Decisão TJSC

Processo: 5002122-56.2018.8.24.0023

Recurso: recurso

Relator: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES

Órgão julgador: Turma, j. 8-2-2022.

Data do julgamento: 11 de novembro de 2025

Ementa

RECURSO – Documento:6901678 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5002122-56.2018.8.24.0023/SC RELATOR: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES RELATÓRIO Para retratar o desenvolvimento processual, adota-se o relatório da sentença: O cumprimento provisório de decisão promovido por P. P. M. sofreu impugnação por parte da executada MRV ENGENHARIA E PARTICIPACOES SA, sob o argumento de inexigibilidade das astreintes, uma vez que a exequente é que se recusou a receber as chaves do imóvel e que, ainda assim, o imóvel foi entregue à exequente antes da data definida pelo juízo nos autos principais (evento 6).

(TJSC; Processo nº 5002122-56.2018.8.24.0023; Recurso: recurso; Relator: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES; Órgão julgador: Turma, j. 8-2-2022.; Data do Julgamento: 11 de novembro de 2025)

Texto completo da decisão

Documento:6901678 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5002122-56.2018.8.24.0023/SC RELATOR: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES RELATÓRIO Para retratar o desenvolvimento processual, adota-se o relatório da sentença: O cumprimento provisório de decisão promovido por P. P. M. sofreu impugnação por parte da executada MRV ENGENHARIA E PARTICIPACOES SA, sob o argumento de inexigibilidade das astreintes, uma vez que a exequente é que se recusou a receber as chaves do imóvel e que, ainda assim, o imóvel foi entregue à exequente antes da data definida pelo juízo nos autos principais (evento 6). Intimada, a impugnada manifestou-se acerca da impugnação ao  cumprimento da decisão e argumentou pela improcedência do incidente (evento 24). (evento 33, SENT1) O Juízo de origem acolheu a impugnação e extinguiu o incidente executivo, nos seguintes termos: Ante o exposto, ACOLHO a impugnação ao cumprimento de sentença e JULGO EXTINTO o cumprimento provisório de decisão, em razão da falta da interesse de agir. Condeno a parte exequente/impugnada ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios do cumprimento provisório de decisão e da impugnação, que fixo no patamar total de dez por cento do valor atualizado do proveito econômico que se pretendia obter (R$19.000,00), com fundamento no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Suspendo a exigibilidade das mencionadas verbas sucumbenciais, tendo em vista que a exequente é beneficiária da gratuidade da justiça (evento 7 dos autos principais). (evento 33, SENT1) Inconformada, a parte exequente interpôs apelação, alegando que a decisão que designou a data de entrega das chaves não impôs efeito modificativo à liminar anteriormente concedida. Logo, o atraso na entrega das chaves gerou a multa cominatória executada, conforme determinado liminarmente. Com base nesses argumentos, requereu o provimento do recurso para desconstituir a sentença e dar prosseguimento ao feito executivo (evento 39, APELAÇÃO1). Foram apresentadas contrarrazões (evento 48, CONTRAZAP1). É o relatório. VOTO 1. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE Estão presentes os requisitos de admissibilidade recursal: cabimento, legitimidade, interesse, tempestividade e regularidade formal. O preparo está dispensado em razão da gratuidade da justiça concedida. 2. JUÍZO DE MÉRITO Verifica-se, nos autos originários n. 0302381-63.2018.8.24.0023, que a apelante obteve a liminar pretendida em 28-3-2018, nos seguintes termos: "[...] ANTE O EXPOSTO, defiro a antecipação dos efeitos da tutela, a fim de determinar à ré a entrega das chaves da unidade imobiliária descrita no item 2 do contrato de compra e venda (fl. 61), bem como a sustação de atos voltados à cobrança do valor aqui discutido, ou seja, "diferença de financiamento", em 48 horas, sob pena de multa diária no importe de R$ 1.000,00". (p. 378-370 - evento 7, DEC51) A apelada foi intimada da decisão em 16-4-2018 (evento 11, AR54), devendo cumpri-la até 18-4-2018. Contudo, pediu a prorrogação do prazo para entrega das chaves (evento 13, PET56), sendo assim decidido: "[...] ANTE O EXPOSTO, deixo de acolher os embargos. Impende ressaltar que, embora não escoado o prazo concedido à apresentação das contrarrazões (ato ordinatório de fl. 45 dos embargos), esta decisão não imputa qualquer efeito modificativo ao decisum que deferiu a tutela de urgência, à caracterizar eventual cerceamento de defesa. 2) No tocante aos pedidos formulados às fls. 375/376 dos autos principais, a existência de recusa no recebimento das chaves e a exequibilidade da multa fixada haverão de ser discutidas em procedimento específico, se deflagrado pela autora (CPC, art. 537, § 3º). Por outro lado, com intuito de evitar demasiadas discussões acerca das condições do bem, sendo que a tutela buscava tão somente a transmissão da posse, designo o dia 07/04/2.018, às 14:00 horas, para a entrega formal das chaves e realização da vistoria do apartamento. Os litigantes deverão comparecer no imóvel em foco na data aprazada e poderão se valer de fotografias e outros meios à descrição do estado da unidade imobiliária, inclusive com a presença de profissionais de suas confianças. Eventual ausência da parte contrária deverá ser comprovada através de ata notarial." (Grifou-se - p. 419-420 - evento 17, DEC61) Na sequência, corrigiu-se erro material quanto à data, redesignando-se a entrega e vistoria para 9-5-2018 (evento 22, DESP65). As chaves foram entregues em 7-5-2018 (evento 29, DOC77 - p. 4-5). Na sentença da Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Obrigação de Fazer e Indenização por Danos Morais e Materiais n. 0302381-63.2018.8.24.0023, foi determinado: "Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC, julgo parcialmente procedentes os pedidos de P. P. M. para: [...] b) determinar à MRV ENGENHARIA E PARTIPAÇÕES S.A a entregar as chaves à Autora, obrigação que já foi devidamente cumprida, confirmando, assim, a decisão de tutela de urgência deferida às fls. 368-370;" (grifou-se - evento 55, SENT114) No recurso de apelação interposto contra a referida sentença, este Tribunal entendeu pela manutenção da decisão, inclusive quanto à retenção das chaves: "Alega a ré, ainda, que 'não poderia ser obrigada a cumprir com sua parte no contrato, sem antes ter recebida a contraprestação por parte da Apelada. Assim, [...] se viu obrigada a reter as chaves até integral cumprimento da parte que cabia à Apelada, não podendo incorrer em prejuízo ao entregar o imóvel sem a garantia do recebimento de valores que lhe são devidos", pugnando "seja reconhecida a inexistência de atraso na entrega do imóvel objeto da presente ação, bem como, a improcedência do pleito de arbitramento de multa por atraso'  evento 61, APELAÇÃO119, p. 9-10. Sem razão também aqui. Conforme já mencionado em tópico anterior, ficou devidamente caracterizada a conduta ilícita da apelante ao condicionar a entrega das chaves à autora mediante assinatura de termo de confissão de uma dívida inexistente. De modo que incide mesmo ao caso a multa moratória prevista na cláusula 5.10, item "b" do contrato (evento 1, INF10, p. 6), decorrente do atraso na entrega das chaves. Logo, não há falar em exceptio non adimpleti contractus". (evento 35, RELVOTO1) Do exposto, embora tenha sido designada nova data para entrega das chaves (9-5-2018), constata-se que os fatos que justificaram a redesignação seriam examinados posteriormente, em incidente executivo, caso proposto. Não há, contudo, efeito modificativo da decisão anterior que concedeu a tutela postulada. Veja-se (evento 17, DEC61 dos autos n. 0302381-63.2018.8.24.0023): "[...] a existência de recusa no recebimento das chaves e a exequibilidade da multa fixada haverão de ser discutidas em procedimento específico, se deflagrado pela autora (CPC, art. 537, § 3º). Por outro lado, com intuito de evitar demasiadas discussões acerca das condições do bem, sendo que a tutela buscava tão somente a transmissão da posse, designo o dia 07/04/2.018, às 14:00 horas, para a entrega formal das chaves e realização da vistoria do apartamento." Essa foi a intenção da decisão, tanto que a sentença confirmou a tutela de urgência deferida, mencionando inclusive a paginação da decisão nos autos físicos, condição igualmente mantida em sede recursal. Portanto, a designação de nova data para entrega das chaves não implica, por si só, na desconstituição da tutela antecipada anteriormente concedida. Sua eventual cassação e a consequente inaplicabilidade da multa diária dependerão das provas produzidas no incidente executivo, a fim de demonstrar se houve obstrução, por parte da apelante, ao cumprimento da obrigação judicial pela apelada. Passa-se, portanto, à análise do cumprimento da obrigação. A apelada foi intimada da decisão em 16-4-2018, devendo cumprir a obrigação até 18-4-2018. Conforme troca de e-mails anexada aos autos, observa-se que as partes ajustaram a entrega das chaves para 19-4-2018, às 18h30min (evento 1, DOC3). No entanto, a entrega foi inviabilizada, segundo a apelante, porque a apelada condicionou o ato à assinatura de laudo de vistoria previamente preenchido, atestando que o imóvel se encontrava em perfeito estado (evento 1, DOC4). Nesse sentido, constata-se que não houve recusa da apelante em receber as chaves, mas apenas discordância quanto ao conteúdo do laudo. Todavia, como a entrega foi condicionada à concordância com o documento, a recusa implicou descumprimento da obrigação pela apelada. A apelante apresentou indícios de prova do alegado, cumprindo seu ônus, nos termos do art. 373, I, do CPC. A apelada, por sua vez, não apresentou prova em sentido contrário, embora o ônus fosse inteiramente seu. Diante dos documentos juntados aos autos, assiste razão à apelante quanto à ausência de cumprimento tempestivo da obrigação. Por outro lado, a mesma troca de e-mails demonstra que a apelada impôs condições às novas tentativas de entrega (evento 1, DOC4), além de pretender receber o bem apenas em 3-5-2018 (evento 1, DOC5), dificultando o cumprimento da obrigação. Logo, embora as condutas da apelada tenham resultado no descumprimento da liminar, a apelante também contribuiu para o atraso na entrega das chaves. Essa situação motivou o pedido de dilação do prazo, formulado em 25-4-2018 (evento 13, PET56) e sua consequente concessão, com nova data fixada para 9-5-2018 (evento 17, DEC61 e evento 22, DESP65). Portanto, como a obrigação não foi cumprida de forma tempestiva pela apelada, a multa diária é devida a partir de 19-4-2018 (quinta-feira), cessando em 25-4-2018 (quarta-feira), data em que a apelada se viu compelida a requerer novo prazo para cumprimento, diante da resistência comprovada da apelante. Assim, diante das particularidades do caso, a manutenção da multa originalmente fixada fere os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a ponto de gerar enriquecimento sem causa à parte adversa. Esse entendimento encontra respaldo na jurisprudência deste Tribunal: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE RESILIÇÃO CONTRATUAL. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA NA ORIGEM. BAIXA DO GRAVAME DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DO VEÍCULO.    RECURSO DO BANCO RÉU. ASTREINTES. PRETENSO AFASTAMENTO DA MULTA. IMPOSSIBILIDADE. MEDIDA NECESSÁRIA AO CUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL. VALOR DIÁRIO. MINORAÇÃO DESCABIDA. COMINAÇÃO FIXADA NOS PARÂMETROS ESTABELECIDOS POR ESTA CORTE. REDUÇÃO, DE OFÍCIO, APENAS DO MONTANTE LIMÍTROFE.    RECURSO DESPROVIDO".  (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4024246-85.2019.8.24.0000, da Capital, rel. Ricardo Fontes, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 01-10-2019). Na mesma linha, o Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5002122-56.2018.8.24.0023/SC RELATOR: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES EMENTA DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DE SENTENÇA. ASTREINTES. ENTREGA DE CHAVES. ATRASO. RESISTÊNCIA RECÍPROCA. LIMITAÇÃO DA MULTA DIÁRIA. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Cumprimento provisório de decisão, referente à execução de astreintes por atraso na entrega de chaves, foi impugnado pela executada. 2. A executada alegou inexigibilidade da multa, sustentando que a exequente se recusou a receber as chaves. 3. O Juízo de origem acolheu a impugnação, extinguindo o incidente por falta de interesse de agir e condenando a exequente ao pagamento de honorários. 4. A exequente interpôs apelação, argumentando que a decisão que designou nova data para entrega das chaves não modificou a liminar que fixou a multa cominatória. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 5. Há três questões em discussão: (i) saber se a decisão que designou nova data para entrega das chaves teve efeito modificativo sobre a liminar que fixou as astreintes; (ii) verificar se houve atraso no cumprimento da obrigação de entrega das chaves e se a multa diária é devida; e (iii) analisar a razoabilidade e proporcionalidade do valor das astreintes. III. RAZÕES DE DECIDIR 6. A decisão que designou nova data para entrega das chaves não teve efeito modificativo sobre a liminar que fixou as astreintes, apenas remeteu a discussão sobre a exequibilidade da multa para incidente próprio. 7. A executada condicionou a entrega das chaves à assinatura de laudo de vistoria, inviabilizando o cumprimento tempestivo da liminar. 8. A exequente também contribuiu para o atraso, impondo condições e dificultando a entrega do bem. 9. A multa diária é devida pelo período de 19-4-2018 a 25-4-2018, data em que a exequente solicitou dilação de prazo devido à resistência da executada. 10. O valor das astreintes deve ser limitado a R$ 5.000,00, em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a fim de evitar enriquecimento sem causa. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Recurso conhecido e parcialmente provido. Tese de julgamento: "A multa diária por descumprimento de obrigação de fazer pode ser limitada quando há resistência recíproca das partes e para evitar enriquecimento sem causa." _______________ Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 537, § 3º; CPC, art. 373, I; CPC, art. 487, I; CPC, art. 85, § 2º. Jurisprudência relevante citada: TJSC, Agravo de Instrumento n. 4024246-85.2019.8.24.0000, rel. Ricardo Fontes, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 1°-10-2019; STJ, AgInt no REsp n. 1.761.583/RS, rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 8-2-2022. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos do decidiu, por unanimidade, conhecer da apelação e dar-lhe parcial provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Florianópolis, 11 de novembro de 2025. assinado por GIANCARLO BREMER NONES, Desembargador Substituto, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6901679v3 e do código CRC 0aaf3a1a. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): GIANCARLO BREMER NONES Data e Hora: 04/11/2025, às 19:20:45     5002122-56.2018.8.24.0023 6901679 .V3 Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:16:44. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 04/11/2025 A 11/11/2025 Apelação Nº 5002122-56.2018.8.24.0023/SC RELATOR: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES PRESIDENTE: Desembargador MARCOS FEY PROBST PROCURADOR(A): CARLOS HENRIQUE FERNANDES Certifico que este processo foi incluído como item 13 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 15/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 04/11/2025 às 00:00 e encerrada em 04/11/2025 às 19:26. Certifico que a 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão: A 3ª CÂMARA ESPECIAL DE ENFRENTAMENTO DE ACERVOS DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DA APELAÇÃO E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO. RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES Votante: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES Votante: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST CLEIDE BRANDT NUNES Secretária Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:16:44. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas