforme registro no prontuário médico e demais elementos de prova.
9. A cirurgia era necessária ao tratamento da catarata, não configurando obrigação de resultado, mas de meio, bastando a comprovação da atuação diligente e tecnicamente adequada do profissional.
10. Ausentes os pressupostos da responsabilidade civil, impõe-se a manutenção da sentença de improcedência.
IV. DISPOSITIVO E TESE
11. Recurso desprovido.
________
Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 370, parágrafo único, 465, § 1º, III; 469; 473; 480; CDC, arts. 6º, VIII; 14, caput e § 4º.
Jurisprudência relevante citada: TJSC, Apelação n. 5004072-81.2020.8.24.0039, rel. Marcos Fey Probst, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 08-10-2024; TJSC, Apelação n. 0313731-23.2015.8.24.0033, rel. Eduardo Gallo Jr., Sexta Câmara de Direito Civil, j. 28-05-2024.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de novembro de 2025.
assinado por EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6827820v8 e do código CRC c397f9d9.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): EDUARDO MATTOS GALLO JUNIOR
Data e Hora: 12/11/2025, às 10:52:38
0303290-17.2016.8.24.0075 6827820 .V8
Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:15:11.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 11/11/2025
Apelação Nº 0303290-17.2016.8.24.0075/SC
RELATOR: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
PRESIDENTE: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
PROCURADOR(A): ANTENOR CHINATO RIBEIRO
SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: JIAN DELLA GIUSTINA por F. C. D. A.
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 11/11/2025, na sequência 26, disponibilizada no DJe de 27/10/2025.
Certifico que a 6ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
Votante: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST
Votante: Desembargador JOAO DE NADAL
NEUZELY SIMONE DA SILVA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:15:11.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas