Relator: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Órgão julgador:
Data do julgamento: 14 de novembro de 2022
Ementa
RECURSO – Documento:6556640 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5002546-07.2023.8.24.0126/SC RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR RELATÓRIO N. M. D. O. interpôs apelação contra a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Itapoá que, nos autos da ação de rescisão contratual c/c danos morais ajuizada em face de FLAVIANO RAMOS, julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos: Cuida-se de ação de rescisão contratual c/c danos morais ajuizada por N. M. D. O. em face de FLAVIANO RAMOS ME, em razão de supostos vícios ocultos em veículo adquirido pelo autor na garagem do réu.
(TJSC; Processo nº 5002546-07.2023.8.24.0126; Recurso: recurso; Relator: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 14 de novembro de 2022)
Texto completo da decisão
Documento:6556640 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5002546-07.2023.8.24.0126/SC
RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
RELATÓRIO
N. M. D. O. interpôs apelação contra a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Itapoá que, nos autos da ação de rescisão contratual c/c danos morais ajuizada em face de FLAVIANO RAMOS, julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos:
Cuida-se de ação de rescisão contratual c/c danos morais ajuizada por N. M. D. O. em face de FLAVIANO RAMOS ME, em razão de supostos vícios ocultos em veículo adquirido pelo autor na garagem do réu.
Alega, em breve síntese, que adquiriu uma veículo de propriedade do réu, porém descobriu que não é possível fazer a transferência do bem, uma vez que apresenta irregularidades em relação ao alongamento do chassi.
[...]
b) Da Decadência
[...]
Pois bem, considerando a data do negócio e o ingresso da ação, tem-se por esgotado o prazo decadência para desfazimento do negócio, visto que o pedido não foi proposto no prazo de 90 (noventa) dias, nos termos do artigo 26, inciso II do CDC.
O motivo para não se considerar a data da reprovação da vistoria e sim do negócio é justamente a previsão contratual de ciência quanto ao veículo ser modificado, o que não era ignorado pelo autor, já que o modelo convencional do próprio veículo não tem carroceria aberta. Neste sentido, por analógica, tem-se o julgado a seguir:
[...]
Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES (art. 487, I do CPC) os pedidos formulados por N. M. D. O. em face de FLAVIANO RAMOS, para condenar a ré ao pagamento de:
a) Danos Morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), corrigido monetariamente desde a data do evento danoso (aquisição do veículo), além de juros de 1%, a partir da mesma data.
Considerando a sucumbência recíproca, condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios em favor do procurador do autor, os quais fixo em 15% sobre o valor da condenação (CPC/2015, art. 85, § 2.º), e ao pagamento de 50% das despesas processuais. Por outro lado, condeno o autor ao pagamento do restante das despesas processuais, a qual também deverá arcar com honorários advocatícios em favor do procurador do réu, estabelecidos em 15% sobre o proveito econômico obtido (CPC/2015, art. 85, § 2.º). A compensação de honorários é vedada pelo ordenamento jurídico atual (art. 85, § 14). (evento 41, SENT1).
Sustentou, em síntese, o afastamento da declaração de decadência, bem como requereu a majoração da condenação ao pagamento de indenização por danos morais (evento 50, APELAÇÃO1).
Contrarrazões no evento 55, CONTRAZAP1.
É o relatório.
VOTO
1 – Admissibilidade
O recurso deve ser conhecido, uma vez que tempestivo e presentes os demais requisitos de admissibilidade.
2 – Mérito
2.1 – Decadência
A parte autora sustentou a não ocorrência de decadência do pedido de rescisão contratual, ao argumento de que o vício oculto apenas tornou-se conhecido com a vistoria do Detran, sendo este o marco inicial da fluência do prazo decadencial.
Com razão.
Por se tratar de relação consumo, nos termos da decisão inaugural (evento 6, DESPADEC1), o prazo para o ajuizamento da ação de rescisão contratual, apontando a ocorrência de vício oculto, é de 90 dias da data do conhecimento do vício, nos termos do artigo 26, II, § 3º, do CDC:
Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: [...]
II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis. [...]
§ 3° Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito.
No caso dos autos, a sentença recorrida, para declarar a decadência do pleito, fundamentou que a parte autora tinha conhecimento das alterações do veículo em razão dos termos do contrato.
Transcreve-se da referida decisão:
Segundo consta, o negócio entre as partes ocorreu aos 14/11/2022, oportunidade em que o autor estava ciente, por meio da documentação do veículo, inclusive de sua passagem por leilão, que se tratava de automóvel customizado, conforme contrato de ev. 1.5, vejamos:
"3.2 O (s) COMPRADOR (ES) declara (m) ter recebido do VENDEDOR informações quanto a existência de sinistro e/ou passagem por leilão do veiculo adquirido, tendo total conhecimento das consequências existentes, não tendo o que reivindicar sobre quaisquer vícios ocultos que o veículo possa apresentar." [evento 1, CONTR5]
Como pedido principal, o autor deseja a rescisão contratual com o retorno do estado anterior ao negócio.
Pois bem, considerando a data do negócio e o ingresso da ação, tem-se por esgotado o prazo decadência para desfazimento do negócio, visto que o pedido não foi proposto no prazo de 90 (noventa) dias, nos termos do artigo 26, inciso II do CDC.
O motivo para não se considerar a data da reprovação da vistoria e sim do negócio é justamente a previsão contratual de ciência quanto ao veículo ser modificado, o que não era ignorado pelo autor, já que o modelo convencional do próprio veículo não tem carroceria aberta. Neste sentido, por analógica, tem-se o julgado a seguir: (evento 41, SENT1).
No entanto, o fato de estar no contrato a ciência de que veículo passou por leilão não resulta na ciência de alongamento do chassi. Na verdade, quando muito, traria luz de que veículo não é novo, mas jamais pode-se extrair que o comprador tinha conhecimento de que veículo sofreu uma alteração estrutural que impediria a transferência perante o Detran. Ademais, a mera alteração visual do veículo não significa dizer que o veículo sofreu a referida modificação irregular de seu chassi.
Ou seja, não se pode extrair da referida cláusula que o comprador tinha conhecimento a respeito do vício que, adianta-se, ensejará a rescisão contratual.
Estabelecida tal premissa, deve-se então apreciar quando ocorreu a ciência do vício.
O contrato de compra e venda do veículo seminovo foi celebrado em 14 de novembro de 2022 (evento 1, CONTR5), cujo veículo, nos laudos do Detran de 2021 e 2022 (evento 23, LAUDO7), já apresentava alterações visuais.
No entanto, quando da realização da vistoria para a transferência do veículo entre os litigantes, o departamento de trânsito solicitou perícia para o veículo, com a hipótese de adulteração da carroceria (evento 1, LAUDO6):
A perícia identificou sinais de emenda por solda, caracterizando alongamento no comprimento do chassi, concluindo pela sua modificação de forma irregular (evento 1, LAUDO7).
A parte apelante sustenta que se tratar de vício oculto, cuja característica é a impossibilidade de seu uso, gozo e disposição do produto forma adequada e que somente se tem conhecimento com a utilização do bem.
Assim, em que pese haver identificação de alteração no visual no CRLV do veículo (evento 23, EXTR5), o vício oculto que inutiliza o veículo apenas foi externado quando da tentativa de transferência de bem, cuja reprovação do órgão de trânsito é o marco inicial do prazo decadencial, por ser a data (19-6-2023 - evento 1, LAUDO6) em que a parte autora tomou conhecimento do vício oculto que a alteração do chassi lhe acarretaria.
Neste sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO COM NUMERAÇÃO DE SÉRIE DO MOTOR ADULTERADA. CONSTATAÇÃO DO PROBLEMA DURANTE VISTORIA DE TRANSMISSÃO DO BEM JUNTO AO DETRAN. IMPOSSIBILIDADE DE TRANSFERÊNCIA DO BEM. DIREITO DE USO, GOZO E DISPOSIÇÃO DO BEM IMPEDIDO. [...] Em ação de indenização por danos materiais e morais onde o autor adquire veículo automotor e, ao tentar efetuar sua transferência junto ao DETRAN, é surpreendido por laudo de vistoria noticiando adulteração no número de série do motor, o que impossibilita a transferência e gera apreensão do bem por autoridade policial, evidente se mostra o dever do comerciante alienante de indenizar o adquirente. ART. 18, CDC. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO. RELAÇÃO DE CONSUMO. VÍCIO OCULTO. PRAZO DECADENCIAL DE 90 (NOVENTA) DIAS A CONTAR DO CONHECIMENTO DO VÍCIO. PRETENSÃO REPARATÓRIA POR DEFEITO. PRAZO PRESCRICIONAL DE 5 (CINCO) ANOS. PREJUDICIAIS AFASTADAS [...] (TJSC, Apelação Cível n. 2009.054905-9, de Criciúma, rel. Carlos Prudêncio, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 15-02-2011). (sem destaques no original).
Cumpre registrar que é incontroverso pelas partes que a alteração do chassi por alongamento é anterior ao contrato de compra e venda, seja porque a parte autora jamais alegou o contrário, seja, ainda, porque a parte ré afirmou, na peça contestatória (evento 23, CONT1), que a parte autora tinha conhecimentos das alterações.
Assim, tendo em vista que a parte autora tomou conhecimento do vício oculto que a impediria de usufruir livremente do bem em 19-6-2023, enquanto ajuizou a presente ação em 23-8-2023, não houve o transcurso do prazo de 90 dias previsto no artigo 26, II, do CDC.
O recurso, portanto, merece acolhimento para afastar a declaração de ocorrência de decadência.
2.2 – Julgamento imediato da causa
A parte autora ingressou com a presente ação para, dentre outros pedidos, requerer a rescisão contratual. A sentença, por outro lado, tendo declarada a decadência, deu por prejudicado tal pleito.
Assim, afastada a ocorrência de decadência, necessária se faz a análise do pedido rescisório.
Considerando que a causa está madura para a análise do mérito, viável o seu julgamento imediato, nos termos do artigo 1.013 do Código de Processo Civil.
2.3 – Rescisão contratual
A parte autora requereu a rescisão contratual, nos termos dos artigos 14 e 35, III, ambos do CDC, ao argumento de que a impossibilidade de transferência do veículo para o seu nome em razão da reprovação na vistoria do Detran acarreta o inadimplemento contratual do vendedor do veículo.
Com razão, mesmo que por fundamento jurídico diverso.
Isto porque, nos termos do artigo 18, § 1º, II, do CDC, existindo vício que torne o produto impróprio ou inadequado, o consumidor pode, à sua livre escolha, optar pela rescisão do contrato, com a imediata restituição dos valores. In verbis:
Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas
as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
[...]
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
No caso dos autos, o vício oculto quanto à alteração do chassi (alongamento não autorizado - evento 1, LAUDO7) permite a rescisão do contrato por culpa do vendedor de veículo, tendo em vista a impossibilidade de transferência do veículo perante o órgão de trânsito.
Neste sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULO C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES, BENS E DANOS MORAIS. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INCONFORMISMO DA AUTORA. PRETENDIDA A RESCISÃO CONTRATUAL. VÍCIO OCULTO CONSISTENTE NA ADULTERAÇÃO DA NUMERAÇÃO DO MOTOR DO VEÍCULO. CONSTATAÇÃO POR LAUDO DE VISTORIA CAUTELAR E PERÍCIA JUDICIAL. VÍCIO QUE IMPOSSIBILITA A TRANSFERÊNCIA DO VEÍCULO PERANTE O ÓRGÃO DE TRÂNSITO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 18 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. IRREGULARIDADE NÃO SANADA PELA REQUERIDA. RETORNO DAS PARTES AO STATUS QUO [...] (TJSC, Apelação n. 0301449-72.2018.8.24.0024, rel. Des. Jairo Fernandes Gonçalves, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 28-01-2025). (sem destaques no original).
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO USADO. GRAVAÇÃO DO CHASSI FORA DO PADRÃO DE FÁBRICA. IMPEDIMENTO À TRANSFERÊNCIA EM VISTORIA POSTERIOR. VÍCIO OCULTO CONFIGURADO. [...]
III. RAZÕES DE DECIDIR [...]
4. A irregularidade na gravação do chassi, embora não aparente, compromete a regular transferência do veículo, caracterizando vício oculto nos termos do art. 441 do Código Civil, implicando responsabilidade objetiva do fornecedor, uma vez que se trata de relação de consumo. [...]
(TJSC, Apelação n. 0324100-61.2015.8.24.0038, do , rel. Luis Francisco Delpizzo Miranda, Segunda Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 18-06-2025).
Assim sendo, diante da procedência do pedido de rescisão contratual, as partes devem retornar ao status quo ante. Deste modo, a parte autora deverá entregar o veículo (Chevrolet Veraneio - placa BFW0F40) à pessoa jurídica ré, no prazo de 15 dias do trânsito em julgado, enquanto esta deverá restituir à parte autora os valores pagos para a formalização do negócio jurídico, bem como deverá devolver o veículo utilizado na entrada (Kawasaki Vulcan - placa ESP8C81), também no prazo de 15 dias do trânsito em julgado, não havendo o que falar em restituição de nenhum dos bens móveis pela Tabela FIPE.
Deste relator:
DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL COM PEDIDO INDENIZATÓRIO. [...]
4. A restituição integral da quantia paga está amparada pelo art. 18, §1º, II, do CDC, sendo descabido o seu valor pela tabela FIPE. [...]
(TJSC, Apelação n. 0310276-03.2016.8.24.0005, do , rel. Leone Carlos Martins Junior, Terceira Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, j. 10-12-2024). (sem destaques no original).
Quantos aos consectários legais, nos casos como o presente em que não há prévia convenção entre as partes, em atenção à tese firmada no Tema 1368/STJ e à orientação jurisprudencial pacífica no sentido de que a taxa Selic abrange, em sua composição, juros de mora e correção monetária: a) a correção monetária, quando incidente de forma isolada, deve ser calculada com base no INPC (Provimento CGJ n. 13/1995, revogado pelo Provimento CGJ n. 24/2024) até a entrada em vigor do parágrafo único do artigo 389 do CC/02 (introduzido pela Lei n. 14.905/2024) e, a partir de 30/08/2024, com base no IPCA; b) os juros de mora, quando incidentes de forma isolada, devem ser calculados à taxa de 6% ao ano (art. 1.062 do CC/1916) e, após a entrada em vigor do CC/02 (em 18/03/2016, segundo Enunciado administrativo n. 1 do STJ), com base na taxa legal, correspondente à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic deduzido o IPCA (art. 406 do CC/02 – divulgada pelo BCB e disponível na denominada "calculadora do cidadão", aqui); e c) para o período de incidência concomitante de correção monetária e juros de mora, a dívida deve ser acrescida apenas da taxa Selic, observada a regra do § 3º do artigo 406 do CC/02.
Neste caso, a correção monetária da restituição, pelo réu, dos valores pagos pela parte autora, incidente desde a data do desembolso (Súmula n. 43/STJ), deve ser calculada com base no INPC até a data da citação (mora ex persona – art. 405 do CC/02), a partir de quando, incidirá apenas a taxa Selic.
Caso verificada a impossibilidade de cumprimento da obrigação de fazer consistente na devolução de quaisquer veículos, deverá ser aplicado ao caso o art. 389 do Código Civil, que dispõe que "não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado".
Ainda, sobre o tema, decidiu o Superior editou a Súmula 29: "o descumprimento contratual não configura dano moral indenizável, salvo se as circunstâncias ou as evidências do caso concreto demonstrarem a lesão extrapatrimonial."
No caso dos autos, a parte apelante nem sequer comprovou a impossibilidade de exercício de sua atividade laboral com o veículo, o que, por si só, já fulmina o direito alegado.
Isto porque, nos termos do artigo 373, I, do CPC, é incumbência do autor comprovar o alegado dano moral. Sem esta prova, a improcedência do pedido indenizatório é a medida a ser adotada.
A propósito:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONSTATAÇÃO PELO DETRAN AO REALIZAR VISTORIA DE QUE O NÚMERO DO MOTOR DO VEÍCULO ERA DIFERENTE AO CADASTRADO NO DENATRAN. DEMORA NA TRANSFERÊNCIA DO BEM. RECURSO DA RÉ. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA AFASTADA. DEFEITO DE QUALIDADE. ART. 18 DO CDC. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA RÉ CONFIGURADA. DEVER DE RESTITUIR O VALOR PAGO PELO VEÍCULO, MEDIANTE SUA DEVOLUÇÃO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. É garantida indenização pelos danos materiais, inclusive com a restituição do valor pago pelo veículo, quando constatado vício de qualidade no automóvel, no caso, com motor alterado, inteligência do art. 18, § 1º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor. O simples inadimplemento contratual, sem que a parte adquirente esteja submetida a situação vexatória excepcional, não se subleva à condição bastante para a ocorrência do dano moral (Apelação Cível n. 2012.064484-7, de Lages, rela. Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, j. 23-10-2012). INSURGÊNCIA DOS AUTORES. PLEITO DE MAJORAÇÃO DO VALOR FIXADO A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE AFASTADA. PREJUDICADO O EXAME DO MÉRITO RECURSAL. (TJSC, Apelação Cível n. 2009.072819-8, da Capital, rel. Stanley da Silva Braga, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 04-04-2013). (sem destaques no original).
Por outro lado, a sentença recorrida condenou a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00. Assim, em razão da ausência de impugnação recursal da parte contrária, bem como diante da impossibilidade de reformatio in pejus, a sentença deve ser mantida quanto à condenação, inclusive nos seus valores.
O recurso, portanto, não merece provimento neste viés, mantendo-se incólume a condenação fixada na sentença recorrida.
3 – Ônus sucumbencial
Com a reforma da sentença e o reconhecimento da procedência dos pedidos autorais, a redistribuição do ônus da sucumbência é medida que se impõe.
Assim, deve-se condenar a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes, em atenção ao Tema 1076/STJ, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, a teor do artigo 85, § 2º, incisos I ao IV, do CPC, acrescidos apenas da taxa Selic a partir do trânsito em julgado.
O montante remunera adequadamente o tempo e o trabalho despendido pelo patrono da parte, levando-se em conta a natureza da presente ação, cuja complexidade não excede os parâmetros da normalidade, o fato de que se trata de processo eletrônico e, portanto, não exige deslocamentos reiterados, bem como o tempo de duração do processo.
No mais, em razão da redistribuição da sucumbência, não se pode falar em fixação de honorários recursais.
Isto porque, em conformidade com a jurisprudência do Superior TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5002546-07.2023.8.24.0126/SC
RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
EMENTA
DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C DANOS MORAIS. VÍCIO OCULTO EM VEÍCULO. ALONGAMENTO IRREGULAR DE CHASSI. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos de rescisão contratual c/c danos morais, declarando a decadência do direito de rescisão contratual por vício oculto no veículo, mas condenando o réu ao pagamento de indenização por danos morais.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. As questões em discussão consistem em: (i) saber se ocorreu decadência do direito de rescisão contratual por vício oculto, considerando o prazo de 90 dias previsto no art. 26, II, do CDC; (ii) saber se procede o pedido de rescisão contratual diante da constatação de alongamento irregular do chassi que impossibilita a transferência do veículo; e (iii) saber se é cabível a majoração da indenização por danos morais.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. O prazo decadencial de 90 dias para reclamar por vício oculto, previsto no art. 26, II, § 3º, do CDC, inicia-se no momento em que o defeito fica evidenciado, e não da data da celebração do contrato, especialmente quando a cláusula contratual não especifica as alterações estruturais do veículo. No caso, o vício oculto (alongamento irregular do chassi que inutiliza o bem) somente foi descoberto quando da vistoria para transferência do veículo junto ao Detran em 19-6-2023, sendo a ação ajuizada em 23-8-2023, dentro do prazo legal.
4. A constatação de alongamento irregular do chassi, que impossibilita a transferência do veículo perante o órgão de trânsito, caracteriza vício oculto, torna o produto inadequado ao consumo, ensejando a rescisão contratual com base no art. 18, § 1º, II, do CDC, com retorno das partes ao status quo ante.
5. O inadimplemento contratual, por si só, não gera dano moral indenizável, salvo se comprovadas circunstâncias excepcionais que demonstrem lesão extrapatrimonial, conforme Súmula 29 do TJSC. No caso, não foi comprovada a impossibilidade de exercício da atividade laboral com o veículo, mantendo-se o valor fixado na sentença, em observância à vedação da reformatio in pejus.
IV. DISPOSITIVO
6. Recurso conhecido e parcialmente provido para afastar a declaração de decadência e julgar procedente o pedido de rescisão contratual, condenando as partes ao retorno ao status quo ante, autorizando eventual conversão em perdas e danos na hipótese de impossibilidade de restituição dos veículos. Sem honorários recursais em razão da redistribuição da sucumbência.
Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 18, § 1º, II, e 26, II, § 3º; CPC, arts. 373, I, e 1.013.
Jurisprudência relevante citada: TJSC, Apelação Cível n. 2009.054905-9, Rel. Des. Carlos Prudêncio, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 15.02.2011; TJSC, Apelação n. 0301449-72.2018.8.24.0024, Rel. Des. Jairo Fernandes Gonçalves, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 28.01.2025; Súmula 29/TJSC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para: a) afastar a declaração de decadência; b) com base no art. 1.013 do CPC, julgar procedente o pedido inicial de rescisão contratual e determinar o retorno das partes status quo ante, cabendo à parte autora devolver o veículo aquirido à ré, no prazo de 15 dias do trânsito em julgado, e à ré, restituir à parte autora os valores pagos, corrigidos desde o desembolso pelo INPC e acrescidos a partir da citação apenas da taxa Selic, bem como restituir o veículo dado em pagamento no prazo de 15 dias do trânsito em julgado, sendo que, em caso de impossibilidade de restituição, a obrigação será convertida em perdas e danos pelo valor atribuído ao bem na data do contrato, com os mesmos consectários legais da parcela líquida; e c) redistribuir os ônus sucumbenciais e condenar a parte embargante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, acrescidos apenas da taxa Selic a partir do trânsito em julgado, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de novembro de 2025.
assinado por LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR, Desembargador Substituto, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6556641v13 e do código CRC 05a10f20.
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Signatário (a): LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Data e Hora: 04/11/2025, às 17:31:38
5002546-07.2023.8.24.0126 6556641 .V13
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 04/11/2025 A 11/11/2025
Apelação Nº 5002546-07.2023.8.24.0126/SC
RELATOR: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
PRESIDENTE: Desembargador MARCOS FEY PROBST
PROCURADOR(A): CARLOS HENRIQUE FERNANDES
Certifico que este processo foi incluído como item 88 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 15/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 04/11/2025 às 00:00 e encerrada em 04/11/2025 às 19:26.
Certifico que a 3ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª CÂMARA ESPECIAL DE ENFRENTAMENTO DE ACERVOS DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO PARA: A) AFASTAR A DECLARAÇÃO DE DECADÊNCIA; B) COM BASE NO ART. 1.013 DO CPC, JULGAR PROCEDENTE O PEDIDO INICIAL DE RESCISÃO CONTRATUAL E DETERMINAR O RETORNO DAS PARTES STATUS QUO ANTE, CABENDO À PARTE AUTORA DEVOLVER O VEÍCULO AQUIRIDO À RÉ, NO PRAZO DE 15 DIAS DO TRÂNSITO EM JULGADO, E À RÉ, RESTITUIR À PARTE AUTORA OS VALORES PAGOS, CORRIGIDOS DESDE O DESEMBOLSO PELO INPC E ACRESCIDOS A PARTIR DA CITAÇÃO APENAS DA TAXA SELIC, BEM COMO RESTITUIR O VEÍCULO DADO EM PAGAMENTO NO PRAZO DE 15 DIAS DO TRÂNSITO EM JULGADO, SENDO QUE, EM CASO DE IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO, A OBRIGAÇÃO SERÁ CONVERTIDA EM PERDAS E DANOS PELO VALOR ATRIBUÍDO AO BEM NA DATA DO CONTRATO, COM OS MESMOS CONSECTÁRIOS LEGAIS DA PARCELA LÍQUIDA; E C) REDISTRIBUIR OS ÔNUS SUCUMBENCIAIS E CONDENAR A PARTE EMBARGANTE AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, ESTES ARBITRADOS EM 10% (DEZ POR CENTO) DO VALOR DA CONDENAÇÃO, ACRESCIDOS APENAS DA TAXA SELIC A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Votante: Desembargador Substituto LEONE CARLOS MARTINS JUNIOR
Votante: Desembargador MARCOS FEY PROBST
Votante: Desembargador Substituto GIANCARLO BREMER NONES
CLEIDE BRANDT NUNES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2025 02:16:23.
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