Decisão TJSC

Processo: 5092916-51.2025.8.24.0000

Recurso: Agravo

Relator:

Órgão julgador:

Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006

Ementa

AGRAVO – Documento:7067540 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5092916-51.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO Trata-se de agravo de instrumento, interposto pelo Banco do Brasil S.A., em face da decisão proferida pelo magistrado Marcelo Volpato de Souza no evento 172, DESPADEC1, no curso do "procedimento de repactuação de dívidas" autuado sob o n. 5045324-05.2023.8.24.0930, que tramita na Vara Estadual de Direito Bancário, e que, por seus fundamentos, impôs o plano judicial compulsório. Pugna, nesses termos, pela concessão de efeito suspensivo ativo ao recurso e, ao final, requereu o seu provimento.

(TJSC; Processo nº 5092916-51.2025.8.24.0000; Recurso: Agravo; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)

Texto completo da decisão

Documento:7067540 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5092916-51.2025.8.24.0000/SC DESPACHO/DECISÃO Trata-se de agravo de instrumento, interposto pelo Banco do Brasil S.A., em face da decisão proferida pelo magistrado Marcelo Volpato de Souza no evento 172, DESPADEC1, no curso do "procedimento de repactuação de dívidas" autuado sob o n. 5045324-05.2023.8.24.0930, que tramita na Vara Estadual de Direito Bancário, e que, por seus fundamentos, impôs o plano judicial compulsório. Em suma, o agravante argumenta que: (i) a autora carece de interesse de agir na medida em que "não prova nenhuma das ditas cobranças ilegais, elencadas na inicial, não aponta qual a cláusula contratual que estaria eivada de nulidades"; (ii) além disso, "A operação foi novado por interesse e conveniência do autor"; (iii) "Não há sequer início de prova das ilegalidades invocadas, sendo, inclusive que parte do entendimento exarado na inicial é equivocado e não representa ato ilícito algum, como a cobrança de juros livres, a legalidade da capitalização de juros, COBRANÇA NOS EXATOS MOLDES DO CONTRATO, SEM PROVA CONTRÁRIA, ENFIM, nenhuma interesse em razão de ofensa a direito possui a autora ao ajuizar a presente ação"; (iv) "A inicial é desconexa, não possui início de prova do Direito invocado, ambas as partes se mostram ilegítimas e, conseqüentemente, não há interesse de agir em relação ao réu, enfim, a demanda não reúne elementos suficientes para recebimento e processamento, sendo o reconhecimento desta preliminar medida que se impõe, juntamente com a condenação da autora nas penas por litigância de má-fé"; (v) "o PEDIDO feito pela autora é impreciso. Assim, como a referida ação não se amolda em um dos casos do artigo 324, do CPC, nos quais é permitido o PEDIDO GENÉRICO, inviabiliza-se a prestação jurisdicional"; (vi) "OS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO NÃO ENTRAM NA LIMITAÇÃO DA LEI 14.181"; (vii) "A AUTORA É TOMADORA DE CRÉDITO CONTUMAZ"; (viii) "OS EMPRÉSTIMOS SÃO FIRMADOS DE ACORDO COM A MANIFESTAÇÃO ATIVA DE INTERESSE E CONVENIÊNCIA DO CLIENTE, ACRESCIDA DE DECLARAÇÃO EXPRESSA DE CAPACIDADE DE PAGAMENTO E VONTADE"; (ix) "NÃO HÁ NULIDADES NAS OPERAÇÕES, TODAS VALIDADAS PELA ASSINATURA – FÍSICA OU ELETRÔNICA – DA PARTE AUTORA"; (x) "O banco não cobra além do limite da Lei e a autora não ganha renda reduzida como alega, beirando a litigância de má-fé"; (xi) "A decisão é contrária às normas de Ordem Pública, ilegal, capaz de gerar prejuízo ao agravante e enriquecimento sem causa à agravada"; (xii) "A LIMINAR DEVE SER REVOGADA, PARA QUE OS DESCONTOS ACONTEÇAM DA MANEIRA ORIGINALMENTE PACTUADA"; (xiii) "o artigo 537, § 1º do Código de Processo Civil, prevê a possibilidade de imposição de astreinte tão somente nos casos em que for suficiente ou compatível com a obrigação, sendo fixado prazo razoável para tanto"; (xiv) "a imposição de “astreintes” tem como escopo assegurar a eficácia da determinação judicial, ou seja, o seu cumprimento. Todavia, no presente caso, não se faz necessária a imposição da multa diária, isto porque, tal cobrança se dá em plena eficácia de contratação por parte do agravado, revestindo-se de legitimidade até prova do contrário"; (xv) "o determinado esta equivocado, tendo em vista que o valor estipulado de multa é muito alto e a obrigação está sendo cumprida pelo Banco"; (xvi) "Quanto à possibilidade de revogação da multa moratória após o trânsito em julgado da sentença, vale salientar o teor dos artigos 497 e 537, §1º, ambos do CPC, o cabimento da referida sanção pode ser reexaminado a qualquer tempo, não estando portanto, sujeito à preclusão ou coisa julgada"; (xvii) "a multa não deve ser aplicada, pois o banco está fazendo todo o possível para cumprir com a obrigação, por culpa apenas de terceiros que ainda não foi cumprida. Caso não entenda pela revogação, que o valor seja diminuído". Pugna, nesses termos, pela concessão de efeito suspensivo ativo ao recurso e, ao final, requereu o seu provimento. É o relato do essencial.  Prossigo com o exame do pedido liminar.  Os requisitos legais de admissibilidade estão satisfeitos, de modo que conheço do recurso.  Com o advento da Lei n. 14.181/2021, uma série de inovações legislativas foram introduzidas no Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990) a fim de enfrentar a problemática do superendividamento das pessoas naturais. O referido diploma legal, por seu turno, define superendividamento como sendo "a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação" (art. 54-A, § 1º).  A lex ainda prevê que tais dívidas "englobam quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada" (art. 54-A, § 2º). Para tanto, o legislador ordinário insculpiu um procedimento próprio para repactuação de tais dívidas, este que, por sua vez, subdivide-se em uma etapa conciliatória (que ocorre a requerimento do consumidor superendividado) e/ou uma etapa contenciosa.  Na etapa contenciosa, "o juiz, a pedido do consumidor, instaurará processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório e procederá à citação de todos os credores cujos créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado" (art. 104-B, caput, da Lei n. 14.181/2021). Feito este breve delineamento normativo, passo a discorrer a respeito do caso vertente.  O magistrado singular, ao decidir no procedimento de repactuação de dívidas, impôs o plano judicial compulsório nos seguintes termos (evento 172, DESPADEC1): Ante o exposto, imponho o plano judicial compulsório nos seguintes termos: a) suspensão da exigibilidade das dívidas durante a vigência do plano, bem como de quaisquer ações de cobrança ou execução em curso; b) limitação de pagamento mensal correspondente a 40% da remuneração bruta do autor, descontados apenas o imposto de renda e a contribuição previdenciária; c) cessação imediata dos descontos referentes a empréstimos consignados em folha de pagamento, bem como proibição de débitos automáticos relativos às dívidas na conta bancária da autora, com prazo de 15 dias para que as instituições financeiras cumpram a ordem sob pena de multa de R$ 5.000,00 por desconto até o limite de R$ 50.000,00 para cada instituição; d) alongamento da dívida pelo prazo necessário para quitação das obrigações considerando o percentual estabelecido no item "b" ou até o limite de 5 anos, o que ocorrer primeiro; e) proibição de a parte autora contrair novos empréstimos ou promover qualquer outra conduta que importe no agravamento de sua situação de superendividamento. f) oficie-se ao empregador do autor (evento 170, COMP7) para cessar os descontos de empréstimos consignados da folha de pagamento, promover o desconto de 40% da remuneração bruta do autor (deduzidos apenas o imposto de renda e a contribuição previdenciária) e depositar os valores em juízo mês a mês. g) determino que os credores providenciem, no prazo de 15 dias, a exclusão do nome do autor dos cadastros de inadimplentes, caso esteja inscrito, bem como se abstenham de realizar nova inscrição durante a vigência do plano, sob pena de multa diária de R$ 500,00, limitada a R$ 10.000,00, em caso de descumprimento; h) intimem-se os credores para que, no prazo de 15 (quinze) dias, apresentem saldo devedor atualizado com base nos contratos firmados entre as partes, inclusive com a discriminação de eventuais encargos incidentes até a data da atualização. i) Após o retorno das informações, voltem os autos conclusos para elaboração do cálculo proporcional, com a definição da porcentagem que será destinada a cada credor, observando-se o limite mensal de 40% do salário liquido do autor e o prazo máximo de 60 meses para cumprimento do plano. Pois bem.  O procedimento de repactuação de dívidas tem como primeira fase tão somente o pleito de designação de audiência de conciliação, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento a todos os seus credores, franqueada a eles a plena oportunidade de debater e negociar, nos termos do art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor. Assim, não há pretensão declaratória ou condenatória e sequer efeitos a antecipar em requerimentos dessa espécie.  Somente após a audiência conciliatória infrutífera surgirá a possibilidade de repactuação forçada e eventual revisão e integração contratual, desde que assim provoque a parte autora. Desse modo, denota-se que o legislador criou dois procedimentos sucessivos e eventuais. Primeiro há tentativa de conciliação judicial ou administrativa (CDC, arts. 104-A e 104-C); somente depois se inicia a repactuação dos instrumentos contratuais (CDC, art. 104-B). Destaque-se, logo, que considerando a necessidade de audiência prévia, inexistem efeitos a antecipar antes de se dar oportunidade de manifestação aos credores.  Na hipótese em estudo, não obstante as valorosas teses apresentadas pela parte agravante, entendo que o efeito vindicado não deve ser concedido. Isso porque, no presente caso, não se discute a legalidade dos descontos em si, tampouco eventuais abusividades nos contratos entabulados. A parte agravada, em verdade, intentou ação de repactuação de dívidas sob o fundamento de que se encontrava em situação de superendividamento. Sobre o tema, convém gizar que a Lei n. 14.181/2021, ao promover alterações no Código de Defesa do Consumidor, prevê a possibilidade de ajuizamento de processo de repactuação ampla de dívidas de consumidor que se encontre em situação de superendividamento. Trata-se, em verdade, da densificação legislativa do princípio constitucional da dignidade humana sob o viés do estatuto jurídico do mínimo existencial, que está intimamente atrelado à proteção de uma esfera patrimonial capaz de atender às necessidades básicas de uma vida digna. Não merecem subsistir as teses do banco, portanto, no sentido de que a parte agravada carece de interesse de agir ou no sentido de que ausentes abusividades contratuais. Em continuidade, o banco sustenta a impossibilidade de estipulação de astreintes na hipótese em comento. Sucessivamente, pugnou pela minoração do patamar estipulado.  Quanto à fixação da multa, em apertada síntese, é certo que a legislação processual civil assegura ao magistrado a imposição de multa para que as obrigações de fazer ou não fazer sejam prontamente atendidas sem danos à parte contrária. É da norma: Art. 536.  No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente. § 1º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial. Igualmente assente nesta Corte de Justiça entendimento no sentido que "é adequada a imposição de multa diária como forma de compelir o adimplemento da medida antecipatória, na forma preconizada pelo art. 461, § 4º, do Código de Processo Civil" (Agravo de Instrumento nº 2013.016808-9, rel. Des. Fernando Carioni, j. em 01.10.2013).  Com efeito, na hipótese dos autos, as astreintes foram fixadas para eventual descumprimento de decisão vergastada, a qual determinou que os credores providenciassem, no prazo de 15 dias, a exclusão do nome do autor dos cadastros de inadimplentes, caso esteja inscrito, bem como se abstenham de realizar nova inscrição durante a vigência do plano, sob pena de multa diária de R$ 500,00, limitada a R$ 10.000,00, Nesta toada, conquanto o banco réu-agravante afirme que o valor fixado é exacerbado, o quantum, por sua vez, não encontra limite normativo, seja mínimo ou máximo, cabendo ao Julgador fixá-lo no montante que melhor atende a situação vertente, sem olvidar a função precípua de persuadir o banco ao cumprimento da diligência. Registre-se que o Superior Tribunal de Justiça sufraga entendimento no sentido que a revisão da multa cominatória só tem lugar em situações excepcionais, quando se mostrar exorbitante ou irrisória frente à dinâmica do caso em concreto, o que não é, obviamente, a situação dos autos. No caso, é de mister considerar que se trata de instituição financeira de grande capacidade econômica. Frisa-se que a finalidade precípua das astreintes é compelir o cumprimento imediato da medida judicial imposta sem, contudo, ensejar enriquecimento sem causa da parte que se beneficiará do cumprimento da decisão, não obstante o valor seja revertido em seu favor.  Por tal motivo, é salutar a fixação de um limite máximo da multa coercitiva, à critério de julgador, levando-se em conta as particularidades do caso concreto, sem olvidar dos critérios da razoabilidade e da proporcionalidade.  Neste sentido:  AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS E OBRIGAÇÃO DE FAZER. TUTELA ANTECIPADA. REQUISITOS DO ARTIGO 273 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/1973 ATENDIDOS. A tutela antecipada pressupõe a prova inequívoca que conduza à verossimilhança das alegações, bem como fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. FIXAÇÃO DE ASTREINTES. OBRIGAÇÃO DE FAZER. CABIMENTO. VALOR DA MULTA. QUANTUM ARBITRADO. IMPOSIÇÃO DE LIMITE MÁXIMO. NECESSIDADE  Consagrou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a possibilidade de fixação de multa à instituição financeira para compeli-la a retirar o nome do autor do cadastro de inadimplentes, porém além de arbitrada com comedimento é necessário fixar o patamar máximo, a fim de evitar enriquecimento sem causa.  (Agravo de Instrumento n. 0155512.11.2015.8.24.0000, de Guaramirim. Relª Desª Janice Goulart Garcia Ubialli, j. em 14.07.2016). (grifos). Além mais, convém gizar que "a periodicidade da penalidade não está atrelada, e nem poderia, ao fato de o desconto realizado pela recorrente ser mensal" (Agravo de Instrumento n. 4017290-58.2016.8.24.0000, da Capital, rel.  Cláudio Valdyr Helfenstein, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 9-11-2017). Frente a tais circunstâncias, considerando que o juiz singular fixou a multa diária em R$ 500,00, limitada a R$ 10.000,00, valores que entendo adequados para evitar eventual enriquecimento ilícito da parte autora e que estão em conformidade com os precedentes da Terceira Câmara de Direito Comercial deste egrégio Tribunal de Justiça, não há se falar em reforma da decisão agravada.  Por todo o exposto, não há probabilidade do direito e é inafastável o indeferimento da tutela. Desta feita, indefiro o efeito suspensivo ativo. Comunique-se a origem.  No mais, abra-se o prazo do art. 1.019, II, do CPC, à agravada.  Após, retornem conclusos.  assinado por GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7067540v7 e do código CRC e47638f2. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA Data e Hora: 11/11/2025, às 18:37:34     5092916-51.2025.8.24.0000 7067540 .V7 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:36:36. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas