AGRAVO – Documento:7061219 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5086868-76.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO Trata-se de agravo de instrumento interposto por G. J. H. contra decisão proferida pelo Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário, nos autos da ação de busca e apreensão n. 5086921-80.2025.8.24.0930, ajuizada por BANCO VOTORANTIM S.A., a qual deferiu a medida liminar para apreensão do veículo objeto de contrato de financiamento garantido por alienação fiduciária. (evento 7, 1G) Sustenta o agravante, em síntese, que a decisão merece reforma, pois o instrumento contratual contém cláusulas abusivas, notadamente quanto às taxas de juros e demais encargos financeiros, as quais teriam sido fixadas em patamar superior à média de mercado divulgada pelo Banco Central, em afronta aos princípios da função social do contrato e da boa-fé objetiva.
(TJSC; Processo nº 5086868-76.2025.8.24.0000; Recurso: Agravo; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7061219 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Agravo de Instrumento Nº 5086868-76.2025.8.24.0000/SC
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de agravo de instrumento interposto por G. J. H. contra decisão proferida pelo Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário, nos autos da ação de busca e apreensão n. 5086921-80.2025.8.24.0930, ajuizada por BANCO VOTORANTIM S.A., a qual deferiu a medida liminar para apreensão do veículo objeto de contrato de financiamento garantido por alienação fiduciária. (evento 7, 1G)
Sustenta o agravante, em síntese, que a decisão merece reforma, pois o instrumento contratual contém cláusulas abusivas, notadamente quanto às taxas de juros e demais encargos financeiros, as quais teriam sido fixadas em patamar superior à média de mercado divulgada pelo Banco Central, em afronta aos princípios da função social do contrato e da boa-fé objetiva.
Sustenta que tais abusividades comprometem a validade da mora e, por conseguinte, tornam ineficaz a notificação extrajudicial que lhe foi dirigida, razão pela qual a busca e apreensão não poderia subsistir.
Defende, ainda, que a cobrança de encargos excessivos descaracteriza a mora, o que impediria a consolidação da propriedade em favor da instituição financeira.
Por fim, alega que a notificação envida retornou como "ausente", "ficando claro que o envio da notificação não é regular, pelo não conhecimento do conteúdo pela parte demandada".
Requer, assim, o reconhecimento da nulidade da notificação e a consequente revogação do mandado de busca e apreensão, com a manutenção da posse do bem em favor do devedor. Sustenta também ser parte hipossuficiente e pleiteia a concessão dos benefícios da gratuidade da justiça, afirmando não possuir condições de arcar com as custas e honorários advocatícios sem prejuízo de seu sustento.
Ao final, requer o provimento do recurso para reformar a decisão agravada, reconhecendo-se a abusividade contratual, a descaracterização da mora e a nulidade da liminar deferida na origem.
É o relatório.
Decido.
O recurso deve ser parcialmente conhecido, adianta-se.
A decisão agravada limitou-se a deferir a medida liminar de busca e apreensão, com base na comprovação da mora nos termos do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969, sem adentrar no exame das cláusulas contratuais ou na eventual abusividade dos encargos pactuados.
Não houve, portanto, manifestação do Juízo de origem sobre as matérias suscitadas no agravo, tampouco requerimento prévio de revogação da medida liminar com fundamento nas alegações ora deduzidas.
A jurisprudência é pacífica no sentido de que o conhecimento de questões não apreciadas pelo Juízo de origem configura indevida supressão de instância, vedada no sistema processual vigente. O agravo de instrumento não se presta à apreciação originária de matérias que deveriam, antes, ser submetidas ao contraditório e à análise no primeiro grau de jurisdição.
A propósito, precedente desta Corte de Justiça:
DIREITO COMERCIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE DEFERIU A MEDIDA LIMINAR. INSURGÊNCIA DO RÉU. AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO CONHECIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Agravo de instrumento interposto contra decisão interlocutória que deferiu liminar de busca e apreensão do veículo objeto de alienação fiduciária em contrato de empréstimo bancário.
II - QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. A questão em discussão é saber se houve caracterização da constituição em mora do devedor frente às teses de abusividade das cláusulas contratuais.
III - RAZÕES DE DECIDIR
3. A decisão que deferiu a medida liminar ampara-se na regularidade da notificação extrajudicial encaminhada ao endereço do réu, inexistindo análise acerca de eventual abusividade nas cláusulas contratuais. Assim, não havendo expressa manifestação judicial acerca das teses aventadas pelo agravante (cláusulas abusivas), encontra-se obstado o conhecimento do recurso, a fim de se evitar indevida supressão de instância.
IV - DISPOSITIVO
4. Agravo de instrumento não conhecido.
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Jurisprudência relevante citada: TJSC, Agravo de Instrumento n. 5072283-87.2023.8.24.0000, rel. Des. Osmar Mohr, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 07.11.2024; TJSC, Agravo de Instrumento n. 5045435-29.2024.8.24.0000, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 03.10.2024.
(AC n. 5005605-22.2025.8.24.0000, Sexta Câmara de Direito Comercial, Rel. Des. Newton Varella Junior, j. 24-4-2025).
Vale lembrar que a descaracterização da mora, por sua vez, não se opera de forma automática diante da mera alegação de abusividade contratual. A suspensão dos efeitos da mora somente é possível após o efetivo reconhecimento judicial da existência de encargos abusivos no período de normalidade contratual, o que demanda análise probatória e decisão de mérito.
Assim, enquanto não declarada a abusividade por sentença ou decisão específica, subsiste a mora do devedor, permanecendo válidos os atos de cobrança e as medidas possessórias fundadas na inadimplência contratual.
Assim, caberia ao agravante, inicialmente, suscitar as alegações de abusividade contratual e ausência de mora perante o Juízo de origem, mediante pedido de revogação da liminar. Somente após eventual indeferimento é que o manejo do agravo seria viável, uma vez que, por ora, não é possível denotar o interesse recursal.
Por fim, em relação à notificação enviada e retornada como "ausente", sabe-se que na ação de busca e apreensão, nos termos do art. 2º, § 2º, e do 3º do Decreto-Lei n. 911/1969, é requisito essencial ao desenvolvimento válido e regular do processo a prévia constituição em mora do devedor por meio de carta registrada com aviso de recebimento.
Ainda, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, por meio da análise dos Recursos Especiais n. 1.951.888/RS e n. 1.951.662/RS (Tema 1.132), consolidou o entendimento de que:
Em ação de busca e apreensão fundada em contratos garantidos com alienação fiduciária (art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969), para a comprovação da mora, é suficiente o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual, dispensando-se a prova do recebimento, quer seja pelo próprio destinatário, quer por terceiros.
Nesse ínterim, se a conclusão do precedente vinculante abrange as notificações extrajudiciais retornadas com o aviso de recebimento de "não procurado", por óbvio o entendimento firmado pela Corte da Cidadania é aplicável quando a correspondência, após 3 (três) tentativas de entrega, retorna com a informação "ausente" (evento 1, NOT7, 1G).
Precedentes deste Tribunal de Justiça:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, COM FULCRO NO ART. 485, IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA CREDORA.
TESE DE REGULARIDADE DA CONSTITUIÇÃO EM MORA. SUBSISTÊNCIA. ENVIO DE DUAS NOTIFICAÇÕES EXTRAJUDICIAIS AO ENDEREÇO CONSTANTE DO CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES, DEVOLVIDAS PELO MOTIVO "NÃO PROCURADO". ENTREGA PRESCINDÍVEL. MORA COMPROVADA AINDA QUE O AVISO DE RECEBIMENTO TENHA RETORNADO PELOS MOTIVOS "AUSENTE" OU "NÃO PROCURADO". ENTENDIMENTO FIRMADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO JULGAMENTO DO TEMA N. 1.132. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA A RESPEITO DA MATÉRIA. ALUDIDO ENTENDIMENTO QUE RESULTOU NA REVOGAÇÃO DA SÚMULA N. 58 DESTE SODALÍCIO. MORA PERFECTIBILIZADA ANTES MESMO DA REALIZAÇÃO DO PROTESTO DO TÍTULO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA O SEU REGULAR ANDAMENTO.
HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS NA ESPÉCIE.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (Apelação n. 5010127-52.2024.8.24.0930, Rel. Des. Rubens Schulz, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 26-9-2024, sem destaque no original).
APELAÇÃO CÍVEL. BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA PROCEDENTE. INSURGÊNCIA DA PARTE RÉ.
MÉRITO. BUSCA E APREENSÃO. CONSTITUIÇÃO EM MORA. PRESSUPOSTO NECESSÁRIO. SÚMULA 72 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENCAMINHADA PARA O ENDEREÇO DO CONTRATO. DEVOLUÇÃO PELO MOTIVO 'NÃO PROCURADO'. NOTIFICAÇÃO VÁLIDA, BASTANDO QUE SEJA ENCAMINHADA AO ENDEREÇO DO DEVEDOR INDICADO NO CONTRATO. APLICAÇÃO DO TEMA 1.132 DO STJ, RESP REPETITIVO Nº 1.951.888/RS. SENTENÇA MANTIDA.
"Em ação de busca e apreensão fundada em contratos garantidos com alienação fiduciária (art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969), para a comprovação da mora, é suficiente o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual, dispensando-se a prova do recebimento, quer seja pelo próprio destinatário, quer por terceiros." (TEMA 1.132, STJ).
HONORÁRIOS RECURSAIS (ART. 85, § 11, CPC). CRITÉRIOS CUMULATIVOS ATENDIDOS (STJ, EDCL NO AGINT NO RESP 1.573.573/RJ). MAJORAÇÃO QUE SE IMPÕE.
RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. (Apelação n. 5018514-27.2022.8.24.0930, Rel. Des. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 1-8-2024, sem destaque no original).
E deste Órgão Fracionário:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. TOGADO DE ORIGEM QUE EXTINGUE O FEITO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. INCONFORMISMO DO BANCO.
NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. CONSTITUIÇÃO EM MORA. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE CONSOLIDOU O ENTENDIMENTO DE QUE É SUFICIENTE O ENVIO DE NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL AO DEVEDOR NO ENDEREÇO INDICADO NO INSTRUMENTO CONTRATUAL, DISPENSANDO-SE A PROVA DO RECEBIMENTO, QUER SEJA PELO PRÓPRIO DESTINATÁRIO, QUER POR TERCEIROS. TEMA 1132 DO STJ. CASO CONCRETO. AUTOR QUE COMPROVOU TER ENCAMINHADO A MISSIVA PARA O ENDEREÇO DO DEVEDOR INDICADO NA AVENÇA. RETORNO DO AVISO DE RECEBIMENTO COM A INFORMAÇÃO "NÃO PROCURADO". CARACTERIZAÇÃO DA MORA QUE RESTOU POSITIVADA. REVOGAÇÃO DA SÚMULA N. 58 DESTA CORTE. SENTENÇA CASSADA. DETERMINAÇÃO DE RETOMADA DA MARCHA PROCESSUAL DO FEITO NA PRIMEIRA INSTÂNCIA.
RECURSO PROVIDO. (Apelação n. 5121675-19.2023.8.24.0930, Rel. Des. José Carlos Carstens Kohler, j. 20-8-2024, sem destaque no original).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL. INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA AUTORA. ALEGAÇÃO DE VALIDADE DA NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL QUE RETORNOU PELO MOTIVO "NÃO PROCURADO" PARA FINS DE CONSTITUIÇÃO DA MORA. ACOLHIMENTO. NOTIFICAÇÃO ENVIADA PARA O ENDEREÇO FORNECIDO PELO DEVEDOR EM CONTRATO QUE SUPRE OS REQUISITOS ESTIPULADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA POR MEIO DO TEMA 1132. MORA CONSTITUÍDA. SENTENÇA CASSADA.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (Apelação n. 5057034-22.2023.8.24.0930, Rel. Des. Vitoraldo Bridi, j. 20-2-2024, sem destaque no original).
Desse modo, tem-se por válida a notificação encaminhada à ré (evento 1, NOT7, 1G), de modo que agiu com acerto o magistrado singular deferiu o pedido liminar de busca e apreensão.
Por tais razões, mantém-se a decisão agravada.
Ante o exposto, nos termos do art. 132, inciso XIV, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça e do art. 932, inciso III, do Código de Processo Civil, conhece-se em parte do recurso e, na parte conhecida, nega-se provimento.
Defere-se o pleito de gratuidade da justiça de forma precária, exclusivamente ao manejo do presente agravo, uma vez que a matéria deve ser submetida ao Juízo de origem.
Intimem-se.
assinado por RICARDO OROFINO DA LUZ FONTES, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7061219v4 e do código CRC cbdf1929.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): RICARDO OROFINO DA LUZ FONTES
Data e Hora: 11/11/2025, às 15:38:08
5086868-76.2025.8.24.0000 7061219 .V4
Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:15:37.
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