AGRAVO – Documento:6920252 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Execução Penal Nº 8001783-69.2025.8.24.0033/SC RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA RELATÓRIO Trata-se de agravo em execução penal interposto por Samantha da Silva (registrado (a) civilmente como P. H. D. S.), contra decisão proferida pelo Juízo da Vara de Execuções Penais da Comarca de Itajaí, que homologou o Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD n. 027/2025), reconhecendo a prática de falta grave, consistente na ocorrência de novo crime doloso (art. 52 da LEP), com a consequente aplicação do consectário legal de fixação de nova data-base para concessão de benefícios (Seq. 34.1 dos autos n. 8000505-33.2025.8.24.0033 - SEEU).
(TJSC; Processo nº 8001783-69.2025.8.24.0033; Recurso: Agravo; Relator: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 24 de fevereiro de 2025)
Texto completo da decisão
Documento:6920252 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Agravo de Execução Penal Nº 8001783-69.2025.8.24.0033/SC
RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA
RELATÓRIO
Trata-se de agravo em execução penal interposto por Samantha da Silva (registrado (a) civilmente como P. H. D. S.), contra decisão proferida pelo Juízo da Vara de Execuções Penais da Comarca de Itajaí, que homologou o Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD n. 027/2025), reconhecendo a prática de falta grave, consistente na ocorrência de novo crime doloso (art. 52 da LEP), com a consequente aplicação do consectário legal de fixação de nova data-base para concessão de benefícios (Seq. 34.1 dos autos n. 8000505-33.2025.8.24.0033 - SEEU).
Inconformada, a defesa requereu, em preliminar, o reconhecimento da nulidade da decisão diante da inafastabilidade de apreciação judicial e da ausência de fundamentação substantiva, em especial a não apreciação das teses defensivas ("art. 93, IX, da Constituição Federal; art. 564, IV, do Código de Processo Penal, e por analogia, art. 489, §1º, IV, do Código de Processo Civil, devendo os autos serem encaminhados ao juízo a quo para apreciação do feito"). No mérito, busca a descaracterização da conduta faltosa por ter a apenada atuado em legítima defesa de terceiro, configurando excludente de ilicitude, nos termos do art. 23, inciso II, do Código Penal (1.1).
Apresentadas as contrarrazões (1.5) e mantida a decisão (1.6), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Procurador de Justiça Dr. Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (7.1).
Este é o relatório.
VOTO
O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.
O agravo em execução manejado por Samantha da Silva (registrado (a) civilmente como P. H. D. S.), objetiva reformar a decisão que homologou processo administrativo disciplinar n. 27/2025, reconheceu a prática de falta grave (art. 52 da LEP), e aplicou o consectário legal de alteração da data-base para 24.02.2025 (Seq. 34 - dos autos n. 8000505-33.2025.8.24.0033 - SEEU).
1. Preliminar - Nulidade pela inafastabilidade de apreciação judicial e ausência de fundamentação substantiva
Busca a defesa o reconhecimento da nulidade da decisão que homologou o PAD e reconheceu a falta grave, ao argumento da não apreciação das teses defensivas, em afronta ao "art. 93, IX, da Constituição Federal; art. 564, IV, do Código de Processo Penal, e por analogia, art. 489, § 1º, IV, do Código de Processo Civil, devendo os autos serem encaminhados ao juízo a quo para apreciação do feito".
Porém, sem razão.
De início, importante destacar que o art. 59 c/c arts. 47 e 48, parágrafo único, da LEP, atribui à Autoridade Administrativa, isto é, o Diretor ou Gerente do Presídio, mediante instauração de processo administrativo disciplinar, a atribuição, em regra, de apurar a prática de faltas disciplinares, incluindo as de natureza grave. De acordo com referidos dispositivos:
Art. 47. O poder disciplinar, na execução da pena privativa de liberdade, será exercido pela autoridade administrativa conforme as disposições regulamentares.
Art. 48. Na execução das penas restritivas de direitos, o poder disciplinar será exercido pela autoridade administrativa a que estiver sujeito o condenado.
Parágrafo único. Nas faltas graves, a autoridade representará ao Juiz da execução para os fins dos artigos 118, inciso I, 125, 127, 181, §§ 1º, letra d, e 2º desta Lei.
[...]
Art. 59. Praticada a falta disciplinar, deverá ser instaurado o procedimento para sua apuração, conforme regulamento, assegurado o direito de defesa.
Ainda assim, em razão da autonomia dos âmbitos administrativo e jurisdicional, bem diante dos princípios constitucionais da inafastabilidade da jurisdição, da instrumentalidade das formas e da eficiência, passou-se a se admitir a possibilidade de apuração de falta grave exclusivamente no âmbito judicial, garantido o direito e contraditório, com audiência de justificação, sendo dispensável, nesse caso, prévio procedimento administrativo disciplinar.
Nesse sentido, segundo o Supremo Tribunal Federal (RE 972598, Relator(a): Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 04/05/2020, Processo Eletrônico Repercussão Geral - Mérito DJe-196 Divulg 05-08-2020 public 06-08-2020 - Tema 941):
[...] a apuração de falta grave em procedimento judicial, com as garantias a ele inerentes, perante o juízo da Execução Penal não só é compatível com os princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, da CF) como torna desnecessário o prévio procedimento administrativo, o que atende, por igual, ao princípio da eficiência de que cuida o art. 37 da Constituição Federal.
Pelos mesmos fundamentos (autonomia dos âmbitos administrativo e jurisdicional e princípio da inafastabilidade da jurisdição), realizada a apuração da falta grave no âmbito administrativo, não deve ficar ela imune à eventual revisão externa, devendo sim ser submetida, como qualquer ato administrativo, a controle judicial, que não fica restrito à legalidade, mas também à legitimidade da decisão administrativa, de modo que "[...] o magistrado, quando provocado, pode apreciar todas as questões relacionadas com a legalidade, proporcionalidade, razoabilidade e adequação dos fundamentos aos fatos reais" (Couto, Reinaldo. Curso de Direito Administrativo. Disponível em: Minha Biblioteca, (4th edição). Editora Saraiva, 2019; pg. 867).
Aliás, reforça a doutrina especializada que a discricionariedade da autoridade administrativa, conceito no qual se insere aquele que preside o PAD, não é absoluta, estando também sujeita a controle do [...] a insindicabilidade [do mérito administrativo] não é absoluta, pois o E seguindo essa linha, o Superior , rel. Júlio César Machado Ferreira de Melo, Terceira Câmara Criminal, j. 02-05-2023 - grifou-se).
Logo, dadas tais particularidades, é incapaz de caracterizar como inidônea a decisão profligada, e por conseguinte de ser invalidada sob qualquer aspecto.
Destaca-se, acerca do assunto, precedentes desta Câmara Criminal (Agravo de Execução Penal n. 8001064-24.2024.8.24.0033, rel. Leopoldo Augusto Brüggemann, Terceira Câmara Criminal, j. 11-02-2025):
AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. IRRESIGNAÇÃO DA DEFESA CONTRA DECISÃO QUE AFASTOU O PEDIDO DE PRESCRIÇÃO E RECONHECEU A PRÁTICA DE FALTA GRAVE COM A REGRESSÃO DE REGIME. [...]
PLEITO DE RECONHECIMENTO DA NULIDADE DA DECISÃO HOMOLOGATÓRIA DO PAD, COM O RECONHECIMENTO DA PRÁTICA DO ATO FALTOSO POR FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA. NÃO OCORRÊNCIA. ATO JUDICIAL QUE REALIZA TÃO SOMENTE CONTROLE DE LEGALIDADE DO PROCEDIMENTO, SEM ADENTRAR NO MÉRITO. ADEMAIS, TESES DEFENSIVAS RECHAÇADAS, AINDA QUE DE FORMA INDIRETA. NULIDADE NÃO VERIFICADA.
REQUERIMENTO DE AFASTAMENTO DO ATO FALTOSO POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO LEGAL E INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA, COM A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. NÃO ACOLHIMENTO. RECUSA INJUSTIFICADA DO APENADO EM SE APRESENTAR AO TRABALHO QUE CARACTERIZA O ATO DESCRITO NO ART. 50, VI, C/C ART. 39, V, AMBOS DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. MANUTENÇÃO DA FALTA GRAVE QUE SE IMPÕE E, POR CONSEQUÊNCIA, IMPOSSIBILIDADE DE AFASTAMENTO DO ATO FALTOSO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
Afasta-se a preliminar arguida.
2. PAD n. 027/2025 (Seq. 22.1)
No mérito, busca a defesa a descaracterização da conduta faltosa, uma vez configurada a causa excludente de ilicitude prevista no art. 23, inciso II, do Código Penal, ante o reconhecimento da legítima defesa de terceiro (1.1).
Igualmente, sem razão.
Infere-se dos autos que a apenada cumpre pena privativa de liberdade total de 13 (treze) anos e 6 (seis) meses de reclusão, pela prática de crimes comum e hediondo, atualmente em regime fechado, com prognóstico de progressão ao semiaberto para 27.08.2029.
Nesse contexto, consta do Procedimento Administrativo Disciplinar que, no dia 24 de fevereiro de 2025, às 18h10min, durante o período de pátio da ala LGBT da galeria Bravo, no Presídio de Itajaí, ocorreu uma discussão entre as apenadas Madonna Pereira de Matos (registrada civilmente como Felipe Pereira de Matos) e Ana Paula Pereira Barbosa, ocasião em que Madonna puxou os cabelos da outra interna, sendo contida por demais reeducandos presentes. Em momento posterior, as apenadas Ana Paula, Gabrieli Pantoja (registrada civilmente como Marcio Danilo da Silva Pantoja) e Samantha da Silva (registrada civilmente como P. H. D. S.) dirigiram-se até Madonna e iniciaram agressões físicas, as quais foram interrompidas por outros internos que se encontravam no local.
Sobre o tema, o art. 52, da LEP, dispõe:
Art. 52 – A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório, ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado [...] Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003).
Ainda, o art. 129, do CP, prevê:
Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano.
No caso concreto, a infração disciplinar encontra-se materialmente comprovada por meio do Boletim de Ocorrência (fls. 10/11, Seq. 22.1) e do Laudo Pericial (fls. 44/46, Seq. 22.1), os quais evidenciam a existência de lesão corporal sofrida pela interna Madonna Pereira de Matos, compatível com o conflito ocorrido entre as apenadas durante o período de pátio na unidade prisional. Veja-se:
Superada essa questão, e com o objetivo de evitar tautologia, adotam-se como razões de decidir os trechos constantes do Procedimento Administrativo Disciplinar, extraídos da manifestação do Diretor da Penitenciária Masculina de Itajaí, que compilou de forma fidedigna os elementos relativos à materialidade e à autoria da infração disciplinar, in verbis (fls. 101-106 - Seq. 22.1):
"Segundo os documentos acostados, as apenadas incorreu no cometimento da falta grave PRATICAR FATO PREVISTO COMO CRIME DOLOSO, quando em data de quando na data de 24/02/2025, às 18h10min, durante o pátio de sol da ala LGBT da galeria Bravo, houve uma discussão entre a apenada Madonna e Ana Paula, tendo Madonna puxado os cabelos da apenada e contida pelos demais apenados. Posteriormente, as apenadas Ana Paula, Gabrieli e Samantha se dirigiram até a apenada Madonna, tendo iniciado agressões físicas, sendo as agressões interrompidas por outros apenados presentes no pátio, e retirada a apenada Madonna do local.
Fora juntado ao procedimento, as infrações cadastradas no SISP das apenadas, o Registro de Ocorrência, Boletim de Ocorrência e Guias de Perícia, Declarações de comparecimento no IGP, defesas a próprio punho das apenadas, Laudos de Corpo de Delito, e vídeos do fato.
Em 02/07/2025 foi realizada a oitiva na presença do Defensor Público Dr. Pedro Ramos Lyra da Silva, e Advogados Dr.Tiago Luiz Ventura OAB/PR 10.0732 Dra. Luany Camargo OAB/SC 43.558 e Dra. Adrielle de Souza Oliveira OAB/PR 98.784, gravada em meio audiovisual, a apenada Madonna manifestou que na data do fato estava sendo vítima de bullying, que as outras apenadas estava se achando por causa do cabelo delas e rindo de mim, que toma remédio controlado mas no dia não o utilizou, que surtou e foi de encontro a Ana Paula e falei “quero ver se você tem cabelo de verdade”, que a Ana Paula me chamou de “filha da puta” e acabei por arrancar os tic tacs do cabelo dela, que depois ela veio com as outras amigas dela para me bater, que um apenado me defendeu para que elas não me batessem,que foi discriminada sendo chamada de viadinho por não ter peito, que inclusive uma das apenadas tirou o sutiã e mostrou falando que teria peito, que quer levar adiante a homofobia e agressão sofrida, Dada a palavra a defesa da apenada esta falou que não havia tomado seu medicamento, que ao não tomar o medicamento não fica agressiva mas sofre, e inclusive surge vontade de atentar contra sua própria vida, que só foi me ofertada a medicação no outro dia. Dada a palavra ao Dr. Tiago, a apenada respondeu que um apenado lhe defendeu não tendo ninguém lhe acertado, que fez exame de corpo de delito, que já respondeu outro PAD contra seu próprio companheiro pela Ana Paula ter lhe seduzido. Dada a palavra ao Defensor Público e a Dra. Adrielle, ambos nada questionaram.
Já a apenada Samantha informou que na data do fato a apenada Madonna agrediu sua amiga, que a apenada surtou pois não aceitou o termino de seu relacionamento com seu antigo companheiro que estava atualmente com a Ana Paula, que não gostamos da atitude que ela fez com a Ana Paula. Dada a palavra a defesa esta nada questionou. Dada a palavra a Dra. Luany, a apenada respondeu que nunca houve ameaça ou bullying para com a Madonna, que falei para a Madonna que ela não precisava se humilhar por homem, que em todo o pátio ela queria avançar em cima da Ana Paula e nunca diminuímos ela. Dada a palavra ao Dr. Thiago e Dra. Adrielle estes nada questionaram.
Outrossim, a apenada Gabrielli declarou que na data do fato estávamos no pátio normalmente, que já estavam na Penitenciária a uma semana, que a apenada Madonna não aceitou o fim do relacionamento dela com seu antigo companheiro, que a Madonna tentou avançar em seu antigo companheiro mas não conseguiu agredi-lo sendo impedida pelo Gabriel, que a Madonna foi ao canto da quadra aonde estávamos falar com a Ana Paula e começou a acariciar o cabelo dela como se fosse amiga dela falando: “amiga ele não presta”, que a Madonna puxou o cabelo da Ana Paula tendo o arrancado e bateu a cabeça dela duas vezes na parede, que elas foram apartadas tendo o Gabriel puxado ela para a outra parede, que nesse momento ela começou a tirar sarro da minha amiga, que minha amiga foi para lá brigar com ela e eu fui lá separar, que não agredi a Madonna, que o fato se deu por ciúmes e não aceitar a situação, que a Madonna toma remédio controlado, que por várias vezes ela aprontou dentro da unidade sendo que por isso ela está na triagem sem convívio, que não houve ameaças ou bullying contra a Madonna, tanto que deixou a Madonna morar na mesma cela e por várias vezes ela só falava de seu antigo companheiro que atualmente não quer mais ela e sim sua amiga Ana Paula. Dada a palavra a defesa, Defensor Público e Advogados Dr. Thiago e Dra. Luany, estes nada questionaram.
Por fim, a apenada Ana Paula depôs que uma apenado estava namorando a Madonna e por ela ser agressiva acabou por terminar com ele, que ao chegar na cela por ambos estarem solteiros acabaram se envolvendo sendo que a Madonna não aceitou, que a apenada começou a proferir xingamentos, que nos primeiros pátios conversou com ela, que em um pátio ela chegou a questiona-lo se ele estaria comigo e ao confirmar a Madonna o agrediu, que as câmeras pegaram e não sabe o que houve acerca disso, que na data do fato estávamos no pátio e a Madonna já namorava outra pessoa, que a Madonna veio pra cima do meu companheiro e tentou agredi-lo, que fui para o lado do pátio sentar com pinhas amigas,que como a Madonna não conseguiu agredir ele ela foi para cima de mim como se quisesse conversar e pedir desculpas, que ela agarrou meu cabelo e me deu socos no rosto, que o pessoal do pátio separou, que não agredi ela sendo que o próprio namorado dela separou, que nunca ameacei ou fiz bullying com ela, que sempre tentei levantar a autoestima dela para que ela não ficasse se humilhando por homem, que o fato ocorreu por ciúmes, que vários outros fatos aconteceram dentro da Unidade por causa dela tendo perdido o convívio nas três celas LGBT, que a Madonna já teve várias chances na galeria mas perdeu pelas atitudes dela, que o histórico dela não é dos melhores tendo inclusive agredido e rasgado a camisa de supervisor, que sabe que ela usava medicação mas não sabe se na data do fato ela tomou pois ela normalmente jogava fora, bem como porque não estava na mesma cela que ela, que não agredi a Madonna e não sabe quem a agrediu. Dada a palavra a defesa, Defensor Público e Advogadas Dra. Adrielle e Dra. Luany, estes nada questionaram.
Em 02/07/2025, o Conselho Disciplinar manifestou-se pela PROCEDÊNCIA do Processo Administrativo Disciplinar em face dos apenados, diante da comprovação de autoria da Falta Grave.
A defesa da apenada Samantha, fez suas alegações em 07/07/2025, requerendo a não caracterização da falta grave diante o reconhecimento da excludente de ilicitude de legítima defesa de terceiro Já a defesa da apenada Gabrieli, proferiu alegações em 08/07/2025, requereu a nulidade do procedimento pela ausência de individualização da conduta, que a apenada Gabrieli teria agido apenas com o intuito de apartar a briga não havendo intenção de proferir agressões e subsidiariamente requereu a desclassificação da conduta para a falta média diante o princípio da proporcionalidade. Outrossim a defesa da apenada Ana, apresentou suas alegações em 16/07/2025, e requereu a improcedência do PAD em seu desfavor diante a fragilidade das provas apresentadas, bem como diante vídeo anexado a apenada Ana figuraria como vítima no procedimento. Por fim a defesa da apenada Madonna, em 18/07/2025 manifestou em suas alegações pelo arquivamento do procedimento uma vez que a apenada seria usuária de medicamentos controlados, e por não tê-los recebidos pela Unidade teriam desencadeado a situação, subsidiariamente requereu a desclassificação para a falta de natureza média/leve.
[...]
Conforme consta nos Laudos Periciais nº 2025.08.03351.25.003-88 e 2025.08.03351.25.001-44, a ofensa à integridade física das autoras/vítimas Ana Paula e Madonna, ficaram comprovadas, e de acordo com o vídeo juntado não há como se falar de legítima defesa, nem mesmo de terceiros, porquanto após agressão de Madonna para com Ana Paula estas foram separadas pelos demais apenados, tendo Ana Paula, Gabrieli e Samantha se reunido para com desígnio de esforços agredir Madonna, momento em que esta já havia cessado as agressões, configurando assim esta atitude como evidente excesso de conduta (fato este omitido pela defesa de Ana Paula).
Ademais, denota-se no depoimento das apenadas que as agressões teriam ocorrido por divergências das reeducadas, seja ciúmes por parte da apenada Madonna para com Ana Paula, ou seja por bullying de Ana Paula, Gabrieli e Samantha para com a Madonna, o que de igual modo não exime nenhuma delas das penalidades aplicáveis ao caso.
Outrossim, verifico que resta devidamente individualizada a conduta de cada apenada na prática da falta grave, em especial pelos vídeos juntados no procedimento no qual é possível identificar cada apenada e suas respectivas atitudes, motivo pelo qual não considero nulo o presente procedimento.
Quanto ao requerimento de desclassificação da conduta para a falta média/leve, entendo que este não merece acolhimento porquanto as condutas praticadas pelas apenadas encontra-se amoldada no rol taxativo do art. 50 da Lei de Execução Penal, não sendo possível sua desclassificação diante as provas incontestes obtidas no presente procedimento.
De mesmo modo, ressalto que embora a apenada Madonna utilize medicamentos na Unidade prisional, atribuir eventual falta dos mesmos (sem provas), bem como culpa à Unidade por retirar todos os apenados para o pátio em conjunto constitui completa inversão da responsabilidade aqui apurada, uma vez que todos os apenados tratam-se de público LGBT+, não havendo até o momento do fato qualquer informação de que não possuíssem convívio entre si, eis que até então pertenciam a mesma galeria.
Assim, se faz necessário que a conduta de todas as apenadas sejam repreendidas, pois suas atitudes demonstram um descaso para com o cumprimento de suas reprimendas, evidenciando um total desrespeito à lei, às normas deste estabelecimento prisional, bem como, com o objetivo finalístico da pena que lhe foi aplicada, deixando visivelmente caracterizado, não estar preparado para o retorno ao convívio com a sociedade.
Por todo o exposto, pode-se concluir que ordenamento jurídico possibilita a regressão de regime, caso as condenadas não se adaptem ao regime menos gravoso, demonstrando assim, a inexistência de sua reintegração social; e que o referido instituto traz a definição legal e condutas ensejadoras de aplicação nos artigos 118 e 50, ambos da Lei nº 7.210/84, bem como, que antes de decretar tal medida, deve-se proceder a prévia oitiva das condenadas.
Por fim, conclui-se que a regressão de regime nestes casos é de suma importância, pois a aceitação de condutas desajustadas fragiliza a credibilidade dos institutos da prevenção e defesa social e ferem os escopos da execução penal, trazidos no art. 1º da supramencionada legislação.
III - DISPOSITIVO
Diante do exposto JULGO PROCEDENTE o presente Processo Administrativo Disciplinar em face das apenadas ANA PAULA PEREIRA BARBOSA - IPEN 854884, MADONNA PEREIRA DE MATOS - IPEN 813787, GABRIELI PANTOJA - IPEN 854939 e SAMANTHA DA SILVA - IPEN 762315, pelo cometimento de falta considerada grave: NOVO CRIME de acordo com o que estabelece o artigo 52 da Lei de Execução Penal."
Como se observa, o Conselho Disciplinar emitiu parecer reconhecendo a prática da falta grave (fls. 64/66, Seq. 22.1). Na sequência, verifica-se que, durante a apuração na esfera administrativa, foram devidamente respeitados os princípios do contraditório e da ampla defesa, conforme demonstra a apresentação de defesa escrita pela apenada (fls. 72/77, Seq. 22.1). Posteriormente, o Diretor da Penitenciária de Itajaí julgou procedente o Procedimento Administrativo Disciplinar em relação às apenadas Ana Paula Pereira Barbosa, Madonna Pereira de Matos, Gabrieli Pantoja e Samantha da Silva (fls. 101/106, Seq. 22.1). Encerrada a instrução, as partes apresentaram alegações finais por meio de memoriais (Seq. 26.1 e 30.1).
Por fim, em 18.08.2025 (Seq. 34.1), a Magistrada homologou o PAD n. 027/2025 e reconheceu a prática de falta grave.
Como se vê, a decisão revela-se idônea.
Há nos autos elementos probatórios suficientes para a caracterização da falta grave, conforme o conjunto de provas reunido no Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD n. 027/2025).
A materialidade e a autoria estão devidamente demonstradas, restringindo-se a controvérsia à tese defensiva de excludente de ilicitude, fundada na alegação de legítima defesa de terceiro.
No caso em análise, embora a defesa da reeducanda Samantha tenha sustentado que esta “não participou da briga, limitando-se a conter a apenada Ana Paula e a afastá-la da confusão”, tal versão não encontra respaldo na prova dos autos.
A partir da análise das imagens constantes do Procedimento Administrativo Disciplinar (Seq. 22.6 e 22.7), observa-se que Samantha, antes de conter Ana Paula, participou ativamente das agressões contra a apenada Madonna, desferindo-lhe golpes com as mãos e empurrões. Apenas após essa sequência é que Ana Paula surge na cena, sendo contida por Samantha, o que evidencia que sua atuação agressiva precedeu qualquer tentativa de contenção. Veja-se:
Inclusive, sobre o tema, bem elucidou a Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Procurador de Justiça Dr. Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti (7.1 - grifou-se):
"A decisão administrativa (SEEU, Seq. 22.1, p. 105) demonstrou de forma clara por que a legítima defesa não se aplica. Segundo os laudos periciais e o vídeo do ocorrido, a integridade física das vítimas Ana Paula e Madonna foi comprovada. Contudo, as agressões das acusadas Ana Paula, Gabrieli e Samantha contra Madonna ocorreram em um momento posterior, após as partes terem sido separadas.
Essa atitude demonstra um evidente excesso de conduta, visto que as agressões de Madonna já haviam cessado.
Além disso, os depoimentos das próprias acusadas indicaram que a briga foi motivada por questões pessoais (ciúmes ou bullying), o que não justifica a aplicação de qualquer excludente de ilicitude, razão pela qual não há respaldo probatório para a tese defensiva.
Assim sendo, ao que se nos afigura, a decisão impugnada deve ser mantida, nos seus exatos termos, por seus próprios e jurídicos fundamentos".
Diante desse contexto, o reconhecimento da infração disciplinar prevista no artigo 52 da Lei de Execução Penal encontra respaldo nos elementos constantes dos autos, os quais se revelam aptos e suficientes para afastar a tese defensiva de excludente de ilicitude (art. 23, inciso II, do Código Penal), uma vez que é inconteste a participação da reeducanda Samantha da Silva nas agressões perpetradas contra a interna Madonna Pereira de Matos.
A propósito, em caso análogo — inclusive referente ao mesmo Procedimento Administrativo Disciplinar nº 027/2025 e envolvendo outra interna participante da mesma ocorrência — este TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Agravo de Execução Penal Nº 8001783-69.2025.8.24.0033/SC
RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA
EMENTA
AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. DECISÃO QUE HOMOLOGOU O PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR Nº 027/2025 E RECONHECEU A PRÁTICA DE FALTA GRAVE, CONSISTENTE NO COMETIMENTO DE NOVO CRIME DOLOSO (ART. 52 DA LEP). RECURSO DA DEFESA.
PRELIMINAR. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA DECISÃO EM RAZÃO DA INAFASTABILIDADE DE APRECIAÇÃO JUDICIAL E DA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO SUBSTANTIVA. DESCABIMENTO. DECISÃO CONCISA E IDÔNEA, FUNDAMENTADA COM BASE NOS ELEMENTOS CONSTANTES DO PAD. EMBORA O JUÍZO DA EXECUÇÃO TENHA COMPETÊNCIA PARA O CONTROLE JUDICIAL DO MÉRITO, NÃO SE EXIGE FUNDAMENTAÇÃO EXAUSTIVA QUANDO PRESENTES ELEMENTOS CONCRETOS. PREFACIAL AFASTADA.
MÉRITO. PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DA FALTA GRAVE, SOB A ALEGAÇÃO DE INCIDÊNCIA DA EXCLUDENTE DE ILICITUDE DA LEGÍTIMA DEFESA DE TERCEIRO. INSUBSISTÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS POR LAUDOS PERICIAIS, REGISTROS DE OCORRÊNCIA, VÍDEOS E DEPOIMENTOS. EXCLUDENTE NÃO CONFIGURADA. CONDUTA INDIVIDUALIZADA E COMPATÍVEL COM A FALTA GRAVE. INEXISTÊNCIA DE NECESSIDADE DE OFERECIMENTO DE DENÚNCIA PARA CONFIGURAÇÃO DA FALTA DISCIPLINAR. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS ESFERAS PENAL E ADMINISTRATIVA. DECISÃO MANTIDA. PRECEDENTES.
RECURSO CONHECIDO, PRELIMINAR AFASTADA E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Câmara Criminal do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso, afastar a preliminar, e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de novembro de 2025.
assinado por ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6920250v6 e do código CRC 24bb044b.
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Signatário (a): ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA
Data e Hora: 11/11/2025, às 16:48:12
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 11/11/2025
Agravo de Execução Penal Nº 8001783-69.2025.8.24.0033/SC
RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA
PRESIDENTE: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN
PROCURADOR(A): EDUARDO PALADINO
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 11/11/2025, na sequência 30, disponibilizada no DJe de 27/10/2025.
Certifico que a 3ª Câmara Criminal, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª CÂMARA CRIMINAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO, AFASTAR A PRELIMINAR, E NEGAR-LHE PROVIMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA
Votante: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA
Votante: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN
Votante: Desembargador Substituto LEANDRO PASSIG MENDES
POLLIANA CORREA MORAIS
Secretária
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