Relator: Desembargadora Fernanda Gomes Camacho; Data do Julgamento: 17/03/2021.
Órgão julgador:
Data do julgamento: 12 de dezembro de 2000
Ementa
RECURSO – Documento:6969824 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 0900079-51.2014.8.24.0023/SC RELATORA: Desembargadora GLADYS AFONSO RELATÓRIO Adota-se, por oportuno, o relatório da sentença: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, qualificado(a, os, as) na inicial, ajuizou(aram) a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE DISSOLUÇÃO DE ASSOCIAÇÃO em face de ASSOCIACAO ''DETERMINACAO E CORAGEM'' e J. R. P., também qualificado(a, os, as) nos autos, perante à Vara da Fazenda Pública, alegando que a Associação Determinação e Coragem foi constituída em 1998 com finalidade assistencial voltada à conscientização de dependentes químicos e alcoólicos, tendo seu estatuto originário e posteriores alterações registrados, inclusive com previsão expressa de que seu patrimônio seria revertido à entidade congênere no caso de dissolução.
(TJSC; Processo nº 0900079-51.2014.8.24.0023; Recurso: recurso; Relator: Desembargadora Fernanda Gomes Camacho; Data do Julgamento: 17/03/2021.; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 12 de dezembro de 2000)
Texto completo da decisão
Documento:6969824 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 0900079-51.2014.8.24.0023/SC
RELATORA: Desembargadora GLADYS AFONSO
RELATÓRIO
Adota-se, por oportuno, o relatório da sentença:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, qualificado(a, os, as) na inicial, ajuizou(aram) a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE DISSOLUÇÃO DE ASSOCIAÇÃO em face de ASSOCIACAO ''DETERMINACAO E CORAGEM'' e J. R. P., também qualificado(a, os, as) nos autos, perante à Vara da Fazenda Pública, alegando que a Associação Determinação e Coragem foi constituída em 1998 com finalidade assistencial voltada à conscientização de dependentes químicos e alcoólicos, tendo seu estatuto originário e posteriores alterações registrados, inclusive com previsão expressa de que seu patrimônio seria revertido à entidade congênere no caso de dissolução.
Segundo a inicial, durante os primeiros anos de existência, a entidade teria recebido recursos públicos e privados para manutenção de suas atividades, inclusive doações de parlamentares e do Fundo Social do Estado.
Em 2006, J. R. P. assumiu a presidência da associação, juntamente com outros membros de sua família, e, a partir de então, a entidade deixou de cumprir sua finalidade estatutária, encerrando suas atividades sociais por volta de 2008, sem promover a regular dissolução administrativa e a destinação dos bens remanescentes. Afirmou que, mesmo inativa, a associação permaneceu formalmente ativa, com o réu mantendo-se na posse do imóvel da entidade, que deu em locação à Associação de Assistência Social e Educacional Liberdade entre 2012 e 2015, auferindo pessoalmente os valores do aluguel, estimados em R$ 3.000,00 mensais.
Disse que o réu celebrou contrato de locação em nome próprio, sem qualquer legitimidade, promovendo a apropriação indevida de patrimônio associativo, contrariando o estatuto social e os princípios da administração transparente e altruísta de bens pertencentes a entidades do terceiro setor. Apontou também que o imóvel fora adquirido por compromisso de compra e venda registrado no nome da associação e servia como sede de suas atividades.
Pleiteou o deferimento de medida liminar de indisponibilidade do imóvel; de suspensão da transferência de domínio reclamada nos autos de Inventário n. 023.02.045219-8 pela Associação Determinação e Coragem até o julgamento definitivo da presente ação civil pública; e de suspensão dos "efeitos da cláusula segunda do contrato de locação de fls. 7/15 celebrado entre J. R. P. e a Associação de Assistência Social e Educacional Liberdade, impedindo-se com isso que o locador continue auferindo vantagens com a locação de imóvel de propriedade da Associação que presidiu e que deixou de cumprir sua destinação social e assistencial há aproximadamente 5 (cinco) anos", evitando-se a "interrupção do uso do bem imóvel para atendimento gratuito de pessoas com dependência alcoólica e química na ação de despejo n. 1021218-04.2013.8.24.0023".
Ao final, com base no art. 61 do Código Civil, no Decreto-Lei n. 41/1966 e demais normas aplicáveis, requereu: i) " a procedência dos pedidos para confirmar os termos do provimento liminar e declarar a inatividade da Associação Determinação e Coragem, com a conseqüente decretação de sua dissolução e destinação de seus bens remanescentes e o cancelamento do registro da entidade social junto ao Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas e na Receita Federal"; ii) "decretar a nulidade do contrato de locação de bem imóvel de fls.7/15 para condenar o requerido J. R. P. a restituir à entidade social locatária o numerário recebido indevidamente a título de aluguel de bem imóvel pertencente à Associação, em valores a serem atualizados em liquidação de sentença por cálculo, preservando-se, de resto, os direitos e interesses de natureza reconhecidamente social e assistencial da contratante de boa-fé"; iii) "a destinação do patrimônio remanescente da entidade associativa extinta, em favor da Associação de Assistência Social e Educacional Liberdade, especialmente o bem imóvel com destinação social e assistencial pública e notória, localizado na Servidão Amantino Cameu, n. 812, Rio Tavares, nesta Capital, em partilha nos autos de Inventário n. 023.02.045219-8 e de Habilitação n. 090.05.006421-5".
A liminar foi deferida no evento 11.
Pela petição de evento 50, a ASSOCIAÇÃO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E EDUCACIONAL LIBERDADE requereu seu ingresso no feito, o que foi deferido na decisão de evento 72, na condição de assistente litisconsorcial simples.
Citados, os réus apresentaram contestação no evento 61 dizendo, de início, que o Ministério Público promoveu a ação com base em suposições e documentos desatualizados, sem comprovação efetiva de má-fé ou de irregularidades graves praticadas no âmbito da Associação Determinação e Coragem. Disseram que a entidade, ao longo dos anos, desenvolveu relevante trabalho de recuperação de dependentes químicos, com sede própria e recursos adquiridos de forma legítima.
O réu Jonas afirmou que, na época da presidência, buscou manter a entidade ativa, mas enfrentou abandono por parte dos associados e ausência de apoio financeiro suficiente, o que inviabilizou a continuidade das atividades. Disse que a associação deixou de operar regularmente a partir de meados de 2008, mas negou ter praticado qualquer ato com intuito de se beneficiar indevidamente de bens ou recursos da entidade. Quanto à posse e à locação do imóvel, defendeu que jamais agiu com intenção de apropriação ou desvio de patrimônio, e que a celebração do contrato com a Associação Liberdade ocorreu com a finalidade de garantir a utilização do espaço para fins compatíveis com a natureza assistencial da entidade, além de viabilizar a preservação do bem.
Requereram, ao final, a rejeição dos pedidos formulados pelo Ministério Público, especialmente quanto à alegada apropriação indevida de bens e à responsabilização pessoal, defendendo a ausência de elementos que justificassem a dissolução judicial da associação e a destinação forçada do imóvel, cuja propriedade ainda se encontraria sob discussão registral. Ainda formularam "pedido contraposto" de devolução imediata do imóvel pela Associação Educacional Liberdade, com posterior desistência homologada (evento 256).
Requerido o reconhecimento da incompetência pela Vara da Fazenda, o processo foi distribuído a esta vara cível (evento 142).
No evento 245 a parte ré defendeu que o CRETA absorveu a demanda da associação ré e que os recursos da locação foram destinados ao CRETA.
Saneado o feito, foi deferida a produção de prova testemunhal em audiência (evento 266), com oitiva no evento 278.
Houve alegações finais - processo 0900079-51.2014.8.24.0023/SC, evento 295, DOC1.
No referido ato, a autoridade judiciária de primeiro grau julgou procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos:
Em face do que foi dito, confirmo a liminar deferida no evento 11 e julgo procedentes os pedidos formulados na Ação Civil Pública pelo Ministério Público para:
a) decretar a dissolução judicial da Associação Determinação e Coragem, com extinção de sua personalidade jurídica e o consequente cancelamento de seu registro nos órgãos competentes, quais seja, o Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas e a Receita Federal;
b) declarar a nulidade do contrato de locação firmado entre J. R. P. e a Associação de Assistência Social e Educacional Liberdade, quanto aos efeitos patrimoniais incidentes sobre o imóvel da entidade extinta;
c) determinar que o patrimônio remanescente da Associação Determinação e Coragem, em especial o imóvel por ela ocupado, seja destinado à Associação de Assistência Social e Educacional Liberdade, nos termos do art. 61 do Código Civil e do art. 39 do estatuto da entidade extinta;
d) condenar o réu J. R. P. à restituição integral dos valores recebidos a título de locação, entre os anos de 2012 e 2015, com correção monetária pelo INPC desde cada recebimento até 29/08/2024 e, a partir de 30/08/2024, pelo IPCA/IBGE (art. 389, parágrafo único, CC), além de juros de mora de 1% ao mês desde a citação válida (art. 405, CC) até 29/08/2024, seguindo, a partir de 30/08/2024, taxa mensal que corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o IPCA/IBGE (art. 406, §1º, CC), em favor da Associação de Assistência Social e Educacional Liberdade, destinatária dos bens da Associação Determinação e Coragem, dissolvida judicialmente.
Custas processuais pela parte ré.
Indevidos honorários (art. 18 da Lei n. 7.347/1985).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Após o trânsito em julgado, oficie-se para cumnprimento da alínea 'a' e comunique-se ao juízo da 5ª Vara Cível da Capital sobre o presente julgamento, em razão da suspensão da ação de despejo n. 1021218-04.2013.8.24.0023.
Após, arquivem-se, cobrando-se as custas - processo 0900079-51.2014.8.24.0023/SC, evento 295, DOC1.
Os apelantes, em suas razões recursais, sustentam a ausência de provas robustas de má-fé ou desvio de finalidade na gestão da Associação "Determinação e Coragem". Argumentam que a documentação apresentada comprova a manutenção da destinação social do bem, seja pelo acolhimento de menores em situação de vulnerabilidade, seja pela posterior utilização por entidade de finalidade análoga. Alegam que as medidas adotadas por J. R. P., na condição de presidente, visavam à continuidade das atividades assistenciais e à preservação do patrimônio. Requerem a improcedência do pedido de dissolução, a manutenção da posse do imóvel pela Associação "Determinação e Coragem", o reconhecimento da legalidade do contrato de locação, a ausência de má-fé e a impossibilidade de restituição dos valores arbitrados. Subsidiariamente, pleiteiam a limitação da condenação aos valores efetivamente pagos.
Ao fim, formulou a seguinte pretensão:
Diante do exposto, requer-se a Vossa Excelência o conhecimento e provimento da presente apelação visando à reforma integral da sentença, para que a Ação Civil Pública seja julgada improcedente e por consequência, sejam acolhidos os argumentos da defesa nos seguintes termos:
- O reconhecimento de que a locação realizada em nome de J. R. P. decorreu de erro material, ausente qualquer indício de má-fé;
- A declaração da validade do contrato de locação firmado;
- A manutenção da personalidade jurídica e das atividades da Associação Determinação e Coragem;
- A manutenção dos bens materiais e do imóvel objeto da lide à titularidade da Associação Determinação e Coragem;
- A exoneração de J. R. P. da obrigação de devolução dos valores recebidos a título de aluguel, ou, subsidiariamente, caso não seja este o entendimento de Vossa Excelência, que eventual condenação se limite aos valores comprovadamente recebidos - processo 0900079-51.2014.8.24.0023/SC, evento 310, DOC1.
O Ministério Público apresentou contrarrazões, requerendo o desprovimento do recurso, com a manutenção integral da sentença recorrida, destacando a comprovação documental da inatividade da associação, o desvio de finalidade estatutária, e a apropriação indevida de recursos patrimoniais por J. R. P., em prejuízo à coletividade e à finalidade assistencial da entidade.
Após, os autos ascenderam a este a oficiar o Ministério Público de Santa Catarina (processo 0900079-51.2014.8.24.0023/SC, evento 9, DOC120), com vistas a apurar as irregularidades apontadas.
Nessa linha, aliás, o parecer ministerial da lavra do eminente Procurador de Justiça Carlos Alberto de Carvalho Rosa cuidou de assentar que a prolongada inatividade da Associação Determinação e Coragem, a apropriação pessoal de valores provenientes da locação do imóvel da entidade e a ausência de qualquer comprovação de regular aplicação dos recursos públicos recebidos demonstram a perda de legitimidade institucional e a quebra de confiança social indispensáveis à continuidade de sua existência jurídica.
[...] o estatuto da Associação Determinação e Coragem, datado de 12 de dezembro de 2000, prevê como objetivo da instituição "conscientizar e informar o dependente de álcool e drogas, sobre o problema do uso abusivo destas substâncias, buscando a sua sobriedade, bem como formar comunidade de vida e aliança" (Evento 132, Informação 520 a 522).
Ocorre que, as provas produzidas nos autos e as informações apresentadas pelo próprio presidente da instituição, o ora apelante J. R. P., não deixam quaisquer dúvidas que realmente houve desvio de finalidade e inatividade da associação, a justificar a extinção da pessoa jurídica e à destinação de seu patrimônio remanescente a fins compatíveis com a assistência social, conforme determinado pelo julgador singular.
Com efeito, quando intimado nos autos de inquérito civil instaurado para apurar possível existência de referidas irregularidades, J. R. P. expressamente reconheceu que "essa instituição está inativa há anos, mais especificamente há mais de 5 anos, restando apenas a baixa frente aos órgãos competentes, o que se dará em tempo oportuno não fazendo nascer qualquer ilícito" (Evento 9, Anexo 171 a 175). Frise-se que referida informação foi apresentada no dia 22 de outubro de 2013 (Evento 9, Anexo 171 a 175), mas, desde então, nenhuma providência administrativa foi adotada para garantir a efetiva dissolução da Associação Determinação e Coragem, o que denota que, mesmo estando formalmente constituída, não são exercidas atividades assistenciais previstas em seu estatuto há mais de dezessete anos.
Como se isso não fosse o suficiente, consoante também reconhecido pela própria parte requerida, entre os anos 2011 e 2012, o bem imóvel que pertente à associação foi utilizado com o objetivo de acolher crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade familiar.
Inclusive, a esse respeito, o documentos e fotografias anexados pelos próprios apelantes confirmam essa circunstância, que configura nítido desvirtuamento dos objetivos dos objetivos da entidade, voltados, repise-se, ao tratamento de dependentes químicos.
Por oportuno, ressalte-se que, ao contrário do que alegam os recorrentes, não há nos autos qualquer mínimo indício de que as atividades desenvolvidas nesses anos efetivamente contemplassem programas de recuperação ou acompanhamento especializado quanto ao uso de álcool e drogas pelos menores acolhidos, estando evidenciada, em realidade, a efetiva ausência de correspondência entre a prática da associação e sua finalidade legalmente estabelecida [...]
Para agravar ainda mais o contexto até aqui delineado, constata-se que, em 27 de janeiro de 2012, J. R. P. procedeu à locação do imóvel pertencente à Associação Determinação e Coragem, firmando o contrato em seu próprio nome, e não em nome da entidade que presidia (Evento 9, Anexo 12 a 20). Além disso, assinou os respectivos recibos confirmando o recebimento dos valores do aluguel em nome próprio, o que, a toda evidência, indica a utilização pessoal de patrimônio pertencente à pessoa jurídica (Evento 9, Anexo 13 a 30).
Chama atenção, nesse contexto, que, quando intimado nos autos do inquérito civil para prestar contas acerca da destinação dos valores recebidos, o particular se limitou a afirmar que, em verdade, seria o verdadeiro proprietário do imóvel (Evento 9, Anexo 171 a 175). É o que se pode concluir por meio da leitura da manifestação datada de 22 de outubro de 2023:
[...] Nada obstante, já durante o trâmite da presente demanda, o recorrente mudou a versão dos fatos, admitindo que o imóvel pertence, de fato, à Associação Determinação e Coragem, mas que houve erro na identificação do locador no contrato de aluguel firmado, constando seu nome no contrato em lugar da entidade que representava, versão essa que ainda sustenta em sede de apelação. Embora a má-fé não se presuma no ordenamento jurídico, as circunstâncias aqui demonstradas permitem concluir, com razoável certeza, que o recorrente se beneficiou indevidamente dos recursos da associação, desvirtuando por completo as finalidades da mesma.
De fato, a primeira alegação de que seria proprietário do imóvel – alegação essa que, posteriormente, foi modificada sem qualquer explicação –, somada à assinatura dos recibos e à ausência de comprovação mínima da destinação dos valores recebidos, denota nítida conduta direcionada ao interesse próprio, em detrimento dos fins assistenciais da entidade.
Portanto, diante de todo o conjunto probatório produzido, não restam dúvidas de que, além da nulidade do contrato de locação celebrado, está caraterizada a inatividade prolongada das atividades assistenciais por mais de dezessete anos e, ainda, o desvio de sua finalidade estatutária, configurando, nos termos do que estabelece o Decreto-Lei n. 41/1966, hipóteses claras que ensejam a dissolução da Associação Determinação e Coragem.
Não há, portanto, qualquer fundamento que justifique a modificação da sentença recorrida que corretamente decretou a dissolução judicial da pessoa jurídica e, por consequência, determinou a destinação do patrimônio remanescente à associação congênere, declarou a nulidade do contrato de locação firmado pelo recorrente em benefício próprio e, ainda, o condenou à restituição integral dos valores recebidos a título de aluguel.
Por fim, o pedido subsidiário do apelante, que diz respeito justamente ao dever de devolver os valores recebidos a título de aluguel, não merece prosperar, uma vez que o próprio julgador, ao condená-lo "à restituição integral dos valores recebidos a título de locação, entre os anos de 2012 e 2015", certamente já delimitou a restituição aos valores, de fato, percebidos por J. R. P., garantindo, assim, a reparação integral sem extrapolar os limites do que efetivamente foi apropriado indevidamente.
Assim, não há falar em alteração do comando judicial recorrido para eventual mitigação da obrigação imposta, uma vez que já está de acordo com os princípios da proporcionalidade, da vedação ao enriquecimento sem causa e da efetiva reparação do patrimônio da associação, estando plenamente adequada a medida adotada pelo juízo de primeiro grau - processo 0900079-51.2014.8.24.0023/TJSC, evento 16, DOC1.
Com efeito, a dissolução judicial da associação configura medida necessária à preservação do interesse público e à destinação do patrimônio remanescente a entidade congênere que efetivamente cumpra função assistencial, de modo a restabelecer a finalidade social originária e assegurar a adequada recomposição do patrimônio lesado.
Diante disso, não há razão para reformar a sentença recorrida, que, com acerto, reconheceu a nulidade do contrato de locação, determinou a restituição integral dos valores indevidamente recebidos e fixou a destinação do acervo remanescente à Associação de Assistência Social e Educacional Liberdade (AASEL), observando, com equilíbrio e técnica, os princípios da proporcionalidade, da vedação ao enriquecimento ilícito e da reparação integral do dano.
O pedido subsidiário de limitação da condenação aos valores comprovadamente pagos pela AASEL não merece acolhida, uma vez que a própria sentença delimitou a condenação aos montantes efetivamente percebidos pelo réu.
É que a pretensão recursal, embora apresentada como medida de proporcionalidade, não encontra respaldo na prova dos autos, pois, como visto, os recibos juntados (processo 0900079-51.2014.8.24.0023/SC, evento 9, DOC21) demonstram que os valores foram pagos diretamente ao requerido, sem qualquer repasse à associação titular do imóvel, e sem prestação de contas.
Com tais elementos em vista, a sentença já delimitou a condenação com base nos valores efetivamente recebidos, afastando qualquer presunção de enriquecimento sem causa da locatária.
Ademais, a restituição dos valores indevidamente percebidos decorre da nulidade do contrato e da ausência de justa causa para o recebimento, nos termos do art. 884 do Código Civil, pelo que não há espaço para nova limitação da condenação, já que ela se encontra devidamente circunscrita aos montantes comprovadamente auferidos pelo requerido, com base documental idônea e que embasou a sentença em questão.
Portanto, a condenação de J. R. P. à restituição dos valores recebidos a título de locação é medida que se impõe para recompor o patrimônio da associação e evitar o enriquecimento sem causa, já que valores recebidos indevidamente devem ser restituídos com as devidas correções monetárias e juros, conforme determinado na sentença, a fim de garantir a reparação integral do dano causado.
Sem honorários (art. 18 da Lei n. 7.347/1985).
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao recurso.
assinado por GLADYS AFONSO, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6969824v25 e do código CRC ab320f77.
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Documento:6969825 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 0900079-51.2014.8.24.0023/SC
RELATORA: Desembargadora GLADYS AFONSO
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DISSOLUÇÃO DE ASSOCIAÇÃO CIVIL. ASSOCIAÇÃO DETERMINAÇÃO E CORAGEM. INATIVIDADE PROLONGADA. DESVIO DE VERBAS PÚBLICAS. CONTRATO DE LOCAÇÃO FIRMADO PELO PRESIDENTE EM NOME PRÓPRIO. APROPRIAÇÃO INDEVIDA DE VALORES. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. VIOLAÇÃO AO ESTATUTO SOCIAL. DESTINAÇÃO DO PATRIMÔNIO REMANESCENTE A ENTIDADE CONGÊNERE. ART. 61 DO CÓDIGO CIVIL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. A controvérsia refere-se à validade da sentença que decretou a dissolução da Associação Determinação e Coragem, declarou nulo o contrato de locação firmado por seu presidente em nome próprio e determinou a devolução dos valores indevidamente percebidos, fixando a destinação do patrimônio remanescente à Associação Liberdade. O Ministério Público comprovou a inatividade da associação e as irregularidades financeiras na referida associação.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. As questões centrais em debate são: (i) a legitimidade da dissolução da associação diante da inatividade prolongada e da ausência de prestação de contas; (ii) a validade da declaração de nulidade do contrato de locação firmado pelo presidente em nome próprio; (iii) a responsabilização pessoal do dirigente pela restituição dos valores recebidos indevidamente; (iv) a legalidade da destinação do patrimônio remanescente à entidade congênere com atuação social comprovada.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A dissolução da associação é justificada pela inatividade desde 2008, pela omissão na extinção formal da entidade e pela ausência de prestação de contas dos recursos públicos recebidos entre 2001 e 2005, conforme apontado pelo Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina.
4. A conduta viola os deveres estatutários e legais de transparência e responsabilidade institucional, na medida em que o contrato de locação firmado entre 2012 e 2015 foi celebrado em nome pessoal do presidente J. R. P., sem autorização assemblear ou previsão estatutária, com firma reconhecida e recebimento direto dos valores (R$ 3.000,00 mensais), o que configura apropriação indevida de patrimônio associativo.
5. A alegação de erro material não se sustenta diante da ausência de qualquer prova documental que legitime o ato.
6. Embora se reconheça que a associação tenha prestado serviço de interesse social ao acolher crianças e adolescentes, tal atuação não afasta a gravidade dos fatos relacionados à gestão patrimonial, que comprometem a continuidade institucional e justificam a dissolução judicial.
7. A destinação do patrimônio remanescente à Associação Liberdade, entidade congênere reconhecida como Organização Social pelo Município de Florianópolis, encontra respaldo no estatuto da associação extinta e no art. 61 do Código Civil, sendo medida adequada para preservar o interesse público e a função social originária.
IV. DISPOSITIVO E TESE
8. Recurso conhecido e desprovido.
Tese de julgamento: "1. A dissolução da associação é cabível diante da inatividade prolongada, da ausência de prestação de contas e da apropriação indevida de recursos patrimoniais. 2. É válida a declaração de nulidade do contrato de locação firmado pelo presidente em nome próprio e a condenação à restituição dos valores recebidos. 3. A destinação do patrimônio remanescente à entidade congênere é legítima e atende ao interesse público."
___________
Dispositivos relevantes citados: Decreto-Lei n. 41/1966, arts. 2º e 3º; Lei n. 10.406/2002, art. 61. Jurisprudência relevante citada: TJSP; Apelação Cível 1000963-29.2019.8.26.0356; Relator (a): Costa Netto; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Foro de Mirandópolis, 2ª Vara; Data do Julgamento: 10/10/2022; TJSP; Apelação n. 4001927-76.2013.8.26.0292; Relatora: Desembargadora Fernanda Gomes Camacho; Data do Julgamento: 17/03/2021.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de novembro de 2025.
assinado por GLADYS AFONSO, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6969825v5 e do código CRC 7d56b954.
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 11/11/2025 A 11/11/2025
Apelação Nº 0900079-51.2014.8.24.0023/SC
RELATORA: Desembargadora GLADYS AFONSO
PRESIDENTE: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS
PROCURADOR(A): VANIA AUGUSTA CELLA PIAZZA
Certifico que este processo foi incluído como item 122 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 11/11/2025 às 00:00 e encerrada em 11/11/2025 às 13:17.
Certifico que a 5ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora GLADYS AFONSO
Votante: Desembargadora GLADYS AFONSO
Votante: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS
Votante: Desembargadora CLÁUDIA LAMBERT DE FARIA
ROMILDA ROCHA MANSUR
Secretária
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