Decisão 1116441-38.2023.8.26.0100

Processo: 1116441-38.2023.8.26.0100

Recurso: Apelação

Relator: CÉSAR ZALAF

Câmara julgadora: Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça

Data do julgamento: 28 de maio de 2025

Ementa Técnica

APELAçãO – RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CESSÃO DE COTA 258 DE CONSÓRCIO CANCELADA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA PARA DETERMINAR QUE A ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO RE- GISTRE A CESSÃO DA COTA. Jurisprudência - Direito Privado APELO DA AUTORA. COTA QUE JÁ HAVIA SIDO ANTERIORMENTE CEDIDA. REQUERIMENTO DE CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS, COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 499 DO CPC. FOR- NECIMENTO DE EXTRATO DESATUALIZADO PELA ADMINISTRADORA. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO ARTIGO 51 DA RESOLUÇÃO Nº 285 DO BANCO CENTRAL E AINDA REPARA- ÇÃO INTEGRAL NOS TERMOS DO ARTIGO 402 DO CC. RECURSO PREJUDICADO. INCONFORMISMO DA RÉ QUE BUSCA A IM- PROCEDÊNCIA DA AÇÃO E INVALIDADE DA CESSÃO DE CRÉDITO, JÁ QUE SEM SUA ANUÊNCIA. DEFENDE A NÃO CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. ALTERNATIVAMENTE, QUE SEJA PELO VALOR MONETÁRIO PAGO PELA AQUISIÇÃO DA COTA. SENTENÇA QUE IMPÕE REFORMA, UMA VEZ QUE A OBRIGAÇÃO SE TORNOU IMPOSSÍVEL, PREJUDICANDO TERCEIRO (CESSIONÁRIO ANTERIOR). CRÍVEL A CONVERSÃO DA AÇÃO EM PERDAS E DANOS, PORÉM A CARGO DA CEDENTE, CONFORME CLÁUSULA 6ª DO CON- TRATO DE CESSÃO. DESÍDIA DA PRÓPRIA AU- TORA, QUE É EXPERT NA AQUISIÇÃO DE CO- TAS, MAS QUE SE BASEOU SOMENTE EM UM EXTRATO DO CONSORCIADO. NÃO HÁ COMO IMPUTAR À RÉ O ÔNUS ADVINDO DAS PERDAS E DANOS, TENDO EM VISTA QUE SEQUER PAR- TICIPOU DA RELAÇÃO JURÍDICA. AUTORA QUE NÃO DETÉM NENHUM CRÉDITO COM A RÉ. RECURSO PROVIDO PARA JULGAR AAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER IMPROCEDENTE.(TJSP; Processo nº 1116441-38.2023.8.26.0100; Recurso: Apelação; Relator: CÉSAR ZALAF; Data do Julgamento: 28 de maio de 2025)

Voto / Fundamentação

, em 14ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso da ré, e julgaram prejudicado o recurso da autora. V.U. Sustentaram oralmente, os Drs. Ronaldo Alves de Andrade e Adriano Zaitter”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. (Voto nº 11.926) O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores CAR- LOS ABRÃO (Presidente) e THIAGO DE SIQUEIRA. São Paulo, 28 de maio de 2025. CÉSAR ZALAF, Relator


Ementa: RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CESSÃO DE COTA 258 DE CONSÓRCIO CANCELADA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA PARA DETERMINAR QUE A ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO RE- GISTRE A CESSÃO DA COTA. Jurisprudência - Direito Privado APELO DA AUTORA. COTA QUE JÁ HAVIA SIDO ANTERIORMENTE CEDIDA. REQUERIMENTO DE CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS, COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 499 DO CPC. FOR- NECIMENTO DE EXTRATO DESATUALIZADO PELA ADMINISTRADORA. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO ARTIGO 51 DA RESOLUÇÃO Nº 285 DO BANCO CENTRAL E AINDA REPARA- ÇÃO INTEGRAL NOS TERMOS DO ARTIGO 402 DO CC. RECURSO PREJUDICADO. INCONFORMISMO DA RÉ QUE BUSCA A IM- PROCEDÊNCIA DA AÇÃO E INVALIDADE DA CESSÃO DE CRÉDITO, JÁ QUE SEM SUA ANUÊNCIA. DEFENDE A NÃO CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. ALTERNATIVAMENTE, QUE SEJA PELO VALOR MONETÁRIO PAGO PELA AQUISIÇÃO DA COTA. SENTENÇA QUE IMPÕE REFORMA, UMA VEZ QUE A OBRIGAÇÃO SE TORNOU IMPOSSÍVEL, PREJUDICANDO TERCEIRO (CESSIONÁRIO ANTERIOR). CRÍVEL A CONVERSÃO DA AÇÃO EM PERDAS E DANOS, PORÉM A CARGO DA CEDENTE, CONFORME CLÁUSULA 6ª DO CON- TRATO DE CESSÃO. DESÍDIA DA PRÓPRIA AU- TORA, QUE É EXPERT NA AQUISIÇÃO DE CO- TAS, MAS QUE SE BASEOU SOMENTE EM UM EXTRATO DO CONSORCIADO. NÃO HÁ COMO IMPUTAR À RÉ O ÔNUS ADVINDO DAS PERDAS E DANOS, TENDO EM VISTA QUE SEQUER PAR- TICIPOU DA RELAÇÃO JURÍDICA. AUTORA QUE NÃO DETÉM NENHUM CRÉDITO COM A RÉ. RECURSO PROVIDO PARA JULGAR AAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER IMPROCEDENTE.





VOTO

São recursos de apelação interpostos contra r. a sentença de fls. 148/153 que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados em Ação de Obriga- ção de Fazer proposta por OBJETIVA-SOLUÇÕES EM CONSÓRCIO S/C LTDA contra PORTO SEGURO ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIOS LTDA, nos seguintes termos: “para impor à ré obrigação de fazer consistente Jurisprudência - Direito Privado em providenciar o registro, em seus sistemas, da cessão da cota de consórcio cancelada nº 111, do grupo nº A257, contrato nº 4000042854, feita por Márcia Cristina dos Santos à autora, com descontos cabíveis. Prazo: 15 dias úteis con- tados do trânsito em julgado, sob pena de conversão em perdas e danos. Corre- ção monetária pela TPTJ e juros de mora mensais legais a contar da eventual mora 15 dias úteis contados da contemplação por sorteio ou o encerramento do grupo. Em consequência, JULGO EXTINTO o feito com resolução do mérito, o que faço a teor do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Em face do resultado ora alcançado, fica à autora (30%) e à ré (70%) carreada a res- ponsabilidade pelo pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa (30% de 10% sobre o valor atualizado da causa devido pela autora ao advogado da ré; 70% de 10% sobre o valor atualizado da causa devido pela ré advogado da autora), sem compensações (CPC, art. 85, §14). Inconformada recorre a autora Objetiva às fls. 228/251. Em apertada sín- tese, requer a conversão da ação de obrigação de fazer em perdas e danos, nos termos do artigo 499 do CPC, pois em seu entendimento o provimento jurisdi- cional se tornou impossível por culpa da ré, que não atualizou os seus cadastros, descumprindo o artigo 51 da Resolução nº 285 do Banco Central. Cita entendi- mentos favoráveis desta E. Corte e do C. STJ (fls. 234/237). Defende que não se trata de julgamento extra ou ultra petita, não havendo que se falar em emenda à inicial. Assevera que a reparação deve ser integral (dano emergente e lucros cessantes) em consonância com o artigo 402 do CC, no valor de R$ 30.270,82. Repisa que a apuração dos valores a receber deve obedecer ao artigo 30 da Lei de Consórcio. De outro bordo, a ré Porto Seguro apela às fls. 165/174. Alega que a r. sentença foi omissa quanto à cessão anterior, devendo ser a ação julgada impro- cedente. Replica que a cessão da autora foi sem anuência e não poderia ser con- siderada válida. Afirma que a autora pretende lucro de aproximadamente 900%, sendo ignorada a cláusula 6ª constante no contrato de cessão de fls. 41/43, que imputa a responsabilidade de indenizar ao cedente. Argumenta que é impossível a conversão em perdas e danos, pois implica na alteração da causa de pedir e pedidos, havendo ofensa aos artigos 329 e 499 do CPC (não cabível no pro- cesso de conhecimento). Colaciona acórdãos deste E. Tribunal que lhe foram favoráveis, pugnando pela improcedência da demanda. Aduz que o artigo 51 da Resolução 285 do Bacen não pode ser aplicado ao caso em debate, dado que sua vigência foi a partir de 01/07/2024. Alternativamente, caso se entenda pela con- versão em perdas e danos, que seja restrito ao valor efetivamente desembolsado 260 pela autora, qual seja, R$ 3.500,00, evitando-se o enriquecimento sem causa. Recursos tempestivos e com recolhimento de custas às fls. 175/177 e fls. 252/254. Contrarrazões da autora Objetiva pelo improvimento. Não há oposição ao julgamento virtual. Jurisprudência - Direito Privado É o relatório. Não há questões que impeçam o conhecimento destes recursos, que quan- to aos seus objetos, deve ser provido o da ré, restando prejudicado o da autora. Trata-se de Ação de Obrigação de Fazer proposta por OBJETIVA-SO- LUÇÕES EM CONSÓRCIO S/C LTDA contra PORTO SEGURO ADMI- NISTRADORA DE CONSÓRCIOS LTDA., relatando que no dia 19/05/2023 celebrou cessão de créditos de cota de consórcio cancelada nº 111, grupo A257, contrato de adesão nº 4000042854, cedente Marcia Cristina dos Santos. Reque- reu: a) que a Requerida anote em seu sistema e registros que a Requerente é ces- sionária dos créditos oriundos da cota de consórcio cancelada nº 111, do grupo nº A257, contrato nº 4000042854, cedidos pela consorciada excluída: MÁRCIA CRISTINA DOS SANTOS, e, por via de consequência, se abstenha de fazer o pagamento do crédito cedido a consorciada cedente, sob pena de ter que pagar de novo, nos exatos termos do artigo 312 do Código Civil e b) que a Requerida comunique a Requerente eventual contemplação da cota cancelada por sorteio ou o encerramento do grupo, colocando a sua disposição o valor do crédito calculado na forma do art. 30 da Lei do Consórcio, sendo inaplicável qualquer desconto a título de multa compensatória por supostos prejuízos causados ao grupo ou a administradora, sem que estes sejam devidamente comprovados, ônus que compete a administradora. Adveio a sentença de parcial procedência para determinar à ré obrigação de fazer consistente em providenciar o registro, em seus sistemas, da cessão da cota de consórcio cancelada nº 111, do grupo nº A257, contrato nº 4000042854, feita por Márcia Cristina dos Santos à autora, com descontos cabíveis. Prazo: 15 dias úteis contados do trânsito em julgado, sob pena de conversão em perdas e danos. Correção monetária pela TPTJ e juros de mora mensais legais a contar da eventual mora 15 dias úteis contados da contemplação por sorteio ou o en- cerramento do grupo. Os pedidos recursais se cingem em: a) possibilidade ou não de conversão da ação em perdas e danos; b) existência ou não de culpa da administradora de consórcio, c) aplicação ou não do artigo 51 da Resolução 285 do Bacen; d) se convertida a ação, se a reparação será integral ou pelo valor pago na aquisição da cota cancelada. Sem embargo, antes de me aprofundar nas razões recursais, indispensável a fixação dos pontos incontroversos: i) A autora celebrou contrato de cessão de cota cancelada em 19/05/2023 com a cedente Marcia Cristina dos Santos, inexistindo a necessidade de anuên- cia da administradora de consórcio, consoante entendimento já pacificado nesta E. Corte1, inclusive no Enunciado nº 16: “Enunciado nº 16 - É possível a cessão de direitos creditórios inerentes à quota de consórcio cancelada, independen- Jurisprudência - Direito Privado temente da anuência da administradora, admitindo-se a propositura de ação judicial para anotação e registro, visando evitar pagamento indevido, mediante prova da cessão, e desde que haja recusa ou omissão diante de pedido extraju- dicial prévio”. ii) Em contestação de fls. 76/82, a ré noticiou que a consorciada (Mar- cia), já havia cedido a cota cancelada nº 111 em 20/02/2023 à GMCON Adm. de Bens e Negócios Ltda; Claramente a atitude da cedente foi de lucro pessoal em detrimento de outros; iii) Em réplica de fls. 98/108, a autora requereu a conversão da ação de obrigação de fazer em perdas e danos e asseverou que a administradora lhe forneceu em 16/05/2023, o extrato financeiro da consorciada, de fls. 59/60, donde se extraiu que a cota ainda continuava em nome da cedente Márcia; iv) A sentença concluiu que se tratava de inovação processual o pedido de conversão da ação e imputou à ré a obrigação de registrar a cessão entre autora e Marcia; v) Ocorre que essa obrigação é inexigível/inexequível, tendo em vista que inexiste crédito a ser transferido, porque já cedido anteriormente, de tal maneira, que a sentença tal como lançada, não pode subsistir, já que prejudicaria a terceira (GMCON), que comprou o crédito anteriormen- te. Nessa esteira: “OBRIGAÇÃO DE FAZER. Consórcio. Cessão de crédito de cotas canceladas. Pretensão da cessionária de compelir a administradora do grupo consorcial a anotar a cessão em seus registros, a fim de evitar o paga- mento ao cedente. Defesa fundada na invalidade da cessão, pois a cota cedida já havia sido objeto de outra cessão de crédito, realizada com terceiro. (...) Sentença de improcedência mantida. Recurso não provido.” (TJSP; Apelação Cível 1111088-17.2023.8.26.0100; Relator (a): Tasso Duarte de Melo; Órgão Julgador: 12ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 11ª Vara Cível; Data do Julgamento: 31/07/2024; Data de Registro: 02/08/2024) Não fosse sufi- ciente, no RESP 2.183.131, de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 18/03/2025 e publicado em 24/03/2025, ficou consignado que: “não há, nem na Lei 11.795/2008 nem nas normas editadas pelo órgão regulador e fiscalizador (Resolução BCB 285/2023), nenhuma disposição obrigando a ad- ministradora de consórcio a efetuar o registro da cessão de direitos creditó- 1 AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - CESSÃO DE CRÉDITO DE COTA DE CONSÓRCIO CANCELADA - Sentença de improcedência (...) Desnecessidade de anuência da administradora do con- sórcio para a validade da cessão por se tratar de cota cancelada por exclusão do consorciado do grupo - Cessão que implica apenas a transferência de direitos creditórios e não de obrigações mútuas que pos- sam prejudicar os interesses do grupo e da administradora de consórcio .....(TJSP; Apelação Cível 1115437-63.2023.8.26.0100; Relator (a): Marco Fábio Morsello; Órgão Julgador: 11ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 12ª Vara Cível; Data do Julgamento: 03/04/2025; Data de Registro: 04/04/2025) 262 rios, a pedido do cessionário, com o qual aquela não mantém nenhum vínculo obrigacional”. (...) Deve o cessionário assumir os riscos de sua atividade, não podendo impor à administradora de consórcios obrigações que ela só tem para com o próprio consorciado”. Jurisprudência - Direito Privado Pois bem, dada a perda da utilidade da prestação obrigacional, resta aqui- latar se ela poderá ser convertida em perdas e danos, como requerido pela auto- ra, nos termos do artigo 499 do CPC: “Art. 499. A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.” Na r. sentença o pedido foi indeferido pautado em duas premissas: “Por fim, inexiste qualquer possibilidade de conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, ao revés do que pretende a autora, por duas razões. A uma, porquanto se trata de proscrita inovação processual, ventilada desde a petição às fls. 98 e ss., a qual substancialmente modificada a causa de pedir próxima delineada na petição inicial. A duas, porque não se verifica impossibilidade ma- terial ou jurídica da tutela específica (CPC, art. 499) - aliás, sequer declinada nos autos.” A primeira premissa (alteração da causa de pedir e pedidos realizada em réplica), foi reafirmada pela ré em suas razões recursais, quem inclusive salien- tou que o artigo 499 do CPC só vale para a hipótese de o autor já possuir título executivo, o que não seria o caso dos autos, posto que atrairia a incidência do artigo 329 do CPC, de modo que o aditamento da inicial dependia seu consenti- mento, o que não ocorreu. E respeitado entendimento desta E. Corte em sentido contrário23, o C. STJ tem asseverado: “Na linha de pacífica jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, é possível a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, 2 Pretensão de se converter a medida em perdas e danos - Descabimento - Não definida a obriga- ção pela prestação de tutela específica, inviável a conversão em perdas e danos, nos termos do art. 499 CC - pedido de conversão da obrigação de fazer em perdas e danos formulado após a citação e posteriormente ao oferecimento de defesa, de modo que condicionado ao consentimento da parte ré, o que não ocorreu. Sentença de improcedência mantida. Recurso da parte autora desprovido. (TJSP; Apelação Cível 1117146-36.2023.8.26.0100; Relator (a): Claudia Carneiro Calbucci Renaux; Órgão Julgador: 24ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 27/03/2025; Data de Registro: 03/04/2025) 3 OBRIGAÇÃO DE FAZER - CONSÓRCIO - CESSÃO DE CRÉDITO DECORRENTE DE COTA CANCELADA - PRETENSÃO DA AUTORA DE ANOTAÇÃO PELA ADMINISTRADORA DA CESSÃO DE CRÉDITO - IMPOSSIBILIDADE - EXISTÊNCIA DE CESSÃO PRETÉRITA REALIZADA POR TERCEIRO - ADITAMENTO DA INICIAL APÓS A CITAÇÃO PARA REQUERER A CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS - IMPOSSIBILIDADE: No caso dos autos a Autora requereu a conversão da obriga- ção de fazer em perdas e danos, em réplica, após a citação da requerida - impossibilidade, a luz do artigo 329, inciso II, do Código de Processo Civil. A jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça já firmou o entendimento quanto à impossibilidade de se emendar a petição inicial após o oferecimento da contestação e o saneamento do processo, quando essa providência importar alteração do pedido ou da causa de pedir, como na hipótese dos autos (STJ - REsp: 1743279 CE 2018/0122940-4). RECURSO NÃO PROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1137606-44.2023.8.26.0100; Relator (a): Nelson Jorge Júnior; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 10ª Vara Cível; Data do Julgamento: 12/03/2025; Data de Registro: 13/03/2025) independentemente do pedido do titular do direito subjetivo, em qualquer fase processual, quando verificada a impossibilidade de cumprimento da tutela es- pecífica.” (RESP 2121365 - MG, Ministra Regina Helena Costa, julgado em Jurisprudência - Direito Privado 05/09/2024). Nessa mesma dicção, já se pronunciou esta E. Câmara, em caso envol- vendo as mesmas partes deste processo: Apelação - Ação de obrigação de fazer - Cessão de crédito de cota de consórcio cancelada - Sentença de improcedência - Procuração pública que se mostra suficiente para demonstrar que os cedentes outorgaram poderes à cessionária para vender, ceder ou transferir para o seu próprio nome ou a quem convier a cota cancelada - Desnecessidade de anuência da administradora do consórcio para a validade da cessão por se tratar de cota cancelada por exclusão do consorciado do grupo - Cessão que implica apenas na transferência de direitos creditórios e não de obriga- ções mútuas que possam prejudicar os interesses do grupo e da adminis- tradora de consórcio - Validade da notificação extrajudicial - Titular da cota que cedeu a mesma cota à terceiro, em data anterior à da transfe- rência junto à autora - Falha na prestação do serviço fornecido pela ré configurada - Administradora do consórcio que deixou de inserir no seu sistema a primeira cessão da cota - Aplicação do art. 51 da Resolução BCB n.º 285 - Conversão em perdas e danos - Cabimento - Inocorrência de alteração da causa de pedir ou do pedido - Perdas e danos cabentes à autora, contudo, que deve corresponder ao que efetivamente pagou pela cessão de crédito, vale dizer, à quantia de R$ 2.000,00, não havendo de se falar no caso vertente em lucros cessantes em favor da demandante - Ação que deve ser julgada parcialmente procedente - Recurso provido em parte. (TJSP; Apelação Cível 1115347-55.2023.8.26.0100; Relator (a): Thiago de Siqueira; Órgão Julgador: 14ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 44ª Vara Cível; Data do Julgamento: 06/11/2024; Data de Registro: 06/11/2024) Por conseguinte, existe a possibilidade de conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, esse inclusive tem sido o entendimento adotado por boa parte das câmaras desta E. Corte4. Além disso, se a obrigação pudesse se resolver em perdas e danos, a au- tora buscou a reparação integral (danos emergentes + lucros cessantes), nos ter- mos do artigo 402 do CC, no valor de R$ 30.270,82, o que a meu ver, poderia convergir para a eira do enriquecimento ilícito, tanto que a jurisprudência deste E. Tribunal, quando admite a conversão, o valor monetário das perdas e danos 4 TJSP; Apelação Cível 1115459-24.2023.8.26.0100; Relator (a): Elói Estevão Troly; Órgão Julga- dor: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 12ª Vara Cível; Data do Julgamento: 25/03/2025; Data de Registro: 26/03/2025/ TJSP; Apelação Cível 1112609-94.2023.8.26.0100; Relator (a): Tavares de Almeida; Órgão Julgador: 23ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 8ª Vara Cível; Data do Julga- mento: 24/06/2024; Data de Registro: 24/06/2024 264 é pela quantia paga pela Objetiva quando adquiriu a cota cancelada, consoante casos análogos: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CESSÃO DE COTA DE CON- SÓRCIO. PERDAS E DANOS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. I. Caso Jurisprudência - Direito Privado em exame A sentença de fls. 154/157 julgou parcialmente procedente a ação, condenando a ré ao pagamento de R$ 6.000,00 em perdas e danos, com sucumbência recíproca e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. Apela a autora, pleiteando reparação por lucros cessantes e aplicação do art. 30 da Lei dos Consórcios, bem como a aplicação integral dos consectários de sucumbência à ré. Apela a ré, alegando a impossibilidade da conversão da obrigação de fazer em per- das e danos e a inaplicabilidade da Resolução 285 do Banco Central. II. Questão em discussão 3. A questão em discussão consiste em (i) a possibilidade de conversão da obrigação de fazer em perdas e danos; e (ii) a responsabilidade da ré pela cessão anterior da cota. III. Razões de decidir 4. A sentença fundamentada avaliou corretamente os elementos probatórios, reconhecendo a responsabilidade da ré pela falta de atuali- zação cadastral, o que culminou na conversão da obrigação de fazer em perdas e danos. 5. O valor da indenização deve corresponder ao valor pago pela cota (R$ 6.000,00), não sendo cabível a reparação por lucros cessantes, que não foram demonstrados. A sucumbência reciproca deve ser mantida, corretamente reconhecida em sentença. IV. Dispositivo e tese 6. Nega-se provimento aos recursos, mantendo a sentença. 7. Tese de julgamento: “1. A cessão de cota de consórcio cancelada independe da anuência da administradora. 2. A conversão da obrigação de fazer em perdas e danos é cabível quando a obrigação não pode ser cumprida.” (TJSP; Apelação Cível 1137605-59.2023.8.26.0100; Relator (a): Spen- cer Almeida Ferreira; Órgão Julgador: 38ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 12ª Vara Cível; Data do Julgamento: 29/11/2024; Data de Registro: 29/11/2024) APELAÇÃO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CESSÃO DA COTA DE CONSÓRCIO. Sentença de improcedência. Insurgência da autora. Cessão que independe da anuência da administradora de consórcios No- tificação da cessão realizada extrato financeiro emitido em nome da con- sorciada originária cota cancelada e que já havia sido cedida anterior- mente para outra pessoa com a anuência da ré - ausência de anotação no sistema cadastral falha na prestação de serviço pelo não cumprimento da obrigação de manter a informação da cessão no sistema cadastral, con- forme dispõe o Art. 51 da Resolução BCB n° 285 de 19/01/2023. Segunda cessão que não pode subsistir - Cessionário, na condição de credor, tem direito de executar o contrato pelo equivalente pago, conforme dispõe o artigo 475 do Código Civil. Conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, correspondente somente ao valor pago pela aquisição da cota. Sentença reformada. Recurso provido em parte. (TJSP; Apelação Cível Jurisprudência - Direito Privado 1130664-93.2023.8.26.0100; Relator (a): Eduardo Velho; Órgão Julga- dor: 17ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 26/11/2024; Data de Registro: 26/11/2024) De fato, essa traz a aparência de ser a melhor solução para o deslinde até aqui. Ocorre que a dicção do artigo 248 do Código Civil, pressupõe um requisi- to, a culpa: “Art. 248. Se a prestação do fato se tornar impossível sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação; se por culpa dele, responderá por perdas e danos”. E nesse contexto, necessário apurar eventual culpa da ré e se ela responde pelas perdas e danos, como já se decidiu nas jurisprudências alhures menciona- das. Repiso, é incontroverso que a ré administradora de consórcio forneceu à cessionária em 16/05/2023, o extrato financeiro da consorciada, de fls. 59/60, donde se extraiu que a cota ainda continuava em nome da cedente Márcia e não apontava que a cota tinha sido cedida anteriormente, o que poderia ter induzido a autora em erro, pautando-se no alegado descumprimento do artigo 51 da Resolução nº 285 do Banco Central de 19/01/2023: Art. 51. A administradora de consórcio deve manter atualizadas as infor- mações cadastrais dos consorciados, inclusive dos consorciados excluí- dos, em especial do endereço, do número de telefone e dos dados relati- vos à conta de depósitos ou conta de pagamento de sua titularidade, se a possuir, bem como à chave Pix correspondente a essas contas, se houver, para as finalidades previstas nesta Resolução. Do excerto acima, surgiu mais um embate, acerca de sua aplicação ao caso em comento, dado que a cessão de créditos ocorreu em 19/05/2023 e a Resolução entrou em vigor em 1º de julho de 2024. E para tanto, adoto as razões de decidir do Des. Thiago de Siqueira na apelação 1115347-55.2023.8.26.0100, componente dessa E. Câmara: Muito embora a vigência da mencionada Resolução tenha entrado em vigor em 1º de julho de 2024, conforme disposto em seu artigo 59, cum- pre-se esclarecer que no texto original da referida resolução, vê-se a ex- pressa autorização de efeitos imediatos a alguns artigos, dentre eles, o já transcrito art. 51: Art. 57. Como regra de transição, os grupos de consórcio constituídos anteriormente à data de entrada em vigor desta Resolução permanecem regidos pelas regras vigentes até essa data até seu encerramento, exceto quanto aos arts. 14, 25, 36, 44, 49, 51 e 53 a 55, desta Resolução, que devem ser aplicados também aos grupos em an- 266 damento nessa data. Posteriormente, o art. 57 foi alterada com a redação da pela Resolução BCB n.º nº 362, de 14/12/2023, que manteve a vigên- cia do art. 51, desde a data do texto original da Resolução, in verbis: Art. 57. Como regra de transição, os grupos de consórcio constituídos antes Jurisprudência - Direito Privado da data de entrada em vigor desta Resolução permanecem regidos pelas regras vigentes até essa data até seu encerramento, exceto quanto ao dis- posto nos arts. 14, 25-A, 25-B, 36, 44, 49, 51 e 53 a 55 desta Resolução, que devem ser aplicados também aos grupos em andamento nessa data. (Redação dada pela Resolução BCB nº 362, de 14/12/2023.). De certo, a ré poderia ser responsabilizada pelas perdas e danos, se não fosse também a desídia da própria autora, que não é inexperiente ou principiante nesta modalidade de avença (aquisição de crédito), sendo apropriado que ao ad- quirir a cota de consórcio, não o fez sem o intuito de obter lucro, eis que esse é seu objetivo primordial, de modo que não pode se valer apenas de um extrato de consórcio para lastrear as suas pretensões. Some-se a isso o fato de que num período de três meses a cedente (Már- cia) realizou as duas negociações, cedendo o crédito, ficando muito evidente as suas intenções de locupletar-se com o alheio, ou seja, recebeu duas vezes pela mesma cota. E a autora sequer pode alegar que foi induzida a erro, porque assumiu o risco do negócio, tanto que constante a cláusula 6ª em seu contrato padronizado de cessão de crédito, fls. 41/43: Cláusula 6ª - Na hipótese do (a) Cedente, sob qualquer pretexto, ceder o (s) crédito (s) objeto da presente negociação para terceiros ou rece- bê-los indevidamente perante a administradora, ainda que por simples crédito em sua conta bancária ou em conta bancária sob sua indicação, fica obrigado a restituir a Cessionária o (s)valor (es)do (s) crédito (s) recebido (s) indevidamente, no prazo de 05 (cinco) dias contados na notificação pela Cessionária, sob pena de aplicação de uma multa não compensatória equivalente a 20% (vinte por cento) do (s) crédito (s) ou recebido (s) indevidamente, acrescida de uma correção de 2% (dois por cento) ao mês, respondendo o (a) Cedente civilmente por perdas e danos e criminalmente na hipótese de fraude ou estelionato. Destarte, chamo a atenção dos demais julgadores, porque em casos assemelhados envolvendo as mesmas partes, como já visto nas jurisprudên- cias, a culpa recaiu sobre os ombros da ré, mas em nenhum desses julgados foi mencionada a existência dessa cláusula (e que consta nos contratos de cessão da Objetiva), o que me leva à conclusão de que não há como imputar à Ré o ressarcimento/ônus de uma cessão de crédito, que sequer participou. Não descuido que ela forneceu um extrato desatualizado à autora, mas isso, a meu ver, não se revela suficiente para condená-la em perdas e danos. Até porque, a cedente, aqui no caso a Sra. Márcia, sairia ilesa e se locupletaria ilici- tamente. A relação jurídica da cessão de créditos foi estabelecida entre autora e cedente, ou seja, a autora não possui nenhum crédito com a ré. Jurisprudência - Direito Privado Incumbe ainda, lançar recente entendimento do Colendo STJ acerca dos riscos da cessionária e do registro de transferência: RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONSÓRCIO. COTA CANCELADA. CES- SÃO DE CRÉDITO. REGISTRO A PEDIDO DO CESSIONÁRIO. AD- MINISTRADORA. OBRIGATORIEDADE. AUSÊNCIA. 1. A controvérsia principal dos autos resume-se em definir se a administradora de consór- cio é obrigada a efetuar o registro, em seus assentamentos, a pedido do cessionário, de cessão de direitos creditórios inerente à cota de consórcio cancelada3. Não há, nem na Lei nº 11.795/2008 nem nas normas edita- das pelo órgão regulador e fiscalizador (Resolução BCB nº 285/2023), nenhuma disposição obrigando a administradora de consórcio a efetuar o registro da cessão de direitos creditórios, a pedido do cessionário, com o qual aquela não mantém nenhum vínculo obrigacional. 4. Ao efetuar a aquisição de direitos creditórios inerentes a cotas de consórcios cance- ladas, notadamente diante da existência de previsão legal e contratual específica exigindo a prévia anuência da administradora, deve o cessio- nário assumir os riscos de sua atividade, não podendo impor à admi- nistradora de consórcios obrigações que ela só tem para com o próprio consorciado. (REsp 2.183.131/SP, 3ª Turma do STJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 19.03.2025, DJe de 24.03.2025) Um único julgado dessa E. Corte, chama a responsabilidade à cedente, o que diante de todo o contexto e até do pacta sunt servanda (cláusula 6ª do contrato de cessão), revela-se equilibrado e se encaixa perfeitamente no pensa- mento de Rui Barbosa5 APELAÇÃO - Obrigação de Fazer - Cessão de crédito - Aquisição de cota de consórcio cancelada - Sentença de procedência, convertido o pedido inicial em perdas e danos. RECURSO DA AUTORA: Pretensão de pagamento integral do prejuízo experimentado, nele inserindo lucros cessantes, ou apurando-se a indenização na fase de liquidação - Ma- joração dos ônus sucumbenciais. RECURSO DA RÉ: Preliminarmente, afirmou a impossibilidade de conversão do pedido em perdas e danos, uma vez que postulado no âmbito da réplica, não deduzido na peça ini- cial - Inaplicabilidade do disposto no artigo 51 da Resolução Bacen 285, porquanto vigente somente a contar de 1º de julho de 2024 - No mérito, o crédito já havia sido cedido a terceiro, assumindo a autora o risco de sua desídia, sem adotar as cautelas necessárias - Pede a improcedên- 5 “A justiça, cega para um dos dois lados, já não é justiça. Cumpre que enxergue por igual à direita e à esquerda.” Rui Barbosa cia do pedido(...) Autora não possui direito ao crédito reclamado nesta ação, devendo postular em demanda própria contra o cedente - Senten- ça reformada - Recurso da ré PROVIDO - Recurso da autora PREJUDI- CADO. (TJSP; Apelação Cível 1117012-09.2023.8.26.0100; Relator (a): Jurisprudência - Direito Privado Marco Pelegrini; Órgão Julgador: 12ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 45ª Vara Cível; Data do Julgamento: 12/02/2025; Data de Registro: 13/02/2025) Em conclusão, a r. sentença deve ser reformada para julgar a ação impro- cedente. Para se evitar incidentes desnecessários, importante ressaltar que não está o órgão julgador obrigado a tecer considerações acerca de toda a argumentação deduzida pelas partes, senão aquelas que interfiram no deslinde da causa, o que se verificou no caso concreto. Ademais, para acesso às instâncias extraordinárias é desnecessária ex- pressa menção a todos os dispositivos legais deduzidos pelas partes. De todo modo, registra-se que é pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Jus- tiça6 no sentido de que “tratando-se de prequestionamento, é desnecessária a citação numérica dos dispositivos legais bastando que a questão posta tenha sido decidida”. Ante o exposto, dou provimento ao recurso da ré para julgar a ação im- procedente e julgo prejudicado o recurso da autora. Consequentemente, a autora deverá arcar com custas, despesas e honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa, devidamente atualizado e corrigido.