Decisão TJSC

Processo: 5092741-57.2025.8.24.0000

Recurso: Agravo

Relator:

Órgão julgador:

Data do julgamento: 19 de junho de 2023

Ementa

AGRAVO – Documento:7060359 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5092741-57.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO M. J. R. M. R. interpôs agravo de instrumento contra a decisão proferida pelo 10º Juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário que, nos autos da "ação repactuação de dívidas (superendividamento)" nº 5106156-33.2025.8.24.0930/SC, rejeitou os embargos de declaração opostos em face da decisão que indeferiu a tutela antecipada requerida pela parte autora, a qual visava a limitação dos descontos dos empréstimos ao patamar de 30% dos rendimentos líquidos da parte autora (evento 12, DESPADEC1 e evento 19, DESPADEC1 - dos autos originários).

(TJSC; Processo nº 5092741-57.2025.8.24.0000; Recurso: Agravo; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de junho de 2023)

Texto completo da decisão

Documento:7060359 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5092741-57.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO M. J. R. M. R. interpôs agravo de instrumento contra a decisão proferida pelo 10º Juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário que, nos autos da "ação repactuação de dívidas (superendividamento)" nº 5106156-33.2025.8.24.0930/SC, rejeitou os embargos de declaração opostos em face da decisão que indeferiu a tutela antecipada requerida pela parte autora, a qual visava a limitação dos descontos dos empréstimos ao patamar de 30% dos rendimentos líquidos da parte autora (evento 12, DESPADEC1 e evento 19, DESPADEC1 - dos autos originários). Para tanto, argumenta que a probabilidade do direito "está amplamente demonstrada a plausibilidade do direito com base na proteção constitucional da dignidade da pessoa humana e na própria finalidade protetiva da Lei n. 14.181/2021 (art. 54-A e arts. 104-A e ss., CDC), que visam preservar o mínimo existencial do superendividado", assim como o perigo da demora, eis que "os documentos anexados à inicial provam descontos mensais que consomem 66,81% da renda líquida da Agravante (R$6.802,46 sobre R$10.182,44), o que gera risco imediato à sua subsistência (aluguel, alimentação, remédios), situação que justifica a intervenção urgente do Judiciário", além da reversibilidade dos efeitos da decisão, ao passo em que "eventuais valores recebidos pelas instituições credoras poderão ser ressarcidos posteriormente caso se demonstre improcedência do pedido; já a inércia do Judiciário permitirá que a Agravante continue perdendo condições mínimas de subsistência (dano de difícil reparação)" (evento 1, INIC1, págs. 3-5). Defende, ademais, a necessidade de "cassação da ordem de emenda à inicial prevista no Evento 12, alíneas 'a', 'b', 'c', 'e', pelo fato de a documentação já acostada nos autos ser plenamente suficiente para o prosseguimento do feito", bem como que "a exigência de prova suplementar, quando já há elementos robustos (holerites, extratos de descontos, contratos em parte juntados), traduz formalismo excessivo e obstáculo ao direito de ação" (p. 8). Dessa forma, requer a concessão da tutela antecipada recursal pretendida e, ao final, o provimento do recurso, a fim de limitar os descontos em 30% (trinta por cento) da sua remuneração líquida mensal e determinar a exibição imediata das cópias dos contratos, Custo Efetivo Total (CET), demonstrativos de juros e extratos dos débitos indicados na inicial (art. 54-G, II, CDC). É o relatório. Decido. Porque preenchidos os preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Pois bem. O pedido de concessão da antecipação da tutela recursal encontra amparo nos artigos 932, II, e 1.019, I, do Código de Processo Civil, já que permitem ao relator apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos. A teor do que dispõe o art. 294 do Código de Processo Civil, a tutela provisória é gênero, contemplando as espécies da urgência e da evidência. Desta forma, a tutela provisória de urgência pressupõe a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300 da novel legislação processual). Já a tutela provisória de evidência, cujos pressupostos encontram-se no art. 311 daquele diploma legal, consoante ensinamento sintetizado do ilustre professor Nelson Nery Junior, em comparação com a tutela de urgência, a tutela da evidência igualmente exige a plausibilidade do direito invocado, mas prescinde da demonstração do risco de dano. Vale dizer, o direito da parte requerente é tão óbvio que deve ser prontamente reconhecido pelo juiz. (Comentários ao Código de Processo Civil. 2ª tiragem. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. P. 871). A partir disso, subsumindo-se os conceitos acima citados à situação fática em exame, constata-se, a priori, que se estaria diante da hipótese da tutela provisória de urgência. Assim, a concessão da tutela provisória de urgência pressupõe, nos termos do art. 300 do novo Código de Processo Civil, a demonstração da probabilidade do direito (tradicionalmente conhecida como "fumus boni iuris") e, junto a isso, a demonstração do perigo de dano ou de ilícito, ou ainda do comprometimento da utilidade do resultado final que a demora do processo representa (tradicionalmente conhecido como "periculum in mora"). (DIDIER JR., Fredie. BRAGA, Paula Sarno. OLIVEIRA, Rafael Alexandria de.; Curso de Direito Processual Civil Vol. 2; 11ª edição; Salvador: JusPodivm; 2016; pp. 607). Segundo o mesmo doutrinador (ob. citada; pp. 608): A probabilidade do direito a ser provisoriamente satisfeito/realizado ou acautelado é a plausibilidade de existência desse mesmo direito. O bem conhecido fumus boni iuris (ou fumaça do bom direito). O magistrado precisa avaliar se há "elementos que evidenciem" a probabilidade de ter acontecido o que foi narrado e quais as chances de êxito do demandante (art. 300, CPC). Inicialmente, é necessária a "verossimilhança fática", com a constatação de que há um considerável grau de plausibilidade em torno da narrativa dos fatos trazida pelo autor. É preciso que se visualize, nessa narrativa, uma verdade provável sobre os fatos, independentemente da produção da prova. Junto a isso, deve haver uma "plausibilidade jurídica", com a verificação de que é provável a subsunção dos fatos à norma invocada, conduzindo as efeitos pretendidos. E prossegue no que diz respeito ao perigo da demora (pp. 610/611): A tutela provisória de urgência pressupõe, também, a existência de elementos que evidenciem o "perigo" que a demora no oferecimento da prestação jurisdicional (periculum in mora) representa para a efetividade da jurisdição e a eficaz realização do direito. O perigo da demora é definido pelo legislador como o perigo que a demora processual representa de "dano ou risco ao resultado útil do processo" (art. 300, CPC). A redação é ruim. Nem sempre há necessidade de risco de dano (art. 497, par. ún., CPC), muito menos a tutela de urgência serve para resguardar o resultado útil do processo na verdade, como examinado, a tutela cautelar serve para tutelar o próprio direito material. Mais simples e correto compreender o disposto no art. 300 como "perigo da demora". Importante registrar que o que justifica a tutela provisória de urgência é aquele perigo de dano: i) concreto (certo), e, não, hipotético ou eventual, decorrente de mero temor subjetivo da parte; ii) atual, que está na iminência de ocorrer, ou esteja acontecendo; e, enfim, iii) grave, que seja de grande ou média intensidade e tenha aptidão para prejudicar ou impedir a fruição do direito. Além de tudo, o dano deve ser irreparável ou de difícil reparação. Dano irreparável é aquele cujas consequência são irreversíveis. (...) Enfim, o deferimento da tutela provisória somente se justifica quando não for possível aguardar pelo término do processo para entregar a tutela jurisdicional, porque a demora do processo pode causar à parte um dano irreversível ou de difícil reversibilidade. Volvendo ao caso em tela, entendo que a decisão agravada, por ora, deve ser mantida. Com efeito, sobre a aludida temática, a Lei 14.181/2021, que introduziu novas diretrizes no Código de Defesa do Consumidor acerca do superendividamento, passou a estabelecer nos arts. 104-A e 104-B da legislação consumerista que: Art. 104-A. A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas. Art. 104-B. Se não houver êxito na conciliação em relação a quaisquer credores, o juiz, a pedido do consumidor, instaurará processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório e procederá à citação de todos os credores cujos créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado. A par das aludidas premissas, denota-se que a etapa inicial em ações dessa natureza (repactuação de dívida) consiste, como bem apontado na origem, que "para processamento do pedido formulado com fulcro no Estatuto do Superendividamento, conforme estabelecido pela Lei n. 14.181/2021, que introduziu alterações n CDC e no Código do Idoso, regulamentada pelo Decreto n. 11.150/2022, com redação dada pelo Decreto 11.567/2023, que entrou em vigor em 19 de junho de 2023, deve ser obrigatoriamente designada audiência conciliatória, à qual devem ser citados todos os credores, cujo comparecimento é obrigatório, sob pena de suspensão da exigibilidade do débito e a interrupção dos encargos da mora, bem como a sujeição compulsória ao plano de pagamento da dívida se o montante devido ao credor ausente for certo e conhecido pelo consumidor, devendo o pagamento a esse credor ser estipulado para ocorrer apenas após o pagamento aos credores presentes à audiência conciliatória.  A Cartilha sobre o Tratamento do Superendividamento do Consumidor, lançada pelo CNJ, salienta que "o artigo 54-A do Código de Defesa do Consumidor, traz apenas a definição legal de superendividamento, que engloba todas as dívidas de consumo, exigíveis (não prescritas) e as que irão vencer, em um conjunto de compromissos de contratos de crédito e compras a prazo e serviços de prestação continuada (art. 54-A, § 1° e § 2°), mas exclui a contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor. Em acréscimo, como o sistema tem como base a boa-fé, acaso verificada a má-fé, o consumidor poderá ser excluído da proteção (art. 54-A, § 3°), afastando-se da possibilidade de conciliação e do plano compulsório as dívidas oriundas de contratos celebrados dolosamente sem o propósito de realizar o pagamento (art. 104-A, § 1°)". A par disso, é importante que se esclareça a natureza dos débitos assumidos, pois se excluem do plano de pagamento as dívidas com garantia real, financiamento imobiliário e crédito rural (art. 104-A). Ademais, sobre o ato de convocação dos credores com previsão no Código de Defesa do Consumidor, após inserções feitas pela Lei n. 14.181/2021, previram-se efeitos e penalidades ao credor que nela não se fizer presente. (...) Gize-se, ainda, que é dever da parte autora apresentar proposta de plano de pagamento, nos termos do artigo 104-A, do CDC, com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservado (com prova documental, como extratos bancários, faturas do cartão de crédito) o mínimo existencial (R$600,00 mensais), nos termos da regulamentação (Decretos 11.150/2022 e 11.567/2023). Assim como no plano judicial compulsório (art. 104-B, § 4º, do CPC), deve assegurar aos credores, no mínimo, o valor do principal devido, corrigido monetariamente por índices oficiais de preço. Aliás, de acordo com o Eminente Ministro do STJ Antonio Herman Benjamin, "ao referir-se expressamente que o plano deve assegurar o valor principal corrigido da dívida, o legislador deixou claro que não recepcionou a medida do perdão que é admitida na legislação de outros países" (BENJAMIN, Antônio Herman. Obra citada. p. 335). Ademais, consigna-se que o procedimento especial não comporta exibição de documentos e produção de prova." (evento 12, DESPADEC1 - dos autos originários, grifo no original). Nessa senda, conclui-se que, tal como consignado na decisão objurgada, sendo o objetivo da parte agravante a repactuação de débito em razão do superendividamento, e considerando a normativa incidente — notadamente os arts. 104-A e 104-B do Código de Defesa do Consumidor, incluídos pela Lei nº 14.181/2021 —, mostra-se, em princípio, necessária a realização de audiência de conciliação, etapa obrigatória do procedimento judicial de repactuação de dívidas. Somente após a tentativa frustrada de autocomposição, é que se viabiliza o prosseguimento da demanda para fins de revisão judicial dos contratos e eventual remanejamento das dívidas contraídas pela parte devedora/agravante (diga-se, alteração do percentual de descontos incidentes sobre seus rendimentos). A propósito, desta Corte: AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO UNIPESSOAL QUE CONHECEU DO AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO PELA AUTORA E, NO MÉRITO, NEGOU PROVIMENTO. INSURGÊNCIA DA PARTE AGRAVANTE.   ALEGADA PRESENÇA DE REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA PARA CESSAR A COBRANÇA DAS DÍVIDAS OBJETO DA AÇÃO DE REPACTUAÇÃO. INSUBSISTÊNCIA. PROCEDIMENTO PREVISTO NA LEI DO SUPERENDIVIDAMENTO (LEI N. 14.181/2021). ADEQUADA A DETERMINAÇÃO DE PRÉVIA REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA CONCILIATÓRIA ENTRE AS PARTES, NA FORMA DO ART. 104-A DO CDC PARA, SOMENTE APÓS, CASO INFRUTÍFERA, AUTORIZAR EVENTUAL INTERVENÇÃO JUDICIAL NA RELAÇÃO CONTRATUAL (ART. 104-B DO CDC). INVIABILIDADE DE DEFERIMENTO DE TUTELA DE URGÊNCIA PARA CESSAR A COBRANÇA DAS DÍVIDAS. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO CONHECIDO E DESPROVIDO.  (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5059465-69.2024.8.24.0000, do , rel. Mariano do Nascimento, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 08-05-2025). AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. DECISÃO QUE POSTERGOU AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. SUSTENTADA A IMPRESCINDIBILIDADE DA REALIZAÇÃO DO ATO PORQUANTO INCIDENTE O RITO ESPECÍFICO DA NOVA LEI. SUBSISTÊNCIA. PROCEDIMENTO JUDICIAL ESPECÍFICO (LEI N. 14.181 /2021). DECISUM QUE MERECE REFORMA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5043163-33.2022.8.24.0000, do , rel. Mariano do Nascimento, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 01-06-2023). AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENVIDIDAMENTO. LEI Nº 14.181/21, QUE INRODUZIU NOVAS DIRETRIZES NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, EM MATÉRIA DE PREVENÇÃO AO SUPERENVIDIDAMENTO DA PESSOA NATURAL, CRÉDITO RESPONSÁVEL E EDUCAÇÃO FINANCEIRA DO CONSUMIDOR. PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA INDEFERIDO NA ORIGEM. SUSPENSÃO DAS AÇÕES EXECUÇÃO QUE TRAMITAM CONTRA OS AGRAVANTES. REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC, POR ORA, NÃO ATENDIDOS. SIMPLES PROPOSITURA DA AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA QUE NÃO ACARRETA A AUTOMÁTICA SUSPENSÃO DAS AÇÕES EM CURSO CONTRA O DEVEDOR. PROBABILIDADE DO DIREITO INVOCADO PELA PARTE NÃO EVIDENCIADA. ALÉM DISSO, TAMBÉM NÃO CONSTATADO PERITO DE DANO OU RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5058408-21.2021.8.24.0000, do , rel. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 23-06-2022). Nesse trilhar, não vislumbrada, ao menos nesta fase de cognição sumária, a presença dos requisitos necessários para a concessão da tutela pretendida, carece de reparo o decisum agravado. Sob tais argumentos, INDEFIRO o pedido de antecipação de tutela recursal. Comunique-se ao Juízo a quo. Após, cumpra-se o artigo 1.019, II, do Código de Processo Civil. Intimem-se. assinado por JOSÉ MAURÍCIO LISBOA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. 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