Relator: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Órgão julgador: Turma, j. 02.10.2023.
Data do julgamento: 11 de novembro de 2025
Ementa
RECURSO – Documento:6693812 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 0303767-06.2017.8.24.0075/SC RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR RELATÓRIO G. M. M. interpôs apelação contra a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível de Tubarão que, nos autos da ação de rescisão contratual c/c reintegração de posse e perdas e danos ajuizada por por S. M. L., julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos: Ante o exposto, declaro resolvido o feito, com análise do mérito e consoante artigo 487, I, do Código de Processo Civil JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos para:
(TJSC; Processo nº 0303767-06.2017.8.24.0075; Recurso: recurso; Relator: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR; Órgão julgador: Turma, j. 02.10.2023.; Data do Julgamento: 11 de novembro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6693812 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 0303767-06.2017.8.24.0075/SC
RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
RELATÓRIO
G. M. M. interpôs apelação contra a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível de Tubarão que, nos autos da ação de rescisão contratual c/c reintegração de posse e perdas e danos ajuizada por por S. M. L., julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos:
Ante o exposto, declaro resolvido o feito, com análise do mérito e consoante artigo 487, I, do Código de Processo Civil JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos para:
a) RESOLVER o contrato de compra e venda de imóvel, por culpa do requerido G. M. M.;
b) DETERMINAR a retomada do imóvel pela autora após a devolução dos valores pagos pelo réu, devidamente comprovados às fls. 30/36 e 113/125, no montante de R$ 95.100,00 (noventa e cinco mil e cem reais), com atualização monetária por tabela deste Tribunal a partir de cada pagamento;
c) CONDENAR o réu ao pagamento de cláusula penal de 10% sobre os valores inadimplidos, os quais perfazem o valor não atualizado de R$ 24.900,00 (vinte e quatro mil e novecentos reais);
d) CONDENAR o réu ao pagamento de perdas e danos, à título de alugueres, no valor mensal de R$ 650,00 (seiscentos e cinquenta reais), até a devida entrega do imóvel, com correção monetária pelo INPC desde cada inadimplemento e com juros de mora de 1% ao mês;
e) CONDENAR o réu ao pagamento dos valores à título de IPTU do imóvel objeto da ação no valor de R$ 2.924,43 (dois mil novecentos e vinte e quatro reais e quarenta e três centavos), vencidos e vincendos, atualizados desde cada desembolso;
f) CONDENAR o réu ao pagamento de R$ 4.362,69 (quatro mil trezentos e sessenta e dois reais e sessenta e nove centavos) à título de taxas condominiais devidamente atualizados;
g) AUTORIZAR a compensação dos valores, à título de perdas e danos bem como de IPTU, taxas condominiais e cláusula penal, dos valores pagos pelo réu;
h) AUTORIZAR que o réu retire as benfeitorias que não causem danos ao imóvel, tais como chuveiro, coifa, fogão, luminárias bem como outros itens de fácil remoção;
Em razão do principio da sucumbência, CONDENO o réu ao pagamento de custas, despesas e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sob o valor atualizado da causa, consoante artigo 85, §2º do Código de Processo Civil.
Defiro ao réu o benefício da gratuidade da justiça, ficando as verbas sucumbenciais sob condição suspensiva de exigibilidade, consoante artigo 98, §3º do Código de Processo Civil (evento 44, SENT100).
Sustentou, em preliminar, a ocorrência de cerceamento de defesa, por não ter sido oportunizada a produção de prova pericial e testemunhal necessárias para demonstrar as benfeitorias realizadas no imóvel e a sua valorização. Relativamente ao mérito, sustentou: a) a impossibilidade de rescisão do contrato em razão do adimplemento substancial; b) a condenação da parte apelada ao pagamento de indenização pelas benfeitorias realizadas no imóvel, que elevaram seu valor de mercado de R$ 120.000,00 para R$ 350.000,00; c) a impossibilidade de cumulação da cláusula penal com a indenização por perdas e danos; e d) a improcedência do pedido de pagamento de taxas condominiais (evento 52, APELAÇÃO107).
Contrarrazões no evento 61, CONTRAZ1.
É o relatório.
VOTO
1 – Admissibilidade
O recurso deve ser conhecido, uma vez que é tempestivo, isento da antecipação do preparo em razão da gratuidade (evento 44, SENT100) e estão presentes os demais requisitos de admissibilidade.
2 – Preliminar de cerceamento de defesa – Análise desnecessária – Incidência do artigo 488 do CPC
O apelante sustenta que a ausência de produção de provas testemunhal e pericial importou no cerceamento do seu direito de defesa, pois eram de suma importância para a adequada resolução da lide no tocante às benfeitorias realizadas no imóvel.
A análise da preliminar é desnecessária, pois, vislumbra-se, em atenção ao princípio da primazia da decisão de mérito (artigo 6º do CPC), que o julgamento do recurso será favorável ao apelante, no ponto.
Aplica-se, portanto, ainda que por analogia, a regra do artigo 488 do CPC, segundo o qual, "desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485".
Neste sentido, colhe-se o seguinte julgado desta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS C/C ALTERAÇÃO DE ÍNDICE DE CORREÇÃO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELO DA CONSTRUTORA REQUERIDA.
PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. APELANTE QUE ADUZ TRATAR-SE DE PRONUNCIAMENTO EXTRA PETITA. ANÁLISE DISPENSADA. DECISÃO DE MÉRITO FAVORÁVEL À PARTE INTERESSADA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. EXEGESE DO ART. 488 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
MÉRITO. CASO CONCRETO. AUTORES QUE ADQUIRIRAM LOTE URBANO, ATRAVÉS DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO FORNECIDO PELA PRÓPRIA CONSTRUTORA. PREVISÃO DE PAGAMENTO DE PARCELAS CORRIGIDAS MONETARIAMENTE PELO IGP-M/FGV. PEDIDO DE REVISÃO CONTRATUAL SOB O FUNDAMENTO DE QUE, COM A SUPERVENIÊNCIA DA PANDEMIA DA COVID-19, A PRESTAÇÃO TORNOU-SE DEMASIADAMENTE ONEROSA. TESE RECURSAL. ALEGADA A INAPLICABILIDADE DAS TEORIAS DA IMPREVISÃO E DA ONEROSIDADE EXCESSIVA AO CASO. ACOLHIMENTO. CLÁUSULAS CONTRATUAIS LIVREMENTE PACTUADAS PELOS INTERESSADOS. AUTONOMIA DAS PARTES QUE DEVE SER RESPEITADA. HIPÓTESES EXCEPCIONAIS DE MITIGAÇÃO. CONTEXTO DE PANDEMIA QUE, POR SI SÓ, NÃO ENSEJA A SUBSUNÇÃO DOS FATOS AOS REQUISITOS PREVISTOS EM LEI. TEORIA DA IMPREVISÃO (ART. 317 DO CC). DESPROPORÇÃO MANIFESTA ENTRE O VALOR DA PRESTAÇÃO E O DO MOMENTO DA EXECUÇÃO NÃO DEMONSTRADA. TEORIA DA ONEROSIDADE EXCESSIVA (ART. 478 DO CC). CONJUNTURA FÁTICA QUE NÃO EVIDENCIA A EXTREMA VANTAGEM DA CONSTRUTORA REQUERIDA, EM DETRIMENTO DE PREJUÍZOS SUPORTADOS PELOS AUTORES. DEMANDANTES QUE, ADEMAIS, NÃO LOGRARAM DEMONSTRAR A REDUÇÃO ABRUPTA DE SEUS RENDIMENTOS, COMO EFEITO DO PERÍODO PANDÊMICO. VARIAÇÃO DO ÍNDICE PREVIAMENTE ESTABELECIDO QUE, POR SI SÓ, NÃO CARACTERIZA O DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL ALEGADO. CLÁUSULAS DO CONTRATO QUE DEVEM SE MANTER HÍGIDAS. SENTENÇA REFORMADA.
INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5001898-39.2021.8.24.0080, do , rel. Álvaro Luiz Pereira de Andrade, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 01-08-2024) (Sem destaques no original).
Desta forma, deixa-se de analisar a preliminar.
3 – Mérito recursal
3.1 – Adimplemento substancial
Sob o argumento de ter havido adimplemento substancial, o apelante defende a impossibilidade de rescisão do contrato, tendo o imóvel como moradia familiar.
Sem razão, adianta-se.
O adimplemento substancial está inserido na função corretiva do princípio da boa-fé, pois busca evitar a resolução do contrato por inadimplemento quando a parte cumpriu de forma significativa suas obrigações, deixando de executar apenas uma parte mínima do pacto, com a finalidade evitar o abuso do direito, permitindo que o cumprimento parcial da obrigação não seja considerado motivo para a extinção da avença.
Sobre a teoria do adimplemento substancial, Orlando Gomes explica que:
Por fim, há a função corretiva do princípio da boa-fé. Nessa área, ele atua principalmente no controle das cláusulas abusivas e como parâmetro para o exercício das posições jurídicas. Sob esse aspecto, destaca-se o adimplemento substancial (substantial performance), hipótese em que o contratante executa grande parte de suas obrigações e somente deixa de executar parte insignificante perante o todo, cuja consequência principal é impedir a resolução do contrato sob alegação de inadimplemento, além de outras figuras ligadas ao abuso do direito (v.g., a proibição do comportamento contraditório, também denominado venire contra factum proprium). O Código Civil de 2002 traz a boa-fé em função corretiva no art. 187, ao erigi-la em critério de determinação do abuso do direito (“Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”). (GOMES, Orlando. Contratos - 28ª Edição 2022. 28. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022. E-book. p.70. ISBN 9786559645640. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9786559645640/. Acesso em: 07 mar. 2025. p . 70)
Outrossim, para Flávio Tartuce:
"[...] pela teoria do adimplemento substancial (substantial performance), em hipóteses em que o contrato tiver sido quase todo cumprido, não caberá a sua extinção, mas apenas outros efeitos jurídicos, visando sempre a manutenção da avença." (TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Teoria Geral dos Contratos e Contratos em Espécie - Vol. 3. 17ª ed., Rio de Janeiro: Editora Forense; Grupo GEN, 2022, p. 317).
In casu, retira-se dos autos - em especial o contrato particular de venda e compra (evento 1, INF4 e evento 1, INF5), do termo de aditamento (evento 1, INF6) e das 21 notas promissórias de R$ 1.700,00 que embasaram a pretensão rescisória (evento 1, INF7 ao evento 1, INF10) - que o apelante adimpliu 70,25% do valor de venda estipulado (R$ 120.000,00), porquanto inadimplente na quantia de R$ 35.700,00.
Em semelhantes situações, assim decidiu este , rel. Gerson Cherem II, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 18-02-2025) (destacou-se).
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. RESCISÃO CONTRATUAL. INADIMPLEMENTO. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. DECISÃO PARCIALMENTE REFORMADA.
I. CASO EM EXAME
1. Trata-se de apelações interpostas por ambas as partes contra sentença proferida em ação de rescisão contratual, na qual a parte autora pleiteia a rescisão do contrato de compra e venda de imóvel em razão do inadimplemento da parte ré.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. As questões em discussão são: (i) saber se a aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial é cabível no caso em análise; (ii) saber se o índice de correção monetária deve ser alterado de INPC para IGP-M; (iii) saber se a parte ré tem direito à devolução de valores a título de benfeitorias; e (iv) saber se a taxa de fruição estipulada na sentença deve ser majorada.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial não se justifica, uma vez que o percentual de pagamento realizado pela parte ré é inferior ao mínimo considerado aceitável para tal teoria, usualmente adotada em 90% do valor total do contrato. Caso concreto em que houve pagamento de 76,5% do total.
4. O índice de correção monetária deve ser alterado para IGP-M, conforme previsão contratual, uma vez que a aplicação do INPC não se justifica no contexto da relação contratual estabelecida entre as partes.
5. A parte ré não especificou as benfeitorias que pleiteia ressarcir, inviabilizando a análise do pedido de devolução de valores.
6. A taxa de fruição estipulada na sentença destoa do cenário fático, pois a inicial apontou valor de diárias na temporada, (R$ 400,00 a R$ 600,00), enquanto o decisum adotou esse montante para aluguel mensal (R$ 400,00). Manutenção da obrigação de arcar com taxa de fruição, mas delegando o arbitramento à fase de liquidação.
IV. DISPOSITIVO E TESE
7. Recurso da parte autora conhecido e parcialmente provido, para alterar a taxa de fruição. Recurso da parte ré conhecido e parcialmente provido para alterar o índice de correção monetária de INPC para IGP-M.
Tese de julgamento: "1. A aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial não é cabível, em regra, quando o percentual de pagamento é inferior a 90%. 2. O índice de correção monetária deve ser o IGP-M, conforme previsão contratual. 3. A devolução de valores a título de benfeitorias não é cabível por falta de especificação. 4. A taxa de fruição deve ser apurada em sede de liquidação."
___________Dispositivos relevantes citados: CC, art. 475; CC, art. 421. Jurisprudência relevante citada: TJSC, Apelação n. 0322490-87.2017.8.24.0038, do , rel. Alexandre Morais da Rosa, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 30-01-2024; Apelação n. 0303680-72.2016.8.24.0079, do , rel. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 03-09-2024; Apelação n. 5000568-21.2020.8.24.0119, do , rel. Osmar Nunes Júnior, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 27-06-2024.
(TJSC, Apelação n. 5007412-32.2020.8.24.0007, do , rel. Gladys Afonso, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 01-07-2025) (destacou-se).
Desta Câmara:
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. RECURSO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível contra sentença que julgou improcedentes os pedidos de rescisão de contrato cumulada com reintegração de posse e reparação de perdas e danos, em razão da aplicação da teoria do adimplemento substancial, tendo a adquirente quitado mais de 80% do valor total do contrato.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. A questão em discussão consiste em saber se é cabível a rescisão contratual quando a compradora, embora inadimplente, já tenha adimplido parcela substancial do valor pactuado (mais de 80% do total).
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A teoria do adimplemento substancial, inserida na função corretiva do princípio da boa-fé objetiva, impede a resolução do contrato quando a parte cumpriu de forma significativa suas obrigações, deixando de executar apenas uma parte mínima do pacto, com a finalidade de evitar o abuso do direito.
4. No caso concreto, das 180 parcelas inicialmente ajustadas, a compradora quitou 154, além de realizar outros pagamentos no curso da demanda, restando saldo inferior a 20% do valor total do contrato, o que configura adimplemento substancial.
IV. DISPOSITIVO
5. Recurso conhecido e desprovido, com majoração dos honorários advocatícios em 2%, nos termos do art. 85, § 11, do CPC.
Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 187 e 475; CPC, art. 85, § 11.
Jurisprudência relevante citada: TJSC, Apelação n. 0322490-87.2017.8.24.0038, rel. Alexandre Morais da Rosa, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 30-01-2024; TJSC, Apelação n. 0300309-44.2016.8.24.0033, rel. Gerson Cherem II, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 18-02-2025; TJSC, Apelação n. 5025025-89.2021.8.24.0020, rel. Vania Petermann, Terceira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 08-04-2025.
(TJSC, Apelação n. 0316582-68.2017.8.24.0064, do , rel. Leone Carlos Martins Junior, Terceira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 06-05-2025) (destacou-se).
Logo, porque aqui o percentual adimplido é inferior ao considerado substancial ao ponto de impedir a resolução do contrato, a manutenção da sentença é medida que se impõe, devendo-se desprover o apelo.
3.2 – Benfeitorias
O apelante insurge-se contra o indeferimento do pedido de indenização pelas melhorias realizadas no imóvel, e que elevaram seu valor de mercado de R$ 120.000,00 para R$ 350.000,00, conforme documentos comprobatórios anexados à contestação.
Com razão.
Oportuna a reprodução do correspondente excerto da sentença recorrida (evento 44, SENT100):
Benfeitorias são obras ou modificações realizadas emdeterminado bem, as quais podem ser voluptuárias, necessárias ou úteis.
As voluptuárias são para o mero embelezamento do imóvel, aquelas que não trazem qualquer tipo de melhoria à utilização da coisa, porém acrescem o seu valor; as necessárias são modificações que se destinamà conservação do imóvel ou que evitem que ele se deteriore; já as úteis, são aquelas que servem para facilitar e aumentar o uso da coisa.
É como se pode retirar do Código Civil:
Art. 96. As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias.
§ 1º São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor.
§ 2º São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem.
§ 3º São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore.
Nesta perspectiva, diz o réu que reformou todo o imóvel objeto da ação, fazendo com que o seu preço subisse ao triplo do que era à época da realização do contrato, já que foram colocados novos pisos, portas, janelas, gesso, instalação elétrica, chuveiro, vasos sanitários, coifa, fogão e luminárias. Para tanto, juntou avaliação de imóvel à fl. 181.
Inclusive, defende que caso não haja o reconhecimento das benfeitorias haverá enriquecimento ilícito pelo autor.
Todavia, percebe-se que o réu deixou de colacionar qualquer tipo de prova, como por exemplo notas fiscais ou outros documentos, dos gastos havidos com as mencionadas benfeitorias, bem como de suas respectivas transações negociais.
Ao contrário, o autor trouxe apenas as fotos de fls. 128/180, que supostamente comprovam a sua realização, mas não os gastos dispendidos com a obra.
Aliás, destaco que o documento de fl. 181, apesar de descrever uma suposta valorização do imóvel, não demonstra se o réu, de fato, foi quem arcou com as despesas das benfeitorias realizadas.
Por isso, [...] improcede pleito ressarcitório pela realização de benfeitorias no imóvel litigioso se estas não foram devidamente comprovadas [...] (TJSC, Apelação Cível n. 0000608-87.2014.8.24.0058, de São Bento do Sul, rel. Des. João Batista Góes Ulysséa, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 25-01-2018).
Nesse sentido, colaciona-se do TJSC a seguinte decisão:
"BENFEITORIAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. Somente é possível postergar a valoração das benfeitorias para a fase de liquidação de sentença quando houver ao menos indício de prova de sua existência" (Apelação Cível n. 2007.053003-0, de Porto Belo, rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben, j. 4/12;08).
Além disso, tem-se que as benfeitorias não foram devidamente comprovadas pela incerteza de quem as realizou, à míngua do artigo 373, II, do Código de Processo Civil.
Por outro lado, muito embora os imóveis em geral tenham grande valorização no decorrer do tempo pela própria especulação imobiliária, destaca-se que o réu sequer era proprietário do imóvel, já que a escritura pública seria lavrada apenas após o pagamento integral dos valores negociados, conforme cláusula G, fl. 26.
Entretanto, entendo razoável a retirada das benfeitorias que não causem danos ao imóvel, como é o caso dos chuveiros, coifa, fogão, luminárias bem como demais itens de fácil remoção.
Ao contrário do que entendeu o magistrado da origem, tem-se que a ausência de notas fiscais e/ou de recibos de pagamento com a compra de materiais e prestação de serviços é compreensível, dado o transcurso de mais de 5 (cinco) anos da celebração do contrato entre as partes e da realização das obras pelo apelante, acredita-se, ocasião em que detinha a qualidade de possuidor de boa-fé do imóvel.
Acerca do assunto, o Código Civil dispõe,
Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.
Portanto, justificada a ausência de especificidade da pretensão indenizatória e comprovada a realização de reforma útil no imóvel - conforme registros fotográficos apresentados pelo réu/apelante com a defesa (evento 11, INF45 ao evento 11, INF66) -, faz jus à indenização postulada. Assim "se assegura o equilíbrio entre os direitos das partes, evitando o enriquecimento sem causa de qualquer delas e respeitando o princípio da proporcionalidade, que exige a harmonização entre o direito de propriedade e a necessidade de indenização pelos investimentos realizados" (TJSC, Apelação n. 0305645-09.2019.8.24.0038, do , rel. Erica Lourenco de Lima Ferreira, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 05-12-2024).
Relativamente ao quantum debeantur, pode ser perfeitamente apurado por meio de liquidação de sentença, devendo ficar claro o valor atualizado do imóvel, sem as benfeitorias realizadas pelo apelante, porquanto incabível que se dê sobre a valorização do bem.
De todo o acima exposto, retira-se da jurisprudência deste Sodalício:
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE CONTRATO. IMÓVEL PÚBLICO. NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO. RECURSOS DESPROVIDOS.
I. CASO EM EXAME
1. Apelações interpostas contra sentença que julgou procedente ação de anulação de contrato de permuta de imóveis, declarando nulo negócio jurídico envolvendo bem público e determinando o retorno das partes ao status quo ante, com indenização por benfeitorias a ser apurada em liquidação.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
2. As questões em discussão consistem em: (i) verificar a ocorrência de nulidades processuais e decadência; (ii) determinar se o imóvel permutado constitui bem público; (iii) analisar a possibilidade de usucapião; e (iv) avaliar a adequação da liquidação de sentença para apuração de benfeitorias.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. Não há nulidade processual por irregularidade na oitiva de testemunhas ou ausência de depoimento pessoal quando não demonstrado efetivo prejuízo.
4. A nulidade absoluta do negócio jurídico, decorrente de objeto ilícito, não se sujeita a prazos prescricionais ou decadenciais.
5. Comprovada a localização do imóvel em área pública, o negócio jurídico é nulo por ter objeto ilícito, sendo vedada sua alienação.
6. Bem público não pode ser adquirido por usucapião, conforme vedação constitucional expressa.
7. É cabível a liquidação de sentença para apuração do quantum devido a título de benfeitorias, uma vez definido o an debeatur.
IV. DISPOSITIVO
8. Recursos conhecidos e desprovidos. Honorários recursais majorados, observada a gratuidade da justiça.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 183, §3º; CC, arts. 100, 102, 104, II, 166, II, 169; CPC, arts. 85, §11, 509, II.
Jurisprudência relevante citada: STF, Súmula 340; STJ, AgInt no AREsp 2.079.504/SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, j. 02.10.2023.
(TJSC, Apelação n. 5000728-15.2021.8.24.0021, do , rel. Leone Carlos Martins Junior, Terceira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 26-11-2024).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL. INADIMPLEMENTO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DA AÇÃO PRINCIPAL E DA RECONVENÇÃO. RECURSO DOS AUTORES.
POSTULADA A CONCESSÃO DA GRATUIDADE JUDICIÁRIA À APELANTE (R.L.G.C.). DEFERIMENTO. SITUAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA CARACTERIZADA.
PRELIMINAR VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL. INSUBSISTÊNCIA. FUNDAMENTOS DO RECURSO QUE ABSTRATAMENTE PODEM INFIRMAR AS RAZÕES DE DECIDIR DA SENTENÇA.
REQUERIDO O AFASTAMENTO DO DEVER DE INDENIZAR AS BENFEITORIAS NECESSÁRIAS E ÚTEIS. TESE DE QUE AS OBRAS SEQUER FORAM REALIZADAS E/OU CONCLUÍDAS. INVIABILIDADE. DEVER DE INDENIZAR QUE DECORRE DA LEI. APURAÇÃO DO QUANTUM DIFERIDO PARA A FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA, AINDA QUE HAJA A POSSIBILIDADE DE SE CHEGAR A VALOR ZERO E SE CONCLUIR PELA INEXISTÊNCIA DE MONTANTE A SER INDENIZADO. PRECEDENTES.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 0310993-61.2018.8.24.0064, do , rel. Álvaro Luiz Pereira de Andrade, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 17-07-2025).
DIREITO CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA C/C REINTEGRAÇÃO DE POSSE. INADIMPLEMENTO PROLONGADO. INAPLICABILIDADE DA PRESCRIÇÃO PARCIAL. DESCARACTERIZAÇÃO DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. LEGITIMIDADE DA RESCISÃO CONTRATUAL. FIXAÇÃO DE FRUIÇÃO DESDE A IMISSÃO NA POSSE. DESPROVIMENTO DO RECURSO DA RÉ E PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO DA AUTORA.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta por ambas as partes contra sentença que julgou parcialmente procedente ação de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel, cumulada com reintegração de posse e cobrança de encargos, diante de inadimplemento contratual.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há sete questões em discussão: (i) saber se houve prescrição quinquenal das parcelas vencidas; (ii) saber se é nulo o processo pela ausência de notificação extrajudicial para purga da mora; (iii) saber se houve adimplemento substancial do contrato; (iv) saber se é cabível a condenação à fruição do imóvel e seu termo inicial; (v) saber se deve ser ampliada a indenização pelas benfeitorias; (vi) saber se há ilegalidade na incidência de encargos sobre prestações pagas até 2017; e (vii) saber se a reintegração pode ser condicionada à devolução de valores pagos e indenização.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A ação não versa sobre cobrança de parcelas vencidas, mas sobre a resolução do contrato por inadimplemento, sendo inaplicável a prescrição quinquenal.
4. A ausência de notificação extrajudicial é suprida pela citação válida e regular, não configurando nulidade processual.
5. Não houve adimplemento substancial, pois o inadimplemento foi prolongado e relevante, afastando a tese.
6. A fruição do imóvel deve ser compensada desde a imissão na posse, por aplicação dos princípios da boa-fé e vedação ao enriquecimento sem causa.
7. A indenização por benfeitorias deve ser restrita às efetivamente comprovadas na liquidação, sendo incabível indenização por valorização do bem.
8. Os encargos moratórios são válidos quando não há comprovação de pagamento integral e tempestivo.
9. A reintegração na posse deve observar a restituição proporcional dos valores pagos e a indenização pelas benfeitorias, como forma de equilíbrio contratual.
IV. DISPOSITIVO E TESE
10. Recurso da ré conhecido e desprovido. Recurso da autora parcialmente provido, para alterar o marco inicial dos aluguéis para a data da imissão na posse.
Tese de julgamento: "1. A ausência de notificação extrajudicial não impede a resolução contratual quando há citação válida. 2. O adimplemento substancial exige cumprimento quase integral da obrigação, o que não se verifica quando o inadimplemento é prolongado e relevante. 3. A fruição do imóvel pelo comprador inadimplente deve ser compensada desde a imissão da posse. 4. A indenização por benfeitorias deve ser restrita às comprovadas como necessárias ou úteis. 5. A reintegração na posse deve ser condicionada à devolução proporcional dos valores pagos e à indenização pelas benfeitorias."
Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 205, 397, 412, 884, 1.219 e 1.255; CPC, arts. 509 e 85.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.255.179/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 25.08.2015; TJSC, Apelação nº 5006647-49.2020.8.24.0011, Rel. Des. Gladys Afonso, 5ª Câmara de Direito Civil, j. 17.06.2025; TJSC, Apelação nº 0313651-21.2017.8.24.0023, Rel. Des. Cláudia Lambert de Faria, 5ª Câmara de Direito Civil, j. 23.08.2022.
(TJSC, Apelação n. 5001420-98.2020.8.24.0166, do , rel. Marcelo Carlin, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 03-07-2025).
Ainda, mutatis mutandis:
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO CUMULADA COM REINTEGRAÇÃO DE POSSE E PERDAS E DANOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou procedentes os pedidos de rescisão de contrato de compra e venda de imóvel, reintegração de posse e perdas e danos, em razão de inadimplemento contratual. Embargos de declaração rejeitados com aplicação de multa por caráter protelatório.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
2. As questões em discussão consistem em: (i) saber se houve inovação recursal em alegações não ventiladas em primeiro grau; (ii) saber se ocorreu cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide; (iii) saber se o apelante faz jus à indenização por benfeitorias realizadas no imóvel; e (iv) saber se deve ser afastada a multa imposta por embargos de declaração supostamente protelatórios.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. Caracterizada inovação recursal quanto aos pedidos de aplicação do contrato original e termo de novação e alegação de pagamento substancial, por não terem sido objeto da contestação nem analisados pela sentença, violando o duplo grau de jurisdição.
4. Não houve cerceamento de defesa, pois a controvérsia sobre inadimplência contratual foi suficientemente dirimida pela prova documental existente, sendo desnecessária a produção de outras provas.
5. O pedido de indenização por benfeitorias não comporta provimento, pois a parte ré não comprovou sua realização na contestação, ônus que lhe incumbia. A fotografia juntada em sede recursal não pode ser admitida por constituir documento que deveria ter sido apresentado em momento oportuno.
6. A multa por embargos protelatórios deve ser afastada, pois constitui medida excepcional aplicável apenas quando clara a intenção de rediscutir questões sem apontar efetivos vícios na decisão. No caso, o embargante especificou claramente as razões da suposta contradição.
IV. DISPOSITIVO
7. Recurso conhecido em parte e, nesta extensão, parcialmente provido. Sem honorários recursais em razão da vitória recursal (Tema 1059/STJ).
Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 370, 373, II, 434, 435, 1.014 e 1.026, § 2º.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp n. 2.054.183/MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 23.04.2024; TJSC, Apelação n. 0007325-16.2013.8.24.0167, Rel. André Carvalho, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 14.05.2024; TJSC, Apelação n. 0310380-78.2019.8.24.0008, Rel. Cláudia Lambert de Faria, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 07.05.2024.
(TJSC, Apelação n. 5031965-16.2021.8.24.0038, do , rel. Leone Carlos Martins Junior, Terceira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 12-08-2025).
Logo, a sentença deve ser mantida no tocante à retirada das benfeitorias que não causem danos ao imóvel (voluptuárias), e reformada quanto ao indeferimento do pedido indenizatório, dando-se, pois, parcial provimento ao apelo a fim de condenar a apelada ao pagamento/compensação das benfeitorias necessárias e úteis, como a substituição dos piso, portas, janelas, rede elétrica e instalação de gesso, cujo valor deverá ser apurado em sede de liquidação de sentença (CPC, art. 509).
Neste sentido:
COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – Rescisão contratual, reintegração de posse e indenização por perdas e danos – Sentença de parcial procedência – Recursos recíprocos. Inequívoca relação consumerista. Condenação dentro dos parâmetros fixados nas Súmulas nºs 01 e 02 do E. TJSP; e 543 do C . STJ. Minoração do montante da restituição para 80% (oitenta por cento) do valor pago. Precedentes desta C. Câmara – Taxa de fruição devida. Obrigação que perdura enquanto a adquirente gozou do imóvel sem contraprestação até a data da devolução – Benfeitorias necessárias. Manutenção. Troca de pisos, azulejos e gessos – Recurso da autora provido em parte para condenação da ré ao pagamento de taxa de fruição desde o momento da caracterização do inadimplemento até a data da efetiva devolução do imóvel. Apelo da ré provido para reduzir o valor de retenção para 20% dos valores pagos. (TJSP - Apelação Cível: 1024732-06.2021.8.26 .0224 Guarulhos, Relator.: Gilberto Cruz, Data de Julgamento: 07/03/2023, 10ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/03/2023).
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. IMÓVEL ARREMATADO EM LEILÃO. COMPROVAÇÃO DO SEU ESTADO DE CONSERVAÇÃO. ÔNUS DO ARREMATANTE . PROVIMENTO Nº 51/20. VIOLAÇÃO DA DIALETICIDADE. PRELIMINAR REJEITADA. MULTA POR EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROTELATÓRIOS. MANUTENÇÃO. RETIRADA DE BENFEITORIAS E PERTENÇAS PELA LOCATÁRIA DO IMÓVEL. INDENIZAÇÃO PARCIAL. 1. Não viola o princípio da dialeticidade o apelo que impugna pontualmente as razões de decidir do Juízo sentenciante. 2. São protelatórios os embargos de declaração que apontam omissão já sanada em anteriores declaratórios opostos por outra parte. 3 . São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro. Os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso (arts. 93 e 94 do CCB). 4. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis (art. 1.219, do CC). 5. Sanca de gesso e revestimento 3D de paredes não são pertenças, mas benfeitorias, que podem ser úteis ou voluptuárias, a depender da situação, cuja remoção desfigura a estética do imóvel, razão pela qual não poderiam ter sido removidas pela locatária, assim como disjuntores, caixas das tomadas e interruptores, pois compõem as instalações elétricas do imóvel, integrando-o e sendo essenciais à fruição do bem. Os móveis, pias, vasos sanitários, torneiras, luminárias, box e espelhos são pertenças, e não benfeitorias, logo, podem ser levantados. O estado de conservação do imóvel anteriormente à locação não permite concluir que tenha sido a locatária a responsável pelos demais danos verificados no imóvel (nas portas, maçanetas, janelas, degraus da escada, pisos e revestimentos dos banheiros e lavabo). 6 . O Enunciado de Súmula nº 326 do STJ é restrito ao pedido de indenização por dano moral, não se aplicando à hipótese de danos materiais. 7. Apelos parcialmente providos.(TJDF 0720424-12 .2021.8.07.0003 1837547, Relator.: ARNOLDO CAMANHO, Data de Julgamento: 03/04/2024, 4ª Turma Cível, Data de Publicação: 22/04/2024) (destacou-se).
3.3 – Cumulação da cláusula penal com a indenização por perdas e danos
Com fundamento no artigo 416, parágrafo único, do Código Civil, dispositivo segundo o qual "ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal, não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi convencionado. Se o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização, competindo ao credor provar o prejuízo excedente", o apelante insurge-se contra a condenação cumulada operada na sentença (alugueres).
Sem razão, adianta-se.
In casu, além de ter constado expressamente no termo de aditamento firmado entre as partes o pagamento "mensal referente à fruição do imóvel pelo período em que o COMPRADOR inadimplente estava na posse" (evento 1, INF6, item 3.1), o Superior , rel. Silvio Dagoberto Orsatto, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 06-09-2023).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
RECURSO DA RÉ/COMPRADORA.
PRETENSÃO DE MANUTENÇÃO DO CONTRATO COM AMPARO NA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. NÃO ACOLHIMENTO. PRESTAÇÕES ADIMPLIDAS PELA RÉ QUE NÃO ALCANÇAM 30% DO VALOR TOTAL DO NEGÓCIO. INADIMPLEMENTO CONFIGURADO. RESCISÃO AUTORIZADA.
AVENTADA A IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE ARRAS, CLÁUSULA PENAL E INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES. ACOLHIMENTO EM PARTE. ARRAS CONFIRMATÓRIAS. IMPOSSIBILIDADE DE RETENÇÃO PELOS VENDEDORES. ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. POSSIBILIDADE, CONTUDO, DE COBRANÇA CONCOMITANTE DE CLÁUSULA PENAL COMPENSATÓRIA E DE ALUGUEL PELA FRUIÇÃO DO IMÓVEL POR LONGO PERÍODO SEM CONTRAPARTIDA, NOTADAMENTE EM RAZÃO DA EXISTÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL DE INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR.
PLEITO DE INCIDÊNCIA DE JUROS DE MORA SOBRE O VALOR A SER DEVOLVIDO. ACOLHIMENTO. DIREITO À RESTITUIÇÃO QUE PASSA A EXISTIR A PARTIR DO MOMENTO EM QUE A OBRIGAÇÃO É CONSTITUÍDA PELA SENTENÇA. JUROS DE MORA SOBRE O VALOR A SER RESTITUÍDO QUE DEVEM INCIDIR A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO DA RESPECTIVA DECISÃO.
POSTULADO O AFASTAMENTO DA MULTA POR OPOSIÇÃO DE EMBARGOS PROTELATÓRIOS. ACOLHIMENTO. EXISTÊNCIA DE INTENSO DEBATE SOBRE A QUESTÃO SUSCITADA PELA APELANTE NOS ACLARATÓRIOS, O QUE, INCLUSIVE, LEVOU AO PROVIMENTO PARCIAL DO SEU APELO. INTUITO PROTELATÓRIO DOS EMBARGOS NÃO EVIDENCIADO. MULTA AFASTADA.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 0302054-40.2017.8.24.0125, do , rel. Selso de Oliveira, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 25-04-2024).
Logo, deve-se desprover o apelo, no ponto.
3.4 – Taxas condominiais
Por último, o apelante insurge-se contra a possibilidade de retenção das taxas condominiais pela apelada, por ausência de comprovação do pagamento por ela, aliado ao fato de ter assumido o parcelamento com o credor originário.
Razão não lhe assiste na insurgência.
Sem a necessidade de delongas, apesar de ser do apelante a responsabilidade pelo pagamento da taxa condominial durante o período de ocupação do imóvel, retira-se do cumprimento provisório de sentença em apenso (processo 5006037-78.2023.8.24.0075/SC, evento 1, ACORDO10) que a apelada assumiu a obrigação perante o condomínio, a fim de evitar a penhora do bem, justamente por se tratar de dívida propter rem, tal como fundamentado na sentença recorrida.
Deve-se negar provimento ao apelo, portanto.
4 – Ônus sucumbencial
Com a reforma da sentença, a readequação da sucumbência é medida que se impõe, na medida em que resta configurada a sucumbência recíproca.
Em consequência, mostra-se adequado condenar ambas as partes ao pagamento das custas processuais, na proporção de 20% para a autora e de 80% para a parte ré, bem como dos honorários de sucumbência, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, distribuídos na mesma proporção.
Quanto aos consectários legais, vale anotar que, de fato,
a jurisprudência do Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 0303767-06.2017.8.24.0075/SC
RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
EMENTA
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C REINTEGRAÇÃO DE POSSE E PERDAS E DANOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados em ação de rescisão contratual c/c reintegração de posse e perdas e danos, determinando a resolução do contrato de compra e venda de imóvel por culpa do réu; a retomada do bem mediante devolução dos valores pagos; e condenando-o ao pagamento de cláusula penal, perdas e danos, IPTU e taxas condominiais.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
2. As questões em discussão consistem em: (i) saber se houve cerceamento de defesa pela ausência de produção de prova pericial e testemunhal; (ii) saber se é aplicável a teoria do adimplemento substancial para impedir a rescisão contratual; (iii) saber se o apelante tem direito à indenização pelas benfeitorias realizadas no imóvel; (iv) saber se é possível a cumulação da cláusula penal com indenização por perdas e danos; e (v) saber se é devida a condenação ao pagamento de taxas condominiais.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A análise da preliminar de cerceamento de defesa pela não produção de prova pericial e testemunhal tendentes à demonstração das benfeitorias realizadas no imóvel e sua valorização é desnecessária, pois o julgamento do recurso será favorável ao apelante neste aspecto, o que atrai a aplicação da regra do art. 488 do CPC, em atenção ao princípio da primazia da decisão de mérito.
4. A teoria do adimplemento substancial não se aplica ao caso, pois o apelante adimpliu apenas 70,25% do valor de venda estipulado, percentual inferior ao considerado substancial pela jurisprudência para impedir a resolução do contrato.
5. O apelante, na qualidade de possuidor de boa-fé, tem direito à indenização pelas benfeitorias necessárias e úteis realizadas no imóvel, conforme art. 1.219 do CC. A ausência de notas fiscais é compreensível dado o transcurso de mais de cinco anos, sendo suficiente para a aferição do direito (an debeatur) a comprovação por registros fotográficos da reforma realizada.
6. É possível a cumulação de cláusula penal compensatória com indenização pelo tempo de fruição do imóvel, pois esta última tem natureza jurídica de aluguéis e se justifica pela vedação ao enriquecimento sem causa, não estando englobada no percentual da cláusula penal.
78. Tratando-se de dívida propter rem, a compensação das taxas condominiais inadimplidas é devida até a desocupação do imóvel.
IV. DISPOSITIVO
8. Recurso conhecido e parcialmente provido para condenar a autora ao pagamento/compensação das benfeitorias necessárias e úteis realizadas pelo réu, com valor a ser apurado em liquidação de sentença. Sem honorários recursais em razão da redistribuição da sucumbência.
Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 96, 187, 416, parágrafo único, 884 e 1.219; CPC, arts. 6º, 85, 98, § 3º, 488 e 509.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp n. 2.024.829/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 07.03.2023; TJSC, Apelação n. 0300309-44.2016.8.24.0033, Rel. Des. Gerson Cherem II, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 18.02.2025; TJSC, Apelação n. 5007412-32.2020.8.24.0007, Rel. Des. Gladys Afonso, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 01.07.2025.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos do decidiu, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nesta, dar-lhe parcial provimento para: a) condenar a autora ao pagamento/compensação das benfeitorias necessárias e úteis realizadas no imóvel pelo réu, cujo valor deverá ser apurado em sede de liquidação de sentença; e b) de ofício, reconhecer a sucumbência recíproca, condenando as partes ao pagamento das custas processuais, na proporção de 20% para a autora e 80% para o réu, bem como ao pagamentos de honorários de sucumbência, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, distribuídos na mesma proporção, observada a suspensão da exigibilidade em relação ao réu, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de novembro de 2025.
assinado por LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR, Desembargador Substituto, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6693813v10 e do código CRC 8b66df21.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Data e Hora: 04/11/2025, às 17:31:19
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 04/11/2025 A 11/11/2025
Apelação Nº 0303767-06.2017.8.24.0075/SC
RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
PRESIDENTE: Desembargador MARCOS FEY PROBST
PROCURADOR(A): CARLOS HENRIQUE FERNANDES
Certifico que este processo foi incluído como item 46 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 15/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 04/11/2025 às 00:00 e encerrada em 04/11/2025 às 19:26.
Certifico que a 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª CÂMARA ESPECIAL DE ENFRENTAMENTO DE ACERVOS DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER EM PARTE DO RECURSO E, NESTA, DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO PARA: A) CONDENAR A AUTORA AO PAGAMENTO/COMPENSAÇÃO DAS BENFEITORIAS NECESSÁRIAS E ÚTEIS REALIZADAS NO IMÓVEL PELO RÉU, CUJO VALOR DEVERÁ SER APURADO EM SEDE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA; E B) DE OFÍCIO, RECONHECER A SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA, CONDENANDO AS PARTES AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS, NA PROPORÇÃO DE 20% PARA A AUTORA E 80% PARA O RÉU, BEM COMO AO PAGAMENTOS DE HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA, ESTES FIXADOS EM 10% (DEZ POR CENTO) SOBRE O VALOR ATUALIZADO DA CAUSA, DISTRIBUÍDOS NA MESMA PROPORÇÃO, OBSERVADA A SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE EM RELAÇÃO AO RÉU, NOS TERMOS DO ARTIGO 98, § 3º, DO CPC.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Votante: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST
Votante: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES
CLEIDE BRANDT NUNES
Secretária
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Identificações de pessoas físicas foram ocultadas