Relator: Desembargadora MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA
Órgão julgador:
Data do julgamento: 11 de julho de 1984
Ementa
RECURSO – Documento:6829089 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5001750-49.2019.8.24.0031/SC RELATORA: Desembargadora MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA RELATÓRIO Trata-se de apelação cível interposta por Brasilux Indústria e Comércio Importação e Exportação Ltda. e pelo Estado de Santa Catarina contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Indaial que, na ação indenizatória trabalhista ajuizada por L. F. M. B. (sucedido pela companheira e pelos filhos) em desfavor dos recorrentes, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos:
(TJSC; Processo nº 5001750-49.2019.8.24.0031; Recurso: RECURSO; Relator: Desembargadora MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 11 de julho de 1984)
Texto completo da decisão
Documento:6829089 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5001750-49.2019.8.24.0031/SC
RELATORA: Desembargadora MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta por Brasilux Indústria e Comércio Importação e Exportação Ltda. e pelo Estado de Santa Catarina contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Indaial que, na ação indenizatória trabalhista ajuizada por L. F. M. B. (sucedido pela companheira e pelos filhos) em desfavor dos recorrentes, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos:
Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pelo autor, a fim de condenar, solidariamente, os requeridos ao pagamento de: a) R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a título de danos morais, a ser atualizado monetariamente a contar deste julgamento (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros moratórios a contar do evento danoso (10-11-2017 - Súmula 54 do STJ); b) R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a título de danos estéticos, a ser atualizado monetariamente a contar deste julgamento (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros moratórios a contar do evento danoso (10-11-2017 - Súmula 54 do STJ). Os valores serão atualizados nos termos da fundamentação.
Diante da sucumbência mínima condeno os requeridos ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, e 86, parágrafo único do Código de Processo Civil. Ente público isento de custas (art. 7°, I, da Lei n. 17.654/2018).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, inexistindo outras providências, arquivem-se com as devidas baixas (evento 59, SENT1 e evento 72, SENT1).
Em suas razões, a empresa apelante sustenta, em síntese, a inexistência de responsabilidade, tanto pela ausência de vínculo empregatício com a vítima quanto pela existência de convênio com a unidade penitenciária, em que esta assume integralmente a responsabilidade pela fiscalização das atividades. No mérito, discorre sobre a falta de autonomia na entrega dos equipamentos de segurança aos apenados, na fiscalização da utilização e, também, na transmissão eficaz do treinamento passado à pessoa que, escolhida pelo responsável da unidade, detinha a função de ensinar os internos. No mais, assevera que a narrativa inicial de que o acidente ocorreu na tentativa de destravar a máquina resulta na confissão de culpa da vítima, pois ultrapassou os limites da função para a qual foi designada.
Assim, requer o afastamento da condenação solidária e, por conseguinte, o direcionamento integral da responsabilidade, na forma objetiva, ao Estado, ou, subsidiariamente, a redução da condenação para que não ultrapasse o montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais) (evento 83, APELAÇÃO1).
O ente público, por sua vez, assevera que o incidente se originou em decorrência de falha mecânica na maquina pertencente à empresa ré, o que o exime da responsabilidade, que deve ser direcionada à empresa privada, não fosse a participação fundamental da vítima ao tentar destravar a máquina, realizando tarefa que não era de sua competência, atraindo para si a culpa pelo resultado do acidente. Assim, requer o afastamento da condenação, ou, subsidiariamente, a redução do valor para o importe de R$ 5.000,00, além da incidência da Taxa Selic somente a partir da data do arbitramento do dano moral/estético, sob pena de infração à súmula n. 362 do STJ.
Apresentadas as contrarrazões (evento 89, CONTRAZAP1), sobreveio parecer ministerial, manifestando-se pela desnecessidade de intervenção no feito (evento 27, PROMOÇÃO1).
É o relatório.
VOTO
L. F. M. B. ajuizou ação indenizatória trabalhista em desfavor de Brasilux Indústria e Comércio Importação e Exportação Ltda. e do Estado de Santa Catarina em razão dos danos experimentados em acidente ocorrido nas dependências da Unidade Prisional Avançada de Indaial, na época em que cumpria pena e prestava serviço para a empresa requerida, objetivando a condenação dos demandados ao pagamento de danos morais e estéticos.
A sentença foi de parcial procedência, à razão da interposição de recursos de apelação pelos requeridos, que serão analisados conjuntamente.
1. Da legitimidade da tomadora de serviço
Dos elementos constantes nos autos, é incontroversa a existência de convênio firmado entre a empresa demandada e o Estado de Santa Catarina, com o propósito de empregar mão de obra carcerária, visando a reintegração social dos apenados e a remição da pena.
Em decorrência desse ajuste, a empresa assumiu compromissos expressos, especialmente no que tange à segurança e às condições estruturais das atividades laborais desempenhadas pelos internos.
Na condição de beneficiária direta dos serviços prestados pelos detentos, a empresa conveniada se tornou responsável pela disponibilização dos equipamentos de proteção individual adequados, bem como pelas ferramentas, insumos e assistência técnica necessários à realização segura das tarefas, in verbis:
CLÁUSULA QUARTA - DAS OBRIGAÇÕES BRASILUX INDÚSTRIA COMÉRCIO IMPORTAÇÃO EXPORTAÇÃO LTDA (TASCHIBA)
I - Promover a instalação da unidade de trabalho prevista na Cláusula terceira.
II - Fornecer todos os móveis, equipamentos, utensílios e matéria prima, necessários à fabricação ou transformação dos produtos.
III - Efetuar o pagamento da remuneração dos reeducandos de acordo com os artigos 29 e 138 da Lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984 - Lei das Execuções Penais, na ordem de 01 (um) salário mínimo vigente no país;
IV - Dar assistência técnica aos reeducandos, de acordo com suas necessidades no desenvolvimento das tarefas, proporcionando-lhes um bom ambiente de trabalho.
V - Manter a unidade abastecida de matéria-prima para execução do trabalho e o bom funcionamento da unidade;
[...]
IX - Indicar pessoas de seu quadro funcional que farão contato com a administração do presídio, levando e retirando produtos, fazendo manutenção do equipamento, com antecedência mínima de 48 horas por escrito; (fls. 28 a 33, evento 12, ANEXO5, grifou-se).
A aludida cláusula deixa clara a extensão da influência exercida pela empresa na organização e gestão do ambiente laboral, demonstrando a responsabilidade compartilhada na oferta de condições para "um bom ambiente de trabalho" e para "o bom funcionamento da unidade", o que inclui, certamente, pelo caráter da atividade desenvolvida, à observância das normas de segurança e à prevenção de acidentes.
Nesse contexto, torna-se indiscutível a legitimidade passiva ad causam da pessoa jurídica para responder à pretensão indenizatória, uma vez que o acidente descrito na inicial teria ocorrido no âmbito da atividade executada sob a responsabilidade técnica e operacional da empresa parceira.
E, ainda que o apenado estivesse sob custódia estatal, o evento danoso teria ocorrido à luz de uma relação triangular, na qual a empresa se beneficiou da força de trabalho disponibilizada e, em contrapartida, assumiu obrigações correlatas, inclusive a de preservar a integridade física dos trabalhadores no manuseio do maquinário disponibilizado.
Logo, considerando que a causa de pedir se ampara em suposta precariedade da segurança do local de trabalho e na falta de oferta de equipamentos apropriados, é legítima a empresa corré para compor o polo passivo da presente ação, na condição de corresponsável pelos prejuízos alegadamente sofridos pelo reeducando durante a execução das atividades para as quais foi contratado.
No mesmo sentido, colhe-se da jurisprudência desta Corte:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRABALHO COM DETENTO NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PRISIONAL. AMPUTAÇÃO PARCIAL DE UM QUIRODÁCTILO E PERDA DA MOBILIDADE DE OUTRO. REDUÇÃO DEFINITIVA DA CAPACIDADE LABORAL. CONVÊNIO FIRMADO ENTRE O ESTADO E A EMPRESA PRIVADA CORRÉ PARA A UTILIZAÇÃO DA MÃO-DE-OBRA DE SEGREGADOS. LEGITIMIDADE PASSIVA DESTA PATENTEADA. RESPONSABILIDADE CIVIL CONFIGURADA. DANO MORAL POSITIVADO. QUANTUM ELASTECIDO. PENSÃO MENSAL VITALÍCIA DEVIDA. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DESTA COM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RECURSO DA EMPRESA DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR PROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0000577-13.2014.8.24.0076, de Turvo, rel. João Henrique Blasi, Segunda Câmara de Direito Público, j. 28-05-2019).
Dito isso, rejeita-se a preliminar aventada.
2. Da legitimidade do Estado
O Estado, na condição de responsável pela custódia do apenado, possui o dever legal de proporcionar condições dignas para o cumprimento da pena de restrição de liberdade, o que abrange "o respeito à integridade física e moral", conforme estabelece o art. 5º, XLIX, da CF.
O referido dever não se extingue, ou se transfere a outrem, quando há delegação da atividade laboral do apenado a terceiros, pois a atuação da empresa privada deve estar sob à vigilância permanente do ente estatal, que se mantém no encargo de assegurar que o exercício do trabalho ocorra dentro dos parâmetros legais de adequação e segurança.
Nesses termos, há entendimento consolidado neste Egrégio Tribunal no sentido de reconhecer que, mesmo na hipótese de formalização de convênio com entidade privada - com o objetivo de promover a ressocialização de apenados por meio da ocupação laboral -, subsiste a responsabilidade do Estado, sendo inevitável a sua manutenção no polo passivo da ação indenizatória dessa espécie.
Veja-se:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRABALHO OCORRIDO NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PRISIONAL. APENADO QUE TEVE SEU DEDO AMPUTADO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. RESPEITO À INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL DO PRESO QUE CONSTITUI DEVER DO ESTADO. ART. 5º, XLIX DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PROEMIAL DE NULIDADE QUE NÃO PROSPERA. PARTE CIENTIFICADA A RESPEITO DA PERÍCIA QUE NÃO SE FEZ PRESENTE INJUSTIFICADAMENTE. OMISSÃO ESTATAL QUANTO À SUPERVISÃO TÉCNICA, TREINAMENTO PRÉVIO E FORNECIMENTO DE MATERIAL ADEQUADO. RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DO ESTADO CONFIGURADA. ADEQUAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO ATINENTE À DANOS MORAIS E ESTÉTICO. MAJORAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. MANUTENÇÃO DIANTE DAS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. RECURSO DO ESTADO DE SANTA CATARINA DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0304635-66.2015.8.24.0038, do , rel. Sérgio Roberto Baasch Luz, Segunda Câmara de Direito Público, j. 06-08-2024, grifou-se).
DIREITO ADMINISTRATIVO E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO E DE EMPRESA CONVENIADA. ACIDENTE DE TRABALHO ENVOLVENDO DETENTO. DANO MORAL, DANO ESTÉTICO E PENSÃO VITALÍCIA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA RECONHECIDA. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO.
[...]
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A legitimidade passiva da empresa e do Estado resta evidenciada diante do convênio que estabelece obrigações específicas de segurança, fiscalização e fornecimento de EPIs, sendo ambos corresponsáveis pelo ambiente laboral dos reeducandos.
4 O Estado mantém responsabilidade mesmo diante da delegação de tarefas à iniciativa privada, pois a custódia impõe dever constitucional de garantir a integridade física e moral do preso (CF/1988, art. 5º, XLIX).
5. A responsabilidade da empresa decorre da omissão em cumprir obrigações contratuais relacionadas à segurança, não tendo comprovado fornecimento de EPIs ou treinamento adequado.
6. A responsabilidade solidária entre Estado e empresa se justifica pela atuação conjunta na execução do programa de ressocialização por meio de trabalho prisional, com omissões recíprocas que contribuíram para o dano.
[...] (TJSC, Apelação n. 5005643-72.2019.8.24.0023, do , rel. Sandro Jose Neis, Terceira Câmara de Direito Público, j. 01-07-2025, grifou-se).
APELAÇÕES SIMULTANEAMENTE INTERPOSTAS. PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO AJUIZADA CONTRA O ESTADO DE SANTA CATARINA EM 22/09/2020. VALOR ATRIBUÍDO À CAUSA: R$ 50.000,00. ACIDENTE OCORRIDO COM DETENTO, ENQUANTO LABORAVA NA PENITENCIÁRIA DE SÃO CRISTÓVÃO DO SUL. CORTE EM SERRA DE MÁQUINA PLAINA, QUE OCASIONOU A AMPUTAÇÃO DO DEDO INDICADOR DA MÃO DIREITA. OBJETIVADA REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS, ESTÉTICOS E PENSÃO MENSAL VITALÍCIA. VEREDICTO DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. PRELIMINAR. ALEGADA ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. SUSCITADA RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA. RECHAÇO. CONVÊNIO FIRMADO POR SCS MADEIRAS EIRELI-ME. COM O ESTADO DE SANTA CATARINA, QUE NÃO TRANSFERE PARA A MADEIREIRA O DEVER DE GARANTIR A INTEGRIDADE FÍSICA DO DETENTO. PRECEDENTES.
"Conquanto tenha o Estado assinado convênio com empresa privada para oportunizar trabalho e recuperação social aos sentenciados de penitenciária, é ele parte legítima para figurar no polo passivo de demanda tendente ao ressarcimento de danos decorrentes de acidente no trabalho exercido por apenado, máxime porque, de forma expressa, 'é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral' (art. 5º, inc. XLIX, da Constituição Federal). Assim, dada a atitude omissiva do estado, substanciada pela não-capacitação e pelo não-fornecimento de equipamentos de segurança ao detento vitimado, sobeja manifesto o dever de indenizar a vítima (AC n. 2009.035456-0, de São Carlos, rel. Des. João Henrique Blasi, j. 17-7-2012)" (TJSC, Apelação n. 0302549-26.2017.8.24.0015, rel. Des. Diogo Pítsica, Quarta Câmara de Direito Público, j. em 10/11/2022) [...] (TJSC, Apelação n. 5021449-31.2020.8.24.0018, do , rel. Luiz Fernando Boller, Primeira Câmara de Direito Público, j. 08-08-2023, grifou-se).
Logo, o Estado deve ser mantido no polo passivo.
3. Da responsabilidade pelo evento danoso
3.1 Do Estado
Inicialmente, acerca da responsabilidade civil do Estado, necessário destacar que o art. 43 do CC, assim dispõe:
Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.
No ponto, o art. 37, § 6º, da CF disciplina que "as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".
Está-se diante da teoria do risco administrativo, em que há responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito público e de direito privado prestadoras de serviço público pelos atos comissivos dos seus agentes, de modo que a obrigação de indenizar prescinde da comprovação dos elementos subjetivos (dolo ou culpa).
Todavia, em relação à conduta omissiva, a doutrina e a jurisprudência adotam a teoria da culpa anônima do Estado (ou da falta do serviço). Nesse caso, a responsabilidade do Estado estará evidenciada se ficar demonstrado que o serviço público não funcionou, funcionou tardiamente ou funcionou de maneira ineficiente.
No caso, constatando-se a prática de conduta omissiva, há duas hipóteses distintas a serem consideradas, a primeira trata da omissão genérica, enquanto a segunda se refere à omissão específica.
Enquanto o dano resultante de omissão genérica do ente público demanda a incidência da teoria da responsabilidade subjetiva, tratando-se da omissão específica, a responsabilidade civil do Estado é objetiva, uma vez que decorre do seu dever de agir para evitar o dano, porquanto se caracteriza pela inércia do Poder Público diante de um dever individualizado de agir para impedir um resultado, respondendo, então, pelos prejuízos provenientes da sua inatividade independentemente de culpa.
Para melhor elucidar a questão, transcreve-se da lição de Sérgio Cavalieri Filho:
Haverá omissão específica quando o Estado, por omissão sua, crie a situação propícia para a ocorrência do evento em que tinha o dever de agir para impedi-lo. Assim, por exemplo, se o motorista embriagado atropela e mata pedestre que estava na beira da estrada, a Administração (entidade de trânsito) não poderá ser responsabilizada pelo fato de estar esse motorista ao volante sem condições. Isso seria responsabilizar a administração por omissão genérica. Mas se esse motorista, momentos antes, passou por uma patrulha rodoviária, teve seu veículo parado, mas os policiais, por alguma razão, deixaram-no prosseguir viagem, aí já haverá omissão específica que se erige em causa adequada do não-impedimento do resultado. (Programa de Responsabilidade Civil. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 261).
Portanto, incide sobre a causa a responsabilidade da administração pública na forma objetiva, assentada na teoria do risco administrativo e, assim sendo, resta necessário perquirir a existência de três elementos, quais sejam, (i) a conduta, (ii) o dano e (iii) o nexo de causalidade entre eles, sendo dispensável a comprovação de elementos subjetivos, como o dolo e a culpa, para o fito de ensejar a responsabilidade estatal.
Pois bem.
Quanto às circunstâncias, é incontroverso que o ocorrido se deu no interior da unidade prisional, e que no momento do incidente o apenado operava maquinário de propriedade da empresa conveniada.
O laudo pericial de fl. 5 do evento 1, ANEXO6, elaborado pelo Instituto Geral de Perícias, na época do fato, confirma a lesão "no segundo quirodáctilo direito, com redução do tamanho compatível com amputação da falange distal. Apresenta então lesão corto-contusa recente, com amputação de parte do segundo dedo da mão direita", o que corresponde à amputação da ponta do dedo indicador da mão direita.
E, ainda que se admita que a vítima tenha tentado destrancar a máquina - função que, em tese, não lhe incumbia - , é certo que o instrumento, mesmo no seu uso habitual, detinha potencial lesivo, e que, segundo a testemunha Antônio Ramon Fotela São Martim, também recolhido na penitenciária na época dos fatos, o autor não estaria usando luva ou outro equipamento de segurança.
No ponto, impende salientar que a oferta de EPI's, e o uso adequado dos equipamentos, é regulamentado pela legislação trabalhista, sendo encargo do Estado, a fiscalização da aludida rotina, no exercício do seu dever de garantir a segurança dos internos.
No mais, sabe-se, também, que a intermediação da relação entre a empresa e o apenado/trabalhador se dava inteiramente sob o crivo dos funcionários da unidade carcerária, de modo que cabia ao Estado garantir a oferta de supervisão técnica aos trabalhadores, evitando que excedessem suas obrigações, seja por ausência de treinamento ou por falta de alguém a quem pudessem reportar eventual problema na máquina.
E, conforme depoimento da testemunha Nelson Leitzke, funcionário da tomadora de serviço, não havia contato entre os apenados e os operadores técnicos da empresa, de modo que o treinamento era passado para um coordenador da unidade prisional, que transmitia para um detento, e esse último repassava as orientações aos demais, o que evidencia a ausência de supervisão e acompanhamento técnico adequados durante o funcionamento dos equipamentos.
Diante desse contexto, verifica-se a ocorrência de falha no cumprimento do dever de fiscalização quanto às obrigações assumidas pela empresa conveniada, o que configura omissão relevante por parte do Estado e enseja sua responsabilização objetiva.
3.2 Da empresa
Para a análise da responsabilidade da empresa, necessário, inicialmente, destacar a disposição contida no art. 28 e incisos, da Lei de Execução Penal:
Art. 28. O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.
§ 1º Aplicam-se à organização e aos métodos de trabalho as precauções relativas à segurança e à higiene.
§ 2º O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho.
Logo, a atividade desenvolvida no interior da unidade prisional é regulamentada não só com a finalidade de assegurar o propósito da pena, mas também de proteger os direitos fundamentais do apenado no exercício voluntário do labor.
No mais, a legislação supra mencionada, em seu art. 34 e incisos, dispõe não só sobre a possiblidade de execução do trabalho prisional por meio de convênio com entidade da iniciativa privada, mas também sobre a responsabilidade da empresa tomadora de serviço na supervisão da produção:
Art. 34. O trabalho poderá ser gerenciado por fundação, ou empresa pública, com autonomia administrativa, e terá por objetivo a formação profissional do condenado.
§ 1o. Nessa hipótese, incumbirá à entidade gerenciadora promover e supervisionar a produção, com critérios e métodos empresariais, encarregar-se de sua comercialização, bem como suportar despesas, inclusive pagamento de remuneração adequada. (Renumerado pela Lei nº 10.792, de 2003)
§ 2o Os governos federal, estadual e municipal poderão celebrar convênio com a iniciativa privada, para implantação de oficinas de trabalho referentes a setores de apoio dos presídios. (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003)
Na hipótese, como já consignado, o termo de convênio juntado aos autos (fls. 28 a 33, evento 12, ANEXO5) atribuiu à empresa obrigações específicas, destacando-se, entre elas, o fornecimento de equipamentos necessários ao desenvolvimento da atividade, os quais, a luz da legislação trabalhista, são todos aqueles destinados à proteção individual (EPIs), bem como as ferramentas, matérias-primas e demais insumos, além da prestação de assistência técnica aos reeducandos.
A aludida obrigação adquire especial relevância diante da declaração da testemunha Nelson Leitzke quanto ao conhecimento da empresa do número de apenados em atividade, em contraponto à declaração da testemunha Antônio Ramon Fotela São Martim, sobre a ausência de oferta de equipamentos de segurança suficientes para todos.
Dito isso, necessário ressaltar que, apesar da observação da testemunha Nelson Leitzke no sentido de que eram enviados equipamentos de segurança de acordo com a requisição do presídio, é certo que a empresa, por ser detentora do conhecimento técnico sobre o potencial lesivo das máquinas e da natureza do trabalho desenvolvido, além de ter ciência do número de pessoas em atividade, tinha a obrigação, estipulada no convênio, de promover a entrega do material adequado e suficiente aos reeducandos.
Destaca-se que na "ficha de controle de equipamento de proteção individual", - que registra a entrega dos equipamentos na unidade prisional de julho de 2012 a janeiro de 2020 - , há menção da entrega de 01 "luva anti-corte" em 13-11-2014, 3 anos antes do incidente, e o equipamento só reaparece na listagem em 29-01-2018, data posterior ao acidente do autor (evento 12, ANEXO4).
Assim, dada a natureza da lesão do autor - corte/amputação de parte do dedo - , em tese, o uso do referido equipamento poderia ter impedido ou atenuado o resultado, e a ausência de disponibilização revela grave descumprimento contratual e negligência quanto à proteção da integridade física do trabalhador.
Impende salientar, ainda, que segundo a testemunha Antônio Ramon Fotela São Martim, a máquina manuseada pelo autor apresentava defeito constantemente e, mesmo com a manutenção periódica, tal situação não se resolvia, o que foi confirmado pelo policial penal Edjalmo Cardoso, que apesar de trabalhar em outro setor, declarou que ouvia falar que a máquina dava muito problema.
No mais, como dito alhures, foi confirmado pelo próprio funcionário da empresa requerida a ausência de treinamentos específicos e periódicos de fiscalização ou de rotinas de capacitação, revelando conduta omissiva que reforça o nexo causal entre sua inércia e o acidente ocorrido.
Faz-se necessário ressaltar que, eventualmente, se determinada atividade demandasse controle mais rígido da operação, cabia a empresa informar à unidade, e juntas deveriam entrar em um consenso sobre a rotina de capacitação e realização do serviço, não podendo a empresa se eximir da responsabilidade apenas alegando ausência de autonomia.
Logo, é inadmissível o acolhimento da tese de culpa exclusiva do autor, ou contribuição, ainda que mínima, para o ocorrido, pois além de não haver comprovação de que lhe foram oferecidos os equipamentos de segurança necessários, bem como realizada a fiscalização adequada, também não há evidências de que o autor tenha recebido orientação suficiente sobre o manuseio da máquina.
A contrário sensu, a prova testemunhal confirma a conduta omissiva, o que ratifica a conclusão de que a empresa contribuiu para o evento danoso ao permitir a realização das atividades laborais sem treinamento específico e supervisão contínua e adequada, tampouco com o fornecimento efetivo dos instrumentos de segurança exigidos, evidenciando falha no cumprimento das obrigações contratuais assumidas, restando caracterizada a culpa por omissão da empresa no caso em análise.
3.3 Da solidariedade
Acerca da questão, observa-se que, embora o art. 265 do CC disponha que "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes", é sabido que ela pode ser reconhecida judicialmente quando houver convergência de condutas para origem do dano, ou obrigações complementares, voltadas à mesma finalidade.
No caso concreto, a solidariedade decorre da atuação paralela do Estado e da empresa privada na implementação do programa de ressocialização por meio do trabalho prisional, havendo omissão do primeiro diante da falha na fiscalização do cumprimento das cláusulas do convênio pela empresa, e da última, ao não assegurar condições seguras de trabalho aos apenados, justificando a responsabilização solidária.
Dessa forma, impõe-se a manutenção da sentença que reconheceu a responsabilidade solidária e condenou ambos ao pagamento de indenização pelos danos estético e moral causados ao autor.
4. Do quantum indenizatório
4.1 Dano moral
Quanto ao valor arbitrado, em relação ao qual pretendem os réus a redução, é cediço que a lei civil não fornece critérios específicos para a fixação do valor da indenização. Por isso a jurisprudência tem optado por confiar ao prudente arbítrio do magistrado essa árdua missão de estipular um valor para amenizar a dor alheia.
Assim é que se tem fixado o quantum indenizatório de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, levando em conta, sobretudo: a malícia, o dolo ou o grau de culpa daquele que causou o dano; as condições pessoais e econômicas das partes envolvidas; a intensidade do sofrimento psicológico gerado pelo abalo sofrido; a finalidade admonitória da sanção, para que a prática do ato ilícito não se repita; e o bom senso, para que a indenização não seja extremamente gravosa, a ponto de gerar um enriquecimento sem causa ao ofendido, nem irrisória, que não chegue a lhe propiciar uma compensação para minimizar os efeitos da violação ao bem jurídico.
Na hipótese, é evidente o sofrimento experimentado pela vítima ao ser exposta à falha na máquina operada, que levou a amputação de parte do dedo, bem como o sentimento de angústia trazido pela própria situação, atrelado à necessidade de intervenção médica e ao tempo de recuperação. Assim, considerando, conjuntamente, as circunstâncias do fato e a extensão física da lesão, tem-se que a quantia fixada na origem (R$ 15.000,00) deve ser mantida, pois se mostra adequada ao fim de eufemizar as consequências do evento lesivo e reprimir suficientemente o responsável, além de estar em conformidade com a jurisprudência em análise de caso bastante semelhante: Apelação n. 5027064-31.2022.8.24.0018, do , rel. Jaime Ramos, Terceira Câmara de Direito Público, j. 26-03-2024.
4.2 Dano estético.
No que tange ao dano estético, é incontroversa a presença de condição de deformidade severa e irreversível, uma vez que o incidente resultou na amputação da ponta do dedo indicador na mão direita da vítima, restando evidente o comprometimento permanente da harmonia física da sua mão.
E, diante de tal situação, observado o tipo de deformidade, a extensão da limitação de algumas atividades cotidianas e, considerando os parâmetros do caso paradigma supra mencionado (n. 5027064-31.2022.8.24.0018), merece parcial acolhimento a insurgência dos réus, motivo pelo qual o valor arbitrado na origem (R$ 15.000,00) deve ser reduzido para o montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais), quantia que se revela suficiente para adequada quantificação do dano.
5. Dos consectários legais
No ponto, afirma o Estado que "restou estabelecido em primeira instância que a correção monetária é devida a contar do evento danoso", e que "o Juízo a quo determinou a substituição dos índices eleitos pela Taxa Selic a contar de 09.12.2021, ou seja, em momento anterior à sentença".
Assim, pugna pela "incidência da Taxa Selic apenas a contar da data do arbitramento do dano moral/estético".
No ponto, razão assiste ao recorrente.
Considerando a natureza distinta da correção monetária (mecanismo de reposição do valor da moeda) e dos juros de mora (indenização pelo descumprimento de uma obrigação legal), o termo inicial de cada um deles também é diverso: no caso, ao passo que a primeira incide desde a data do arbitramento (Súmula 362 do Superior , rel. Bettina Maria Maresch de Moura, Terceira Câmara de Direito Público, j. 16-09-2025).
AÇÃO DE COBRANÇA - CONTRATO ADMINISTRATIVO - INADIMPLEMENTO DOS CONSECTÁRIOS DA MORA - NÃO CARACTERIZAÇÃO DA SUPRESSIO E DO VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM - TERMO INICIAL DO PRAZO DE PAGAMENTO A PARTIR DA CERTIFICAÇÃO DA NOTA FISCAL - PREVISÃO CONTRATUAL EXPRESSA NO CONTRATO 1376/2023 - ENCARGOS DE MORA CONFORME EC113/2021 - INAPLICABILIDADE DO ART. 354 DO CC - INCIDÊNCIA, DELIBERADA DE OFÍCIO, DA EC 136 A CONTAR DE SUA VIGÊNCIA - AUSÊNCIA DE DIREITO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA À AUTARQUIA MUNICIPAL - RECURSOS E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDOS.
1. O pagamento com atraso de prestações devidas por força de contrato administrativo impõe à Fazenda Pública o pagamento de juros de mora e correção monetária.
2. A supressio e o venire sancionam quem por sua conduta indica uma opção consciente por abdicação de direitos, estimulando o outro interveniente a confiar no surgimento de determinada realidade jurídica. A conduta faz nascer uma base negocial que se preste a moldar o conteúdo primitivo do pactuado.
Aqui, diversamente, a Administração apenas quer mitigar o valor devido, como se fosse ético premir o particular a ficar sem pagamento mesmo parcial. Quem admite o creditamento apenas nominal, nas circunstâncias, não está renunciando; está exercendo um direito, ainda que limitadamente.
Além do mais, como notório, a jurisprudência referenda o exato procedimento da acionante, possibilitando que à frente se reclamem os encargos de mora. Seria capcioso - e afrontoso à segurança jurídica da qual o venire e a supressio são apanágios - compreender que o direito de cobrança estaria afastado.
3. Os encargos de mora se submetem à legislação sucessivamente em vigor. Não há direito adquirido a um índice.
Ratificação da sentença que aplicou os Temas 810 do Supremo Tribunal Federal e 905 do Superior , rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 23-09-2025).
Em resumo: a) sobre as indenizações de danos morais e estéticos, incidirão juros de mora, a contar do evento danoso, em conformidade com os índices aplicados à caderneta de poupança (Lei Federal n. 11.960/2009, art. 1º-F); b) a partir do arbitramento, ocorrido em data posterior a promulgação da EC 113/2021, as indenizações deverão ser atualizadas nos termos do art. 3º da referida emenda; c) a partir de 10-09-2025, as indenizações deverão ser atualizadas nos termos dos arts. 389 e 406 do Código Civil; e d) a partir da expedição do precatório/RPV, a atualização se dará na forma do art. 97, §§ 16 e 16-A, do ADCT, com a nova redação dada pela EC 136/2025.
Por fim, em razão da ausência de alteração substancial no julgado, e considerando que o valor arbitrado a título de danos morais não exerce influência sobre a distribuição sucumbencial (Súmula 326, STJ), mantenho a sucumbência nos termos da sentença vergastada.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento aos recursos de ambos os réus para reduzir o quantum indenizatório fixado a título de dano estético para o patamar de R$ 10.000,00 (dez mil reais), e ao recurso do Estado no que tange a modulação dos consectários legais.
assinado por MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6829089v78 e do código CRC 5589663b.
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1. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc136.htm
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Documento:6829090 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5001750-49.2019.8.24.0031/SC
RELATORA: Desembargadora MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA
EMENTA
DIREITO ADMINISTRATIVO E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL DO ESTADO E DE EMPRESA CONVENIADA. RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO EM UNIDADE PRISIONAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DE AMBOS OS APELANTES. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA RECONHECIDA. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS.
I. CASO EM EXAME
Ação indenizatória ajuizada por apenado em razão de acidente ocorrido durante o exercício de atividade laboral em unidade prisional, prestando serviços para empresa conveniada com o Estado. Sentença de parcial procedência que condenou solidariamente os demandados ao pagamento de indenização por danos morais e estéticos. Interposição de recursos por ambos os réus, visando o afastamento da responsabilidade ou a redução do valor indenizatório.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
As questões em discussão consistem em: (i) saber se o Estado e a empresa conveniada possuem legitimidade passiva para responder por danos decorrentes de acidente de trabalho ocorrido em unidade prisional; (ii) saber se há responsabilidade dos réus no caso concreto; (iii) saber se há solidariedade entre os réus; (iii) saber se os valores fixados a título de danos morais e estéticos devem ser mantidos ou reduzidos; (iv) saber qual o termo inicial da incidência da taxa Selic na condenação.
III. RAZÕES DE DECIDIR
A empresa conveniada assumiu obrigações contratuais específicas quanto à segurança e ao fornecimento de equipamentos de proteção individual, sendo corresponsável pela integridade física dos apenados.
O Estado, como responsável pela custódia do apenado, mantém o dever constitucional de garantir condições seguras de trabalho, mesmo diante de convênio com entidade privada.
A omissão de ambos os réus quanto à fiscalização, treinamento e fornecimento de equipamentos de segurança caracteriza falha no dever de vigilância e supervisão.
A responsabilidade solidária decorre da atuação conjunta e omissões recíprocas na execução do programa de ressocialização por meio do trabalho prisional.
O valor fixado a título de dano moral (R$ 15.000,00) deve ser mantido, enquanto o valor referente ao dano estético deve ser reduzido para R$ 10.000,00.
Os juros de mora incidem a partir do arbitramento (Súmula 54/STJ), com aplicação da Taxa Selic a partir da data do arbitramento da condenação, em 21.03.2023.
IV. DISPOSITIVO E TESE
Recurso do Estado conhecido e parcialmente provido. Recurso da empresa conhecido e parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. A empresa conveniada e o Estado são corresponsáveis pela segurança do ambiente laboral dos apenados, sendo legítimos para figurar no polo passivo da ação indenizatória.” “2. A responsabilidade solidária decorre da atuação conjunta e omissões recíprocas na execução do programa de ressocialização por meio de trabalho prisional.” “3. A ausência de fornecimento de equipamentos de proteção e de supervisão técnica adequada configura culpa por omissão da empresa.” “4. A correção monetária incide a partir da data do arbitramento e os juros de mora desde o evento danoso, com aplicação da Taxa Selic, in casu, a partir da data de arbitramento.”
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XLIX; CC, arts. 43, 265; CPC, arts. 85, § 2º, 86; Lei nº 7.210/1984, arts. 28, 34; Súmulas 54 e 362 do STJ.
Jurisprudência relevante citada: TJSC, Apelação Cível n. 0000577-13.2014.8.24.0076, Rel. João Henrique Blasi, 2ª Câmara de Direito Público, j. 28.05.2019; TJSC, Apelação n. 0304635-66.2015.8.24.0038, Rel. Sérgio Roberto Baasch Luz, 2ª Câmara de Direito Público, j. 06.08.2024; TJSC, Apelação n. 0302549-26.2017.8.24.0015, Rel. Diogo Pítsica, 4ª Câmara de Direito Público, j. 10.11.2022; TJSC, Apelação n. 5027064-31.2022.8.24.0018, Rel. Jaime Ramos, 3ª Câmara de Direito Público, j. 26.03.2024; TJSC, Apelação n. 0301489-76.2016.8.24.0007, Rel. Vera Lúcia Ferreira Copetti, 4ª Câmara de Direito Público, j. 27.02.2025.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara de Direito Público do decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento aos recursos de ambos os réus para reduzir o quantum indenizatório fixado a título de dano estético para o patamar de R$ 10.000,00 (dez mil reais), e ao recurso do Estado no que tange a modulação dos consectários legais, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de novembro de 2025.
assinado por MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6829090v5 e do código CRC 29acead8.
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Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 11/11/2025 A 11/11/2025
Apelação Nº 5001750-49.2019.8.24.0031/SC
RELATORA: Desembargadora MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA
PRESIDENTE: Desembargador JOAO HENRIQUE BLASI
PROCURADOR(A): NARCISIO GERALDINO RODRIGUES
Certifico que este processo foi incluído como item 31 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 11/11/2025 às 00:00 e encerrada em 11/11/2025 às 16:47.
Certifico que a 2ª Câmara de Direito Público, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS RECURSOS DE AMBOS OS RÉUS PARA REDUZIR O QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO A TÍTULO DE DANO ESTÉTICO PARA O PATAMAR DE R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS), E AO RECURSO DO ESTADO NO QUE TANGE A MODULAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA
Votante: Desembargadora MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA
Votante: Desembargador JOAO HENRIQUE BLASI
Votante: Desembargador RICARDO ROESLER
NATIELE HEIL BARNI
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:36:20.
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