Relator: Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV , o relator, no prazo de 5 (cinco) dias:
Órgão julgador: Turma, j. 17/03/2025, DJEN de 24/03/2025.
Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006
Ementa
AGRAVO – Documento:7057536 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5091968-12.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO I. J. G. K. interpôs agravo de instrumento com pedido de tutela antecipada recursal em face da decisão interlocutória prolatada pelo 18º Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário que, no âmbito da "ação de revisão contratual cumulado com pedido de tutela de urgência" n. 5139473-22.2025.8.24.0930, indeferiu a tutela de urgência, nos seguintes termos (Evento 5): [...] O juiz poderá conceder a tutela de urgência quando: a) houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito; e b) caracterizado o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300 do CPC).
(TJSC; Processo nº 5091968-12.2025.8.24.0000; Recurso: Agravo; Relator: Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV , o relator, no prazo de 5 (cinco) dias:; Órgão julgador: Turma, j. 17/03/2025, DJEN de 24/03/2025.; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7057536 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Agravo de Instrumento Nº 5091968-12.2025.8.24.0000/SC
DESPACHO/DECISÃO
I. J. G. K. interpôs agravo de instrumento com pedido de tutela antecipada recursal em face da decisão interlocutória prolatada pelo 18º Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário que, no âmbito da "ação de revisão contratual cumulado com pedido de tutela de urgência" n. 5139473-22.2025.8.24.0930, indeferiu a tutela de urgência, nos seguintes termos (Evento 5):
[...]
O juiz poderá conceder a tutela de urgência quando: a) houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito; e b) caracterizado o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300 do CPC).
A parte autora alegou que a mora estaria descaracterizada pelo fato de que a negociação havida entre as partes, o contrato litigioso, prevê encargos bancários tidos como abusivos.
Como é cediço, na linha da remansosa jurisprudência que trata do tema em referência, para a descaracterização da mora é indispensável: a) apuração de ilegalidade substancial durante a normalidade, como juros remuneratórios e capitalização vedados, a ponto de prejudicar de forma significativa o equilíbrio econômico-contratual; e b) depósito judicial do montante incontroverso, pois eventual ilegalidade não afasta a responsabilidade pelo adimplemento do principal, acrescido do que se reputa devido.
Quanto à abusividade de encargos negociais, é cediço que a revisão contratual é medida excepcional, admitida apenas quando demonstrada a presença de elementos objetivos que afastem a presunção legal de simetria e paridade de obrigações (art. 421-A do CC). Mesmo nas relações de consumo, os contratos somente podem ser modificados ou revistos quando evidenciada a presença de cláusulas que prevejam obrigações despropocionais ou devido a causa superveniente que implique em sua onerosidade excessiva (art. 6º, V, do CDC).
Nesse passo, a revisão contratual deve ser realizada de forma sistemática, considerando o pacto em sua integralidade e não apenas cláusulas isoladas. Isso porque a identificação de eventual desequilíbrio contratual exige a verificação do impacto das cláusulas impugnadas sobre a equidade da relação jurídica como um todo, a fim de se verificar a existência ou não de desvantagem exagerada ou de onerosidade excessiva para o consumidor (art. 51, caput, IV, e § 1º, do CDC).
No caso dos autos, não há comprovação bastante acerca de fato superveniente que tenha ocasionado alteração no equilíbrio econômico da relação jurídica impugnada. Dessa forma, presume-se que a parte autora ainda possui as mesmas condições financeiras da época em que firmou o contrato sub judice com a parte ré, momento em que concordou com os encargos descritos no contrato e valores nele estabelecidos.
Com efeito, sem aprofundar a análise do mérito neste momento processual, entendo que não foi demonstrada a existência de encargos excessivamente onerosos à parte autora ou que a coloquem em desvantagem desproporcional, pelos motivos expostos a seguir.
Em julgados mais recentes, o STJ tem decidido que a estipulação de juros remuneratórios acima da média de mercado, por si só, não é suficiente para caracterização de abusividade contratual. Esse entendimento parte da constatação de que a fixação da taxa contratual leva em conta uma série de fatores, como o custo de captação de recursos pela instituição financeira, o risco de inadimplência da parte contratante, o spread bancário e a análise de condições específicas da operação. Do contrário, o Logo, a mera comparação da taxa prevista no contrato litigioso com a média divulgada pelo Banco Central para tal espécie de negociação não é suficiente para se verificar a existência de cobrança abusiva, sem que sejam consideradas as particularidades de cada agente financeiro e a situação específica da operação contratada. É necessário que se demonstre, de forma contextualizada com o caso concreto, que a taxa estipulada pela casa bancária extrapolou o que seria admitido para tal situação. Vide: AgInt no AREsp n. 2.768.010/RS, rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 17/03/2025, DJEN de 24/03/2025.
À toda evidência, o simples fato de a taxa de juros remuneratórios ter sido pactuada em patamar superior à taxa média de mercado não é o bastante para que tal cláusula seja considerada abusiva, visto que as instituições financeiras não se baseiam apenas na taxa média praticada pelo mercado para nortear suas contratações. Questões inerentes à situação financeira da parte contratante, o risco de inadimplemento, o custo da operação e, enfim, outros fatores ponderados pela parte ré certamente influenciaram na fixação da taxa ora impugnada.
Além disso, a capitalização de juros é admitida em contratos bancários firmados após 31/03/2000 (art. 5º da MP 2.170-36/01, reedição da MP 1.963-17/00, mantida em vigor pelo art. 2º da EC 32/01).
É o teor da Súmula n. 539 da Corte da Cidadania, que assim dispõe: "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada". Não é demais lembrar que tal diploma legal foi julgado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, inclusive no que toca ao cumprimento dos requisitos de urgência e necessidade. Vide: STF, RE n. 592.377, rel. Min. Teori Zavascki, j. 04/02/2015).
Vale destacar, de mais a mais, que a ausência de indicação específica do percentual de juros diários não é o bastante ensejar a nulidade da avença.
No caso em comento, há indicação da taxa de juros e do custo efetivo total do contrato, bem como do valor mensal das prestações devidas pela parte requerente, que tinha plena ciência do montante que deveria pagar mensalmente para honrar sua contraprestação negocial.
Ademais, a parte autora não demonstrou de forma objetiva como isso a prejudicou a ponto de motivar a revisão contratual. Não há elementos concretos de que essa informação seria determinante para a entabulação do negócio jurídico, isto é, de que ela não teria adquirido o mútuo nessas mesmas condições caso tivesse ciência do índice de capitalização diária.
À toda evidência, o contrato supracitado previu de forma expressa que os juros seriam capitalizados, indicou os índices aplicáveis mensal e anualmente, bem como estabeleceu de forma clara e objetiva o valor total da contratação, das parcelas mensais e do valor devido ao final da operação. Isso significa que, desde o início, a parte autora teve acesso às informações essenciais para compreender o conteúdo da avença e as obrigações por ela assumidas, sem que se possa cogitar abusividade gritante no contrato que justifique a modificação ou a revisão das cláusulas contratuais. Não há, portanto, violação ao dever de informação (art. 6º, III, do CDC).
Quanto às tarifas pactuadas, ab initio, não há como se atestar sua ilegalidade, pois prevalece o entendimento de que sua cobrança é válida, desde que os serviços tenham sido efetivamente prestados pela instituição financeira. Situação esta que poderá ser esclarecida no curso da instrução processual.
O mesmo raciocínio se aplica ao seguro contratual, cuja caracterização como "venda casada" somente ocorre na hipótese de não ter sido oferecida ao consumidor a opção de contratar ou não o referido serviço. Por isso, faz-se necessária a prévia oitiva da parte adversa para esclarecimento dos fatos, o que inviabiliza o reconhecimento da suposta ilegalidade do encargo initio litis.
Ademais, para fins de análise da tutela provisória de urgência, a suposta abusividade destes encargos não se mostra relevante, já que não dizem respeito ao "período de normalidade contratual".
[...]
De registrar que também não houve demonstração efetiva de que a cláusula impugnada tenha ocasionado cobrança, pela parte ré, de valores superiores aos que eram devidos pela parte autora.
Dessa forma, a tese levantada pela parte autora não enseja a concessão da tutela provisória de urgência, pois, por enquanto, não se verifica a existência de abusividade contratual.
Não fosse isso bastante, também não está caracterizado o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, requisito que certamente não se confunde com a pressa de se obter provimento jurisdicional favorável.
Isso porque o perigo ou mesmo o risco devem ser havidos como sendo aqueles concretos e atuais, jamais aqueles presumidos, futuros e incertos, como se assenta na hipótese em apreço.
Sobre o assunto, são pertinentes as colocações de Teori Albino Zavascki quando afirma que "o risco de dano irreparável ou de difícil reparação e que enseja antecipação assecuratória é o risco concreto (e não o hipotético ou eventual), atual (ou seja, o que se apresenta iminente no curso do processo) e grave (vale dizer, o potencialmente apto a fazer perecer ou a prejudicar o direito afirmado pela parte). Se o risco, mesmo grave, não é iminente, não se justifica a antecipação da tutela" (Antecipação da Tutela, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 1999, p. 77).
[...]
Portanto, não demonstrados os requisitos do art. 300 do CPC, o indeferimento da tutela provisória de urgência postulada é medida de rigor.
ANTE O EXPOSTO:
Relego para fase posterior a realização de audiência de conciliação e mediação, se as partes sinalizarem em contestação e em réplica esse desejo.
Indefiro a tutela de urgência, diante da falta de probabilidade do direito (art. 300 do CPC).
Cite-se a parte ré para contestar, no prazo de 15 dias.
Por se tratar de relação de consumo, diante da verossimilhança do que foi alegado pela parte autora, manifestamente hipossuficiente, fica invertido o ônus da prova (art 6º, VIII, do CDC).
A parte ré deverá exibir, com a contestação, os documentos atrelados à relação jurídica com a contrária ou justificar a impossibilidade de exibição, sob pena de se presumir como verdadeiros os fatos que se pretendia comprovar através dessa prova (arts. 396 e 400 do CPC).
Concedo o benefício da justiça gratuita à parte autora (art. 98 do CPC), uma vez que sua hipossuficiência econômica restou comprovada.
Em suas razões recursais (Evento 1), a parte agravante aduz, em resumo, a existência de abusividade na fixação dos juros remuneratórios, uma vez que muito superiores à média de mercada estabelecida pelo Bacen. Defende, ademais, que por esta razão, está devidamente descaracterizada a mora do consumidor e proibição de inclusão de seu nome nos órgãos de restrição ao crédito. Argumenta que estão presentes os requisitos para a concessão da tutela.
Requereu, inicialmente, a concessão da antecipação dos efeitos da tutela, com o escopo de manter "o veículo na posse da agravante, além de determinar a exclusão do nome da autora dos órgãos de restrição de crédito, ou, caso ainda não efetivada, seja a ré proibida de fazê-lo, sob pena de multa diária a ser arbitrada por V. Excelências".
É o relatório necessário. Decido.
Do juízo de admissibilidade
O recurso foi interposto tempestivamente no prazo legal (CPC, art. 1.003, § 5º c/c art. 219). Dispensa-se a comprovação do preparo recursal, uma vez que a parte recorrente é beneficiária da justiça gratuita (Evento 5 da origem).
Assim, preenchidos estes e os demais pressupostos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido, com análise imediata do pleito de antecipação dos efeitos da tutela, do qual o Código incumbe o relator:
Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV , o relator, no prazo de 5 (cinco) dias:
I - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão;
[...]
Do pedido de tutela recursal antecipada
Os requisitos para a obtenção de tutela provisória de urgência em sede recursal são os mesmos que se aplicam aos demais estágios do processo, identificados pelo art. 300, caput, do diploma: (a) "a probabilidade do direito"; e (b) "o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo". É indispensável, aliás, que ambos influam, não bastando, por exemplo, que o provimento do recurso seja plausível: afinal, o que justifica a inversão da ordem normal do procedimento, com a postergação do contraditório, é a necessidade de atuar imediatamente para dirimir risco aos direitos em conflito. Conforme ensinam Fredie Didier Júnior, Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga:
Importante é registrar que o que justifica a tutela provisória de urgência é aquele perigo de dano: i) concreto (certo), e, não hipotético ou eventual, decorrente de mero temor subjetivo da parte; ii) atual, que está na iminência de ocorrer; e, enfim, iii) grave, que tem aptidão de prejudicar ou impedir a fruição do direito. Dano irreparável é aquele cujos efeitos são irreversíveis. [...] Dano de difícil reparação é aquele que provavelmente não será ressarcido, seja porque as condições financeiras do réu autorizam supor que não será compensado ou restabelecido, seja porque, por sua própria natureza, é complexa sua individualização ou quantificação precisa. Enfim, o deferimento da tutela provisória somente se justifica quando não for possível aguardar pelo término do processo para entregar a tutela jurisdicional, porque a demora do processo pode causar à parte um dano irreversível ou de difícil reversibilidade. [Curso de direito processual civil. Vol. 2. Salvador: Juspodivm, 2015, p.595-597)]
Salienta-se, que para a análise da concessão de antecipação de tutela em ações revisionais, que tem por objetivo obstar a inscrição do nome do mutuário em órgãos de proteção ao crédito e mantê-lo, em caso de alienação fiduciária de veículo, na posse do bem, deve ser observado o entendimento consolidado do Superior , rel. Rocha Cardoso, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 19-10-2023).
Em igual sentido, caso relatado pela Exma. Desembargadora Soraya Nunes Lins, também integrante desta Egrégia Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA RÉ. JUROS REMUNERATÓRIOS. UTILIZAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN, TÃO SOMENTE, COMO REFERENCIAL PARA A CONSTATAÇÃO DA ABUSIVIDADE. OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS ESTIPULADOS NO RESP N. 1.821.182/RS. ONEROSIDADE DO ALUDIDO ENCARGO QUE DEVE SER APURADA DE ACORDO COM AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA, IN CASU, DE JUSTIFICATIVA PLAUSÍVEL POR PARTE DA RÉ PARA PRESERVAÇÃO DAS ELEVADAS TAXAS PACTUADAS ENTRE AS PARTES. MANUTENÇÃO, PORTANTO, DA LIMITAÇÃO DO ENCARGO À MÉDIA DE MERCADO QUE SE IMPÕE. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CABIMENTO. EXISTÊNCIA DE ENCARGOS ABUSIVOS. DEVER DE PROMOVER A DEVOLUÇÃO DOS VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE, NA FORMA SIMPLES, ATUALIZADO COM BASE NOS ÍNDICES OFICIAIS, DIANTE DA AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. VEDAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5002979-56.2021.8.24.0069, do , rel. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 21-09-2023).
Conclui-se, a partir das premissas acima destacadas, que a verificação comparativa entre a taxa de juros praticada pelo Bacen e aquela do contrato revisando, por si só, não é suficiente para avaliar a decantada abusividade do encargo remuneratório. É imprescindível, adicionalmente, avaliar todas as peculiaridades da época da contratação, a exemplo dos riscos da operação avençada, das garantias embutidas, do relacionamento obrigacional entre as partes, da situação econômica do contratante, entre outras. Portanto, a análise deve perfectibilizar-se detalhadamente, de forma a subsidiar a intervenção estatal com segurança.
Neste viés, “a verificação da abusividade dos juros não é taxativa, não observa critérios genérico e universais, de modo que o fato de a taxa de juros remuneratórios contratada ser o dobro ou triplo ou outro múltiplo da taxa apurada pelo Banco Central não determina o reconhecimento de abusividade" (STJ, AgInt no REsp n. 1.949.441/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. em 23-8-2022, DJe de 9-9-2022). Essa compreensão, ao que parece, tem razão de ser, mormente porque "o crescimento exponencial das taxas de juros está diretamente ligado à segurança da instituição financeira em ver devolvido o numerário cedido à empréstimos; pois quanto maiores os riscos envolvendo o negócio, associados à deficiência econômica aferível a cada consumidor, impõe-se um olhar distinto nas taxas de juros. Se assim não fosse, a adoção paritária de juros remuneratórios sem análise dos requisitos pessoais do consumidor imporia uma vantagem desmedida ao mal pagador, único responsável pela elevação do spread bancário que afeta diretamente nas taxas ofertadas" (TJSC, Apelação n. 5004246-79.2020.8.24.0075, rel. Rocha Cardoso, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 19-10-2023).
No caso em tela, as partes firmaram "Empréstimo pessoal com garantia de veículo automotor" n. AR00317188, no dia 01.09.2025, sendo os juros remuneratórios contratados à razão de 4,83% a.m. (Evento 1, CONTR6). A taxa de mercado divulgada pelo Bacen, à época da contratação, era de 2,03% a.m. (25471 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Aquisição de veículos).
Nesse contexto, a priori, parece-me que a taxa praticada é muito superior à média de mercado. Não há nos autos, por ora, qualquer elemento de prova que demonstre os custos da captação dos recursos à época do contrato, fontes de renda da parte autora para apurar sua situação econômica, nem mesmo indicativos sobre o resultado da análise do perfil de risco de crédito pertinente à instituição financeira.
Assim, ainda que necessário se afastar do mero cotejo entre a taxa praticada e a média divulgada, é possível perceber uma abusividade na cobrança dos juros remuneratórios.
A respeito, de minha lavra:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSOS DE AMBAS AS PARTES. RECURSO DA CASA BANCÁRIA. PLEITO DE AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS. CRÉDITO PESSOAL NÃO CONSIGNADO. NECESSIDADE DE AFERIÇÃO BASEADA NA OBSERVÂNCIA DAS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO (SITUAÇÃO DA ECONOMIA À ÉPOCA, GARANTIAS OFERECIDAS, PERFIL DO CONTRATANTE E RISCOS DA OPERAÇÃO). TAXA MÉDIA DITADA PELO BANCO CENTRAL (BACEN) QUE INDICA, TÃO SOMENTE, UM CRITÉRIO ÚTIL DE AFERIÇÃO CONSIDERANDO AS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. TAXA PRATICADA MUITO SUPERIOR À MÉDIA DE MERCADO. AUSÊNCIA DE JUSTIFICATIVAS PARA A ELEVADA TAXA DE JUROS, MUITO SUPERIOR A MÉDIA DE MERCADO QUE, APESAR DE NÃO SER UM LIMITADOR, SERVE COMO REFERENCIAL. PRECEDENTES. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE DEMONSTRAR O RESULTADO DA ANÁLISE DE PERFIL DO MUTUÁRIO CAPAZ DE JUSTIFICAR A ADOÇÃO DA ELEVADA TAXA PRATICADA. ENCARGO ABUSIVO. RECURSO DA PARTE AUTORA. PLEITO DE INCIDÊNCIA DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DO BACEN SEM ACRÉSCIMO DO PERCENTUAL DE 50%. ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS. RECONHECIMENTO DA ILEGALIDADE NA ORIGEM, COM A LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS À TAXA MÉDIA DE MERCADO, ACRESCIDOS DE 50%. JURISPRUDÊNCIA QUE NÃO IDENTIFICA OBJETIVAMENTE QUALQUER PORCENTAGEM DETERMINADA DE VARIAÇÃO ADMITIDA E, PERANTE A ABUSIVIDADE VERIFICADA IN CONCRETO, EFETIVAMENTE SUBSTITUI O ENCARGO CONTRATUAL PELO ÍNDICE MERCADOLÓGICO. RECURSO PROVIDO NO PONTO. PEDIDO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA DOBRADA. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE DEMOSNTRAÇÃO DE MÁ-FÉ DA CASA BANCÁRIA. TESE AFASTADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS CABÍVEIS APENAS EM FAVOR DO CAUSÍDICO DA PARTE AUTORA. HIPÓTESE QUE AUTORIZA A MAJORAÇÃO PREVISTA NO ART. 85, § 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PRESENÇA CUMULATIVA DOS REQUISITOS FIXADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA CONHECIDO E DESPROVIDO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. (TJSC, Apelação n. 5000503-61.2022.8.24.0020, do , rel. Silvio Franco, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 21-03-2024).
Da descaracterização da mora
O instituto da descaracterização da mora tem como fundamento a inocorrência de inadimplemento culposo do devedor, nos termos do art. 394 do Código Civil, em razão da existência de encargos abusivos no contrato objeto do litígio, fato que pode repercutir diretamente na causa do inadimplemento e retira do devedor a imputação pela mora. Essa compreensão resulta da premissa da existência de um nexo de causalidade entre a abusividade no encargo incidente durante o momento em que a obrigação deveria ser cumprida e a ocorrência da mora debitoris, motivo pelo qual o reconhecimento judicial da inexigibilidade do referido encargo afeta a mora.
Não se desconhece que, à luz do que tem recentemente decidido o Superior , rel. Tulio Pinheiro, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 11-06-2024).
Outrossim, merece ênfase que inexiste prejuízo ao recorrente quanto à possibilidade da consignação em juízo dos referidos montantes, uma vez que tal verba ficará depositada em conta única, para levantamento pelo Banco mediante autorização judicial.
Sendo assim, prima facie, está demonstrada a verossimilhança das alegações do ora agravante, a qual é pressuposto imprescindível à concessão da tutela. No tocante ao requisito do periculum in mora, este se encontra devidamente configurado, pois o prosseguimento do feito pode gerar graves danos ao agravante, tendo em vista a possível inscrição de seu nome do rol de inadimplentes e a perca do bem dado em garantia da avença.
Portanto, tendo em vista que "a norma exige para a concessão da tutela de urgência a presença cumulativa dos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora [...]" (STJ, RCD na AR 5.879/SE, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 26-10-2016) e, estando presentes ambos os requisitos, há de ser deferida a medida pleiteada.
Por derradeiro, importante consignar que a decisão ora exarada não se reveste de definitividade, na medida em que o presente recurso ainda está pendente de exame definitivo pelo Órgão Fracionário, o qual poderá, inclusive, pronunciar-se de modo diverso.
Da conclusão
Pelas razões expostas, defere-se o pedido de antecipação da tutela recursal para manter o bem na posse da parte agravante e ordenar à instituição financeira agravada que se abstenha de incluir restrição creditícia em nome da parte recorrente e, caso já existente, promova sua exclusão, no prazo de 5 (cinco) dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 200,00 (duzentos reais), limitada ao importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), e autorizar o depósito em juízo do valor incontroverso nos moldes da fundamentação supra.
A eficácia desta decisão está condicionada ao depósito das parcelas vencidas e vincendas no curso da ação, no prazo de 15 (quinze) dias, observado os parâmetros desta decisão quanto aos juros remuneratórios.
Em atenção à Sumula 410 do Superior Tribunal de Justiça -“a prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer" -, deverá o Juízo de primeiro grau promover a intimação pessoal da instituição bancária para cumprimento da presente injunção.
Comunique-se o Juízo a quo.
Cumpra-se o disposto no art. 1.019, inciso II, do Codex Processual.
Publique-se. Intime-se.
assinado por SILVIO FRANCO, Desembargador Substituto, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7057536v32 e do código CRC bb8c6310.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SILVIO FRANCO
Data e Hora: 11/11/2025, às 12:36:44
5091968-12.2025.8.24.0000 7057536 .V32
Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:14:21.
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